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JUSTIÇA RESTAURATIVA

No documento Redução da maioridade penal (páginas 30-34)

A denominação justiça restaurativa é atribuída a Albert Eglash, que, em 1977, escreveu um artigo intitulado Beyond Restitution: Creative Restitution, publicado numa obra por Joe Hudson e Burt Gallaway, denominada ‘Restitution in Criminal Justice’ (Van Ness e Strong, 2002:27). Eglash sustentou, no artigo, que havia três respostas ao crime – a retributiva, baseada na punição; a distributiva, focada na reeducação; e a restaurativa, cujo fundamento seria a reparação.66

A expressão ‘justiça restaurativa’ acabou por prevalecer em português, embora pareça uma tradução imprópria de ‘restorative justice’, porque, talvez, em língua portuguesa, fosse mais indicada à expressão ‘justiça restauradora’. 67

Justiça Restaurativa tem por finalidade o encontro que busca lidar com o conflito, por meio de uma ética, fundamentada no diálogo, na inclusão e na responsabilidade social, com uma visão transformadora, entre o programa novo e a ruptura dos valores da justiça tradicional (punitiva), ou seja, uma mudança de paradigma. 68

Com base nesses fatos, o diploma em comento proporciona uma justiça transformadora, em que o objetivo do processo é respeitar e valorizar a experiência da pessoa de cada participante, ou seja, a justiça assume o compromisso de restaurar o mal causado às vitimas, famílias e comunidades, não se preocupando tão somente com a punição dos infratores. 69

2.4.1 Das diferenças entre o modelo tradicional e a justiça restaurativa

66

PINTO, Renato Sócrates Gomes. A construção da Justiça Restaurativa no Brasil. O impacto no sistema de Justiça criminal. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1432, 3 jun. 2007. Disponíve l em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9878>. Acesso em: 09 nov. 2009.

67

Ibid.

68

ISOLDI, Ana Luiza Godoy; PENIDO, Egberto. Justiça Restaurativa: a construção de uma nova maneira de se fazer Justiça. MPMG jurídico, ano I, n. 3, dez. 2005/ jan. 2006, p. 60-61;

KONZEN, 2007, p. 81 e 82

69

ZEHR, Howard. Toews, Barb. Maneiras de conhecer para uma visão restaurativa do mundo . In:SLAKMON, Catherine. Machado, Maíra Rocha. BOTTINI, Pierpaolo Cruz (Org.). Novas Direções na Governança da Justiça e da Segur ança. Brasília, DF: Ministério da Justiça, 2006, p. 424/427.

No modelo tradicional no que se refere aos valores, o conceito de crime é juridicamente aceito como um ato contra a sociedade, sendo esta representada pelo Estado, na violação da norma, lei penal. Tem como fundamentação o sistema acusatório.70

O Estado é detentor do monopólio da justiça criminal, primado no interesse público. Entretanto, encontra-se inerte quanto às necessidades do infrator, da vítima e da comunidade afetada. São tutelados bens e interesses, com a punição do infrator e proteção da sociedade. A ressocialização desempenha um papel secundário, em que vítima e infrator ficam isolados, não existindo nenhum acompanhamento, assistência psicológica, jurídica, social e econômica por parte do Estado. 71

No que se refere ao infrator, em relação as sua conduta, esta é relacionada à sua má-formação. O infrator dificilmente tem conhecimento, participação no processo, fica alienado aos fatos processuais, uma vez que o meio de comunicação utilizado é por meio de advogado. Em resumo ele não é responsabilizado, mas sim, punido pelo delito cometido. 72

Em relação à justiça restaurativa, existem doutrinadores que afirmam que a justiça restaurativa estabelece ‘uma nova maneira de abordagem da justiça penal, utilizando como prioridade a reparação dos danos causados às pessoas, ao invés de punir os transgressores’. Com isso, procuram demonstrar que a simples punição não considera os fatores emocionais e sociais, e que é fundamental, para as pessoas afetadas pelo crime, restaurar o trauma emocional, os sentimentos e relacionamentos positivos, o que pode ser alcançado por meio da Justiça Restaurativa, que tem como principal objetivo reduzir o impacto dos crimes sobre os cidadãos, mais do que diminuir a criminalidade.73

Sustentam que a Justiça Restaurativa é capaz de ‘preencher essas necessidades emocionais e de relacionamento e é o ponto chave para a obtenção e manutenção de uma sociedade civil saudável’.74

70

KONZEN, 2007, p. 101 e 102.

71

SCURO, Pedro . Manual de Sociologia Geral e Jurídica. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 102/104.

i72 KONZEN, op. cit., p. 101.

73

SÓCRATES, Adriana. Práticas Restaurativas como diferentes formas de lidar com o que comparece à Justiça. Disponível em http://www.justiciarestaurativa.org/news/adriana . Acesso em 15 de out 2009.

74

Adriana Sócrates destaca que a “justiça restaurativa possibilita, exatamente, este espaço para fala, para expressão de sentimentos e emoções vivenciadas, que serão utilizadas na construção de um acordo restaurativo, que contemple a restauração das relações sociais e dos danos causados”.

Sobre o tema dissertam Prudente e Sabadell:

“[...] aproximada, o objeto, os princ ípios, a utilização e operação do programa, a ruptura dos valores da justiça tradicional (punitiva), enfim, destacar relevantes pontos e vantagens da adoção, dessa nova forma de restaurar conflitos”.75

Apresentam-se nas tabelas abaixo algumas das diferenças existentes entre o modelo de Justiça Criminal, também chamado retributivo e o modelo restaurativo, com vistas a exemplificar os procedimentos e resultados dos dois modelos e os efeitos que cada um deles projeta para a vítima e para o infrator.76

TABELA 1 – Diferenças entre o modelo de Justiça Retributiva e Justiça Restaurativa.

JUSTIÇA RETRIBUTIVA JUSTIÇA RESTAURATIVA Prevenção Geral e Especial

- Foco no infrator para intimidar e pu nir

Abordagem do Crime e suas Conseqüências - Foco nas relações entre as partes, para restaurar Penalização

Penas privativas de liberdade, restritivas de direitos, multa

Estigmatização e Discriminação

Pedido de Desculpas, Reparação, restituição, prestação de serviços comunitários.

Reparação do trauma moral e dos Prejuízos emocionais – Restauração e Inclusão

Tutela Penal de Bens e Interesses, com a Punição do Infrator e Proteção da Sociedade

Resulta responsabilização espontânea por parte do infrator

Penas desarrazoadas e desproporcionais em regime carcerário desumano, cruel, degradante e criminógeno – ou – penas alternativas ineficazes (cestas básicas)

Proporcionalidade e Razoabilidade das Obrigações Assumidas no Acordo Restaurativo

Vítima e Infrator isolados, desamparados e desintegrados. Ressocialização Secundária

Reintegração do Infrator e da Vítima Prioritárias

Paz Social com Tensão Paz Social com Dignidade

Fonte: PINTO, Renato Sócrates Gomes. A construção da Justiça Restaurativa no Brasil. O impact o no sistema de Justiça criminal. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1432, 3 jun. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9878>. Acesso em: 09 nov. 2009.

75

PRUDENTE, Neemias Moretti. Justiça Restaurativa - A era da

Criminologia Clínica. O Estado do Paraná, Curitiba, 19 ago. 2007. Caderno Direito e Justiça, p. 03.

76

TABELA 2 – Efeitos para a vítima.

JUSTIÇA RETRIBUTIVA JUSTIÇA RESTAURATIVA

Pouquíssima ou nenhuma consideração, ocupando lugar periférico e alienado no processo. Não tem participação, nem proteção, mal sabe o que se passa.

Ocupa o centro do processo, com um papel e com voz ativa. Participa e tem controle sobre o que se passa.

Praticamente nenhuma assistência psicológica, social, econômica ou jurídica do Estado

Recebe assistência, afeto, restituição de perdas materiais e reparação

Frustração e Ressentimento com o sistema Tem ganhos positivos. Suprem-se as necessidades individuais e coletivas da vítima e comunidade

Fonte: FONTE: PINTO, Renato Sócrates Gomes. A construção da Justiça Restaurativa no Brasil. O impacto no sistema de Justiça criminal. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1432, 3 jun. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9878>. Acesso em: 09 nov. 2009.

TABELA 3 – Efeitos para o infrator. (continua)

JUSTIÇA RETRIBUTIVA JUSTIÇA RESTAURATIVA

Infrator considerado em suas faltas e sua má- formação

Infrator visto no seu potencial de respon sabilizar- se pelos danos e conseqüências do delito Raramente tem participação Participa ativa e diretamente

Comunica-se com o sistema por Advogado Interage com a vítima e com a comunidade É desestimulado e mesmo inibido a dialogar com

a vítima

Tem oportunidade de desculpar-se ao sensibilizar-se com o trauma da vítima É desinformado e alienado sobre os fatos

processuais

É informado sobre os fatos do processo restaurativo e contribui para a decisão Não é efetivamente responsabilizado, mas punido

pelo fato

É inteirado das conseqüências do fato para a vítima e comunidade

Fica intocável Fica acessível e se vê envolvido no processo

Não tem suas necessidades consideradas Supre-se suas necessidades

Fonte: PINTO, Renato Sócrates Gomes. A construção da Justiç a Restaurativa no Brasil. O impacto no sistema de Justiça criminal. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1432, 3 jun. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9878>. Acesso em: 09 nov. 2009.

De acordo com o analisado, o sistema acusatório da tradição retributiva pugna pela busca de um juízo de valores, com a pretensão da instituição da responsabilidade, sem qualquer preocupação com a ressocialização do indivíduo.77

77

Por outro lado, a Justiça Restaurativa, foi idealizada como uma tentativa de olhar o fenômeno do delito e a produção de justiça com outra visão, com a característica mais ou menos restaurativa na medida do grau de envolvimento de cada parte, a reparação da vitima, a responsabilidade do transgressor e a reconciliação da comunidade de assistência. Haveria somente processo restaurativo se houvesse a participação ativa dos três grupos.78

Assim sendo, a justiça seria obtida por necessidade, não mais por merecimento, tendo como ‘ponto chave a obtenção e manutenção de uma sociedade civil saudável’.79

No documento Redução da maioridade penal (páginas 30-34)

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