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4. CONFIGURAÇÃO DO SETOR PRIMÁRIO DO NORTE DO

4.8. Jaguapitã

4.8.4. José Maria Botelho

Sua família é natural de São Paulo (pai e mãe), foram ao Norte do Paraná atraídos pela disponibilidade de terras, e se estabeleceram em Jaguapitã. Chegaram em 1948 e começaram a trabalhar como “porcenteiros”, em 1962 conseguiram comprar uma posse102 de 15

alqueires (38 hectares) e iniciar o plantio de café.

Nesta atividade permaneceram até 1975, quando a geada negra assolou a região; anteriormente a geada chegaram a colher 1.000 sacas de café, e possuir mais de 10 “porcenteiros” para auxiliar na lida da propriedade. José conta que seu pai poderia, se quisesse, ter adquirido outras propriedades, pois o custo da terra era muito barato e financiava- se o pagamento em alguns anos103.

Entretanto o mesmo não o fez, pois necessitaria mão de obra muito grande e também uma logística de produção maior, pois o acesso às propriedades era muito precário104. Além do café, eram plantados vários

gêneros alimentícios entremeados nos cafezais, garantindo assim o sustento da propriedade sem precisar comprar quase nada de fora, os únicos produtos comprados eram sal e querosene, porque até o óleo era substituído pela banha dos porcos criados na propriedade.

Após a grande geada houve uma erradicação quase que total dos cafezais na região, principalmente pelos pequenos produtores, que não conseguiram se recuperar para replantar. Aqueles que já possuíam uma condição melhor de plantio, com mecanização de algumas etapas, conseguiram se recuperar e lucrar mais durante alguns anos após a geada, isto porque o preço do mesmo havia disparado 200%. Mesmo assim cabe destacar que a geada não foi o único fator para a mudança de atividade, as políticas de erradicação do café contribuíram muito para a mudança de muitos produtores para outras atividades incentivadas e tornavam-se mais rentáveis.

Em Jaguapitã e na propriedade de José, a mesma comprada por seu pai em 1962, o café foi imediatamente substituído por algodão e soja.

101 Entrevista cedida por José Maria Botelho, pequeno proprietário rural e presidente da APROJAG, em Jaguapitã, no dia 18 de agosto de 2009.

102 Terra devoluta que foi ocupada por grileiros e vendida, mais tarde o governo legitimaria a posse de muitos destes terrenos para findar conflitos por terras. 103 Soma-se ainda o fato da terra ser muito fértil e não haver gastos com adubos e preparação do solo.

104 Para chegar na cidade de Jaguapitã, em caso de chuvas, a viagem chegava a durar meio dia.

Onde a terra era mais fértil plantava-se soja, onde a terra era menos fértil, algodão. Após um tempo nestas atividades, iniciou a de criação de aves em parceria com a empresa de Rolândia. A avicultura, então se tornou uma alternativa na região, principalmente após a entrada de muitas outras empresas no ramo da avicultura, inclusive as de Jaguapitã. Após algum tempo mudou novamente o foco de sua propriedade para a produção de laranja e também a criação de gado bovino leiteiro, atividades que continuava até a data da entrevista, em 2009.

Para a plantação de laranja havia uma parceria com a cooperativa da região, a COROL (que na época estava em vias de ser arrendada para a COCAMAR). Além do incentivo à produção (com assistência técnica e treinamentos), na época da colheita eram fornecidos funcionários registrados pela cooperativa que eram transportados até a propriedade e realizavam a colheita em até dois dias. O resto da manutenção das laranjas ficava a cargo do produtor, do valor pago pelas frutas era descontado uma taxa para o pagamento da diária daqueles funcionários que auxiliavam na colheita – para o produtor a prática era vantajosa, pois evitava os custos de registro dos profissionais.

A atividade de fruticultura, segundo Botelho (2009), não havia dado lucros exorbitantes nos 10 anos em que esteve na atividade. Somente conseguia cobrir seus custos com pequena margem. Para a colheita daquele ano, esperava ter prejuízo, pois houve grande aumento na produção brasileira daquele ano, visando a importação, uma vez que a produção de laranjas dos EUA havia sido afetada por intempéries climáticos, fazendo com que o preço da mesma, em 2009, estivesse muito abaixo do valor dos outros anos.

Outro fato que, segundo Botelho (2009), contribuiu para um preço baixo da laranja e dos alimentos em geral, é o fato de que o governo Lula preocupou-se em reduzir o preço dos alimentos para melhorar a qualidade de vida da população mais carente, mas ao mesmo tempo não subsidiou o custo de produção dos agricultores, com implementos agrícolas. Financiamentos agrícolas não faltavam, mas não atingiam os patamares esperados pelos produtores para bancar seus custos de produção, e nem davam a garantia ao produtor em caso de algum percalço no meio do caminho.

Isto porque os distribuidores, as redes de supermercado, ao invés de reduzirem sua margem de lucro, começaram a pagar menos aos produtores, diminuindo o total arrecadado por eles. Ou seja, segundo Botelho (2009), quem efetivamente bancou a queda no preço dos alimentos foi a base produtiva, já que não houve também um

estabelecimento de preços mínimos pagos ao produtor na época em questão.

Mesmo assim, com o que ganhou nesta atividade, aliado a financiamentos do PRONAF Mais Alimentos, o mesmo conseguiu na época comprar dois tratores, uma caminhonete e pulverizadores105.

Além da atividade de fruticultura, a propriedade de José contava ainda com a criação de gado bovino leiteiro. Esta, segundo ele, era uma atividade rentável, pois era regulada por um conselho, o CONSELEITE- PR106, que regulava um preço de referência107 para atividade no estado do Paraná. A atividade leiteira na época contava com 32 pequenos produtores associados à APROJAG e APROLEITE108, que juntos

105 Mesmo com Botelho (2009) afirmando que a fruticultura de laranja não era tão rentável, pois não cobria os custos, houveram estes investimentos feitos com o ganho da produção de laranja. O que pode subentender-se é que o mesmo considera estes equipamentos parte dos custos de produção para manter-se competitivo na atividade.

106 “O CONSELEITE-PARANÁ é uma associação civil, regida por estatuto e regulamentos próprios, que reúne representantes de produtores rurais de leite do Estado e de indústrias de laticínios que processam a matéria-prima (leite) no Estado do Paraná. O Conselho é paritário, ou seja, o número de representantes dos produtores rurais é igual ao número de representantes das indústrias. (...) O principal objetivo do Conselho é a busca de soluções conjuntas, pelos produtores rurais e indústrias, para problemas comuns do setor lácteo paranaense” (CONSELEITE-PR, 2015).

107 O preço de Referência “É um valor médio da matéria-prima (leite) calculado a partir dos preços de venda, das indústrias participantes do Conselho, dos seguintes derivados lácteos: leite pasteurizado, leite UHT, leite cru resfriado, leite em pó, bebida láctea, iogurte, creme de leite, doce de leite, requeijão, manteiga, queijo prato, queijo mussarela, queijo parmesão e queijo provolone. O preço de referência pretende representar um valor justo para a remuneração da matéria-prima tanto para os produtores rurais quanto para as indústrias” (CONSELEITE-PR, 2015).

108 Segundo Botelho (2009), o município de Jaguapitã, em 2009, contava com duas associações entre os pequenos produtores, a Associação dos Produtores Rurais de Jaguapitã (APROJAG) e a Associação dos Produtores de Leite de Jaguapitã (APROLEITE). A primeira foi fundada para a compra e venda de produtos em conjunto, visando reduzir os custos de compra e aumentar os lucros na venda (em especial na venda do leite). Recebe de seus participantes uma taxa de R$ 10,00 mensais e também auxílio financeiro da prefeitura. Além disso, esta última doou bens de capital para a associação, e estes são alugados para os integrantes por um preço simbólico por hora e por um valor maior para não integrantes, além de possuir sede e área de lazer para seus integrantes. A

retiravam cerca de 2.000 litros de leite por dia, entregavando parte para o grupo Bertin e parte para o grupo Líder. No primeiro grupo de produtores, como a negociação era coletiva, todos recebiam o mesmo valor pelo litro do leite, que na época era, em média de R$0,74; já o segundo negociavam individualmente, recebendo valores diferentes. Segundo Botelho (2009), estes valores poderiam ser maiores, assim como o volume entregue, se todos os produtores negociassem de maneira coletiva estima-se que o montante diário poderia ultrapassar 6 mil litros de leite.

A atividade leiteira para o município de Jaguapitã sempre foi uma importante complementação de renda do produtor, além de, em alguns casos, ser a principal fonte de renda. Esta atividade é uma das únicas no meio agrícola que proporciona pagamentos mensais, podendo ser utilizada como “capital de giro” de uma propriedade. Segundo Botelho (2009), mesmo com a modernização da atividade, a maioria da produção leiteira do município de Jaguapitã é de agricultores familiares, em torno de 80%.

Em sua propriedade contava com uma estrutura boa para a criação dos animais, com acesso a ordenhadeiras automáticas e geladeiras, equipamentos mínimos para a atividade atualmente. Não havia nenhum funcionário registrado na propriedade, naquela época, o trabalho era dividido entre pai e filho, que em 2009 estava terminando a faculdade de agronomia na Universidade Estadual de Londrina – UEL. Além do trabalho agrícola, Botelho (2009) era o presidente da APROJAG, cargo que ocupava de maneira voluntária.