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A articulação entre os diversos setores – governamentais e não governamentais – como, por exemplo, de saúde, de educação, de segurança, permitem a consolidação de melhorias nas condições de vida das pessoas, promovendo sua saúde. A oferta e garantia de segurança, condições favoráveis de trabalho, acesso à educação formal de qualidade, serviços organizados de modo a criar condições necessárias para que as mulheres possam exercer seus direitos são condições básicas que determinam os modos de vida e condições de saúde da população – não se restringindo a das mulheres. É neste sentido que a PNAISM inclui tais aspectos como diretrizes para a exequibilidade da AISM.

Os profissionais de saúde também são sensíveis a estas considerações. A médica Helena apontou alguns destes aspectos abordados pela PNAISM na entrevista que fizemos. Segundo ela, um dos desafios que enfrentam para melhorar as condições de saúde das mulheres é a falta de estrutura ofertada àquela que é mãe e trabalha. Helena falou diversas vezes sobre o curto tempo da licença maternidade e a necessidade de que a extensão para 6 meses de licença seja lei para todo tipo de trabalho. Comentou ainda sobre a oferta de creches públicas para que as mulheres possam trabalhar favorecendo a inserção destas no mercado de trabalho (DC). Em suas palavras:

“os pontos negativos com relação à saúde da mulher estaria um pouco ligada com a intersetorialidade, nem seria especificamente só de uma secretaria de saúde um órgão de saúde, que é o que? Eu acho que ainda se precisa dar uma melhor estrutura à mulher que trabalha e que é mãe... é... o retorno ao trabalho, esse aumento de 4 a 6 meses como sendo opcional, eu acho que não é bom porque acho 6 meses até pouco pra se criar, se cuidar de uma criança. Eu acho que deveria não ser só um projeto que voltado à empresa cidadã, mas que fosse realmente uma obrigação, dar esses 6 meses de licença. Acho que não se oferece, não se cria uma estrutura de creches, de serviços que possam também favorecer pra que essas mulheres estejam inseridas no mercado de trabalho com tranquilidade sabendo que vão deixar seus filhos. Acho que se precisa investir demais em educação. Educação é a base de tudo. Se oferecer escolas dignas pras pessoas pra que elas tenham uma boa formação. Isso é a base de tudo. E... também em relação a violência contra mulher, acho que ainda se tem muito que evoluir. Então acho que ainda tem muito que avançar, mas já houve historicamente uma melhora significativa.”

No processo de investigação, quando voltei minha atenção à intersetorialidade, pude perceber que as escolas e as fundações culturais são importantes instituições na comunidade. Além da oferta de informação e conhecimento para a população, são espaços de interação de jovens.

As escolas articulam-se com o serviço de saúde para a realização do PSE, mas não vi outras atividades realizadas em conjunto, voltadas à saúde da população em geral. A articulação entre USF e escolas restringe-se na oferta de espaços para realização de atividades educativas da equipe, como era o caso do PSE e dos grupos de adolescentes, principalmente – como foi a atividade que eu puder participar, com a equipe Lírio do Vale.

As fundações culturais exercem grande influência na comunidade. A fundação Sempre-Viva, por exemplo, oferece diversos cursos, oficinas, e tem uma frequência de jovens considerável. Grupos de mulheres e homens também frequentam o espaço, em cursos de dança, de reeducação alimentar, grupos de geração de renda, etc. A equipe Lírio do Vale realizava algumas atividades em conjunto com a fundação, como oficinas com temas ligados à saúde com jovens e feira de saúde. Tanto as profissionais da Unidade como as da fundação me relataram destes eventos que fizeram em parceria, pouco tempo antes da minha pesquisa de campo.

Com relação aos outros setores, a Unidade Ipê coopera também com a delegacia da mulher, que é praticamente vizinha. A delegacia disponibiliza salas para atividades das equipes, material didático e panfletos informativos sobre a violência de gênero. As profissionais da equipe Lírio do Vale mencionaram a possibilidade de uma articulação mais estreita com a delegacia para tratar sobre violência doméstica. Ainda que a iniciativa não tenha sido da delegacia da mulher, mas de uma professora de enfermagem que faz suas atividades de estágio com o alunado na USF Ipê, a delegacia fora o espaço onde eu participei de uma oficina destinada às ACS sobre violência contra mulheres. A atividade de cunho educativa e informativa rendeu bons frutos com as ACS da equipe Lírio do Vale que acompanhei. Rita, depois dessa oficina estava mais sensível a problemas referentes. Também fora este o único espaço onde tive conhecimento concreto de casos de violência contra mulheres no bairro Jardim.

Perguntei para algumas profissionais como Ivana, Tereza, Helena e as agentes de saúde, todas elas disseram-me que havia alguns casos de violência em suas áreas de abrangência, que faziam contato com a delegacia quando achavam pertinente. Adiante

abordo novamente este tema, onde discuto sobre as condições das mulheres na vida doméstica e conjugal.

A oficina sobre violência contra a mulher direcionada à equipe de ACS que participei, contou com a disponibilização de panfletos informativos e vários folders explicativos sobre os tipos de violência que se pode verificar contra as mulheres, oferecidos pela delegacia e pela professora. Em conversa com a delegada, esta me falou que a delegacia frequentemente realiza seminários, eventos, oficinas com a população do bairro e ainda disse-me: “eu vejo que a comunidade aqui ainda ficou bem mais vigilante, os vizinhos estão de olho, não deixam acontecer casos de violência porque sabem que a gente tá aqui, que a gente tá fazendo um trabalho de conscientização, a gente se integra bem com a comunidade...” Eu mesma não pude verificar essa questão, pois não tive conhecimento de atividades realizadas pela delegacia enquanto estive em campo, nem mesmo ouvi algum morador do bairro falar sobre isso, mas vi um cartaz na parede da delegacia que divulgava uma oficina com jovens para geração de renda. A associação de moradores do bairro também é outra instituição que promove diversas atividades com a população. Possui um serviço de reforço escolar para as crianças, realiza atividades com mulheres, oferece cortes de cabelo e serviços de salão de beleza gratuitos, além de abrigarem alguns estudantes de enfermagem que aferem, semanalmente, a glicemia a pressão arterial das pessoas. A associação é mais um espaço onde a equipe realiza suas atividades educativas.

Ao realizarem atividades educativas, profissionalizantes, de assistência e orientação às mulheres vítimas de violência, oferta de salão de beleza, entre outras, estas instituições contribuem para a promoção da saúde. A médica Helena, também abordou a importância destas instituições dizendo que o seu trabalho seria de melhor qualidade se contasse com um trabalho em rede, com a parceria dos outros atores.

Eu poderia apontar ainda outros aspectos relevantes para a promoção da saúde da população do Bairro Jardim, que se referem à necessidade de um bom funcionamento de setores de serviços públicos imprescindíveis como: o serviço de coleta de lixo que não é suficiente, permanecendo focos de insalubridade nas ruas, ou mesmo a segurança pública – já que a violência tem se tornado um importante alvo de preocupações no bairro. É possível perceber que estas são questões importantes para elevar as condições de vida e saúde da população do bairro, que quando não funcionam adequadamente, não são capazes de criar condições favoráveis para prevenção e promoção à saúde. .

De porte destas observações, posso recolocar as diretrizes da PNAISM que consideram a importância da articulação e parceria de setores governamentais e não governamentais. Percebi a existência da prestação de serviços à comunidade por parte destes diversos setores, mas diante das poucas evidências de atividades realizadas em conjunto (USF e outros setores), constatei que ainda não foi possível superar as ações fragmentadas e isoladas que frequentemente realizam – ainda que se observem esforços das profissionais em mudar este cenário.