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Inovação pedagógica enquanto ruptura paradigmática: um caminho à mudança

PARTE I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

CAPÍTULO 3 – INOVAÇÃO PEDAGÓGICA, TIC E APRENDIZAGEM

3.2. Inovação pedagógica enquanto ruptura paradigmática: um caminho à mudança

tarefa fácil. Uma ruptura paradigmática verdadeira passa por uma reestruturação organizacional, acompanhada de uma revolução no currículo e uma orientação que vise mais o futuro do que o passado (TOFFLER, 1973).

Assim, em concordância com Fino (2000) acreditamos que a aprendizagem está condicionada ao contexto em que se desenvolve, sendo mais significativas aquelas que se desenvolvem em atividades autênticas, que valorizem as estruturas cognitivas, provoquem discussões, interações e possibilitem o aprender e o reaprender, buscando inovações nas práticas pedagógicas.

Nesse sentido, frente aos significados que a educação tem adquirido em tempos atuais, dedicaremos o próximo tópico à discussão da Inovação Pedagógica enquanto ruptura paradigmática, sem esquecer que “a educação não pode deixar de ter os olhos no futuro” (SOUSA, 2004, p. 73).

3.2. Inovação pedagógica enquanto ruptura paradigmática: um caminho à mudança

A inovação pedagógica pressupõe um salto, uma descontinuidade. Nesse caso, descontinuidade relativamente ao velho e omnipresente paradigma fabril.

Carlos Nogueira Fino

As últimas décadas do século XX e os anos inicias do século XXI têm sido profundamente abalados por mudanças na sociedade, como consequência da transição da modernidade para a pós-modernidade (HARGREVES, 1998), ou, como diria Toffler

(1980), da Segunda para a Terceira Onda. Estas mudanças veem causando descontinuidade de paradigmas no sentido kuhniano do termo79.

Portanto, torna-se

[...] inegável que as estruturas de poder da sociedade e as relações entre as variáveis de como “estamos vivendo na sociedade do conhecimento” ou na “sociedade da informação”, “sociedade do risco”, “era pós-moderna” exigem mudanças constantes em todos os setores da sociedade. Nessa perspectiva, a constante ebulição do mercado de trabalho e os desafios que envolvem os aspectos sociais e toda a formação do ser humano enquanto transformador e ator da História sobrecarregam a escola com preocupações excessivamente variadas (LEDES, 2010, p. 4, destaques da autora).

Nesse cenário de aceleradas mudanças paradigmáticas que cotidianamente se fazem visíveis na sociedade contemporânea, o termo “inovação” tem sido cada vez mais utilizado para se referir ou até para justificar mudanças de padrões nos mais variados campos do conhecimento, que se aceleram na velocidade da informação.

Para um melhor entendimento dos mais diversos significados atribuídos ao termo inovação é conveniente analisar sua etimologia a partir do latim innovatio, que significa novidade, renovação. Atentemos ainda que neste termo o prefixo in assume o valor de movimento de introduzir algo, ou seja, a palavra “inovação” pode ser definida como a introdução de uma novidade, algo novo ou algo feito de uma maneira diferente do que sempre foi feito antes80.

Para Vasconcellos (2009) inovação é

[...] a capacidade de mudar um cenário, de revolucionar, por mais simples que seja a ideia inovadora, se ela for capaz de revolucionar trará um ganho imenso para aquele que executou a inovação e permitirá a este ter uma melhor posição no espaço em que ele convive. [...] Inovação é diferente de uma novidade, ela tem um grande valor por trás dela, novidades são coisas únicas e são difíceis de serem compreendidas (VASCONCELLOS, 2009). Em conformidade, Ledes (2010) esclarece que inovação é a incorporação de algo novo em uma atividade humana e que a diversidade de significados do termo está relacionada

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Kuhn (1996) define paradigma como um modelo ou padrão aceito, durante um período de tempo, e compartilhado de forma universal por uma comunidade científica, formada por praticantes de uma mesma especialidade, que tiveram uma educação relativamente similar e compartilham da mesma iniciação profissional.

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à abrangência com a qual se aplica no desenvolvimento humano e na melhoria da qualidade de vida.

Ora, sendo um paradigma um conjunto de valores, crenças, técnicas e práticas compartilhadas por membros de uma comunidade (KUHN, 1996), somente uma crise nesse modelo há muito estabelecido pode levar a mudanças. Nesse sentido, a inovação dar-se-ia a partir de uma crise que surge no momento em que “[...] o paradigma existente deixou de funcionar adequadamente na exploração de um aspecto da natureza, cuja exploração fora anteriormente dirigida pelo paradigma” (Ibidem, p. 126), uma vez que o surgimento das crises paradigmáticas “[...] consiste exatamente no fato de que indicam que é chegada a ocasião para renovar os instrumentos” (Ibidem, p. 105).

O paradigma vigente na educação, surgido como produto do sistema fabril, no qual o objetivo era pré-adaptar as crianças às necessidades da indústria, acostumando-as a ambientes de confinamento e barulho, disciplina coletiva, horários rigorosamente regulados, lugares pré-determinados e a hierarquização da escola (TOFFLER, 1973) lembra tanto um processo de produção industrial que Bobbitt (1918; 1924), inclusive, chegou a defender que a cultura de eficácia científica aplicada ao processo de moldagem e manufatura de carros poderia ser transferida para a escola.

Sendo assim, a crise paradigmática na educação se instalou a partir do momento em que a escola pública, criada no auge da Revolução Industrial para satisfazer as necessidades da sociedade emergente, entra em confronto com uma nova realidade de organização social e econômica, onde a informação e o conhecimento prevalecem sobre as tradicionais industriais de manufaturas (TOFFLER, 1973), e essa escola, por consequência, não mais se enquadra na nova ordem pós-industrial complexa, incerta, flexível, acelerada e tecnológica (HARGREAVES, 1998).

Bem, uma situação de crise de um paradigma, se por um lado pode ser vista como caótica, por outro representa uma oportunidade única para repensar problemas e rever conceitos que antes não se mostravam aparentes, pois eram encobertos por falsas aparências e preconceitos. Portanto, essas situações de crise se apresentam como oportunidades propícias para ver claramente a essência das coisas (COMENSAÑA- SANTALICES & GALUÉ, 1982).

É evidente que um modelo educacional que se mantem anacronicamente moderno em um mundo pós-moderno complexo iria criar um hiato entre a escola e o mundo além dela. Segundo Hargreaves (1998), esta disparidade vem causando uma crise na escola contemporânea ao provocar um confronto entre duas forças poderosas, onde

De um lado, está um mundo cada vez mais pós-industrial e pós-moderno, caracterizado pela mudança acelerada, a compressão intensa do tempo e do espaço, a diversidade cultural, a complexidade tecnológica, a insegurança nacional e a incerteza científica. Do outro lado, está um sistema escolar moderno e monolítico que continua a perseguir propósitos profundamente anacrônicos por intermédio de estruturas opacas e inflexíveis (HARGREAVES, 1998, p. 4).

Para Toffler (1973) na educação contemporânea o “[...] objetivo primordial deverá ser o de aumentar a ‘capacidade de confrontação’ do indivíduo – a velocidade e a economia com as quais poderá ele adaptar-se à mutação contínua” (TOFFLER, 1973, p. 336, destaque do autor). Assim, um maior índice de mutações, requer maior atenção ao entendimento dos padrões dos eventos que virão, visto que na sociedade pós-moderna as escolas precisam desenvolver a capacidade de preparar os indivíduos para o seu tempo e ter uma visão ampla de futuro.

Diante dessa crise paradigmática dos sistemas educacionais a inovação também assume uma linha de atuação na educação. Entretanto, numa visão educacional, a inovação – denominada inovação pedagógica – deve ser encarada num sentido mais amplo do que uma mera evolução natural, incorporação de recursos tecnológicos na escola ou maquilagem de métodos antigos de ensino, como nos alertam, respectivamente, Cardoso (1992), Castanho (2000) e Fino (2000):

[...] inovação não é simples renovação, pois implica uma ruptura com a situação vigente, mesmo que seja temporária e parcial. Inovar faz supor trazer à realidade educativa algo efetivamente novo, ao invés de renovar que implica fazer aparecer algo sob um aspecto novo, não modificando o essencial (CARDOSO, 1992, p. 1).

Inovação é a ação de mudar. Alterar as coisas, pela introdução de algo novo. Não se deve confundi-la com invenção (criação de algo que não existia) ou com descoberta (ato de encontrar o que existia e não era conhecido). [...]. Inovar consiste em introduzir novos modos de atuar em face de práticas pedagógicas que aparecem como inadequadas ou ineficazes (CASTANHO, 2000, p. 76).

A ideia de inovação, por exemplo, só faz completamente sentido quando contraposta à ideia de tradição. O que é inovar na escola? Não será, de alguma maneira, desafiar certa rotina de fazer as coisas, procurar novos pontos de vista para compreender os fenómenos, buscar fundamentação em

teoria nova, promover um reencontro com as actualidades? Seguindo essa linha de raciocínio, inovar na escola será, de alguma maneira, colocar desafios à inércia cultural que ainda remete muito do que se faz no seu interior a uma origem longínqua. Será promover o aparecimento de uma cultura nova, nesse caso, uma cultura menos dependente de uma ideia de escola entendida como uma espécie de federação de várias turmas que adoptam, no essencial, procedimentos semelhantes, mas mais focada na turma local onde a inovação pode acontecer, de facto, com maior probabilidade (FINO, 2000, p. 385).

Nesse sentido, Fino (2008a) avança no conceito de inovação pedagógica ao defender que esta não deve ser buscada em reformas educacionais, modificações curriculares ou em mudanças de programas, mas deve envolver posicionamento crítico frente às práticas pedagógicas tradicionais, pois “[...] a inovação envolve obrigatoriamente as práticas” (FINO, 2008a, p. 2).

Frente às mudanças constantes características da contemporaneidade e considerando a educação como um processo dialógico, transformativo e formativo, o caminho para se chegar a uma verdadeira inovação nas práticas pedagógicas, que promova o desenvolvimento de habilidades, valores e competências e o desenvolvimento de aprendizagens que se façam significativas, passa pelo rompimento com um sistema educacional que há muito se encontra falido.

No entanto, embora ninguém conteste a crise paradigmática pela qual passa os sistemas educativos na atualidade qualquer mudança que venha a abalar o velho paradigma fabril de educação é vista com desconfiança e acompanhada de muita resistência por parte daqueles que detém as rédeas do sistema, uma vez que novidades não emergem sem dificuldades (KUHN, 1998).

Para Kuhn (Op. cit.) a ruptura de um paradigma é uma mudança profunda que provoca significativas modificações no modo de pensar um sistema, afetando intrinsicamente seus critérios de legitimação, sua visão de realidade, seus problemas e as maneiras como se propõem soluções para eles, ou seja,

A transição de um paradigma em crise para um novo, [...], está longe de ser um processo cumulativo. É antes uma reconstrução da área de estudos a partir de novos princípios, reconstrução que altera algumas das generalizações teóricas mais elementares do paradigma, bem como muitos de seus métodos e aplicações. Durante o período de transição haverá uma grande consciência (embora nunca completa) entre os problemas que podem ser resolvidos pelo antigo paradigma e os que podem ser resolvidos pelo novo. Haverá igualmente uma diferença decisiva no tocante aos modos de solucionar os problemas (KUHN, 1998, p. 116).

Nesse cenário, o papel do docente torna-se essencial, à medida que uma inovação pedagógica capaz de causar descontinuidade no paradigma vigente compreende obrigatoriamente às práticas pedagógicas (FINO, 2008a). Porém, essa mudança de atitude não é tarefa das mais simples, visto que a imagem da escola tradicional se encontra fortemente firmada na sociedade, nas mentes dos alunos, dos pais dos alunos, dos gestores escolares, dos políticos e dos próprios docentes (FINO, 2009).

Fino (2009) destaca ainda que desde sua criação no passado industrial e através do tempo a imagem da escola tradicional vem se cristalizando e se perpetuando por meio do invariante cultural resultante da profunda difusão e enraizamento social do modelo de escola através das gerações. Essa visão arraigada da escola dificulta qualquer tentativa de inovação pedagógica, fazendo com que, devido a sua força ideológica, muitas tentativas de inovação resultem “[...] numa absoluta falsificação destinada a ‘vender’ o velho paradigma utilizando novos meios” (Ibidem, p. 13, destaque do autor).

A solução para essa maquiagem pedagógica passa pela mudança dos papeis dos atores envolvidos na educação e um aprofundamento epistemológico, em oposição ao conceito tradicionalmente aceito de que o desenvolvimento intelectual do aprendiz segue um único caminho retilíneo: do pensamento operatório-concreto ao abstrato (PIAGET, 2013). Papert (1994), por exemplo, defende o alongamento do domínio operatório bem como a interposição de ambos os períodos, pois trabalhar com o concreto facilitaria, mesmo em níveis mais elevados de aprendizagem, a concepção dos erros e alargaria a possibilidade de aprender com e a partir deles.

Desse modo, para que realmente aconteça uma inovação pedagógica faz-se necessária uma interação entre a escola, seus docentes e as práticas pedagógicas, com a ruptura intencional, consciente, criativa e crítica do um paradigma antigo e a implantação de um novo paradigma, vindo a favorecer a criação de situações nas quais os aprendizes sejam o foco principal e que favoreçam a aprendizagem ao invés do ensino, levando em consideração que

A inovação pedagógica implica mudanças qualitativas na práticas pedagógicas e essas mudanças sempre envolvem um posicionamento crítico, explícito ou implícito, face às práticas pedagógicas tradicionais. É certo que há factores que encorajam, fundamentam ou suportam mudanças, mas a inovação, ainda que se possa apoiar nesses factores, não é neles que reside, ainda que possa ser encontrada na maneira como são utilizados. [...] a inovação pedagógica pressupõe um salto, uma descontinuidade. Nesse caso,

descontinuidade relativamente ao velho e omnipresente paradigma fabril, tala qual é descrito por Toffler (1970) e Gimeno Sacristán (1985), e acontece localmente, isto é, no espaço, físico ou virtual, onde se movem aprendizes e professores, funcionando estes, deliberadamente, como agentes de mudança. E consiste na criação de contextos de aprendizagem, incomuns relativamente aos que são habituais, nas escolas, como alternativa à insistência nos contextos de ensino (FINO, 2008a, p. 1, destaques do autor).

Em concordância com Fino (Op. cit.), acreditamos que diante do paradigma tradicional presente nas escolas, a inovação pedagógica deve ser vista como uma ruptura de natureza cultural, abrindo espaço para implantação de uma nova cultura educativa que destoe dos moldes vigentes, mesmo que, à primeira vista, pareça estranho para quem está acostumado a seguir regras e tradições, visto que “é esta, evidentemente, a cultura que foi embebendo, não apenas os muros da escola, mas também a mente das pessoas (professores incluídos), sob a forma de invariante cultural, ao longo de dois séculos” (FINO, 2011, p. 47).

Não se trata, no entanto, de reger as culturas da escola, mas de estimular uma reformulação das estruturas escolares, para que se afastem dos modelos e padrões modernos que, em um mundo de mudanças rápidas e flexíveis e de recursos e saberes compartilhados, inibe a inovação nas práticas pedagógicas (HARGREAVES, 1998), pelo fato de que o paradigma fabril de escola criado há mais de duzentos anos não sofreu modificações substanciais. Portanto, até hoje “[...] não houve ruptura paradigmática na escola pública, mas o que tem ocorrido é a continuidade do paradigma tradicional maquiada superficialmente” (NASCIMENTO, 2015, p. 45).

Assim, não podemos fugir da necessidade urgente de ruptura do velho paradigma fabril de educação, que, apesar de ter perdido a capacidade de preparar os alunos como já o fez no passado ainda mantem fortes laços nas escolas atuais. O caminho para essa ruptura paradigmática passa pela sensibilidade de adequação dos sistemas educativos às mudanças e tendências do mundo pós-moderno que, embora implique incertezas e aponte para o inesperado, abre caminho à inovação nas práticas pedagógicas tradicionais (FINO, 2008a).

Em se tratando de educação contemporânea, Schlechty (1990) e Hargreaves (1998) defendem, tal como Toffler (1980), a necessidade de que a escola valorize as competências pós-modernas, como a flexibilidade, a adaptabilidade e o trabalho em

cooperação com seus pares, em detrimento das qualidades modernas que ainda hoje inundam os sistemas educativos. Para Hargreaves (Op. cit.),

Isto aponta claramente para necessidade de ambientes escolares que possam gerar a aprendizagem autónoma, individualizada e significativamente colaborativa que é essencial a um local de trabalho pós-industrial. [Atualmente], a maior parte das estruturas escolares existentes, com seus formatos de lições individuais, dadas em salas de aulas individuais, por professores isolados, adequam-se mal a estas necessidades (HARGREAVES, 1998, p. 57).

E completa:

Em termos educativos, é insensato ignoramos as necessidades e exigências da flexibilidade na economia pós-industrial, agarrando-nos a identidades disciplinares antigas e estruturas departamentais ossificadas que se ajustavam a outras necessidades, numa outra época (Ibidem, p. 59).

É nessa oposição à ortodoxia em relação aos paradigmas tradicionais que a inovação pedagógica deve atuar, pois, como afirma Fino (2008a, p. 2), “[...] o caminho da inovação raramente passa pelo consenso ou pelo censo comum [...]. Aliás, se a inovação não fosse heterodoxa, não era inovação.”

Toffler (1973) além de defender a mudança do antigo paradigma fabril de educação acrescenta que “a nova educação deve ensinar o indivíduo como classificar e reclassificar as informações, como avaliar a sua veracidade, quando alterar as categorias quando necessário, como examinar os problemas de uma nova direção – como ensinar- se a si mesmo” (TOFFLER, 1973, p. 346).

Para indicar o caminho que a escola deve seguir na pós-modernidade Toffler (Op. cit.) faz uma analogia entre a educação e um sistema de computador, afirmando que a educação deveria utilizar a mesma estratégia do computador, que usa múltiplos programas de armazenamento de dados e um “programa fundamental” usado pelo operador para informar a máquina sobre a escolha do programa a aplicar, o que aumentaria a adaptabilidade à dinâmica do mundo contemporâneo.

A necessidade de descontinuidade do paradigma fabril de educação também é defendida por Freire (1987), que o denomina de “educação bancária”, onde os professores atuam como “depositantes de conteúdos” e os alunos como “depositários” passivos de informação.

Segundo Freire (Op. cit.), o “educador bancário” tenta “depositar”, “encher” o educando com conteúdos, que, na maioria das vezes, não faz parte de sua vida cotidiana, tornando-o, portanto, como mero depósito de conteúdos sem fins práticos. Este processo conduz os aprendizes a uma memorização mecânica, ou seja, “vasilhas” a serem cheias pelo educador. Nesse modelo, a educação é vista como uma doação dos que “sabem” aos que “não sabem”.

Para tentar reverter este quadro seria necessário um trabalho de educação problematizadora, que busque a superação da contradição educador-educando para que ambos se tornem sujeitos ativos do processo educativo, em contrapartida à “educação bancária”, que apenas reproduz os conteúdos sem formar senso crítico (FREIRE, 1987). Essa ruptura só seria possível por meio de uma revolucionária mudança cultural, o que encontra eco nas palavras de Kuhn (1998, p. 32): “[...] a transição sucessiva de um paradigma a outro, por meio de uma revolução, é o padrão usual de desenvolvimento da ciência amadurecida”.

Assim como Toffler (1973) e Freire (1987), Papert (1980) destaca a necessidade de uma ruptura paradigmática no modelo tradicional de educação e nomeia essa ruptura paradigmática de “megamudança”. Justifica sua necessidade em prol de uma adequação das instituições escolares modernas à contemporaneidade, onde a capacidade de renovação frente a um mundo tecnológico e acelerado se torna uma das competências mais exigidas dos alunos fora da escola.

Segundo Fino (2000; 2008a), para que inovação pedagógica, enquanto ruptura paradigmática deixe de ser uma exceção e passe a ser algo natural, substanciada na cultura das escolas, faz-se necessário, em primeiro lugar, que os professores desçam do pedestal no qual foram colocados pelos inventores da escola moderna e entrem na realidade que é a da organização dos contextos de aprendizagem dos seus aprendizes.

A dificuldade é que, no geral, as escolas ainda valorizam mais os contextos de ensino do que os contextos de aprendizagem, e essa supremacia do ensinar sobre o aprender constitui uma significativa barreira à inovação pedagógica. Na visão de Fino (2000), da qual compartilhamos,

[...] para mudar a escola não basta ou é inútil mudar o ensino, entendido como o conjunto de pressupostos de uma óptima transmissão do

conhecimento, ou mudar os instrumentos de controlar a eficácia dessa transmissão. O que é preciso é que os professores desçam do nicho onde foram colocados pelos geniais inventores, como dizia Toffler, da escola modelada na fábrica, para descerem à realidade que é a da organização dos contextos de aprendizagem das crianças ou dos jovens que lhes são confiados. Na verdade, mais importante para um professor do que ensinar bem, é que os aprendizes com que lhe compete trabalhar aprendam bem (FINO, 2000, p. 413, destaques do autor).

No entanto, as vertentes inovadoras trazidas pela pós-modernidade que poderiam fomentar os contextos de aprendizagem referidos por Fino (Op. cit.) e indispensáveis à inovação pedagógica enquanto rupturas paradigmáticas não são bem acolhidas pela escola, que por temor em perder o controle sobre o que se aprende e da maneira como se aprende prefere permanecer atrelada a uma cultura que perdeu o vínculo com a realidade. Desse modo, considerando que a aprendizagem deve ser o foco principal do processo educativo, dedicaremos os próximos tópicos à discussão sobre essa temática.