• Nenhum resultado encontrado

A Comissão Nacional de Energia Nuclear - CNEN73 é o órgão responsável pelo planejamento, supervisão, orientação, fiscalização, licenciamento e controle da atividade nuclear no Brasil. A CNEN também desenvolve pesquisas na utilização de técnicas nucleares em diversas áreas (APÊNDICE G).

Uma atividade fundamental da CNEN é o estabelecimento de normas74 para a regulamentação de toda a atividade concernente à utilização das radiações ionizantes no país.

As normas de radioproteção são elaboradas para garantir a segurança do público e daqueles que trabalham com radiações, contra seus efeitos danosos, sem inibir suas aplicações. São, portanto, documentos de referência e, como tais, aplicam o conhecimento atual disponível na área, seguindo, de modo geral, a filosofia de radioproteção e recomendações de instituições internacionais, como a International Commission on Radiological Protection – ICRP.

Contudo, as normas de radioproteção, como de outras áreas, utilizam uma formulação sintética para abarcar uma área ampla de conhecimentos, empregando diversos conceitos que dependem de um conhecimento especializado, em geral, de difícil assimilação pelo público fora do sistema de perícia técnica da área.

Em diversos setores e atividades que utilizam tecnologias com radiações, a obrigatoriedade de seguir as normas de radioproteção e a falta de conhecimento, recursos e treinamentos necessários para isto, dão origem à incompatibilidade entre as obrigações legais da fiscalização e a atuação dos responsáveis pelas atividades, à insegurança em quem trabalha nestas atividades e a procedimentos inadequados, podendo resultar em exposições à radiação, prejudiciais e desnecessárias, de profissionais, pacientes (área saúde) e público.

Deste modo, a informação na área de radioproteção tem propósito específico, que é transmitir o conhecimento disponível para qualificar pessoas a exercê-la localmente, nas

73

Autarquia federal ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia. 74

No caso de normas estabelecidas por outro ministério, como é o caso do Ministério da Saúde em relação à Portaria 453 para a área de radiodiagnóstico, a CNEN participa da elaboração, discussão e implementação das mesmas.

diversas atividades que utilizam radiações, adquirindo uma importância fundamental para a CNEN, como sistema de perícia técnica e, ao mesmo tempo, órgão de controle e fiscalização na área de radiações. Esse aspecto instrumental da informação é reconhecido pela instituição, que procura implementar fluxos de informação para a sociedade por diversos meios, como cursos de radioproteção para a formação de profissionais, palestras, cursos e treinamento para profissionais fundamentais no apoio e segurança da população (bombeiros, policiais, vigilância sanitária), formação de pessoal, através de mestrado na área nuclear, orientações de teses, palestras para estudantes e profissionais diversos, além da intensiva circulação de documentos técnicos da área, através de bibliotecas e serviços de informação.

Entretanto, o conhecimento na área das radiações e, particularmente na área de radioproteção, é complexo e exige grande esforço dos profissionais envolvidos, que constituem recursos limitados para promover a disseminação necessária desse conhecimento especializado. Para que essa disseminação seja realizada a contento, é necessário que novas formas de disseminação da informação sejam sempre agregadas, para que a radioproteção seja efetivamente implementada em todos as atividades que utilizam radiações ionizantes.

A implementação de sistemas de informação exclusivamente dedicados aos aspectos dos riscos das radiações e à radioproteção, capacitados para informar e discutir sobre tais riscos com públicos distintos e em promover e facilitar o entendimento das normas e dos princípios de radioproteção, é vista como uma forma de facilitar a disseminação e aplicação do conhecimento nessa área.

Ainda que não se possa dispensar a fiscalização do cumprimento das normas, a radioproteção se torna mais efetiva se exercida pelo próprio indivíduo que trabalha com radiações, com o devido conhecimento inicial para fazê-lo, mas, sobretudo, considerando a complexidade do tema, tendo à sua disposição informações consolidadas, de fácil acesso, cujo entendimento seja facilitado pela ampla utilização dos diversos recursos técnicos disponíveis (seção 2.10).

É fundamental, entretanto, que esses sistemas estejam capacitados a receber e analisar um fluxo de informações proveniente do cotidiano das atividades com radiações para o sistema de perícia técnica, como forma de adequar sua comunicação e atender a seus objetivos, mas, sobretudo, como forma de avaliar sua própria atuação.

Em relação ao público que não utiliza radiações em seu cotidiano, a CNEN tem uma série de obrigações quanto à sua segurança, que constituem grande parte de suas atividades, do apoio ao estabelecimento de políticas para o setor ao recolhimento e destinação adequada a fontes fora de uso.

Em situações de acidentes, em particular aquelas que possam dar origem a situações críticas, a instituição tem um grupo permanente de pronto atendimento às emergências radiológicas (Serviço de Atendimento às Emergências Radiológicas -SAER), mas é necessário que seu trabalho seja apoiado por sistemas de informação adequados tanto para o apoio à população em situações críticas quanto em situação de rotina.

3 Metodologia

As considerações da base teórica indicam que a informação é um elemento essencial na percepção de grande parte dos riscos tecnológicos modernos, os quais não podem ser detectados diretamente pelo homem por meio de seus sentidos. Desse modo, é essencial que indivíduos ou grupos interessados de algum modo em riscos desse tipo tenham comportamentos informacionais ativos, que podem ser estendidos a relações diretas com os sistemas de perícia técnica responsáveis pelas tecnologias em questão.

Entretanto, como se mostrou, a percepção de risco é um fenômeno, cuja manifestação não resulta, nem unicamente, nem diretamente, das informações recebidas sobre determinado perigo, mas de um conjunto de fatores que incluem elementos culturais, sociais, ideológicos, relativos à personalidade do indivíduo, de suas experiências, sua afetividade e, provavelmente, de seu comportamento e atitude em relação ao conhecimento e informação.

Não há uma metodologia de investigação única, ou mais adequada, para abarcar todos esses fatores, e, provavelmente, diversos estudos e abordagens metodológicas sejam necessários para que se possa aprofundar a investigação do conjunto.

Embora se tenha procurado dar uma visão teórica do conjunto de elementos e circunstâncias que fazem da percepção de risco um fenômeno revelador de características da sociedade moderna, focalizou-se a pesquisa de campo na relação entre informação e a percepção do risco das radiações ionizantes.

Essa pesquisa foi realizada com públicos distintos e, via análise quantitativa, com a aplicação de procedimentos estatísticos, procurou-se verificar se essa relação existe e como se apresenta.

A proposta metodológica consistiu na adoção de dois eixos de investigação, posteriormente cotejados para verificar se as relações encontradas entre as variáveis de ambos poderiam fornecer elementos para o entendimento da relação entre informação e percepção de risco.

No primeiro eixo, adotou-se a perspectiva de Taylor (1991) (seção 2.10.2) sobre os contextos informacionais de grupos distintos (grupos relacionados a atividades e profissões) que, segundo o autor, apresentam similaridades em relação à informação onde quer que

estejam e definiu-se o que se denominou situação informacional75, que se aplica a cada público (grupo) interessado de alguma forma nas informações sobre as radiações.

A definição do conceito de situação informacional (seção 3.3.1) é bastante similar ao de ambiente de uso da informação de Taylor (1991), mas traz também elementos propostos por Allen (1996) para o projeto de sistemas de informação.

Considerou-se que no caso do conceito de situação informacional, o “problema”76 de informação, se reconhecido e definido pelo grupo, traria consigo uma representação ou compressão da situação informacional, como na abordagem de Taylor (1991). Como neste trabalho investiga-se a percepção do risco das radiações, tomou-se essa percepção, por hipótese, como o problema informacional, pelo menos parcial, dos grupos analisados. Se verdadeiro, o “problema” deve refletir parcialmente ou constituir uma representação parcial da situação informacional e, portanto, com ela apresentar relações.

Segundo Taylor (1991), o risco percebido na atividade que o profissional desenvolve vai afetar a quantidade e qualidade de informação requerida para decisões. O autor não está se referindo a nenhuma profissão em particular, mas, do ponto de vista da proteção radiológica (Radioproteção), espera-se que a informação seja utilizada pelo menos de forma instrumental por aqueles que trabalham com radiações, para aumentar a sua segurança.

O segundo eixo consistiu na investigação da percepção de risco de cada público e foi realizada por meio da abordagem psicométrica. Essa abordagem permite considerar muitos aspectos da percepção de risco, além de ser a abordagem que acumulou mais experiência na pesquisa empírica da área. Neste trabalho, considerou-se importante fazer uma investigação ampla (probabilística) no universo da saúde, tendo em vista que um dos propósitos da informação, neste caso, é melhorar as condições de radioproteção e segurança da área.

O paradigma psicométrico admite que os riscos sejam definidos subjetivamente pelos indivíduos, que podem ser influenciados por fatores psicológicos, sociais, culturais e institucionais (SLOVIC, 2000). Como visto, essa abordagem é considerada não contextual (KRIMSKY, 1992) por considerar que os riscos têm “características”77 que são universais. Embora essa seja a abordagem quantitativa que apresenta o maior poder explanatório da

75

Este conceito será definido no item relativo à operacionalização dos conceitos, mas, essencialmente, refere-se a uma abordagem exploratória do contexto informacional do usuário da informação incluindo a investigação das necessidades de informação, diversos tipos de recursos do usuário, tarefas e comportamento em relação à informação sobre determinado tema.

76

Taylor usa o termo problema em um sentido genérico. Para o autor, os formalistas tendem a separar o problema em três partes: questões que especificam, problemas que conectam e construção de sentido que orienta (MACMULLIN; TAYLOR, 1984).

77

Assim como indivíduos têm personalidades, os indivíduos expressam suas cognições e afetividade em relação aos riscos julgando individualmente as características dos riscos.

variância nas respostas, Sjöberg (1996) afirma que a inclusão do fator confiança e de outros fatores específicos podem aumentar consideravelmente o poder explanatório, concluindo que a idéia das dimensões gerais de risco para explicar a percepção de risco é limitada (seção 2.8). Tendo em vista as considerações anteriores, utilizou-se neste trabalho uma abordagem psicométrica, na qual se utilizaram as dimensões gerais dos riscos comumente investigadas, mas acrescentaram-se dimensões relativas a aspectos de confiança, informação, compromisso com o ambiente e natureza, equidade de distribuição de riscos e benefícios e preparo para situações de acidentes, que, acredita-se, contribuíram para contextualizar a avaliação. Entretanto, considera-se que, no caso da área de saúde, a avaliação psicométrica já estava contextualizada naturalmente, uma vez que as respostas se relacionavam a uma avaliação das condições de trabalho dos próprios respondentes. É oportuno lembrar que a situação informacional é essencialmente contextualizada.

A dimensão informação foi introduzida na avaliação procurando-se evidenciar a dependência, parcial pelo menos, da percepção de risco com a informação, tendo em vista todas as considerações feitas sobre seu papel na formação da percepção dos riscos tecnológicos modernos. Além disso, buscou-se evidenciar a avaliação e atitude dos respondentes quanto a aspectos informacionais para compará-los com a descrição da situação informacional realizada no primeiro eixo.

A situação informacional dos respondentes e sua percepção de risco constituem processos individuais e sociais dinâmicos, cuja evolução a presente pesquisa não investigou, configurando-se como um estudo de variáveis em um único ponto no tempo. Não investigar tais processos é uma limitação que se assumiu com a abordagem quantitativa, que aqui é feita na perspectiva pós-positivista, na qual se admite que a realidade não pode ser completamente apreendida, apenas aproximada (DENZIN e LINCOLN, 2000; TROCHIM, 2001).

Em linhas gerais, o método utilizado para proceder à investigação constituiu-se das etapas seguintes:

• escolha dos conceitos mais importantes;

• escolha de uma abordagem para a operacionalização dos conceitos;

• definição dos públicos a serem investigados – profissionais da área de saúde e estudantes; • definição das amostras para cada público, considerado como um universo;

• elaboração de um instrumento de pesquisa (questionário) que abordasse uma exploração da situação informacional dos respondentes e, paralelamente, uma avaliação de sua percepção dos riscos das tecnologias que utilizam radiações ionizantes;

• coleta de dados (aplicação dos questionários);

• tratamento e análise dos dados, constituído de quatro etapas para área de saúde (seis para o público de estudantes):

o análise descritiva dos dados pessoais e da situação informacional dos respondentes (amostras) dos públicos pesquisados;

o construção de uma escala de Likert para investigação da estrutura dimensional do constructo percepção de risco dos respondentes e avaliação de um índice de percepção de risco destes;

o investigação da existência de subgrupos dentro das amostras com relação à percepção de risco;

o investigação da relação entre a percepção de risco e a situação informacional dos respondentes;

o no caso do público de estudantes, avaliação da existência de causalidade da variável informação sobre a variável percepção de risco.

o também no caso do público de estudantes, investigação da relação entre percepção de risco e representações relativas às radiações ionizantes;

• delineamento de perfis de subgrupos de respondentes em cada público.

A pesquisa constituiu um estudo descritivo, quanto à situação informacional, e um estudo relacional, quanto à investigação da relação entre situação informacional e percepção de risco. Para o público de estudantes, investigou-se também a relação causal entre informação e percepção de risco.

O método adotado reflete a complexidade de avaliar-se o construto multidimensional percepção de risco (SLOVIC, 2000).

Como outras características psicológicas, as atitudes78 não são observáveis diretamente. A escala de Likert avalia a atitude, como tendência psicológica dos respondentes em relação à entidade percepção de risco, por meio da observação das avaliações que eles fazem de dimensões mais simples. A escala de Likert construída fornece uma indicação da estrutura dimensional da percepção de risco, o que permite um melhor esclarecimento do construto em relação as suas dimensões ou fatores constituintes, confirmando ou não, por exemplo, a pertinência da variável informação. A escala pode também fornecer indicações da importância relativa desses fatores na formação da percepção de risco, por meio da variância

78

A atitude é uma tendência psicológica que se expressa na avaliação de uma entidade particular com algum grau de favorecimento ou desfavorecimento.

explicável por cada um deles79. Contudo, não pode explicar o processo da formação da percepção de risco, nem a informação como processo, o que demandaria outras abordagens.

Portanto, o planejamento da pesquisa objetivou investigar se a dimensão (fator) informação é pertinente na estrutura da percepção de risco. A investigação verificou também se a percepção de risco avaliada apresentou relações com a situação informacional dos respondentes.

A abordagem utilizada está de acordo com a afirmação de Nunnally e Bernstein (1994) de que os interesses da investigação científica se colocam na medida em que determinados atributos relativos a pessoas ou objetos variam. Constantes físicas são sempre importantes em equações que especificam relações entre atributos que variam. Mas constantes, uma vez estabelecidas, em geral não constituem um campo de investigação. Algo semelhante acontece com atributos relacionados às pessoas de determinado grupo, com os quais todos concordem. A investigação de tais atributos pode confirmar o consenso em torno deles, mas fornece pouca informação sobre o grupo. São as variações das respostas entre as pessoas ou entre grupos para as variáveis investigadas que podem fornecer informações sobre essas pessoas ou grupos, quando se consegue explicar a origem dessas diferenças observadas. Assim, segundo esses autores, “cientistas procuram atributos que variam consideravelmente, desenvolvem medidas para estes atributos, e tentam ‘explicar’ as fontes de variação com teorias e experimentos” (NUNNALLY e BERNSTEIN, 1994, p. 116). Ou ainda, segundo os mesmos autores:

O propósito de teorias científicas é explicar tanto quanto possível as variações de variáveis inter-relacionadas. [...] A variância é explicada pelo estudo de como medidas de diferentes atributos variam simultaneamente (covariação). O cientista espera encontrar um número relativamente menor de variáveis básicas que expliquem a variação em muitas outras variáveis (NUNNALLY e BERNSTEIN 1994, p.116).

Sobre a multidimensionalidade da percepção de risco, tem-se, na perspectiva de Churchill (1995), que construtos (como a percepção de risco) podem ser definidos em termos de outros construtos:

O papel da investigação científica é estabelecer os relacionamentos que existam entre os construtos do modelo. Alguns dos construtos precisam ser relacionados a dados observáveis [...] ou seu modelo será circular, com construtos não observáveis sendo definidos em termos de outros construtos não observáveis (CHURCHILL, 1995, p.525).

Considerou-se que, dentre as abordagens metodológicas utilizadas na Ciência da Informação para sistemas de informação, aquelas que situam a necessidade de informação e a

79

ação do usuário como fatores determinantes de sua análise são as que oferecem melhores perspectivas de atingir os objetivos propostos.

Características do fenômeno da informação, como, por exemplo, tipos de fontes, confiabilidade das fontes, necessidades de informação do respondente e comportamento na procura por informações, foram consideradas importantes, a princípio, para a investigação das relações desse fenômeno com a percepção de risco.