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No presente estudo a fonte de dados emanou do relato dos próprios estudantes de Engenharia, ou melhor, da percepção destes estudantes acerca de suas experiências de formação e como estas afetaram as disposições de pensamento crítico. Para tanto, empregou- se a entrevista como instrumento de coleta de dados. Muito utilizada em estudos qualitativos, a entrevista pode ser definida como “a técnica em que o entrevistador se apresenta frente ao investigado e lhe formula perguntas, com o objetivo de obtenção dos dados que interessam à investigação” (GIL, 2008, p. 109). Esta técnica possibilita a obtenção de dados em profundidade, que serão analisados para compreensão e aquisição de respostas aos problemas de pesquisa levantados, gerando conhecimento. Tais dados podem ser classificados e quantificados posteriormente, dependendo da finalidade da pesquisa.

Dentre os tipos de entrevista existentes, o que se mostrou mais adequado aos propósitos da pesquisa e, por isso, foi utilizada foi a entrevista semiestruturada, que “se baseia em um roteiro de assuntos ou perguntas e o entrevistador tem a liberdade de fazer outras perguntas para precisar conceitos ou obter mais informações sobre os temas desejados (isto é, nem todas as perguntas estão predeterminadas)” (SAMPIERI; COLLADO; LUCIO, 2013, p. 425). Este tipo de entrevista, ao mesmo tempo em que norteia o trabalho do pesquisador, permite maior abertura para esclarecer pontos confusos ou conflitantes durante o processo.

Como exposto por Ennis (1996), uma das formas de se avaliar as disposições de pensamento crítico se dá por meio do uso de instrumentos que possuem questões abertas, como é o caso das entrevistas. Este tipo de instrumento permite ao entrevistado o relato de sua tendência a agir de determinada forma, podendo-se assim explicitar a disposição do estudante. Se partirmos do pressuposto que fazer uma consideração sobre algo, alguém ou sobre si mesmo é também fazer uma avaliação, podemos inferir que na presente pesquisa sucedeu-se uma avaliação por parte do estudante (autoavaliação) no que se refere às alterações nas disposições de pensamento crítico, mesmo não sendo este o objetivo do estudo – avaliar as disposições.

Tendo em vista o objetivo da pesquisa, qual seja, investigar a contribuição das experiências de formação universitária na determinação de alterações das disposições de pensamento crítico a partir da percepção dos estudantes de Engenharia, a construção do

instrumento de coleta de dados teve como referência documentos e informações institucionais acerca das atividades promovidas e/ou reconhecidas pela universidade como importantes para a experiência de formação dos estudantes, bem como os componentes da dimensão das disposições de pensamento crítico a partir do referencial de Facione (1990). Assim, a estrutura do roteiro de entrevista organizada especialmente para este estudo, composta por duas partes, foi concebida como segue:

A primeira parte foi composta de um conjunto de itens com o objetivo de caracterizar o participante, sendo estes: código, idade, sexo, curso, e período atual do curso (semestre).

A segunda parte da entrevista foi composta por itens que conduziram o estudante na identificação e relato de suas experiências de formação na graduação, no entendimento dos componentes de disposição de pensamento crítico com base em Facione (1990), e na reflexão acerca da relação entre suas experiências de formação e os componentes de disposição de pensamento crítico.

Por experiências de formação estabeleceu-se o conjunto de atividades desenvolvidas pelo estudante durante o curso de graduação envolvendo tanto as curriculares obrigatórias como as não obrigatórias, promovidas ou sob a responsabilidade da universidade, e que têm um impacto na sua formação. Estas atividades foram predefinidas tendo como base um documento institucional que regulamenta as atividades complementares dos cursos de graduação da instituição e são definidas a seguir:

a) disciplinas obrigatórias e optativas: disciplinas da grade curricular do curso que são ofertadas em cada período. No caso das disciplinas optativas o estudante necessariamente deve escolher entre as ofertadas e cumprir um determinado número de disciplinas conforme estabelecido no projeto de cada curso;

b) estágio curricular obrigatório: definido como tal no Projeto Pedagógico do Curso (PPC), cuja carga horária é requisito para aprovação e obtenção de diploma. Tem como objetivos: facilitar a futura inserção do estudante no mundo do trabalho; promover a articulação da instituição de ensino superior com o mundo do trabalho; facilitar a adaptação social e psicológica do estudante à sua futura atividade profissional; e complementar as competências e habilidades previstas no perfil do egresso;

c) trabalho de conclusão de curso (TCC): atividade obrigatória, constituída por disciplinas/unidades curriculares dos currículos dos cursos de graduação da instituição, que se caracteriza por uma pesquisa científica e/ou tecnológica aplicada;

d) atividades complementares: atividades que privilegiam a construção de comportamentos sociais, humanos, culturais e profissionais. Tais atividades são adicionais às demais atividades acadêmicas e devem contemplar os grupos de atividades descritos abaixo:

– grupo 1. Atividades de complementação da formação social, humana e cultural, estando inclusas: i. atividades esportivas; ii. cursos de língua estrangeira; iii. participação em atividades artísticas e culturais; iv. participação efetiva na organização de exposições e seminários de caráter artístico ou cultural; v. participação como expositor em exposição artística ou cultural;

– grupo 2. Atividades de cunho comunitário e de interesse coletivo, estando inclusas: i. participação efetiva em Diretórios e Centros Acadêmicos, Entidades de Classe, Conselhos e Colegiados internos à Instituição; ii. participação efetiva em trabalho voluntário, atividades comunitárias, CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes), associações de bairros, brigadas de incêndio e associações escolares; iii. participação em atividades beneficentes; iv. atuação como instrutor em palestras técnicas, seminários, cursos da área específica; v. engajamento como docente não remunerado em cursos preparatórios e de reforço escolar; vi. participação em projetos de extensão, e de interesse social;

– grupo 3. Atividades de iniciação científica, tecnológica e de formação profissional, estando inclusas: i. participação em cursos extraordinários da sua área de formação, de fundamento científico ou de gestão; ii. participação em palestras, congressos e seminários técnico-científicos; iii. participação como apresentador de trabalhos em palestras, congressos e seminários técnico-científicos; iv. participação em projetos de iniciação científica e tecnológica, relacionados com o objetivo do Curso; v. participação como expositor em exposições técnico-científicas; vi. participação efetiva na organização de exposições e seminários de caráter acadêmico; vii. publicações em revistas técnicas; viii. publicações em anais de eventos técnico-científicos ou em periódicos científicos de abrangência local, regional, nacional ou internacional; ix. estágio não obrigatório na área do curso; x. trabalho com vínculo empregatício, desde que na área do curso; xi. trabalho como empreendedor na área do curso; xii. estágio acadêmico na

instituição; xiii. participação em visitas técnicas organizadas pela instituição; xiv. participação e aprovação em disciplinas/unidades curriculares de enriquecimento curricular de interesse do Curso, desde que tais disciplinas/unidades curriculares tenham sido aprovadas pelo Colegiado de Curso e estejam de acordo com o Projeto Pedagógico do Curso. xv. participação em Empresa Júnior, Hotel Tecnológico, Incubadora Tecnológica; xvi. participação em projetos multidisciplinares ou interdisciplinares; xvii. participação em intercâmbio; xviii. participação em programa de monitoria.

Como a pesquisa tem um caráter exploratório, outras atividades poderiam ser inclusas conforme relato do estudante participante. Estas atividades foram dispostas em forma de lista, constituindo-se como documento anexo ao instrumento (entrevista).

No que se refere à disposição de pensamento crítico, o referencial adotado na presente pesquisa foi o definido por Facione (1990), o qual apresenta sete componentes que constituem esta dimensão: Busca da Verdade, Mente Aberta, Analiticidade, Sistematicidade, Autoconfiança no Pensamento, Curiosidade, e Maturidade Cognitiva. A definição de cada elemento encontra-se na seção 3.3 (Avaliação da disposição de pensamento crítico: o CCTDI) e será abordada novamente em seção posterior neste trabalho. A definição de cada disposição foi apresentada ao estudante em forma de cartões impressos e plastificados, o que constitui parte do instrumento de coleta de dados, como material de apoio. Este procedimento foi adotado com a finalidade de auxiliar o estudante na melhor compreensão dos conceitos apresentados, podendo este recorrer à definição sempre que necessário.

Ao final da segunda parte da entrevista, ainda, foram feitos dois questionamentos aos estudantes a fim de verificar sua percepção acerca: 1) da intencionalidade por parte de professores e/ou da própria instituição em desenvolver as disposições de pensamento crítico nos estudantes, bem como 2) do desenvolvimento das disposições a partir da experiência de formação vivenciada no curso. O roteiro de entrevista final, bem como a lista de atividades encontram-se no apêndice A.

Com o propósito de adequar melhor o roteiro de entrevista aos objetivos do estudo, verificar o tempo médio de realização das entrevistas, examinar a adequação dos

equipamentos e do espaço físico escolhido para a realização da entrevista, verificar a

capacidade metacognitiva dos estudantes em responder os questionamentos, e testar a habilidade da pesquisadora na realização da mesma, um estudo piloto foi realizado tendo a

participação voluntária de três estudantes de graduação, sendo um externo à instituição onde a coleta foi feita e dois dos cursos de Engenharia (um de Engenharia Elétrica e outro de Engenharia de Computação).

Os resultados deste estudo piloto demonstraram que o instrumento era adequado aos objetivos da pesquisa, já que os estudantes conseguiram relatar, de forma bastante pertinente, suas experiências de formação e o possível impacto sobre as disposições de pensamento crítico. A preocupação inicial da pesquisadora era ter segurança do entendimento, por parte dos estudantes, dos conceitos (disposições de pensamento crítico) apresentados. O resultado do estudo piloto possibilitou a confirmação de que os estudantes eram capazes de compreender os conceitos, e ainda fazer análises e reflexões sobre os mesmos e sua relação com as atividades de formação. É importante ressaltar que o conteúdo das entrevistas do estudo piloto não foi incluído na pesquisa para efeitos de análise.

Em conformidade com a Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012, que “aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos” (BRASIL, 2012), bem como a Resolução nº 510, de 07 de abril de 2016, que “dispõe sobre as normas aplicáveis a pesquisas em Ciências Humanas e Sociais [...]” (BRASIL, 2016), este projeto de pesquisa foi submetido à avaliação ética pelo Comitê de Ética em Pesquisa de ambas as instituições – instituição proponente (CAAE: 62761016.2.0000.5404) e instituição coparticipante (CAAE: 62761016.2.3001.5547) – através de sua inserção na Plataforma Brasil, sendo aprovado no mês de fevereiro de 2017.