• Nenhum resultado encontrado

O jovem rico, por ele mesmo e pelo outro

5. MÉTODO

6.4. Algumas comparações conclusivas

6.4.2. O jovem rico, por ele mesmo e pelo outro

Esforço pessoal e Mudança de vida

O jovem rico, por ele mesmo: Os jovens ricos trazem pouquíssimas respostas sobre a

presença do esforço pessoal nos seus futuros. Quando esse elemento aparece, é direcionado ao sucesso de seus empreendimentos profissionais. O esforço não parece ser um elemento tão necessário para que eles alcancem as suas metas – ou, quando é, é um esforço leve, possível. Quanto às mudanças que preveem para suas vidas, aparece a ideia de que, devido às dificuldades que experimentarão no futuro, alguns sonhos poderão ser realizados e outros não.

O jovem rico, pelo outro: O grupo dos jovens pobres, por sua vez, significa de diferentes

formas a presença do esforço pessoal na vida dos ricos, todas elas elevando-o a um valor supremo. Há a ideia de que a camada alta tem uma vida fácil e de que, por isso, não precisa fazer esforços – terá uma boa vida, mas também nunca conhecerá o valor de conseguir as coisas por seu mérito. Existe também o significado de que o rico não quer se esforçar e que, por isso, arruinará a sua vida, em um enredo novelesco trágico que envolve mortes, uso de drogas etc. Por fim, há a imagem do jovem rico que empreende esforços à semelhança do pobre, renunciando às comodidades de sua condição social, e que, por isso, tem uma vida mais modesta e mais difícil – mas com o sabor do mérito.

Comentário: Percebemos que o esforço pessoal aparece de forma muito menos enfática

quando tomamos em análise os sujeitos ricos – seja no que falam sobre si, seja no que os jovens pobres falam sobre esse outro. A significação que se destaca é a de que o rico até tem que se esforçar, mas muito menos do que o pobre, e de que, se esse esforço lhe ajuda a alcançar alguns objetivos, não é elemento essencial como é para a camada pobre.

Ensino médio

O jovem rico, por ele mesmo: Os jovens ricos caracterizam pouco o seu ensino médio:

mencionam que o aproveitaram ao máximo e que houve, no momento de sua conclusão, muitas festas e uma viagem – o que caracteriza a experiência de formatura em colégios da camada alta.

! "%+!

O jovem rico, pelo outro: O grupo dos jovens pobres, por sua vez, idealiza as escolas dos

ricos: são as melhores, mais chiques, mais desejadas, que dão preparação certa, ensino de qualidade, boas oportunidades e boas referencias não só educacionais, como também morais. Os ricos concluem o ensino médio com êxito, aprendem com responsabilidade, adquirindo conhecimentos e retendo o máximo de informações.

Comentários: Tanto os jovens ricos, quando falam de si, quanto os jovens pobres, quando

falam do outro, demonstram uma exaltação do que é dos ricos. No contexto de valorização do que é privado, ideologia que corre em nossa sociedade, a escola particular que atende à camada rica é vista como instituição idealizada, o ápice do prestígio.

Ensino superior

O jovem rico, por ele mesmo: Os jovens ricos descrevem seus projetos de cursar o ensino

superior com uma impressionante riqueza de detalhes, traçando um percurso por várias instituições de prestígio nos cenários nacional e internacional, começando na graduação e se estendendo até o doutorado. Preveem a necessidade de fazer um ano de cursinho depois do colégio, o que é justificado como uma consequência de não terem conseguido passar no vestibular – algo incoerente com o fato de que estudam em uma escola cujos alunos tradicionalmente têm boa aprovação nesse concurso. No entanto, isso parece se dever mais ao desejo de ganharem um tempo para pensar com calma na profissão a escolher. Valorizam, ainda, a faculdade como um momento de mudanças e de descobertas. Procuram cursos com boa aceitação social, mas chama atenção a ausência da tradicional tríade direito-medicina- engenharia; destacam-se os cursos ligados a atividades de criação ou artísticas.

O jovem rico, pelo outro: Os jovens pobres, por sua vez, idealizam as possibilidades de

ensino superior que o rico tem: ele está preparado por sua escola e sua família e, por isso, pode passar com facilidade no vestibular; entra em boas universidades particulares, pagas sem dificuldade por seus pais; tem um ensino de qualidade e acessa boas oportunidades. Tudo isso sem fazer esforços. Os cursos que os ricos desejariam fazer são muito mais procurados e prestigiados: engenharia, direito, medicina, economia. Aparece, ainda, a imagem do jovem rico que não quer e não precisa fazer faculdade, pois já tem dinheiro.

! "%#!

Comentários: Tanto o jovem rico, no percurso que procura para o seu ensino superior,

quanto o jovem pobre, na percepção que tem das perspectivas desse outro, falam de um percurso que, à semelhança do que encontramos nas falas quanto ao ensino médio, é de prestígio e de vitórias. O que é do rico fica, de novo, valorizado, colocado como ideal.

Trabalho

O jovem rico, por ele mesmo: Para os jovens ricos, o significado principal do trabalho é a

conquista de independência em relação a suas famílias. Buscam traçar os seus caminhos sozinhos, sem a ajuda dos pais. Eles desejam um percurso de trabalho que comece ainda na faculdade, com estágios, e que se desenvolva em vários lugares diferentes, permitindo possibilidades de experimentar para que descubram qual é a área em que querem se focar. Chama atenção a presença do desejo de abrirem suas próprias empresas. Esses jovens desejam um trabalho que lhes permita realizar seus sonhos e que possibilite tempo livre para desenvolverem outras atividades por que se interessam. Querem ser pesquisadores, professores, diretores ou presidentes, publicitários, urbanistas, pianistas, economistas, matemáticos etc.

O jovem rico, pelo outro: O trabalho que os jovens pobres imaginam para os ricos também é

idealizado, assim como as possibilidades no ensino superior. Sem esforços, o jovem rico conseguiria empregos, através da rede de contatos dos seus pais ou então na empresa da própria família. É esperado que os jovens da camada alta sigam a profissão de seus pais e que deem continuidade aos seus negócios. Destacam-se, no futuro desse jovem rico, profissões de prestígio e/ou de poder, em posições de chefia: médico, gerente, presidente ou dono de empresa, advogado etc. Aparece, na imagem de jovens ricos que não estudaram e que, por isso, não conseguiram um bom emprego a ideologia do estudo como meio – que compreende um esforço individual – para a colocação ocupacional e social.

Comentário: Destacamos o desencontro entre as profissões que os jovens ricos desejam para

si e aquelas que o grupo de jovens pobres supõe para seus futuros: os ricos querem trabalhar em profissões menos tradicionais e ocupar posições mais modestas do que aquelas que os jovens pobres colocam no futuro que imaginam para esses outros. Os jovens ricos querem conseguir seus empregos por si mesmos, escolher profissões por si mesmos, e não se acomodar em colocações no mercado garantidas pelas redes de contato dos pais.

! "%$!

Família

O jovem rico, por ele mesmo: O significado que aparece mais fortemente nas falas dos

jovens ricos é o desejo de autonomia em relação à família de origem. Ainda que isso lhes custe um declínio em sua condição socioeconômica ou os faça passar por momentos difíceis, o desejo de experimentar dificuldades por sua própria conta aparece de forma expressiva entre esses jovens, que parecem desejar sair de uma superproteção familiar. Eles desejam também construir uma nova família: encontrar alguém que amam, casar e ter filhos, mas apenas depois de se estabilizarem profissionalmente.

O jovem rico, pelo outro: Os jovens pobres imaginam para o rico uma família boa, bem

relacionada, tradicional, que dá tudo do bom e do melhor para os filhos, que se orgulha deles e lhes apoia – principalmente no plano financeiro – em seus projetos. A família desses jovens garante os seus futuros, ajudando-os a conseguir empregos por meio de seus contatos ou passando para os filhos o controle dos negócios familiares. Aparecem também, com menor expressão, significados de uma família pouco acolhedora, distante.

Comentários: Também a família dos jovens ricos é idealizada pelos jovens pobres. Eles

parecem acreditar que ter uma família rica é essencial para se obter sucesso na vida. No entanto, os jovens ricos de nossa pesquisa se assemelham aos sujeitos pesquisados por Scalon e Cano (2005) e Kulnig (2010), que atribuem pouca importância ao pertencimento a uma família rica para que se tenha um futuro bom. Os jovens ricos, em vez de se acomodarem devido às riquezas e às facilidades fornecidas por sua família, desejam alçar seus próprios voos, descolar-se da superproteção familiar em busca de seus próprios caminhos, ainda que isso lhes custe confortos – inclusive financeiros.

! "%%!