3.1 Modelos de planejamento e controle em usinas de cana-de-açúcar
3.1.11 Lacuna na literatura
Na seção 3.1 foi revisada a literatura sobre modelos que tratam do planejamento e controle da produção em usinas de cana-de-açúcar, resumidos na Tabela 3. Várias abordagens de modelagem com distintos métodos de solução foram empregadas para a obtenção de planos de colheita, produção e distribuição física com horizontes de tempo de longo, médio e curto prazo.
Tabela 3: Modelos de planejamento e controle Tipos de
planejamento Referências Características Planejamento
industrial Vijayalakshmi (1987) Programação linear Contexto governamental Paiva e Morabito (2009
e 2013) Programação inteira mista Maximização de receita Modelo de seleção de processos Paiva e Morabito
(2011) Programação inteira mista Maximização de receita Modelo de seleção de processos Otimização robusta
Carvalho (2009) Modelo semi-variância de Markowitz Escolha do mix ótimo de produtos Mele et al. (2011) Programação inteira mista
Maximização econômica e ecológica de uma rede de usinas Considera o planejamento agrícola, industrial e da distribuição física nesta rede
Distribuição
Física Yoshizaki et al. (1996) Programação linear Distribuição física do etanol
Modelo de fluxo em redes com transbordamento Colin et al. (1999) Programação linear
Distribuição física do açúcar Modelo de fluxo em redes Kawamura et al. (2006) Programação linear
Distribuição física do açúcar Modelo de fluxo em redes Xavier (2008) Programação inteira mista
Localização de tanques de armazenagem de álcool Desenho da
infraestrutura de colheita
Salassi et al. (2002) Programação inteira mista
Definir a quantidade de cana mecanizada e manual Otimização da produtividade e recuperação de açúcares Higgins et al. (2004b) Localização de terminais ferroviários
Maximizar teor de açúcares
Agregação de áreas em grupos de colheita Capacidade de transporte (raio médio) Meta de processamento da usina Higgins e Laredo
(2006) Localização de terminais ferroviários Agregação de áreas em grupos de colheita Capacidade de transporte (raio médio) Neungmatcha et al.
(2013) Localizar pontos de carregamento para consolidação de carga de fornecedores Escolha do tipo de carregador
Tabela 3: Modelos de planejamento e controle (continuação) Tipos de
planejamento Referências Características Análise de cenários de colheita e transporte (Simulação discreta)
Arjona et al. (2001) Testar cenários
Amortização de equipamentos Higgins e Davies
(2005), Higgins e Laredo (2006)
Testar cenários
Dimensionamento de recursos (locomotivas e vagões) Turnos de trabalho
Ianoni e Morabito
(2006) Testar cenários Políticas no descarregamento de caminhões
Le Gal et al. (2009) Dimensionamento de recursos de colheita e transporte Baseado em programação de colheita macro
Silva et al. (2011) Testar cenários Turnos de trabalho Mundim (2009) Testar cenários
Dimensionamento de recursos (caminhões, máquinas e tratores) Políticas de despacho dinâmico de veículos
Viabilidade econômica do estoque sobre rodas
Bastos (2009) Análise de variáveis relacionadas à logística de colheita e transporte para melhorar regularidade no suprimento de matéria-prima
Programação e sequenciamento de veículos
Singh e Pathak (1994) Minimizar custos dos equipamentos (mão-de-obra, depreciação, capital, manutenção, combustível, lubrificação e impostos) Hahn e Ribeiro (1999) Minimizar os tempos de fila
Considera o número de equipamentos disponíveis nas frentes de colheita, bem como de veículos
Higgins (2006) Programação inteira mista Minimizar os tempos de fila
Considera a disponibilidade de carretas dependente da capacidade de produção da frente de colheita
Formação de blocos de colheita Higgins et al. (2004b) e Higgins e Laredo (2006)
Minimizar a distância entre a área e o centro de massa do bloco Restrição limitando o tamanho
Modelo de programação inteira e função objetivo não linear Barata (1992) Blocos agrupados por variedades, estágio de corte, tipo de solo,
distância entre a área e a usina, data do último corte ou plantio, tratos culturais, dentre outros
Jena (2009) Blocos agrupados por distância entre os talhões menor que um quilômetro, valores da qualidade da matéria-prima iguais, colheita na mesma época e por uma mesma frente
Planejamento plurianual (implantação e reforma)
Barata (1992)
Higgins et al. (1998) Programação linear Maximizar teor de açúcares Meta de processamento
Capacidade de transporte (raio médio)
Época do ano a ser plantada a variedade (reforma) Higgins (1999)
Higgins e Muchow (2003)
Higgins et al. (2004a)
Programação inteira mista (GAP) Meta de processamento da usina Maximizar teor de açúcares
Capacidade de transporte (raio médio) Capacidade de colheita
Época do ano a ser plantada a variedade (reforma) Colin (2009) Método de implantação do canavial
Programação quadrática Planejamento
de plantio Sartori et al. (2001) Programação linear Maximizar teor de açúcares Meta de processamento
Capacidade de transporte (raio médio) Piewthongngam et al.
(2009) Programação linear Maximizar teor de açúcares
Tabela 3: Modelos de planejamento e controle (continuação) Tipos de
planejamento Referências Características Planejamento de
colheita macro Guise e Ryland (1969) Programação quadrática Considera capacidade industrial, custos de produção e margem de contribuição
Análise do momento de início e final de safra para a obtenção de melhor rentabilidade
Jiao et al. (2005) Programação quadrática
Maximização do teor de sacarose
Proporção que cada fazenda deve produzir Guilleman et al. (2003), Le Gal et al. (2003), Gaucher et al. (2003), Le Gal et al. (2008), Lejars et al. (2008), Le Gal et al. (2009)
Simulação determinística utilizando o software MAGI Maximizar teor de açúcares
Produção agrícola Capacidade industrial
Capacidade de transporte e colheita
Caliari et al.
(2004) Programação linear Frentes de colheita previamente definidas Maximização do teor de sacarose
Consideração da capacidade da usina, áreas de maturadores e vinhaça
Scarpari e
Beauclair (2010) Programação linear Decisão do tipo de colheita (manual e mecanizada)
Decisão da tecnologia de transporte (rodotrem ou treminhão) Restrição das capacidades de colheita, carregamento e transporte Higgins (2002) e
Higgins e Postma (2004)
Programação inteira mista com o problema de escalonamento de enfermeiras
Determinação do padrão de entrega de fornecedores à usina Função multiobjetivo
Analisa a utilização de terminais ferroviários, locomotivas e sistema viário
Guan et al. (2009) Enfoque em uma fazenda
Sequenciamento de operações agrícolas
Solução através de meta-heurísticas (Simulated Annealing, Algoritmo Genético)
Stray et al. (2012) Determinação da sequência de colheita dos fornecedores de uma usina
Problema do caixeiro viajante assimétrico com custos dependentes do tempo
Grunow et al.
(2007) Meta de processamento da usina Maximizar teor de açúcares Capacidade industrial
Capacidade de transporte (raio médio) Capacidade de colheita
Jena e Poggi
(2013) Programação inteira mista GAP Meta de processamento da usina Maximizar teor de açúcares
Aplicação de maturadores e vinhaça Capacidade industrial
Capacidade de transporte (raio médio) Capacidade de colheita
Tabela 3: Modelos de planejamento e controle (continuação) Tipos de
planejamento Referências Características Planejamento de
colheita (Operacional)
Milan et al.
(2006) Minimizar custos de transporte Meta de processamento da usina
Capacidade de transporte rodoviário e ferroviário Capacidade de colheita
Restrições de jornada de trabalho Grunow et al.
(2007) Meta de processamento da usina Maximizar teor de açúcares Dimensionamento de veículos Jena e Poggi
(2013) VRP tratado como GAP Meta de processamento da usina Maximizar teor de açúcares
Aplicação de maturadores e vinhaça Capacidade de transporte (raio médio) Capacidade de colheita
Analisando estes modelos, percebe-se que, apesar de trabalhos como Higgins (1999), Higgins e Muchow (2003), Higgins et al. (2004b), Grunow et al. (2007) e Jena e Poggi (2013) abordarem vários dos aspectos do modelo conceitual por meio da modelagem em GAP, o plantio e a colheita são tratados sem a análise dos deslocamentos das frentes de colheita. Parte-se de uma definição prévia das frentes sem considerar a sequência de colheita dos blocos, a perda de capacidade devido ao deslocamento das frentes e sua interferência nas capacidades de colheita e transporte (veja seção 2.4). Stray et al. (2012) aborda o sequenciamento das áreas, porém não divide a operação em frentes de colheita, contrastando da realidade brasileira.
Quando estes planos são desdobrados no plano operacional e, posteriormente, no controle de tráfego, pode-se verificar condições de infactibilidade. Contratações momentâneas de terceiros para incrementar a capacidade de colheita e transporte vêm se tornando cada vez mais improváveis, devido à especificidade e alto custo dos recursos de colheita e transporte, como as colhedoras de cana, as unidades de transbordo e as unidades de carga canavieiras (rodotrem).
Com isso, a otimização de açúcares, que foi prevista no planejamento de colheita macro e alimentou o plano industrial, bem como a comercialização dos produtos, não se concretiza ou realiza-se apenas parcialmente. Este tipo de desvio causa desgaste no relacionamento entre os elos da cadeia de produção e prejuízos à empresa, devido à redução de eficiência industrial oriunda da qualidade da matéria-prima inferior à prevista, como também falhas na estratégia de comercialização, especialmente no que tange à venda a mercados futuros.
Desta maneira, percebe-se uma lacuna na literatura gerada pela falta de uma abordagem de otimização que trate a programação das frentes de colheita, visando equilibrar o suprimento à unidade fabril, o manejo varietal, a capacidade de colheita e de transporte, e que possa orientar o tipo de variedade nas áreas a serem plantadas, bem como o dimensionamento de veículos e colhedoras. Estes relacionamentos estão inspirados nas necessidades de usinas localizadas na região Centro-Sul do Brasil, ou seja, unidades produtivas predominando estruturas de colheita e transporte com controle próprio, bem como com tendência à mecanização da colheita e formação de grandes conglomerados.