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Jesus de Nazaré, todo o Verbo de Deus

No documento rogeriosantosbebber (páginas 88-90)

CAPÍTULO 2: REAÇÕES DA ORTODOXIA CATÓLICA

2. A Propósito da Mediação Salvífica Única Universal de Jesus Cristo

2.2 Jesus de Nazaré, todo o Verbo de Deus

Uma questão contra a qual se manifestou a ortodoxia é sobre a não plena exclusividade em Jesus do Lógos que se encarnou em detrimento do Lógos como tal. Assim afirma a Notificação: “deve-se acreditar firmemente que Jesus de Nazaré, filho de Maria e único Salvador do mundo, é o Filho e Verbo do Pai. Para a unidade do plano de salvação centrado em Jesus Cristo, há que pensar também que a ação salvífica do Verbo se atua em e por Jesus Cristo, Filho encarnado do Pai, como mediador da salvação de toda a humanidade” (Notificação 2).

E continua: “por conseguinte, é contrário à fé católica não só afirmar uma separação entre o Verbo e Jesus, ou entre a ação salvífica do Verbo e de Jesus, mas também defender a tese de uma ação salvífica do Verbo como tal na sua divindade, independentemente do Verbo encarnado (Notificação 2).

A Dominus Iesus para sustentar a plenitude da encarnação do Verbo em Jesus Cristo apoia-se na Sagrada Escritura, onde se lê, por exemplo, que em Cristo “habita corporalmente toda a Plenitude da divindade” (Cl 2, 9) e nos concílios cristológicos de Niceia e Calcedônia (cf. DI 10).

Colocados os pressupostos da fé cristológica na inseparabilidade da pessoa divina do Verbo de Jesus de Nazaré, a Declaração afirma: “com a encarnação, todas as ações salvíficas do Verbo de Deus fazem-se sempre em unidade com a natureza humana, que Ele assumiu para a salvação de todos os homens. O único sujeito que opera nas duas naturezas – humana e divina – é a única pessoa do Verbo” (DI 10).

E conclui: “portanto, não é compatível com a doutrina da Igreja a teoria que atribui uma atividade salvífica ao Lógos como tal na sua divindade, que se realizasse ‘à margem’ e ‘para além’ da humanidade de Cristo, também depois da encarnação” (DI 10).

Para rebater qualquer possibilidade de fundamentação do pluralismo religioso na ação do Lógos ásarkos, a Declaração afirma para justificar de um lado a universalidade da salvação cristã, e do outro, o fato do pluralismo religioso: “há quem proponha uma economia do Verbo eterno, válida também fora da Igreja e sem relação com ela, e uma economia do

Verbo Encarnado” (DI 9). Dando continuidade à sua afirmação e se posicionando contra a teologia da ação iluminadora universal do Lógos ásarkos319, a Declaração se pronuncia: “A primeira teria um plusvalor de universalidade [Lógos ásarkos] em relação à segunda, que seria limitada aos cristãos, se bem que com uma presença de Deus mais plena” (DI 9).

França Miranda, em comunhão com o pensamento da Dominus Iesus e fazendo alusão ao modelo teológico de Dupuis,320 dirá:

Mais recentemente, procurou-se estabelecer uma atividade salvífica da segunda ou da terceira pessoa da Santíssima Trindade que, respeitando o evento salvífico de Jesus Cristo, pudesse ser reconhecida também presente nas outras religiões. [...] A dificuldade surge quando se trata de relacionar essa atividade com o evento salvífico de Jesus Cristo. Atribuir uma atividade específica ao Logos não encarnado, antes e depois da encarnação, que ultrapassa a economia salvífica do Logos encarnado, mas sem constituir uma economia separada a de Cristo, não resolve a questão e ainda a torna mais complexa, devido ao caráter sumamente discutível de alguns de seus fundamentos. De fato, como não existe tempo em Deus, carece de sentido falar de uma atividade antes ou depois da encarnação. O desígnio salvífico de encarnar-se é uma autodeterminação da liberdade divina ab

aeterno. A questão não consiste em reconhecer uma atividade salvífica do Logos

em todo o curso da história. Isto deve ser afirmado sem mais. Mas como relacioná- la com a pessoa de Jesus Cristo?321

Como as pessoas trinitárias se revelam em suas ações salvíficas na história, qualquer referência ao Logos de Deus implica inevitavelmente o evento salvífico Jesus Cristo. Ao se atribuir ao Logos uma atividade que ultrapassa a ação salvífica de Cristo, pode-se perguntar: o que realmente significa ainda a palavra Logos? O que revela de fato esta atividade? [...] [Quanto ao Espírito] atribui-se a ele uma atividade que não se limita ao que dele revelou o evento salvífico Jesus Cristo. Desse modo, retorna a questão sobre o significado do termo Espírito Santo nesse contexto322.

319 Dupuis fala de teólogos como Geffré, Schillebeeckx, Duquoc e Dulles que, com ele “convergem na em

ver a economia do Verbo encarnado como sacramento de uma economia mais vasta, aquela do Verbo eterno de Deus que coincide com a história religiosa da humanidade.” DUPUIS, Jacques. La teologia del Pluralismo

Religioso Rivisitata. Rassegna di Teologi, p. 670.

320 Outro teólogo que coloca em questão o pensamento de Dupuis, com base na exegese de Dufour é

Giacomo Canobbio. Esse teólogo italiano foi presidente da Associação Teológica Italiana entre os anos de 1995 a 2003, ou seja, no período em que o livro de Dupuis foi notificado. O autor reconhece a presença de uma ação iluminadora universal do Logos (Jo 1, 9), mas considera problemático dizer que é um Lógos ásarkos, para Canobbio trata-se de Cristo. A seu ver, “o Lógos joanino não pode ser pensado prescindindo de Cristo”. (p. 143). E lança uma questão: por que razão o evangelista João deixa de usar a expressão Lógos para designar Cristo depois do versículo 14 do Prólogo? CANOBBIO, Giacomo. Nessuna Salvezza Fuori Della Chiesa?: storia e

senso di un controverso principio teologico, p. 139-153. Como ressensor de Dupuis, Canobbio também critica

sua perspectiva da ação do Lógos “além Cristo” por considerar que essa afirmação reduziria a encarnação a ser “o modelo de um geral modo de Deus tornar-se presente ao mundo”. DUPUIS, Jacques. La teologia del

Pluralismo Religioso Rivisitata, p. 670.

321 MIRANDA, Mario de França. As religiões na única economia salvífica. In: TRASFERETTI, José;

GONÇALVES, Paulo Sérgio Lopes. Teologia na Pós-Modernidade: abordagens epistemológica, sistemática e

teórico-prática, p. 335-360.

322 MIRANDA, Mario de França. As religiões na única economia salvífica. In: TRASFERETTI, José;

GONÇALVES, Paulo Sérgio Lopes. Teologia na Pós-Modernidade: abordagens epistemológica, sistemática e

No documento rogeriosantosbebber (páginas 88-90)