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As seções anteriores trouxeram algumas considerações iniciais sobre a dificuldade da circunscrição da noção de informação, tendo em vista o caos conceitual que decorre de seu uso em quase todas as disciplinas científicas conhecidas. Foi indicado que, por este mesmo motivo, a investigação a que se propôs este item estaria circunscrita à perspectiva da ordem social, conforme delineada acima, e aos fins a que se estabeleceu a presente dissertação de mestrado.

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É inequívoco que a história da informação sempre esteve intimamente ligada à própria História do homem. Não por outro motivo, o desenvolvimento da escrita – que consigo trouxe a possibilidade de disseminação do conhecimento e do desenvolvimento da matemática – figura como o grande marco que separa os agrupamentos humanos mais primitivos das grandes civilizações.58

Em particular, há uma relação muito estreita entre a evolução da informação – ou mais precisamente, dos meios de propagação do conteúdo informacional e da popularização de certos conteúdos – e o modelo de organização social burguês inaugurado no século XVIII, do qual já se tratou acima.

Primeiro, é razoável afirmar que as revoluções burguesas foram em parte tornadas possíveis em razão da aceleração do processo de disseminaçao da informação que se observou a partir da Baixa Idade Média. Durante a maior parte do medievo, as fontes informacionais ficaram restritas aos círculos católicos. A Reforma Protestante e o Renascimento trouxeram à tona muitas destas fontes, que por sua vez influenciaram os pensadores iluministas que inspiraram os movimentos revolucionários. Além disso, a descoberta dos tipos móveis por Johannes GUTENBERG, em meados do século XV, permitiu que a mensagem daqueles autores alcançasse um público infinitamente mais vasto.59 Não fosse pela imprensa, por exemplo, dificilmente o Iluminismo teria chegado com a mesma força à América do Norte, onde impulsionou a Independência dos Estados Unidos.

Segundo, o rompimento com as amarras culturais e com o sistema feudal abriu um terreno fértil para o desenvolvimento tecnológico e para transformações profundas no modo de produção capitalista.60 Principalmente a partir do século XIX, o aumento da produção informacional e a revolução tecnológica seguiram retroalimentando-se. A

58 G

LEICK, James. The information: a history, a theory, a flood. New York: Pantheon Books, 2011, pp. 28-50.

59 Sobre o tema, conferir a obra seminal de E

ISENSTEIN, Elizabeth. The printing press as an agent of change: communications and cultural transformations in early-modern Europe. Cambridge: Cambridge University Press, 1979.

60 C

APURRO, Rafael; HJORLAND, Birger. O conceito de informação, Perspectivas em Ciência da Informação, v. 12, n. 1, jan.-abr. 2007, p. 149. (Trad. Ana Maria Pereira Cardoso, Maria da Glória Achtschin Ferreira e Marco Antônio de Azevedo.)

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produção do conhecimento e sua disseminação impulsionaram o avanço tecnológico, e o avanço tecnológico, principalmente no que diz respeito aos meios de comunicação e transporte, permitiu que mais indivíduos tivessem acesso ao conhecimento e, com isso, contribuíssem para o desenvolvimento científico e o crescimento econômico.61 A Revolução Industrial é produto deste processo.

Outrossim, dos dois exemplos expostos, é possível derivar que a noção de informação para a ordem social, de que aqui se trata, pode coincidir, de modo bastante simplificado, com a unidade informacional básica de que trata FLORIDI, composta por

“dado + significado”. Isto é, a informação – como aquela de cunho filosófico, religioso, científico ou tecnológico – é tudo aquilo que pode ser notado e compreendido.62

CAPURRO E HJORLAND, ao proporem que a noção de informação na Ciência da

Informação se ligue àquilo que é informativo para uma determinada pessoa,63 vão além daquela unidade mais básica, e partem da ideia de “conhecimento comunicado”64. Os autores destacam que este conhecimento, por sua vez, é geralmente definido como informação em termos de sua (i) relevância e (ii) novidade para o indivíduo.65 Estas noções a que se referem CAPURRO E HJORLAND são particularmente úteis para o enfoque que se quer dar para a informação na ordem social e na ordem de mercado, na medida em que elas

61

GLEICK, James. The information: a history, a theory, a flood. New York: Pantheon Books, 2011, pp. 78- 124.

62

FLORIDI, Luciano. Information: a very short introduction. New York: Oxford University Press, 2010, pp. 20-23.

63 C

APURRO, Rafael; HJORLAND, Birger. O conceito de informação, Perspectivas em Ciência da Informação, v. 12, n. 1, jan.-abr. 2007, pp. 154-155. (Trad. Ana Maria Pereira Cardoso, Maria da Glória Achtschin Ferreira e Marco Antônio de Azevedo.)

64 Para C

APURRO E HJORLAND, há que se falar em conhecimento na medida em que, quando se está a tratar de seres humanos, o processo de aquisição da informação é sempre seletivo. Assim, “[q]uando estamos lidando com o significado de uma mensagem, discutimos interpretação, isto é, a seleção entre as possibilidades semânticas e pragmáticas da mensagem. Interpretar uma mensagem significa, em outras palavras, introduzir a perspectiva do receptor – suas crenças e desejos, torná-lo um parceiro ativo no processo de informação.” CAPURRO, Rafael; HJORLAND, Birger. O conceito de informação, Perspectivas em Ciência da Informação, v. 12, n. 1, jan.-abr. 2007, pp. 151-155 e 173. (Trad. Ana Maria Pereira Cardoso, Maria da Glória Achtschin Ferreira e Marco Antônio de Azevedo.)

65 C

APURRO, Rafael; HJORLAND, Birger. O conceito de informação, Perspectivas em Ciência da Informação, v. 12, n. 1, jan.-abr. 2007, p. 150. (Trad. Ana Maria Pereira Cardoso, Maria da Glória Achtschin Ferreira e Marco Antônio de Azevedo.)

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permitem afirmar, aqui, que a informação se presta, invariavelmente, às funções de conferir segurança e de reduzir as incertezas dos agentes que a recebem.

Contudo, antes de aprofundar a análise dos elementos que definem a informação e as funções da informação que serão enfocadas, é preciso primeiro tecer alguns comentários breves sobre como se dá a distribuição da informação na ordem social.

De um lado, como já antecipado no início do presente Capítulo, o estudo da informação é bastante dificultado porque, no limite, tudo – as cores, os aromas, as sensações, ou a ausência destes elementos – é informação. O indivíduo é cercado, a todo o tempo, por estímulos informacionais.66

Por outro lado, porque a produção informacional no mundo é de tal magnitude e porque o processamento da informação depende também de componentes subjetivos,67 não pode o indivíduo nem absorver tudo, nem absorver a informação de forma idêntica a outros indivíduos. Daí resulta que, a despeito de estar envolvido a todo o tempo em relações de troca informacional – absorvendo, produzindo e replicando informação –, o indivíduo está também sempre em constante situação de déficit informacional.

Nesse sentido, a despeito de certos atributos especiais da informação, como a possibilidade de disserminar-se com muita rapidez,68 é possível afirmar que a informação não se distribui na ordem social de forma homogênea – isto é, os seres humanos individualmente considerados não dispõem da mesma quantidade de informação, não processam a informação da mesma forma e não podem conhecer completamente a extensão a que estão informados os outros indivíduos.

Isto posto, embora relevante para diversas outras perquirições científicas, a perspectiva da informação como um fenômeno compreensivo que equivale à própria

66 B

ORGMANN, Albert. Holding on to reality: the nature of information at the turn of the millenium. Chicago: The University of Chicago Press, 1999, pp. 1-6.

67 C

APURRO, Rafael; HJORLAND, Birger, O conceito de informação, Perspectivas em Ciência da Informação, v. 12, n. 1, jan.-abr. 2007, p. 155. (Trad. Ana Maria Pereira Cardoso, Maria da Glória Achtschin Ferreira e Marco Antônio de Azevedo.)

68 F

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descrição ou percepção da realidade é inútil aqui, na medida em que ela reduz tudo a informação e por isso não permite que certas diferenciações valiosas para a dinâmica dos mercados sejam feitas nos próximos Capítulos. Nesse sentido, o estudo da informação é facilitado enfocando-se a distribuição não equivalente da informação na ordem.

Feitas estas considerações, é possível continuar avançando na análise da noção e função da informação na ordem social.

Assim, porque os seres humanos vivem neste constante estado de déficit informacional, a informação e o processo de aquisição da informação podem ser entendidos da seguinte perspectiva.

A informação deve implicar potencial de mudança, ou mudança objetiva do status informacional do sujeito. Daí decorre que a informação geralmente é acompanhada dos elementos de relevância e/ou de novidade dos quais se tratou acima. Por relevância e novidade se quer dizer que a informação pode preencher ou complementar a ausência de conteúdo, assim como ela pode reforçar ou transformar uma posição inicial. Nesta linha, a própria ausência de conteúdo informacional pode ser, ela mesma, informação. Basta que, uma vez incorporada aos fluxos de informação do indivíduo, a (não) informação tenha o potencial de operar mudança na situação informacional do sujeito que a recebe.69 Por esta razão, a informação tem sido definida na doutrina especializada como “a diferença que faz a diferença”.7071

69 C

APURRO, Rafael; HJORLAND, Birger. O conceito de informação, Perspectivas em Ciência da Informação, v. 12, n. 1, jan.-abr. 2007, pp. 171-172. (Trad. Ana Maria Pereira Cardoso, Maria da Glória Achtschin Ferreira e Marco Antônio de Azevedo.)

70 F

LORIDI, Luciano. Information: a very short introduction. New York: Oxford University Press, 2010, p. 23.

71

Mais ao ponto dos objetivos da presente dissertação de mestrado, é curioso notar que a lógica da informação como diferença que faz a diferença é, no limite, parecida com a aplicada pela Suprema Corte norte-americana quando recorre ao chamado total mix test para determinar a materialidade de uma informação na configuração da ilicitude. De acordo com tal teste, há que se falar em materialidade se um investidor razoável teria considerado uma dada declaração ou omissão como relevante para a tomada da decisão de investimento (Basic Inc. v. Levinson, 485 U.S. 224, 231). Não é suficiente alegar que o investidor teria considerado a informação “importante”. Por outro lado, também não é necessário provar que o investidor teria agido de forma diferente se a correta divulgação de informações tivesse sido feita. Na prática, a materialidade depende das circunstâncias de um determinado caso. Cf. COFFEE JR., John C. Securities Regulation: cases and materials. 11ª ed. New York: Foundation Press, 2009, p. 965.

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Dos elementos acima referidos, que acompanham a noção usual de informação, é possível afirmar que a informação invariavelmente opera reduzindo a incerteza de quem a recebe. As diferenças informacionais entre grupos e entre indivíduos isoladamente considerados implicam necessariamente a existência da incerteza – isto é, a impossibilidade de que o indivíduo saiba algo com total segurança ou de que aja com total segurança se chamado a agir. A informação correta, como aqui definida, porque introduz novos e importantes elementos ao conjunto informacional do indivíduo, tende a reduzir o leque de incertezas do sujeito. Isto não implica dizer, reitere-se, que o grupo ou indivíduo de que se trata está “bem” informado, mas apenas que ele se encontra “mais” informado e por isso, ao menos do ponto de vista teórico, dotado de mais segurança para agir.7273

Retomando o que toca à ordem social, das considerações acima resta ainda mais clara a relação da informação como verdadeiro vetor de funcionamento da ordem, impulsionando-a a constantes transformações, em um processo que muitos descreveriam como a própria “evolução” da humanidade.

No entanto, as considerações acima tecidas também desnudam certas implicações que surgem ao voltar-se o olhar para o interior da ordem, e para as relações travadas entre os indivíduos do ponto de vista informacional.

Recorrendo-se a uma simplificação metodológica, concluiu-se que a ordem é um sistema passível de transformações, mas relativamente constante de padrões de interação, norteado por interesses identificáveis, cujo caráter comum identifica a ordem e aproxima suas estruturas. No seio deste sistema encontram-se relações nas quais um indivíduo ou um grupo ocupa posição tal que lhe permite impor sua vontade sem o concurso da resistência de outro indivíduo ou grupo.74 Do sujeito ativo (ou sujeitos ativos) desta relação diz-se que

72

Ainda que o “agir” seja, efetivamente, “deixar de agir”.

73 Naturalmente, quando a informação é incorreta, esta segurança é apenas aparente.

74 Cf. C

OMPARATO, Fábio Konder. O poder de controle na sociedade anônima. Rio de Janeiro: Forense, 1983, p. 7.

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tem ele um poder; correlatamente, coloca-se o sujeito passivo em posição jurídica de sujeição.75

O poder, ensina DE CHIARA, se manifesta tanto pela possibilidade76 de interferência legítima quanto pela interferência mesma daquele que o exerce na esfera de interesses de terceiros.77

FOUCAULT relembra, de modo bastante apropriado, que a natureza desta

interferência não é, necessariamente, repressiva, nem implica sempre efeitos negativos:

Mas me parece hoje que a noção de repressão é bastante inadequada para capturar precisamente aquele que é o aspecto produtivo do poder.

(...)

Eu acredito que esta é uma concepção de poder inteiramente negativa, estreita e rudimentar, uma que tem curiosamente se espalhado. Se o poder nunca fosse nada além de repressão, se ele não fizesse nada a não ser dizer não, você realmente acredita que alguém seria compelido a obedecê-lo? O que torna o poder possível, o que torna o poder aceitável, é simplesmente o fato de que ele não apenas pesa sobre nós como uma força que diz não; ele também conecta e produz coisas, ele induz ao prazer, ele forma conhecimento, ele produz discurso. Ele deve ser considerado como uma rede produtiva que corre por todo o corpo social, muito mais que um espécime negativo cuja função é a repressão.7879

75 H

OHFELD, Wesley Newcomb. Some fundamental legal conceptions as applied in judicial reasoning, Yale Law Journal, v. 23, 1913, pp. 44-55.

76

Neste mesmo sentido, SANTI ROMANO destaca que há poder mesmo quando há apenas a possibilidade de seu exercício – isto é, a interferência efetiva na esfera de interesses de outrem não é condição para a verificação da existência do poder. Cf. ROMANO, Santi. Frammenti di un dizionario giuridico. Milano: Giuffrè, 1947, p. 181.

77 D

E CHIARA, José Tadeu. Moeda e ordem jurídica. Tese (Doutorado em Direito) - Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1986, pp. 30-31.

78

“But it seems to me now that the notion of repression is quite inadequate for capturing what is precisely the productive aspect of power. (…) Now, I believe that this is a wholly negative, narrow, skeletal conception of power, one that has been curiously widespread. If power were never anything but repressive, if it never did anything but to say no, do you really think one would be brought to obey it? What makes power hold good, what makes it accepted, is simply the fact that it doesn’t only weigh on us as a force that says no; it also traverses and produces things, it induces pleasure, forms knowledge, produces discourse. It needs to be considered as a productive network that runs through the whole social body, much more than as a negative instance whose function is repression.” (Tradução livre.) FOUCAULT, Michel. Truth and Power. In: CHOMSKY, Noam; FOUCAULT, Michel. The Chomsky-Foucault debate: on human nature. New York/London: The New Press, 2006, p. 152.

79 Cf. também S

ANTI ROMANO, para quem o exercício de um poder pode conferir restrições, desvantagens e onerosidade, mas também benefícios e vantagens. Cf. ROMANO, Santi. Frammenti di un dizionario giuridico. Milano: Giuffrè, 1947, pp. 181-184.

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O poder pode ser adquirido ou expressado de diversas formas. Para BODENHEIMER, a aquisição e o exercício do poder podem ser devidos a características físicas, psicológicas ou intelectuais da pessoa.80 COMPARATO, em estudo seminal que focaliza o poder manifestado no âmbito das sociedades anônimas, por sua vez, destaca que o poder pode ter por base contrato, tradição, fé religiosa ou necessidades biológicas.81

Outrossim, a titularidade ou o controle da informação também podem ser compreendidos como expressão de poder. No limite, não é exagero afirmar que a informação é elemento fundamental do sistema de ordem porque contém o poder que visceral à própria ordem. Esta afirmação se mostra cada vez mais correta nos dias atuais, que perfazem a comumente denominada “Era da Informação”.82

A relação entre informação e poder é tão antiga quanto o próprio homem. Não por outro motivo, os sacerdotes e pensadores – em suma, os detentores do saber – ocuparam posições de destaque e privilégio em diferentes civilizações, tanto no Oriente quanto no Ocidente. Notoriamente, como já afirmado acima, quaisquer descrições do período feudal reconhecem que a estabilidade do sistema estamental dependia em larga medida tanto do controle exercido pela Igreja Católica sobre as fontes informacionais na forma de ricas bibliotecas mantidas por clérigos de toda a Europa, quanto das homilias diárias ou semanais proferidas pelos sacerdotes durante as missas, quando se interpretavam as escrituras e se reafirmava o poder da Igreja sobre as vidas dos fiéis.

O Renascimento e a passagem do medievo para a Modernidade derrubaram o controle institucional exercido pela Igreja Católica sobre o fluxo informacional, mas não mudaram a natureza da informação como expressão de poder. Com efeito, há quem afirme que jamais na História esteve o homem mais dependente da informação do que hoje, pelo

80 B

ODENHEIMER, Edgar. Ciência do Direito: filosofia e metodologia jurídicas. Rio de Janeiro: Forense, 1966, p. 261.

81 Cf. C

OMPARATO, Fábio Konder. O poder de controle na sociedade anônima. Rio de Janeiro: Forense, 1983, p. 7.

82 F

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que nunca antes a exclusão tecnológica e a manipulação informacional representaram tamanho fardo.83

Assim, desde há muito se admite que o indivíduo que possui e/ou controla a informação é apto a exercer um enorme poder de influência nas relações sociais – seja tomando decisões para si, seja ditando comportamentos de terceiros. De uma banda, como visto, quando introduz segurança, a informação chama a ação – ela permite escolher, seduzir terceiros, comprar e vender, explorar oportunidades, abandonar projetos ou ideias, etc. A dinâmica informacional permeia, pois, a todo tempo as interações humanas, pelo que, revisitando o ensinamento de FOUCAULT, a informação se revela como verdadeira

força produtiva – talvez a maior força produtiva do século XXI.

Contudo, como se verifica para toda forma de poder que se torna ilegítima ou ilícita, a problemática da informação como expressão de poder adquire particular relevância quando esta interferência na esfera de interesses de terceiros ameaça ultrapassar os limites tolerados pela ordem jurídica. Com efeito, não raro a informação pode ser mantida em sigilo, divulgada, distorcida e manipulada, a depender dos objetivos que comandam tais ações – invocando a ação de terceiros, às vezes em injustificado detrimento destes. De modo correlato, a ausência da informação, assim como a informação incorreta, invariavelmente afeta a capacidade de ação, resistência ou oposição do indivíduo, sujeitando-o à vontade do outro.

Nota-se que este padrão de interação, fundado na prevalência informacional, se revela desde as situações ou negócios mais corriqueiros, nos quais a interferência ou a possibilidade de interferência na esfera de terceiros se dá de forma legítima, e por isso é acolhida pela ordem jurídica, até aquelas hipóteses em que a interferência efetivamente ultrapassa os limites ditados pela ordem, configurando, em certos casos, hipótese de ilicitude.

Neste particular, merecem destaque as relações travadas em ambiente de mercado – em especial, no mercado de valores mobiliários. Nele, a informação pode atuar tanto como

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força que garante a segurança e permite o investimento,84 quanto poder que subjuga e coloca em risco tanto o funcionamento do próprio mercado, quanto o atingimento das finalidades constitucionais deste.

As relações jurídicas que se estabelecem na ordem social são objeto de permanente arbitragem do Direito, como sistema valorador orientado para o ideal de Justiça que é.85 Os Capítulos seguintes cuidarão de aprofundar a análise daquelas relações quando fundadas no elemento informacional, tanto na ordem de mercado, em geral, quanto no mercado de valores mobiliários, em específico. No caso deste último, enfocar-se-á o papel do Direito Econômico86 como regulador das liberdades individuais ante o interesse coletivo, expresso na necessidade de preservação do mercado como instrumento importante para o aprofundamento do processo de desenvolvimento.

84 D

E CHIARA, José Tadeu. Moeda e ordem jurídica. Tese (Doutorado em Direito) - Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1986, p. 92.

85 V

IDIGAL, Geraldo de Camargo. Teoria geral do Direito Econômico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977, p. 7.

86 Breves apontamentos sobre o Direito Econômico como disciplina jurídica independente seguirão no

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CAPÍTULO II - MERCADO E INFORMAÇÃO

SUMÁRIO: 2.1 Da ordem social para a ordem do mercado. – 2.2 O mercado como ordem