Nesse anúncio, ainda temos a venda como finalidade principal do gênero, o que vai mudar é o tipo de venda. Agora, o serviço é vendido, e não mais um produto, inicialmente. A estrutura do gênero é mantida: presença de título, corpo do texto e identificação de onde o serviço deverá ser encontrado. Observando esse anúncio, podemos ver que a mulher, mesmo sendo representada por poucas integrantes, já tem espaço no mercado de trabalho e ocupa cargos desempenhados fora do âmbito do lar. A temática do texto diz respeito ao anúncio de médica ginecologista que oferecia seus serviços às senhoras. Trata-se de um serviço pago, uma vez que no final do texto temos a descrição dos preços do serviço oferecido de acordo com as consultas pretendidas, mas, mesmo assim, ainda fica clara a concomitância das duas finalidades: informar e vender. Informar no sentido de dizer às leitoras que existe uma médica especialista em doenças das senhoras. E vender, porque essa prestação de serviços tem um preço.
Os linguistas Askehave e Swales, como foi dito anteriormente, reconheceram que o propósito comunicativo sozinho – mesmo ainda o considerando muito importante – dificilmente servirá como critério fundamental para o reconhecimento do gênero. Assim, começaram a priorizar o contexto, ou seja, os participantes e os elementos da situação responsáveis pela geração de textos de um gênero.
Vejamos o seguinte anúncio, do ano de 1955:
Anúncio 20: Jornal das Moças, 06/01/1955
Na década de 1930, fumar47 tornava-se uma prática elegante. As mulheres almejavam ser vistas com um cigarro na mão. Isso pode ser comprovado na obra cinematográfica “Gilda”
– filme norte-americano, do ano de 1946, dirigido por Charles Vidor e produzido por Virginia
Van Upp – o qual mostra a personagem da atriz Rita Hayworth fumando, evidenciando, assim, a ideia da independência e sensualidade associada ao ato de fumar48. A partir do século XX, houve um incremento na prevalência de mulheres fumantes49. Portanto, o anúncio
do cigarro “Hollywood”, na década de 1950, torna-se perfeitamente normal para a época, já
que a prática do fumo estava relacionada à elegância para as mulheres. Vejamos o próximo exemplo
47
Em 1927, a marca de cigarro norte-americana “Lucky Strike”, do empresário americano George Washington Hill, lança uma campanha voltada para o público feminino com o slogan “Reach for a Lucky instead of sweet” (Pegue um Lucky em vez de uma bala). Esse slogan surgiu de um episódio cotidiano vivenciado por Hill. Certo dia, o empresário vinha passando pela rua e se deparou com uma mulher gorda comendo uma bala. Do outro lado, havia uma mulher magra, elegante, com um cigarro na mão. Por isso, a ideia de propor ao público feminino que fumasse o cigarro Lucky em vez de comer balas, já que estas fazem com que as mulheres engordem. Esta informação foi utilizada de acordo com a matéria “É proibido fumar” da revista Exame, versão digital, de 31/07/1996. Disponível em: http://exame.abril.com.br/revista-exame/edicoes/0615/noticias/e-proibido-fumar- m0049753. (Acesso em: 2 set. 2013).
48
Informação utilizada de acordo com a matéria “É proibido fumar” da revista Exame, versão digital, de 31/07/1996. Disponível em: http://exame.abril.com.br/revista-exame/edicoes/0615/noticias/e-proibido-fumar- m0049753. (Acesso em: 2 set. 2013).
49 Informação contida no site do Ministério da Saúde. Disponível em:
122 Nova, abril de 1982 Claudia, fevereiro de 1991
Figura 18: Anúncios do século XX
Com o passar dos anos, estudos e pesquisas comprovaram que o tabagismo causa uma série de problemas para a saúde, como: câncer de pulmão, boca, laringe, faringe, esôfago, pâncreas, rim, bexiga e colo de útero; morte por bronquite, enfisema, infarto agudo do miocárdio e doenças vasculares. Logo, o que antes era visto como elegante, agora, traz risco à saúde.
Nesse exemplo, temos dois outros anúncios de cigarro. No da esquerda, temos o desenho de uma mulher com o cigarro na mão. Novamente, o anúncio incita que fumar é
elegante, justamente, por causa do nome da marca do produto “Charm”. Na imagem da
direita, temos o anúncio do mesmo fabricante, porém está incluso um novo elemento: trata-se
Sombra azul “tudo azul” Blush rosa “sonho de moça”
Lábios com batom vermelho
“fúria”
Maquilagem com pó translúcido marfim
“ecológico” Maço em dourado “praia”
O MINISTÉRIO DA SAÚDE ADVERTE: FUMAR É PREJUDICIAL À SAÚDE. Sobrancelhas delineadas com
lápis marrom “glacê” Olhos delineados com lápis
preto “crise”
Cigarro em branco “Branca de Neve”
de um comunicado do Ministério da Saúde o qual anuncia que a prática do fumo é prejudicial à saúde. Vê-se que aqui há a presença de um discurso (Ministério da Saúde) que contrasta com o discurso proposto pelo anunciante de que “O importante é ter Charm”. Essa frase apresenta dois sentidos: a) relacionada ao fato de que o mais importante é, para quem fuma,
ter o cigarro “Charm”; b) diz respeito à ideia de que quem fuma o cigarro “Charm”(substantivo próprio), tem charme (substantivo com função de adjetivo), ou seja,
aquilo que atrai ou dá prazer.
O crescente número de fumantes no Brasil na década de 1980 ocasionou muitas mortes por causa do câncer de pulmão. Em decorrência desse fato, a doença é tida como uma das principais causas de morte no Brasil, sobretudo, em homens (ZAMBONI, 2002). No ano de 1996, é aprovada a Lei Federal nº 9.294 que restringe o uso e também a propaganda de produtos derivados do tabaco em locais coletivos, públicos ou privados, exceto a lugares destinados ao consumo, desde que sejam áreas isoladas e ventiladas, os conhecidos fumódromos. De acordo com o segundo parágrafo do artigo terceiro dessa lei,
A propaganda conterá, nos meios de comunicação e em função de suas características, advertência, sempre que possível falada e escrita, sobre os malefícios do fumo, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas, segundo frases estabelecidas pelo Ministério da Saúde, usadas sequencialmente, de forma simultânea ou rotativa. (Lei 9.294, Art 3º, § 2º, 1996)
Diante dessa situação, vimos que o propósito comunicativo, sozinho, não estabelece o critério fundamental para reconhecimento do gênero. Em anúncios publicitários de cigarros veiculados em épocas distintas, constatamos que ora o cigarro é bem visto pela sociedade, ora é visto, pelo discurso do governo federal, como um malefício à saúde da população. O reconhecimento dessa distinção só foi possível pela análise do contexto de acordo com a época em que os dois anúncios foram publicados. Logo, nas décadas de 1950 e 1980, quando o cigarro era visto como sinônimo de elegância, o propósito do gênero estava focado apenas na venda do produto. Já na década de 1990, quando começou a vigorar a lei antitabagista, o anúncio de cigarro passou, mesmo que implicitamente, a ter dois propósitos: primeiro, a venda do produto; segundo, de acordo com o discurso do Ministério da Saúde, alertar a população acerca dos malefícios relacionados ao ato de fumar.
Ainda na década de 1990, encontramos o seguinte anúncio.
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