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2 SABERES NECESSÁRIOS À PROMOÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

2.1 CAMINHOS METODOLÓGICOS SUGERIDOS

2.1.2 Interdisciplinaridade

A organização do ensino escolar em várias disciplinas é instituída a partir de uma visão de mundo fragmentária, reducionista e mecânica. A maior parte das ciências foi consolidada num positivismo predominante, em que era acentuada a divisão sujeito e objeto. De acordo com Trindade (1999, p.76):

A fé no modelo científico, fora do qual não há nenhuma verdade, foi o fator limitante da concepção cartesiana e, no entanto, é ainda hoje, muito difundida. Seu método, baseado no raciocínio analítico, alavancou o desenvolvimento do pensamento científico. Contudo, por outro lado, acabou provocando uma profunda cisão no nosso modo de pensar, gerando o ensino disciplinar compartimentado.

Nessa discussão, sabemos que a visão compartimentada das diversas áreas do conhecimento é fruto do paradigma científico moderno predominante no final do século XIX, em que articular o conhecimento não era possível ao especialista. Conforme Paviane (2008) surge a intersciplinaridade como uma teoria epistemológica que tende a superar a excessiva especialização disciplinar surgida da racionalidade científica moderna. Os sintomas da crise das disciplinas e do excesso de fragmentação8 do ensino, a interdisciplinaridade não dilui e

8 “A fragmentação do ensino em matérias não passa do reflexo do parcelamento sofrido pelas ciências, inevitável

nem cria disciplinas, mas é capaz de ampliar o trabalho disciplinar na medida em que promove a aplicação do conhecimento de uma disciplina em outra.

Em conformidade com os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio:

[...] a interdisciplinaridade não tem a pretensão de criar novas disciplinas ou saberes, mas de utilizar os conhecimentos de várias disciplinas para resolver um problema concreto ou compreender um determinado fenômeno sob diferentes pontos de vista. Em suma, a interdisciplinaridade tem uma função instrumental. Trata-se de recorrer a um saber diretamente útil e utilizável para responder às questões e aos problemas sociais contemporâneos (BRASIL, 1999, p. 34–36).

Isso evidencia que reunir várias disciplinas em torno de um mesmo tema não se caracteriza num trabalho interdisciplinar, mas é necessária a articulação dos conhecimentos. Para uma melhor compreensão sobre a interdisciplinaridade, o texto de Ferreira (1999, p. 33- 34) traz uma metáfora que ilustra bem a noção do termo: o conhecimento é uma sinfonia:

Para sua execução será necessário a presença de muitos elementos: os instrumentos, as partituras, os músicos, o maestro [...] todos os elementos são fundamentais, descaracterizando, com isso, a hierarquia de importância entre os membros. Durante os ensaios as partes se ligam, se sobrepõem e se justapõem num movimento contínuo [...] o projeto é único: a execução da música. Apesar disso, cada um na orquestra tem sua característica, que é distinta [...] também na construção do conhecimento a integração das muitas ciências não garante a sua perfeita execução. A interdisciplinaridade surge, assim, como possibilidade de enriquecer e ultrapassar a integração dos elementos do conhecimento [...] mas não só integração, também de criação e recriação de outros pontos para discussão [...].

Ao enfatizar o ensino de geografia a partir da exposição dessa metáfora, consideramos que a interdisciplinaridade é inovadora e dinâmica, em que o ensino da referida disciplina seja evocado ao desenvolvimento da aprendizagem dos alunos, principalmente se houver a articulação dos conhecimentos que abrangem o ensino escolar. Nessa perspectiva, os docentes que trabalham em equipe e permitem a abertura para o diálogo, para o conhecimento compartilhado, mesmo em meio às diferenças, fazem a interdisciplinaridade ser enriquecida na sua prática e torna possível a integração das diversas áreas do conhecimento.

O trabalho que deve se desenvolver em sala de aula com a interdisciplinaridade, Fazenda (1994, p. 86) faz a seguinte discussão:

porém, não faz nenhum sentido partir dessa fragmentação, pois ela dificulta a compreensão da realidade, que não está parcelada na compartimentalização delimitada pelas diferentes disciplinas científicas” (BUSQUETS, et al, 1998, p. 58).

Numa sala de aula interdisciplinar a autoridade é conquistada, enquanto na outra é simplesmente outorgada. Numa sala de aula interdisciplinar a obrigação é alternada pela satisfação; a arrogância, pela humildade; a solidão, pela cooperação; a especialização, pela generalidade; o grupo homogêneo, pelo heterogêneo; a reprodução, pela produção do conhecimento.

A sala de aula interdisciplinar é utilizada por professores que fazem do seu cotidiano uma aprendizagem contínua, que a ação das suas atividades resulta de tempos de reflexões e experiências na profissão, sabem que o interesse dos alunos pelas aulas está mais relacionada ao seu domínio teórico e metodológico da disciplina do que um ensino voltado pela imposição da sua autoridade.

Nessa perspectiva, podemos dizer que a interdisciplinaridade não compreende apenas o encontro entre as disciplinas escolares, mas pode ser entendida pelo diálogo, pela parceria e atitude entre os docentes. Sobre as atitudes de um professor interdisciplinar, Fazenda (1994, p. 82) diz:

Entendemos por atitude interdisciplinar, uma atitude diante de alternativas para conhecer mais e melhor; atitude de espera ante os atos consumados, atitude de reciprocidade que impele à troca, que impele ao diálogo – ao diálogo com pares idênticos, com pares anônimos ou consigo mesmo – atitude de humildade diante da limitação do próprio saber, atitude de perplexidade ante a possibilidade de desvendar novos saberes, atitude de desafio - desafio perante o novo, desafio em redimensionar o velho – atitude de envolvimento e comprometimento com os projetos e com as pessoas neles envolvidas, atitude, pois, de compromisso em construir sempre da melhor forma possível, atitude de responsabilidade, mas, sobretudo, de alegria, de revelação, de encontro, enfim, de vida.

Em conformidade com Trindade (2008) um professor interdisciplinar reconhece os limites do seu próprio conhecimento, não se satisfaz com o que aprendeu, nem com o que ensinou, mas tem compromissos para superar as próprias limitações. Nesse sentido, é necessário o professor interdisciplinar se ater de toda experiência que já possui, reconhecer que há velhas práticas de ensino que não podem deixar de existir, mas podem ser ressignificadas.

Ao relacionar as práticas interdisciplinares ao cotidiano dos professores no contexto escolar, Tavares ( 2008, p. 142-143) diz que:

É no ambiente de aprendizagem que o professor interdisciplinar exercita o seu desapego, sua ousadia e suas possibilidades de cooperação e de diálogo. É no dia-a-dia que esse professor utiliza como instrumental a sua própria disposição de desaprender, de romper com sua prática rotineira, dogmática, conservadora e prepotente. Num ato de humildade, parte para o exercício da reflexão crítica sobre o conhecimento, e suas práticas pedagógicas são construídas e transformadas com o outro.

Nessa perspectiva, podemos afirmar que um professor interdisciplinar é capaz de construir “pontes” no intuito de unir, de encontrar e realizar as atividades pedagógicas exigidas no âmbito escolar; por ouro lado, no cotidiano das escolas e do ensino podem ser erguidos “muros” que separam, bloqueiam e atrofiam cada vez mais o conhecimento dos principais sujeitos do processo de ensino-aprendizagem. Segundo Aigner (2003), muitas vezes os trabalhos ditos “interdisciplinares” nas escolas resumem-se a juntar as disciplinas sobre um único tema. Nesse caso, sem a articulação entre os conhecimentos, não há interdisciplinaridade.