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3 IRAUÇUBA E MISSI: O CONTEXTO DA BUSCA

3.1 Irauçuba: a caracterização do lugar

O município de Irauçuba está localizado na mesorregião noroeste do Ceará, a aproximadamente 157 quilômetros da capital do estado. Limita-se com os seguintes municípios: ao norte com Miraíma, ao sul com Canindé e Sobral, a oeste com Sobral e a leste com Tejuçuoca e Itapajé. Possui uma área total de 1.461 km2 e é dividido em quatro distritos: Boa Vista do Caxitoré, Irauçuba, Juá e Missi.

Irauçuba passou à categoria de município no dia 20 de maio de 1957, através da lei 3.589 (MOTA, 2003). Tem sua história política marcada pelo regime oligárquico paternalista e durante muito tempo foi governada por representantes de dois partidos que

disputavam o cargo: o “feijão podre”, representado pela família Bastos, e o “carne brava”.

Em 2004, passa a ser governada por uma gestão popular que nasce do desejo de transformação de jovens lideranças de diversas localidades do município. Sobre a política partidária em Irauçuba, Figueiredo (2007) esclarece:

Carne brava e feijão podre disputavam o domínio pelo município. Entretanto, o domínio dos que são intitulados de feijão podre predominou por quarenta e sete anos. O nome feijão podre se deu devido a um filho mais velho do prefeito Antônio Negreiros que foi identificado ao vender feijão apodrecido para funcionários da prefeitura administrada pelo seu pai (trechos de depoimentos de nossos informantes-chave) (FIGUEIREDO, 2007, p. 129).

De acordo com Dias (1998), a fauna em Irauçuba era vasta e existiam espécies diversificadas de médio e grande porte, por exemplo, o veado arcado, que era chamado desta forma pelos povos indígenas que habitavam na região, por possuir uma protuberância no dorso, semelhante à corcova dos camelos.

A tribo dos Guanacés habitava a região e durante os períodos de estiagem, de acordo com Dias (1998), ateavam fogo na vegetação com o intuito de simplificar a caça e afugentar répteis como cobras. No entanto, apesar da intervenção negativa sobre a paisagem nativa, esta não era feita com frequência pelos índios, havendo tempo para que a natureza se regenerasse.

Sobre o povoamento pelos brancos, Dias (1998) relata que este se deu no final do século XVII e que sua história está ligada à de um poço, Cacimba do Meio, nome dado à região pelo casal Maria Joana e Luís da Mota Melo, oriundos de Pernambuco, que ali se estabeleceram, comprando o espaço que compreendia a Cacimba do Meio. Os descendentes do casal se dedicaram, predominantemente, à pecuária e à agricultura de subsistência como atividade complementar, já que ambas vinham sendo bastante utilizadas na época. O nome Cacimba do Meio perdurou até aproximadamente 1910, quando um viajante que sempre pedia hospedagem na casa do senhor Luís da Mota Melo, chamado de doutor Valá, deu um outro nome ao lugarejo. O referido viajante, impressionado com o fato de a família Mota Melo estar sempre reunida com os filhos e netos em casa, comparou-a então com uma grande colmeia, passando a chamá-la de Irauçuba, que significaria “grande abelha amarela”.

Existe outra interpretação para a palavra Irauçuba, entretanto. Para muitos,

como citei anteriormente, a palavra significa “amizade”, o que faz referência à forma como

os visitantes eram recebidos na pequena localidade e o sentimento que caracterizava as relações comunitárias.

Sobre o nome do município e de sua sede, a cidade de Irauçuba, temos uma contribuição registrada que denota um sentido simbólico que conviria ser resgatado nas discussões populares do lugar. O sentido de sociedade que trabalha solidariamente, refletido no significado de „amizade‟, sentido vinculado historicamente ao nome de Irauçuba. Associava-se a uma metáfora, uma analogia a um agrupamento de abelhas que existia abundantemente na região. Uma abelha amarelada que produzia de modo bastante solidário, afetivo, amoroso, fraterno (FIGUEIREDO, 2007, p.130).

O município representa uma das regiões mais críticas do Ceará em questões de vulnerabilidade climática, encontra-se inteiramente inserido em área semiárida e faz parte, junto com os municípios de Gilbués no Piauí, Seridó no Rio Grande do Norte e Cabrobó em Pernambuco, do chamado Núcleo de Desertificação. Compreende-se por desertificação, de acordo com a definição da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), apresentada na Agenda 21 (2000, p.183): “a degradação da terra em zonas áridas, semi-áridas, sub-úmidas secas, resultante de vários fatores que incluem variações climáticas e atividades humanas”.

Em Irauçuba, a emigração e o êxodo rural fazem parte da história das pessoas, como em outras cidades cearenses. O município, que tem dos seus 22.347 habitantes, 7.981 morando em área rural (IBGE, 2010), sofre com os impactos causados pelas secas e pela forte degradação, provocada pela ação inadequada por parte da população local e pelo histórico descaso político em relação às condições ambientais do lugar. Em relação à emigração, este fator agrava-se com a falta de incentivo para a agricultura familiar e pelo estigma que faz com que muitos jovens sintam vergonha de exercer atividade agrícola. Este é um sentimento facilmente encontrado nos jovens quando questionados sobre quem trabalha na agricultura (FERREIRA, 2006). Tal afeto está ligado a uma autoimagem negativa, o que despotencializa o sujeito, abalando sua autoestima e enfraquecendo seu potencial de criticidade e autonomia. Pode-se dizer que isso é típico de uma educação descontextualizada que supervaloriza a cultura externa em detrimento da cultura local. Com isso, o êxodo rural tem crescido a cada censo, como podemos verificar de acordo com os dados do IBGE (2010): em 1970, a população total do município era de 13.822 habitantes, a grande maioria, 11.258, morava na área rural e apenas 2.564 pessoas

habitavam na área urbana. De acordo com o censo de 2000, a população era constituída de 10.873 moradores em área urbana e 8.687 em área rural. Segundo o último censo, feito em 2010, a área rural hoje é composta por 7.981 pessoas e a área urbana, por 14.366.

Apresento no próximo tópico a comunidade Missi, local em que foi desenvolvida a segunda etapa da pesquisa, que constou da construção das narrativas do professores da escola de Ensino Fundamental Josefa Clotilde.

A história apresentada abaixo foi resgatada durante o diálogo intergeracional, uma das atividades propostas pela metodologia de pesquisa utilizada.

Nesta etapa, foi formado um grupo com alguns dos professores colaboradores da pesquisa e algumas das pessoas mais velhas da comunidade, para juntos reconstruirmos a história do Missi, desde sua origem até os dias atuais.