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CAPÍTULO 3 – MEDIAÇÃO E INTERATIVIDADE NOS ESPAÇOS MUSEAIS

3.2 INTERATIVIDADE

3.2.1 INTERATIVIDADE NOS MUSEUS

Com relação ao surgimento do conceito de interatividade nos museus, Falcão et al. (2003) descreve que esse começa a aparecer em oposição à forma de comunicação que era predominante nos museus (a contemplação), permitindo que os visitantes possam “[...] desencadear um comportamento reativo por parte dos aparatos expostos” (p. 189).

O mesmo autor também salienta que o primeiro museu a usar essa nova forma de comunicação foi o Deutschs Museum, fundado em 1903, em Munique, na Alemanha, onde o visitante poderia acionar o aparato à sua frente, fazendo com que o objeto pudesse funcionar. Esse tipo de aparato ficou conhecido como “modelo Push Button de interação” (FALCÃO ET AL, 2003, p. 190). Da mesma forma que esse museu, “[...] o Science Museum de Londres (1927) e o Museum of Science and Industry, dos EUA (1933), aplicaram os princípios da interatividade em suas exposições como uma forma de cativar seus públicos e conduzi-los à assimilação de certos conceitos científicos” (SÁPIRAS, 2007, p. 31). Cazelli (1992) acrescenta, afirmando que:

Enquanto o velho museu de ciência se contentava em exibir seus objetos históricos protegidos por caixas de vidro em filas intermináveis, o novo museu de ciência se mostrava atraente e estimulante com suas máquinas modernas em funcionamento. As referências não eram mais do tipo “aqui está um velho motor” e, sim, “veja o que acontece ao apertar o botão ou girar a manivela” (p. 14).

A forma de o público lidar com os museus mudou com a introdução desses novos aparatos tecnológicos. Ainda segundo Cazelli (1992),

A opção por estimular o visitante a participar de suas exposições e atividades, apertando botões, girando manivelas, manuseando equipamentos, foi passo determinante para a interação direta com o público. Daí, até mesmo, a nomenclatura museus interativos de ciência procedente dessa tentativa de diálogo. A norma “não tocar nos objetos”, rigorosa nos museus tradicionais, é abolida nesses centros. Tudo o que vai ser exposto é concebido e organizado com fins educacionais. A dimensão educativa própria das exposições, tanto permanentes como temporárias, é completada por atividades paralelas: sessões de vídeos, filmes, jogos em computadores, etc. (p. 15).

Na Figura 6, tem-se um exemplo de um aparato denominado de “ilusões de cor”, que funciona no modelo Push Button de interação. Nesse, basta pressionar um botão para que o

disco comece a girar e então é possível verificar que, à medida que a velocidade de rotação do disco vai aumentando, as cores vão se fundindo e surgem outras que não estavam presentes nele, quando se encontrava parado.

Figura 6 – Experimento ilusões de cor do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra.

Essa forma de relação do visitante com os objetos em exposição, presente nos aparatos do tipo Push Button, é denominada de reativa. Mas ser reativo significa ser interativo? Essa pergunta tem suscitado diferentes posicionamentos de respostas.

Williams (1979 apud Machado, 1990) alerta para o fato de que é necessário distinguir a tecnologia interativa da reativa, pois “[...] a primeira deve dar total autonomia ao espectador, enquanto a segunda pressupõe um leque de escolhas predeterminado” (p. 26). Ao discorrer sobre essa distinção, Machado (1990) afirma que:

Boa parte dos equipamentos hoje experimentados ou já comercializados como interativos são, na verdade, apenas reativos. Os videogames, por exemplo, solicitam a resposta do jogador/ espectador (resposta inteligente em alguns casos; resposta mecânica na maioria dos outros), mas sempre dentro de parâmetros que são as ‘regras do jogo’ estabelecidas pelas variáveis do programa. Isso quer dizer que nas tecnologias reativas não há lugar propriamente a respostas no verdadeiro sentido do termo, mas a simples escolhas entre um conjunto de alternativas preestabelecidas (p. 26).

Com isso, pode-se identificar a relação reativa como aquela em que existe pouco controle do usuário sobre as respostas, pois esse irá trabalhar com um grupo limitado de possibilidades de escolhas e as suas ações sempre o levarão às respostas pré-determinadas, impossibilitando que ele possa ter total controle sobre as ações e sobre quais caminhos essas o levarão.

No entanto, Fischer (1987 apud Primo, 2000) considera a relação reativa como um tipo de interação, e essa tem sido a visão mais difundida pelo público em geral e pela indústria que vende produtos chamados de interativos, mas que são na verdade somente reativos. Primo (2000) salienta que não se deve admitir que os sistemas reativos se tornem “[...] o exemplo fundamental de interação (como vem acontecendo nos slogans da indústria informática). Podemos então os apresentar como um tipo limitado de interação, sem jamais esquecer das profundas limitações que impõe à relação” (p. 86).

Ao discutir sobre as formas de interação existentes nos museus e o seu desenvolvimento ao longo dos tempos, Falcão (1999) comenta que é possível encontrar nos museus da atualidade

[...] um amplo espectro de tipos de interatividade que vão desde o mero acionamento de botões que desencadeiam o funcionamento de aparatos, painéis que propõem perguntas e respostas emitindo luzes e sons, até situações nas quais o visitante pode estabelecer um “diálogo” com o modelo, na medida em que o usuário detém um certo controle sobre os parâmetros que determinam mudanças no comportamento do modelo exposto. Para ações diferentes há respostas diferentes que podem levar a indagações do interesse do visitante..., muitas vezes de forma não imaginada pelos idealizadores das exposições (p. 41).

Mas, finalmente, quais são as formas de interação possíveis de ocorrer em uma visita ao museu? De acordo com Wagensberg (2001), elas podem se dar em três níveis: hands-on (manual), minds-on (mental) e hearts-on (emocional). A interatividade hands-on é aquela em que o visitante pode, com suas mãos, manipular objetos que estão expostos e, a partir daí, receber uma resposta, “O visitante é um elemento ativo da exposição” (p. 348, tradução nossa). Essa forma de interação surge, de acordo com Cazelli (1992), com a construção do Exploratium, em São Francisco, EUA, no ano de 1969, trazendo um “[...] movimento em favor da troca da proposta push-botton pela do hands-on. Inaugurou a fase dos museus interativos de segundo grau, nos quais o visitante é convidado não só a tocar, mas também a interagir com os módulos em exposição” (p. 16).

A minds-on é aquela que Wagensberg (2001) considera complementar a anterior, pois permite criar relações entre o que é visto no museu e a realidade fora dele, possibilitando que o visitante possa assumir uma postura crítica em relação ao que está em exposição, permitindo a esse “Sair de uma exposição com mais perguntas (ainda mais dúvidas) do que tinha ao entrar, essa é precisamente uma boa medida do valor de uma exposição [...] detectar um paradoxo ou contradição, vislumbrar uma idéia nova” (p. 348-349, tradução nossa).

Já na interatividade do tipo hearts-on, o envolvimento do visitante se dá pelo estímulo emocional com a exposição, Chelini e Lopes (2008) descrevem que essa ocorre quando a exposição prioriza

[...] as identidades presentes no entorno do museu, promovendo a identificação, com o acervo, do visitante da comunidade local; e um despertar para uma nova cultura, quando o visitante é de outras localidades. É o tipo de interatividade que ocorre quando o Museu de Zoologia opta, por exemplo, por compor suas exposições a partir de organismos neotropicais, que despertam no visitante brasileiro uma identidade, enquanto proporcionam ao estrangeiro um contato com ambientes que não o de sua naturalidade (p. 232).

De acordo com Wagensberg (2000), a interatividade do tipo hands-on é conveniente, a do tipo minds-on é imprescindível e a do tipo hearts-on é muito recomendável. Pode-se perceber que todas as três formas são consideradas importantes e podem estar presentes isoladamente, mas o ideal é que elas possam aparecer combinadas em uma exposição. Frank Oppenheimer e sua equipe do museu Exploratorium de San Francisco, nos Estados Unidos, consideram que o conceito de hands-on, “[...] sempre deveria estar ligado ao conceito minds- on” (PAVÃO e LEITÃO, 2007, p. 40).

A simples utilização de aparatos interativos não significa que vá ocorrer aprendizagem, pois existem outros fatores que devem ser levados em consideração. Hein (2009) salienta que, para o visitante poder compreender o objeto em exposição e tornar essa experiência no museu um momento propício à aprendizagem, um dos fatores mais importantes é o tempo que ele leva em cada experimento. Para isso, é necessário criar um ambiente agradável e confortável, através de variadas atitudes, “A mais simples e eficaz é adicionar um lugar para sentar” (p. 70). Essa atitude permite que o visitante possa ficar encorajado a usar o experimento por um período prolongado e a partir desse momento tornar essa experiência mais produtiva. Outra critica de Hein (2009) está relacionada ao layout de alguns museus que deixam diversos aparatos tecnológicos próximos e com isso o visitante,

que está utilizando um determinado experimento, passa a ser atraído para outro, seja por sons ou por luzes, entre outras formas de atrair a sua atenção.

Apesar de concordar com a posição de Hein com relação à necessidade de aumentar o tempo em que os visitantes passam em um determinado experimento, é importante salientar que somente o tempo não significa que ocorreu a aprendizagem naquele momento. É necessário que esse visitante disponha de outros recursos, como a possibilidade da mediação humana, para transformar esse momento em uma experiência prazerosa e produtiva, pois, como nos alerta Marty (2008), “Visitantes com dispositivos interativos podem passar mais tempo em galerias tentando descobrir como usar o dispositivo do que realmente aprendendo ou interagindo com ela” (p. 133-134, tradução nossa).

Com relação a essa questão da ocorrência da aprendizagem que possa ocorrer nos museus de ciência, Cazelli (1992) ressalta que “A despeito de diferentes opiniões, há uma tendência em considerar que os museus interativos de ciência apresentam grande potencial de aprendizagem” (p. 29). E esse potencial pode ser encontrado em todos os museus que apresentam aparatos interativos e uma proposta pedagógica para a utilização dos mesmos elementos por parte dos visitantes.

Como apresentado até agora, o conceito de interatividade se pauta como uma forma de interação em que a tecnologia encontra-se presente. Mas o que é tecnologia? Quais são as principais tecnologias que têm sido utilizadas atualmente nos museus do mundo? A seguir, procurar-se-á discutir esse assunto.