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Inteligências coletivas, psicotecnologias e inteligência conectiva A primeira versão do livro “Inteligência coletiva – por uma antropologia do

2. Sociedade em rede

2.5 A cultura digital

2.5.4 Inteligências coletivas, psicotecnologias e inteligência conectiva A primeira versão do livro “Inteligência coletiva – por uma antropologia do

ciberespaço”, data de 1994. Assim se define: “é uma inteligência distribuída por toda parte, incessantemente valorizada, coordenada em tempo real, que resulta em uma mobilização efetiva das competências” (LÉVY, 2007, p. 28)

Ao examinar as tecnologias da inteligência, principalmente depois da sociedade em rede, Pierre Lévy passou a caracterizar a dinâmica da rede como forma de expressão de uma inteligência global, distribuída pelo mundo. Identifica que a internet possibilita uma nova forma de se relacionar com o conhecimento. Não há dúvidas de que sempre

Página | 86 que uma sociedade passou a ter acesso às informações, ocorreram mudanças sociais, como no caso da sociedade do livro.

[...] O ciberespaço suporta tecnologias intelectuais que amplificam, exteriorizam e modificam numerosas funções cognitivas humanas: a memória (banco de dados, hiperdocumentos, arquivos digitais de todos os tipos), imaginação (simulações), percepções (sensores digitais, tele presença, realidades virtuais), raciocínios (inteligência artificial, modelização de fenômenos complexos) (LÉVY, 2005, p. 157).

O autor vê nessas formas as tecnologias da inteligência que levam a novas formas de acesso, novos tipos de raciocínio e de conhecimento. O próprio processo de aprendizagem é totalmente resignificado. A forma como um internauta pode lidar com um texto, é hipertextual, nada que está na rede está fora da dinâmica do hipertexto. Nela é possível explorar diversos documentos, navegar para a página de uma referência sem mesmo ter lido o texto anterior até o final etc. O fato das pessoas terem a percepção de que a informação circula na rede desmistifica a idéia de que existe um “reservatório de conhecimento transcendente, e o saber não é nada além do que as pessoas sabem” (LÉVY, 2005, p. 29).

O centro de estudo de Lévy são as alterações humanas, que acontecem a partir da fusão entre o homem e a rede. A característica principal da inteligência coletiva está ligada às possibilidades de intercâmbio entre computadores surgidos com a internet em meados dos anos noventa. Desde o seu surgimento, a internet passou de repositório de informações a espaço de acesso generalizado, atualmente passando pela fase do compartilhamento, tanto de dados quanto de conteúdo. É nessa esfera de compartilhamento que se firma um novo tipo de coletividade interessada em trocar informações, em gerar informações e fazer com que elas circulem. Com o conceito de inteligência coletiva, Pierre Lévy busca elucidar um conhecimento horizontal, em detrimento do conhecimento piramidal.

[...] No lugar de uma representação em escalas lineares e paralelas, em pirâmides estruturadas em níveis, organizadas pela noção de pré- requisitos e convergindo para saberes ‘superiores’, a partir de agora devemos preferir a imagem de espaços de conhecimentos emergentes, abertos, contínuos, em fluxo, não lineares. (LÉVY, 2005, p. 158).

Assim, a inteligência coletiva se expressa através da ação emergente, aquela ação inesperada, que resulta dos agenciamentos imprevistos que acontecem no meio caótico da rede. Valoriza a inteligência enquanto projeto e força criativa, mas é importante destacar que a emergência da inteligência coletiva não pressupõe o conhecimento do todo, o ciberespaço. A cibercultura não tem essa pretensão social,

Página | 87 muito pelo contrário, ela mostra as estruturas totalizantes da modernidade, que o “todo está definitivamente fora de alcance” (LÉVY, 2005, p. 161).

A realidade da comunicação em tempo real, e da interconexão generalizada favorece todos esses processos, assim como a mobilidade da significação. Neste processo fica evidente que a separação entre emissor e receptor não funciona para pensar a esfera colaborativa da rede.

O ideal mobilizador da informática não é mais a inteligência artificial (tornar uma máquina tão inteligente quanto, talvez mais inteligente que um homem), ma sim a inteligência coletiva, a saber, a valorização, a utilização otimizada e a criação de sinergia entre as competências, as imaginações e as energias intelectuais [...]. (LÉVY, 2005, p. 167).

A utilização social da rede dá a ela o caráter de coletividade, e, portanto de proximidade e afinidade entre seus agentes. Essa coletividade, de certa forma, vem dizer ao homem que ele não constrói sozinho.

De forma diferente, Derrick De Kerckhove pensa a dinâmica da rede, muito influenciado pelas idéias de McLuhan sobre a força da eletricidade na constituição de importantes mudanças sociais. Para isso inaugura o termo Psicotecnologias. Kerckhove olha para a relação entre homem e tecnologia de uma maneira mais visceral, como se ela sempre tivesse feito parte dele. “A nossa realidade psicológica não é uma coisa ‘natural’. Depende parcialmente da forma como o nosso ambiente, incluindo as próprias extensões tecnológicas, nos afeta” (KERKCKHOVE, 1997, p. 33).

A definição de psicotecnologias diz respeito à tecnologia que emula, estende ou amplifica o poder da mente humana. Para isso considera o ambiente como o resultado da interação e a interação também como resultado do ambiente. Nesse caso o ambiente de interação é criado junto com os meios, Kerckhove destaca,

[...] essas tecnologias não apenas prolongam aas propriedades de envio e recepção da consciência, como penetram e modificam a consciência dos seus utilizadores. A realidade virtual ainda está mais ajustada a nós. Acrescenta o tacto à visão e a audição e está mais próxima de revestir totalmente o sistema nervoso humano do que alguma tecnologia já o fez. Com a realidade virtual e a tele presença [...] literalmente ara o exterior a nossa consciência [...]. Com a televisão e os computadores mudamos a localização do processamento de informação de dentro dos nossos cérebros para ecrãs à frente dos nossos olhos, em vez de por detrás. (KERKCKHOVE, 1997, p. 34).

Página | 88 Kerckhove acredita que essa condição de envolvimento entre tecnologia e homem traz a coletivização, mas com receio do peso do “comunitário”, prefere chamar a dinâmica da rede de inteligência conectiva, termo que desvincula a rede do sentido de resultado, como se a inteligência coletiva buscasse sempre por um resultado de sua troca. O termo inteligência conectiva pode significar apenas um processo, algo que não visa efetivação específica.

Essa idéia de conectividade está ligada também à proliferação do uso das Tags3

(forma surgida com a idéia de Web 2.0 - formas de articulação e softwares colaborativos), na construção dos sites colaborativos. Com elas, a estrutura de busca e associação da informação na web é alterada, já que as tags atribuem significado sem a ordem hierárquica tradicional do conhecimento. As tags foram criadas para dar conta desse processo caótico e contínuo em detrimento da categoria.