• Nenhum resultado encontrado

5.4 DESENVOLVIMENTO DA PESSOA PARA O MUNDO DO TRABALHO

5.4.3 Inteligência emocional e afetividade

A Inteligência Emocional pode ser entendida como um subconjunto das Inteligências Múltiplas, pois, segundo Salovey e Mayer (2004), refere-se à capacidade de avaliar e de expressar emoções, à capacidade de compreender a emoção e o conhecimento emocional e à capacidade de controlar emoções para promover o crescimento emocional e intelectual. Bar-On (2002) ressalta que os

estudos sobre Inteligências Múltiplas de Howard Gardner contribuíram para a Teoria de Inteligência Emocional. O conceito inicial de IE proposto por Salovey e Mayer envolvia a auto percepção e a empatia, e referia-se à capacidade de utilizar informações emocionais para guiar a cognição e o comportamento, conceito que revela uma íntima relação com as inteligências interpessoais e intrapessoais propostas por Gardner (1995).

Salovey e Mayer (2004) foram os autores que apresentaram à comunidade científica o conceito de Inteligência Emocional, porém, o autor que popularizou esse pensamento, principalmente no meio empresarial, foi Daniel Goleman (1995) com o lançamento do livro Inteligência Emocional. Goleman (1995) relacionou a teoria da IE ao mundo do trabalho. Segundo o autor, essa inteligência é a capacidade mais importante na explicação do sucesso no trabalho. Esta afirmação influenciou muitas empresas na década de 1990 a investirem em treinamentos e considerarem os aspectos emocionais dos indivíduos nos processos seletivos.

Goleman (1995) também foi o grande responsável por difundir o conceito de QE, ou seja, coeficiente emocional. Para o autor, o QI  coeficiente de inteligência , e o QE não são capacidades que se sobrepõem, mas sim capacidades distintas. Segundo Goleman (1995), o QE é cada vez mais importante para o sucesso e desenvolvimento das organizações, pois funcionários que possuem confiança em si, autocontrole, compromisso e integridade são mais exitosos, assim como as empresas onde atuam. Sheth, Sisodia, Wolfe (2008), assim como Goleman (1995), ressaltam que as organizações devem buscar desempenhos não apenas econômico, mas também humano, o que os autores denominam de uma "companhia humana", onde prevalece as conexões emocionais entre os colaboradores da organização e nas relações com seus clientes.

Contudo, para Salovey e Mayer (2004), a inteligência emocional não é contraditória à inteligência, ela é uma habilidade cognitiva relacionada ao uso das emoções para auxiliar na resolução de problemas, ou seja, a inteligência emocional é uma intersecção entre as inteligências e as emoções. Salovey e Mayer (2004) identificaram quatro habilidades centrais da Inteligência Emocional, organizadas em níveis de complexibilidade, dos mais elementares aos mais complexos, estas habilidades são: percepção das emoções, facilitação ao pensamento, compreensão das emoções e o controle de emoções para promover o crescimento emocional e intelectual.

A percepção das emoções refere-se à capacidade de identificar emoções em si e em outras pessoas, objetos, paisagem, sons e comportamento. Contempla também a habilidade de avaliar e expressar emoções relacionadas a sentimentos, assim como o discernimento de expressões falsas e verdadeiras. A segunda habilidade destacada pelos autores compreende a emoção como facilitadora do ato de pensar, ou seja, quando as emoções priorizam determinadas ideias por considerá-las mais relevantes ajudando no julgamento de situações. A terceira habilidade contempla a compreensão e análise de emoções, assim como o emprego do conhecimento emocional, ou seja, relaciona-se à capacidade de interpretar e compreender os significados das emoções que estão presentes nos relacionamentos interpessoais. A quarta habilidade refere-se ao controle reflexivo de emoções para o crescimento emocional e intelectual. Essa seria a capacidade de manter-se aberto a sentimentos, administrando a emoção em si mesmo e nos outros pela moderação das emoções negativas e valorização das emoções positivas (SALOVEY; MAYER, 2004).

As ideias de Salovey e Mayer (2004) estão intimamente relacionadas aos pensamentos de Maturana. Segundo Maturana e Varela (2001), todas as nossas ações estão fundamentadas no emocionar. Nosso viver se dá no entrelaçamento cotidiano entre razão e emoção, assim, todo sistema racional tem um fundamento emocional. O autor também destaca a importância de se estabelecer relações sociais sadias, considerando que o social é compreendido como domínio de condutas relacionais fundadas na emoção. Ao se referir à emoção, entretanto, o autor não se refere ao que convencionalmente chamamos de sentimento, mas afirma que emoções são disposições corporais dinâmicas que definem os diferentes domínios de ação em que nos movemos (MATURANA; VARELA, 2001). Dessa forma, a emoção faz parte de todas as relações sociais, é a emoção que constitui o domínio de condutas em que se dá a operacionalidade da aceitação do outro como legítimo outro na convivência. A importância das emoções e a visão sistêmica estão no centro das ideias propostas pelo autor. Segundo Maturana e Varela (2001), se queremos compreender qualquer atividade humana, devemos atentar para a emoção que define o domínio de ações no qual aquela atividade acontece e, no processo, aprender a ver quais ações são desejadas naquela emoção. Esse pensamento aplica-se nas diferentes relações sociais, ou seja, no trabalho, na educação ou no dia a dia.

Goleman, Boyatzis e McKee (2002), de forma muito semelhante às habilidades apresentadas por Salovey e Mayer (2004), também dividem a inteligência emocional em quatro aspectos: autoconsciência, que é a compreensão das próprias emoções, possibilidades, limites, valores e motivações do sujeito; autogestão, que representa a capacidade de gerenciamento das próprias emoções; consciência social, que é a capacidade de perceber as emoções do outro; e administração de relacionamentos, que define o saber lidar com as emoções dos outros, a partir da consciência de suas próprias emoções.

Essa visão apresentada pelos autores de que o ser humano é capaz de crescer com o aprendizado e com a análise e compreensão de seus conteúdos emocionais, e dos que os cercam, está bastante relacionada com os pensamentos da psicologia positiva apresentados pelo psicólogo Martin Seligman (2004), que dizem que o conhecimento das forças e virtudes emocionais pode propiciar o "florescimento" (flourishing) das pessoas, comunidades e instituições, uma condição que permite o desenvolvimento pleno, saudável e positivo dos aspectos psicológicos, biológicos e sociais dos seres humanos.

A abordagem de Goleman (2001) sobre inteligência emocional apresenta grandes contribuições para o meio organizacional. Segundo o autor, as pessoas que possuem inteligência emocional desenvolvida têm as seguintes características: capacidade de liderar e organizar grupos ou rede de pessoas; capacidade de mediar e negociar soluções e acordos, evitando conflitos e disputas; capacidade de estabelecer bom relacionamento social; e capacidade para análise no meio social a partir dos sentimentos e preocupações das outras pessoas.

A Teoria das Inteligências Múltiplas, apesar de sua popularidade, recebe algumas críticas. Uma delas é se realmente a inteligência emocional pode predizer o desempenho profissional. Outro questionamento é se ela não seria apenas um traço de personalidade (COBÊRO; PRIMI; MUNIZ, 2006; GONZAGA; MONTEIRO, 2011). Em pesquisa realizada por Cobêro, Primi e Muniz (2006), utilizando o teste de medição de inteligência emocional, Mayer, Salovey, Caruso Emotional Intelligence Test (MSCEIT), confirmam-se as relações relatadas na literatura entre inteligência e desempenho no trabalho, ou seja, dessa forma, a probabilidade de uma pessoa inteligente emocionalmente ter desempenho superior no trabalho é maior do que de uma com baixa inteligência emocional. Assim, reforça-se a abordagem de Goleman (1999) de que as organizações devem considerar em sua avaliação aspectos

relacionados à inteligência emocional, levanto em conta, portanto, a forma com que as pessoas lidam com elas mesmas e com os outros, além da inteligência tradicional, da formação acadêmica e das experiências profissionais.

A respeito da crítica que considera a possibilidade de a inteligência emocional ser apenas um traço de personalidade, o estudo desenvolvido por Cobêro, Primi e Muniz (2006) concluiu que a inteligência emocional é um constructo novo associado à inteligência, mas praticamente distinto de medidas de personalidade. Esse resultado corrobora com a abordagem de Gonzaga e Monteiro, 2011, que considera o fato de as emoções abrangerem apenas uma das quatro bases de personalidade, sendo que as outras três (motivação, cognição e consciência) estão separadas da base emocional. Os dados e os fatos apresentados em relação às críticas realizadas evidenciam, portanto, a seriedade da teoria das inteligências múltiplas apresentada pelos autores citados nesta revisão bibliográfica.

A inteligência emocional, além de ganhar popularidade e se destacar no meio empresarial, também apresenta contribuições relevantes para o mundo acadêmico. Segundo Regô e Rocha (2009), durante muitos anos, os aspectos cognitivos racionais do educando foram supervalorizados em detrimento do conhecimento subjetivo. A educação com objetivos exclusivamente cognitivos, no entanto, tem se mostrado insatisfatória, e as novas gerações têm mostrado crescente falta de competência emocional e social (SANTOS, 2000). Mosquera e Stobäus (2006, p. 125) destacam que "… a afetividade é fundamental para a vida humana e representa um dos aspectos mais significativos na construção de seres humanos mais saudáveis e, especialmente, mais capazes de tomar decisões sábias e inteligentes." A educação emocional, portanto, é de extrema relevância para o desenvolvimento do ser humano. A pessoa emocionalmente educada é capaz de lidar com as emoções de modo a desenvolver seu potencial pessoal e sua qualidade de vida, pois cria possibilidades de afeto entre os demais, possibilita o trabalho cooperativo e desperta o sentido de comunidade.

A educação emocional é de grande importância para a educação de gestores. Segundo pesquisa desenvolvida por Abraham (2006), os alunos das escolas de negócio precisam desenvolver habilidades relacionadas à inteligência emocional, pois elas são fundamentais para uma carreira de sucesso e realização, e, complementa o autor, essa deve ser uma responsabilidade primordial dos educadores. Low et al. (2004) ressaltam que, apesar do desenvolvimento cognitivo

ser ainda o objetivo central das escolas, faculdades e universidades, pode ser desastroso promover uma educação sem contemplar conhecimentos emocionais e afetivos. Uma combinação de conhecimentos acadêmicos (cognitivos), comportamentais (ação) e afetivos (emocionais) é fundamental para os alunos enfrentarem as questões complexas com as quais irão se deparar, tanto na vida pessoal quanto na vida profissional.

Hué (2008) chama a atenção para o problema das instituições escolares, centradas exclusivamente no desenvolvimento da inteligência racional, desconsiderando as questões passionais da conduta humana nos ambientes escolares. O autor destaca que os educadores e os gestores das instituições de ensino não podem ficar cegos frente à outra realidade da inteligência humana, frente à parte emocional da inteligência.

Outro ponto importante relacionado com a educação da emoção refere-se ao fato de que aquilo que é emocionalmente aprendido é mais difícil de ser esquecido (HUÉ, 2008). O fato de a memória relacionar-se com as emoções tem o sentido biológico da reação frente a uma situação. A base fisiológica das emoções não está no coração, mas no cérebro. Tem sua base fisiológica no centro do cérebro no paleocórtex, próximo ao nariz, por isso chama-se rinencéfalo, o que explica o fato de a primeira sensação das emoções ter origem olfativa. A zona cerebral responsável pelas emoções encontra-se também próximo aos lobos temporais, lugar em que podemos encontrar a base da memória humana, as datas e os acontecimentos marcantes, tudo fica gravado nesse local. Nossa vida está regida pelas emoções, permitindo recordar bons e maus momentos. Os bons podem nos levar a viver na ilusão, os maus, por vezes, nos levam a não realizar com plenitude nossas atividades pessoais e profissionais.

As emoções impulsionam o ser humano para a reação, ou seja, é o que faz a pessoa reagir. Por um lado, seus instintos, desejos e impulsos, e, por outro, os sentimentos, as emoções e os afetos. De acordo com Hué (2008), temos que aprender a conviver com as emoções positivas e negativas, os bons e maus momentos que podem ser recordados a qualquer tempo. Não podemos viver sem emoções. A alegria de viver está relacionada às mudanças, às tensões, às crises, ao enfrentamento de situações e às adversidades. Dessa forma, o ser humano precisa ser emocionalmente educado para conhecer as suas emoções e as alheias, sua

intensidade e suas causas e consequências, dando conta, assim, das suas próprias emoções, uma vez que está familiarizado com elas.

O sentimento é uma emoção pensada e repensada, uma vez que a realidade só existe na medida em que a pensamos. As emoções só existem na medida em que as valorizamos como negativas ou positivas. Para Hué (2008), é o pensamento positivo que regula o sentimento para o bem-estar, tudo está no pensamento. A verdadeira felicidade do ser humano, sua verdadeira realidade, encontra-se no pensamento e na capacidade de transformar emoções negativas em pensamentos positivos.