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Capítulo 2. DA DEMOCRACIA PARTICIPATIVA

2.2. Evolução da Democracia Participativa

2.2.4. Instrumentos de participação legislativa

A despeito das diferenças conceituais, em linha geral pode-se considerar como sendo os principais instrumentos participativos existentes no Direito Constitucional moderno, os seguintes institutos:

a) Plebiscito e Referendo

Relativamente aos termos plebiscito e referendo existe uma profunda ambiguidade semântica que cabe registrar. Conforme lembra Benevides (1991), na obra A cidadania ativa: referendo, plebiscito e iniciativa popular, o termo plebiscito vem do latim (plebis + scituam), designando, na Roma Antiga, a decisão soberana da plebe, expressa em votos. Mais tarde, entretanto, o plebiscito se tornaria uma simples formalidade para legitimar os cônsules investidos de poder supremo, como Pompeu e César, casos que deram origem a expressào “cesarismo plebiscitário”.

O referendo, por seu turno, vem da expressão ad referendum, e se origina das antigas Dietas das Confederações Helvéticas do séc. XV, que reservava a população de certos cantões suíços, como os de Valais e Grisons, o poder de validar todas as leis votadas pelos representantes das assembléias cantonais. Com o passar do tempo, o termo passou a ser sinônimo de consulta popular.

Esta imprecisão semântica redunda em um emprego muito diversificado de ambas as expressões no mundo contemporâneo. Os

franceses, por exemplo, muito marcados pelos plebiscitos napoleônicos e gaullistas, nutrem profunda aversão pelo instituto, não o contemplando em seu ordenamento. Eles entendem que o plebiscito é um desvirtuamento do referendo, sendo convocado pelo Chefe de Estado ou de Governo apenas para sobrepor-se de forma populista às decisões do Parlamento, fragilizando assim a democracia representativa.

No Brasil, também houve muita discussão doutrinária sobre a melhor definição dos dois institutos. Pontes de Miranda estabeleceu entre ambos uma distinção de gênero (referendo) e espécie (plebiscito). Já Paulo Bonavides distinguia o referendo plebiscitário (julgamento ou arbitragem) do plebiscito consultivo. Conforme descreve Benevides (1991), há ainda o entendimento de Nelson de Souza Sampaio e José Afonso da Silva, que consideravam o plebiscito como um mecanismo de democracia direta (o povo julga diretamente um regime ou pessoa, sem participação do Pode Público), ao passo que, o referendo seria um instrumento da democracia semi-direta (o povo participaria do processo legislativo).

A inteligência prevalente, tanto na doutrina pátria quanto na estangeira, segue os critérios distintivos básicos defendidos por Di Ruffia (1965), quais sejam: a natureza da matéria submetida ao eleitorado e o momento de sua manifestação. De sorte que, segundo o constitucionalista italiano, o plebiscito revela-se numa consulta popular prévia sobre fato ou medida geral a terem lugar no futuro, ou seja, o plebiscito é sempre anterior a edição de qualquer norma ou tomada de providência. Já o referendo, consiste em consulta popular sobre uma norma jurídica, quer como requisito para emprestar-lhe vigência (referendo constitutivo), quer para mantê-la em vigor (referendo ab-rogatício).

Entre nós, a celeuma foi resolvida com a definição dada pela da Lei n˚ 9.709, de 1998, que previlegiou o critério temporal, como mais tarde será comentado. A despeito de todas as considerações da doutrina nacional e estrangeira, o legislador pátrio conceituou os três instrumentos. Sendo assim, a presente pesquisa adotará as definições legais.

b) Iniciativa Popular

A iniciativa legislativa popular foi primeiramente adotada pelo Cantão suíço de Vaud, em 1845. Trata-se de um instrumento mediante o qual uma certa porcentagem de eleitores registrados pode requerer que uma proposta de sua escolha seja submetida ao voto popular. Às vezes se dá ao órgão legislativo a oportunidade de deliberar, com precedência, sobre a proposição; caso deixe de fazê-lo, a proposição é levada diretamente ao

eleitorado. Somente a Itália e a Suíça têm esse tipo de instrumento em nível nacional. Nos Estados Unidos, ele existe em nível estadual. Vinte e três estados daquele país têm disposições sobre seu uso, seja para medidas constitucionais, seja para legislação ordinária.

Para Bonavides (2003), “de todos os instrumentos da democracia semi-direta o que mais atende às exigências populares de participação positiva nos atos legislativos é talvez a iniciativa”.

A iniciativa popular representa o direito outorgado ao eleitorado para a proposição de norma jurídica perante o Poder Legislativo. Di Ruffia (1965) distingue a iniciativa constitucional da legislativa e registra a existência, no direito comparado, de outras duas modalidades de iniciativa popular: a simples e a formulada. Na simples, também chamada pura, o eleitorado apresenta apenas uma moção ao Parlamento, para que aprove lei com determinado conteúdo; já na formulada, o projeto é elaborado de forma articulada pelos próprios cidadãos.

Devido à complexidade da participação no processo legislativo, que envolve uma série de procedimentos que vão desde a redação do texto (moção, projeto de lei ou emenda constitucional), coleta e conferência de assinaturas, apresentação, admissibilidade constitucional e jurídica, apreciação do mérito etc., o êxito desse instrumento nem sempre é garantido, ainda que o número de subscrições seja expressivo.

c) Veto Popular

O veto popular ou, ainda, referendo de veto é um direito político de participação, que permite rechaçar uma lei depois de promulgada. Da mesma maneira que a iniciativa popular, o exercício do veto também depende de um quorum mínimo de cidadãos e um processo específico para a sua formulação. Na maioria dos paises que o adotam, o veto dá-se em duas etapas. Na primeira, dentro do prazo fixado (geralmente de sessenta a noventa dias) é convocada a consulta. Na segunda, após a realização da consulta e tendo sido alcançado o quorum previsto em lei, desconstituiu-se a norma vetada, com eficácia ex-tunc.

d) Opção popular

A opção popular é uma modalidade de participação, em que o cidadão manifesta uma escolha entre várias alternativas legislativas ou relativas a alguma decisão administrativa a ser tomada. Foi o caso, por exemplo, citado por Bonavides (1976), quando o povo francês, após o

término da Segunda Guerra Mundial, teve que escolher entre três alternativas: retornar à Constituição de 1875; convocar uma constituinte soberana ou convocar uma constituinte com poderes limitados.

e) Revocação ou Recall

O termo recall significa revogar, reparar, anular, e é esta exatamente a finalidade da consulta popular. O recall consiste no poder político exercido pelo povo para revogar a eleição de um membro do Poder Legislativo, ou para destituir um funcionário eleito ou ainda para reformar uma decisão judicial sobre a constitucionalidade de uma lei.

f) Lobby

O termo lobby, que traduzido significa "ante-sala", "parte do prédio em que o acesso é público", passou a ser utilizado na linguagem política para identificar a atividade de defesa de interesses.

Historicamente a origem da palavra - em seu sentido de postulação de interesses – apresenta pequena diferença na Inglaterra e nos Estados Unidos. Na primeira, o termo indicava o vestíbulo por onde passavam os membros da Câmara dos Comuns, a caminho das sessões, onde e quando eram abordados pelos representantes dos grupos de interesses. Já nos Estados Unidos, o uso dessa palavra tem a ver com o vestíbulo dos hotéis onde os presidentes eleitos ficavam hospedados antes de se mudarem para a Casa Branca. Ali mesmo, os lobistas exerciam suas pressões, quer junto ao candidato eleito ou aos futuros membros do Executivo, quer junto aos deputados e senadores que vinham visitar o futuro presidente.

Nas demais democracias ocidentais, como no Brasil, o termo lobby é utilizado para designar as atividades laborativas de um grupo de pessoas, para influenciar as decisões das autoridades públicas, a fim de que os seus interesses sejam atendidos. Entre nós, esse instrumento é também chamado de grupo de pressão ou grupo de interesse. O alvo principal do lobby é sempre o Poder Executivo, que concentra a maior parcela de poder político, mas também atua sobre o Poder Legislativo, sobretudo no que tange a atividade legiferante e fiscalização orçamentária. Não raro o lobby também atua junto ao Poder Judiciário.