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Justificação do tema e contexto

No documento QUE MÚSICAS FALAMOS (páginas 30-34)

II.1. Definição da problemática

Recentes recomendações do Conselho da Europa apontam para o repensar de perspetivas no âmbito do ensino das línguas estrangeiras no sentido de se caminhar para uma visão mais socializante desta atividade. Com efeito “Language teaching is a social and political activity" (Byram, 2008: 3). Antes de se ser professor de língua é-se um ser fundamentalmente social e político, pelo que para além de se exercer funções letivas se deve exercer funções humanitárias e cívicas no sentido em que se põe em prática um conjunto de comportamentos que visam a defesa de valores fundamentais para uma vida no coletivo, em harmonia e com garante do bem-estar e respeito pelo Outro.

Those who teach second or foreign language have to think about how the language is offering a new perspective, a challenge to the primary language of identity, and a different vision of the culture(s) in which they live and have hitherto taken for granted. (Byram, 2008:2)

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O exercício da docência irmana o exercício da humanidade e todos os fenómenos de socialização/politização a ela inerentes. Fica assim um professor, nomeadamente um professor de língua estrangeira, profissionalmente obrigado a incluir na sua prática letiva a aprendizagem, não só dos conhecimentos ao nível dos condicionalismos específicos da língua-cultura alvo, mas também das capacidades de interação, relacionamento e mediação, sendo que se prevê que estas se manifestem sempre que o estudante comunique não só mas também numa língua diferente da sua:

Intercultural competence is different from factual knowledge about another country. So along with the linguistic competence teachers should be able to develop in their learners the intercultural competence which enables them to interact with people of different cultural backgrounds, multiple identities and specific individuality. (Byram et al, 2002:32)

Como professora a exercer funções há cerca de duas décadas em escolas de e em redor da grande capital, uma cidade cosmopolita e nessa medida tão impregnada pela condição da diversidade cultural, nesse desafio permanente da convivência humana, onde a mesma se estende inevitavelmente para o palco das escolas, a questão da escolha de uma certa abordagem metodológica pelo professor de língua estrangeira nos meandros dessa diversidade não poderia deixar de se impor como uma preocupação.

Deste modo passa a questão de investigação do presente TP por equacionar a música, nomeadamente na substância das letras de canções de expressão inglesa, enquanto representações dos valores, atitudes e crenças da cultura jovem, como um meio do desenvolvimento da consciencialização intercultural e na procura de estratégias, atuação ou metodologias para promover a competência intercultural nos estudantes de ILE.

Michael Byram, um dos precursores da abordagem intercultural no ensino das línguas, vê as mesmas como representando identidades: “Languages (…) are ways of expressing and recognising the many social identities people have” (Byram, 2006:6). Elas são usadas para identificarem e negociarem identidades por aqueles que as usam, sendo que as pessoas podem ter várias identidades sociais. Ainda que para Byram não

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seja clara a ligação entre o fenómeno de aprender uma língua estrangeira e o do emergir de uma nova identidade, defende o autor que um dos fatores que pode influenciar essa ligação é precisamente as abordagens de ensino da língua sendo certo que as línguas são adquiridas naturalmente e ensinadas formalmente. Byram tem vindo a reinvindicar desde 1997 uma “pédagogie des échanges” para mais recentemente se interrogar sobre: "How important is the inclusion of anti-racist pedagogies and the human rights and democracy in foreign language teaching” (Byram e Risager, 2002:94).

Esta não será uma preocupação nova pelo que sempre que falamos numa “escola intercultural” estejamos tentados a associá-la a dificuldades de relacionamento entre indivíduos de culturas distintas para as quais se espera soluções práticas e um trabalho concreto e ao nível institucional de reconstrução dos afetos. Contudo, podemos, e devemos, igualmente pensar que esse trabalho poderá, e deverá, passar pela sala de aula com a aplicação de um conjunto de práticas pedagógicas que favoreçam a interpretação de novas identidades, pelo menos daquelas nas quais não tenhamos tido ainda a oportunidade de viajar: “We ‘travel’ from one identity to another” (Dervin, 2006:34).

Com o intuito de promover uma atitude tolerante e democrática na interação com o Outro, bem como fomentar uma reação não estereotipada face ao Outro, a utilização de indicadores da competência intercultural de canções e a inclusão de atividades que contemplem a discussão, a análise e a reflexão sobre diferentes temas identitários de e sobre os alunos prevê um agradável mergulho na dimensão afetiva, comportamental e intercultural do ensino da língua inglesa.

Para além do facto da promoção da tolerância e dos valores democráticos estarem efetivamente consagrados nos programas ministeriais, tal abordagem poderá proporcionar a dimensão do Outro e uma experiência com o Outro em sala de aula e transportar consigo o compromisso do professor de ILE em implementar uma aprendizagem inovadora que contemple os níveis cognitivo e afetivo que a música pode conferir:

Culturality has long lagged behind in language teaching. We went from culturalism i.e. lists of cultural facts about the foreign culture to interculturalism usually understood as means of comparing two cultures:

23 that of the learner and the target culture, emphasizing mostly on differences

and stereotypes. (Dervin, 2006:34)

Ainda que mais preocupado com o meio universitário e com a ausência de uma prática pedagógica que tenha uma linha de ação intercultural, Dervin refere-se ao uso por parte dos professores de "grammars of culture" ou formas estereotipadas de aprender o Outro.

De modo a contrariar a ideia de que abordar a questão cultural no ensino da língua passa pela mera transmissão de listas organizados de produtos culturalmente atribuídos, agregou-se às propostas de atividades didáticas concebidas pelos autores de New Frontiers, Ensino Profissional I (manual sugerido pela escola na qual ocorre a presente investigação), aquilo que já se designou por subprograma: um conjunto atividades constituído por canções em língua inglesa a acrescentar às reduzidas propostas musicais aí contidas. A par da didatização de canções sugeriu-se o preenchimento da AIE como instrumento aglutinador de trabalho e de avaliação da competência intercultural.

II.2. Contexto físico da investigação

Alicerça-se, assim, o presente estudo em dois pilares: o da utilização das canções de expressão inglesa na promoção da consciencialização intercultural no ensino de ILE, tratando-se de apresentar aquelas como propostas de aprendizagem significativas, ao mesmo tempo que se explora a componente afetiva no ensino da língua, e o da utilização da AIE como mecanismo de intervenção crítica no tratamento da competência intercultural.

Recorreu-se para tal ao suporte das novas tecnologias, nomeadamente na utilização da Internet que permitiu um rápido acesso, não só às letras dos textos musicados como também a um diversificado conjunto de informações sobre os autores e contextos em que as mesmas surgem “Teachers will need to seek new kinds of materials (…) Sources include the Internet where it is available” (Byram et al, 2002:32).

A instituição na qual decorreu a experiência reportada no presente trabalho situa-se na área da grande Lisboa, Alcântara, e conta com uma tradição de 96 anos ao

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serviço do ensino público na área das Ciências e Tecnologias. Aliando experiência às atuais necessidades do mercado de trabalho e tendências dos alunos, a Escola Secundária Fonseca de Benevides tem um leque de oferta desde o 3º Ciclo do ensino básico aos Cursos Profissionais e de Educação e Formação para jovens e adultos.

Os alunos a cargo da professora-investigadora dos cursos Técnico de Apoio em Gestão Desportiva (10º PD2), Técnico de Eletrónica, Automação e Computadores (10º PE1) e Técnico de Instalações Elétricas (10ºPE2) foram informantes do GE, sendo que alunos de três outros cursos profissionais constituíram o GC. A amostra inicial foi de 72 alunos de ILE, composta maioritariamente por elementos do sexo masculino. Refira-se que ambos os grupos sofreram alterações na sua composição no decorrer da investigação pelo fato de vários alunos terem apresentado equivalências nos módulos da disciplina de Inglês ou por terem simplesmente desistido da frequência dos cursos, tendo essas variações sido mais notórias em número no GE, sem que essas tenham de qualquer modo prejudicado os resultados do presente estudo.

No documento QUE MÚSICAS FALAMOS (páginas 30-34)

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