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inseminação artificial

No documento FEBRASGO - Manual de Reprodução Humana (páginas 30-35)

Em 1870, John Hunter descreveu pela primeira vez a inseminação como a solução de um problema de infertilidade conjugal em que o esposo apresentava problema de hipospadia. Entretanto, até hoje o valor da inseminação artificial na correção da subfertilidade masculina ou feminina permanece em discussão. Teoricamente, a finalidade da inseminação artificial é facilitar a chegada dos espermatozoides às trompas em número adequado para fertilizar os oócitos e no tempo correto da rotura folicular (técnica de aproximação de gametas). Des- sa forma, alguns problemas que causam infertilidade poderiam ser superados, como muco cervical de baixa qualidade, oligoastenozoospermia, defeitos nos mecanismos de ejaculação, presença de anticorpos antiespermatozoides e casos rotulados como ISCA. A aplicação da inseminação intrauterina (II) aumentou após o aprimoramento das técnicas de capacitação espermática para os processos de FIV. Essas técnicas retiram do esperma prostaglandinas, agentes infecciosos, proteínas antigênicas, além de leucócitos, células germinativas imaturas e esper- matozoides imóveis. Tais mudanças diminuem as linfoquinas e citoquinas e re- duzem a formação de radicais oxidantes, melhorando a habilidade de fertilização dos espermatozoides.

Em 2005, o Programa Europeu de monitoramento das técnicas de reprodu- ção assistida relatou o uso de 129 mil ciclos de II com o esperma do marido e 21 mil ciclos com doação de esperma. Em mulheres com menos de 40 anos, a II produziu taxa de gravidez de 11% por ciclo e, em casos de doação de esperma, de 18,9%. A taxa de gestação gemelar em pacientes com menos de 40 anos foi de 11%.

Apesar de a II ser amplamente utilizada, as evidências de efetividade na corre- ção da infertilidade masculina são discretas. Steures et al. (2006) não verificaram benefícios com II em 253 casais com diagnóstico de infertilidade sem causa apa- rente. Apesar de haver inúmeros trabalhos publicados sobre II, ainda persistem discordâncias quanto aos benefícios dessa metodologia na correção dos proble- mas de infertilidade.

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indicações

subfertilidade masculina

Geralmente, nas alterações discretas das concentrações e da motilidade dos es- permatozoides (oligoastenozoospermia), assim como nas do volume ejaculado (vo- lume excessivo ou reduzido) e da viscosidade.

fator cervical

Nas situações de produção insuficiente do muco cervical, anormalidades anatô- micas do colo uterino (estenoses etc.) e na presença de anticorpos antiespermatozoi- des no muco cervical.

infertilidade sem causa aparente

casais HiV soro discordantes (marido HiV positivo)

Pode-se obter gestação saudável pela II de esperma capacitado previamente e avaliado quanto à presença do vírus da imunodeficiência humana 1 (HIV-1) (PCR negativo no fluido seminal).

Preservação da fertilidade: armazenamento de esperma antes da quimioterapia

Qualidade da amostra de esperma

Não há um consenso sobre o limite inferior da concentração da amostra de espermatozoides móveis que deveria ser utilizado para II. Dessa forma, vários autores referem como limite inferior da concentração a presença de 3 milhões, 5 milhões ou mesmo 10 milhões de espermatozoides móveis por ml após o preparo da amostra.

momento da ovulação

A determinação do momento da ovulação é um aspecto importante no con- trole do tratamento dos ciclos de II. Diversos autores acreditam que a perfei- ta avaliação do momento da ovulação seria a variável mais importante para o sucesso da II. Dessa forma, alguns protocolos são empregados para esse fim e a maioria baseia-se na avaliação do desenvolvimento folicular ovariana pelo ultrassom seriado.

Inseminação artificial

técnica de preparo da amostra para inseminação intrauterina

Diferentes fatores podem alterar a qualidade da amostra de sêmen para II. Apesar de haver um número significativo de métodos de capacitação espermática, até hoje não é possível afirmar qual deles é o melhor. Por outro lado, ainda não se comprovou nenhum benefício real com a adição ao esperma de substâncias como pentoxifilina, calicreína, fluido folicular etc. Acredita-se que o grau de teratozoospermia presente na amostra de esperma pode negativamente afetar os resultados da II.

local da inseminação

Em 1960, Eckerling descreveu como terapia da oligozoospermia a deposi- ção de espermatozoides capacitados na região do colo uterino ou intrauterina. Teoricamente, a inseminação artificial do tipo cervical baseia sua utilização no conceito de que as modificações cíclicas dos esteroides ovarianos sobre o colo uterino criariam condições para seu papel como reservatório e sítio de capacita- ção dos espermatozoides, que periodicamente migrariam para a trompa. Ao con- trário, as inseminações do tipo intrauterino ou tubário não conseguiriam manter esse fluxo. Entretanto, faltam evidências para confirmar a real importância dessa função cervical. As inseminações com espermatozoides capacitados por diferen- tes técnicas laboratoriais ganharam popularidade após 1978, especialmente a de- posição intrauterina, chamada de perfusão tubária (alto volume). Também se tem preconizado o uso da perfusão tubária com injeção de alto volume da suspensão espermática (acima 2 ml) e, até o momento, não se encontraram diferenças com II de baixo volume.

número de inseminações

Outro ponto de discordância na literatura é o número de inseminações por ciclo. Teoricamente, o processo de ovulação em ciclos estimulados poderia ocorrer em diferentes momentos (poliovulação), sendo esperado um aumento das possibilidades de concepção com o uso de duas inseminações com intervalos diferentes. Alguns au- tores relataram melhores resultados com duas inseminações consecutivas por ciclo, entretanto outros não referiram benefícios com essa conduta.

Protocolo do programa de inseminação intrauterina

Um casal infértil deveria realizar, antes da sua inclusão num programa de II, os seguintes exames:

• análise espermática completa; • TPC;

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Quadro 1. Protocolo sugerido para II

i. Homem

1. > 3 x 106 espermatozoides móveis após capacitação 2. Morfologia > 5% de formas normais (Kruger et al.) 3. Ausência de infecção seminal

ii. mulher

1. Exame ginecológico normal

2. Pelo menos uma trompa permeável

3. Ciclos estimulados: gonadotrofinas (FSH recombinante ou gonadotrofina menopáusica humana [hMG]/citrato de clomifeno [CC] em baixas condições socioeconômicas) 4. Inseminação: duas, realizadas 24 horas e 36 a 38 horas após hCG

5. Volume inseminado: 0,5 ml na região fúndica do útero 6. Manutenção da fase lútea: progesterona ou hCG 7. Número de ciclos de inseminações: 3

Realiza-se estimulação ovariana para II com gonadotrofinas na dose de 75 UI a 150 UI (a seleção da dose inicial depende do peso, idade da paciente, antecedentes da síndrome dos ovários policísticos) aplicada com intervalos de 48 horas, tendo início no terceiro dia do ciclo menstrual. Em geral, procura-se obter dois folícu- los ovarianos como resposta ideal. A dose de gonadotrofinas necessária para cada paciente é cuidadosamente avaliada pelo seguimento do desenvolvimento folicular por meio de ultrassonografia vaginal seriada. Habitualmente, não se costuma dosar estradiol plasmático no controle do processo ovulatório. Uma dose de 250 µg de gonadotrofina coriônica humana (hCG) recombinante será administrada quando um ou dois folículos apresentarem diâmetro maior que 17 mm. Em geral, realizam-se duas inseminações por ciclo entre 36 e 38 horas após o emprego da hCG. O mate- rial inseminado costuma ter um volume de 0,5 ml, suficiente para caracterizar uma inseminação como do tipo tubouterina. Geralmente, três ciclos de II são realizados. Todo o manuseio de sêmen deve ser executado com material asséptico. Além disso, deve-se observar, na amostra original, a existência de bactérias (ideal: ausência) ou leucócitos (ideal: número inferior a 1 milhão no aumento de 400 vezes). A incidência de infecção pélvica após II é rara e poucos serviços utilizam antibioticoterapia profi- lática. Habitualmente, a manutenção da fase lútea é realizada após a rotura follicular com progesterona micronizada via vaginal 400 mg/dia, ou gel na dose de 90 mg/dia durante 14 dias, ou hCG com três doses de 1.500 UI (Quadro 1).

Inseminação artificial

resultados

inseminação intrauterina em ciclo natural

infertilidade sem causa aparente

Em quatro importantes trabalhos de ISCA envolvendo 990 casais com a duração da infertilidade variando de 1,7 a 6,5 anos, observou-se uma diferença com relação às taxas de gravidez de 7% (IC 95%: 4 a 12) por casal e de 3% (IC 95%: 1 a 24) por ciclo com o uso da II em comparação com o controle. O efeito da II por ciclo é de significância marginal, fazendo que o protocolo preconizado deva sempre incluir três ciclos II para atingir um possível significado estatístico.

infertilidade masculina

Na literatura, há apenas uma revisão sistemática comparando II versus coito pro- gramado (CP), ambos em ciclos naturais. A II não foi superior ao CP (OR: 5,3; IC 95%: 0,42 a 67).

inseminação intrauterina em ciclos estimulados com citrato de clomifeno

infertilidade sem causa aparente

Na literatura estão descritos apenas dois trabalhos comparando citrato de clo- mifeno (CC) com II versus CC apenas. Em ambos os estudos, não se observaram diferenças significativas quanto às taxas de gestação. Por outro lado, comparando-se CC + II versus II em ciclo natural, em um total de 26 pacientes não se verificaram di- ferenças significativas entre as taxas de gestação (OR: 3,8; IC 95%: 0,3 a 48). Além disso, ao se comparar CC + II versus CP em um total de 51 pacientes, obtiveram-se 11% de gravidezes em 73 ciclos de CC + II e 4% de gestações em 103 ciclos de CP. A diferença de 7% na taxa de gravidez não foi significativa (IC 95%: - 1 a 15).

infertilidade masculina e outras indicações

Não há trabalhos descritos com CC + II nessas situações.

inseminação intrauterina em ciclos estimulados por gonadotrofinas e outros

O uso de FSH ou hMG possui o intuito teórico de produzir aumento no número de folículos e, consequentemente, um número maior de oócitos para fertilização.

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Em 2006, Verhulst et al. publicaram uma metanálise mostrando em pacientes com ISCA que a estimulação ovariana com gonadotrofinas + II apresentou taxas de crianças nascidas vivas significativamente maiores do que a II em ciclo natural (OR = 2,1; IC 95%; 1,2 a 3,5). Em 2007, outra metanálise que analisou 3.957 pacientes e 11 estudos aleatórios verificou que as taxas de gestação são signi- ficativamente superiores quando se empregam gonadotrofinas versus fármacos antiestrogênicos (7 estudos; n = 556; OR = 1,8; IC 95%; 1,2 a 2,7). Por outro lado, ao se comparar fármacos antiestrogênicos com inibidores da aromatase, não houve diferença significativa entre as taxas de gestação nos casos II (5 estudos; n = 313; OR = 1,2; IC 95%; 0,64 a 2,1). A mesma conclusão foi referida quando se compararam diferentes tipos de gonadotrofinas (9 estudos; n = 576). Além disso, a adição de hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH) agonista não apresentou nenhum benefício (4 estudos; n = 391; OR = 0,98; IC 95%; 0,6 a 1,6), ocasionan- do um maior número de gestações múltiplas. Com relação ao uso de antagonistas adicionados aos estímulos com gonadotrofinas, também não ocorreram benefícios em termos de gestação (OR = 1,5; IC 95%; 0,83 a 2,8). Dessa forma, quando as gonadotrofinas forem usadas, os protocolos com baixas dosagens são os preferi- dos. Entretanto, deve-se tomar cuidados especiais para evitar gestações múltiplas de ordem elevada, ou seja, suspender a estimulação ovariana em caso de o número de folículos iguais ou superiores a 16 mm ser superior a 2.

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