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CAPÍTULO III: ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS DA PESQUISA

3.1. DOCUMENTOS NACIONAIS E DAS AGÊNCIAS INTERNACIONAIS

3.1.1 LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL E PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (n° 9.394/96), documento de referência no Brasil, trata, genericamente, sobre a formação continuada em vários artigos, porém, como mencionado, nada especifico para o ensino superior. Iniciando pelo artigo 40, no que concerne à formação continuada, direciona o olhar mais como subterfúgio para a formação para o trabalho (pedagogia tecnicista46), a valer: ―A educação profissional será

46A pedagogia tecnicista considera que as instituições de ensino devem modelar o modo de se comportar do aluno, assim, estará contribuindo para um sistema harmônico, funcional e orgânico, cabendo à prática docente organizar e desenvolver o processo de aquisição de habilidades e conhecimentos específicos deste aluno, permitindo integrá-lo à máquina do sistema social global. Para Demerval Saviani, a partir do pressuposto da neutralidade científica e inspirada nos princípios de racionalidade, eficiência e produtividade, a pedagogia

desenvolvida em articulação com o ensino regular ou por diferentes estratégias de educação continuada, em instituições especializadas ou no ambiente de trabalho.‖ O artigo 63, no inciso III, traz os ―programas de educação continuada para os profissionais de educação dos diversos níveis.‖ O artigo 66 aponta que ―a preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós‐graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado.‖ Já o artigo 67, inciso II, estipula o ―aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico remunerado para esse fim‖. O artigo 80 emblema que ―o Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada.‖ E o último artigo a evidenciar é o 87, §3º, inciso III que, mantendo a subsequência da forma generalizada, proclama ―realizar programas de capacitação para todos os professores em exercício, utilizando também, para isto, os recursos da educação a distância.‖ (BRASIL, 1996, arts. 40, 63, 66, 67, 80, 87, respectivamente). Como dito anteriormente, percebe-se no texto da lei 9.394/96, a referência à formação continuada, porém, a mesma não faz alusão ao ensino superior e nem tão pouco ao docente do ensino superior. Traz, unicamente, a educação dos diversos níveis, como cita o artigo 63, contudo, nada que venha nortear a formação continuada e que abra caminhos para uma educação no ensino superior que permita romper com a educação tradicionalista. Como refere Maria Lucia Vasconcelos (2009, p. 33), na interessante análise que faz acerca da LDB e a capacitação do docente do ensino superior, ―há preocupação com a formação dos docentes da educação básica, tendo, até mesmo, a formação pedagógica excepcionalmente explicitada. O professor universitário, no entanto, estaria sendo excluído nos ―programas de educação continuada.‖‖

Em junho de 2014, foi lançado pelo governo federal um novo Plano Nacional de Educação (Lei Nº 13.005), e o mesmo traz uma série de metas, algumas que, inclusive, tratam diretamente do trabalho e carreira docente. No entanto, assim como a LDB, nada especifico para o ensino superior, nem tão pouco para a formação continuada do docente do ensino tecnicista advogou a reordenação do processo educativo de maneira a torná-lo objetivo e operacional. De modo semelhante ao que ocorreu no trabalho fabril, pretendeu-se a objetivação do trabalho pedagógico. Buscou-se, então, com base em justificativas teóricas derivadas da corrente filosófico-psicológica do behaviorismo, planejar a educação de modo a dotá-la de uma organização racional capaz de minimizar as interferências subjetivas que pudessem pôr em risco sua eficiência. ―Se na pedagogia tradicional a iniciativa cabia ao professor e se na pedagogia nova a iniciativa deslocou-se para o aluno, na pedagogia tecnicista o elemento principal passou a ser a organização racional dos meios, ocupando o professor e o aluno posição secundária. A organização do processo converte-se na garantia da eficiência, compensando e corrigindo as deficiências do professor e maximizando os efeitos de sua intervenção.‖ (SAVIANI, 2013, p.382).

superior. Para melhor clarificar esta afirmação, buscamos evidenciar algumas dessas metas e estratégias e seu modelo generalista, que mais se aproximam ou genericamente se direcionam para o ensino superior, ou esclarecendo melhor, para a formação continuada do professor do ensino superior.

A meta 13 do PNE, em seu texto: ―elevar a qualidade da educação superior e ampliar a proporção de mestres e doutores do corpo docente em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação superior para 75% (setenta e cinco por cento), sendo, do total, no mínimo, 35% (trinta e cinco por cento) doutores.‖ (BRASIL, PNE, 2014-2024). Tal meta se traduz um tanto heterônoma, pois ao tempo que convida a elevação da qualidade da educação superior, bem como ampliação de mestres e doutores do corpo docente, não esclarece qual estratégia será utilizada - lembrando, o contexto em que vivemos, onde, segundo afirmação do próprio Ministro da Educação, Mendonça Filho ―a educação brasileira vem progredindo, mas a passos lentos, aquém do desejável.‖ (PORTAL BRASIL, 2017). ―A previsão‖, segundo o ministro é um aumento orçamentário nos recursos para a educação de ―7% em relação a 2016, o que representaria um crescimento de R$ 9 bilhões para a educação.‖ (PORTAL BRASIL, 2017). Mas esta previsão - se efetivada - seria o suficiente para dar conta de suprir as carências da educação brasileira e, ainda, elevar a qualidade da educação superior conforme o sugerido na meta 13. De acordo com o PNE - LEI N° 010172 - a meta ―16. Promover o aumento anual do número de mestres e de doutores formados no sistema nacional de pós- graduação em, pelo menos, 5%‖, (BRASIL, PNE, 2001-2010) já trazia a ampliação da proporção de mestres e doutores do corpo docente em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação superior, porém, não foram encontrados dados que comprovassem ou não a efetivação de tais metas.

O aumento orçamentário de 7% dos recursos para a educação, conforme informado pelo ministro da Educação do Brasil, é terminantemente insuficiente para suprir as necessidades dos novos desafios propostos para aumentara qualidade do ensino superior. Os indicadores da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), documento que integra um vasto universo de indicadores, buscando aferir, desde a dimensão de mulheres na docência, regularidade de uso das tecnologias por grau de instrução, até a totalidade de valor mútuo - destinado ao Ensino Superior – revelam a insuficiência dos investimentos em educação superior para o cumprimento das metas. Vale dizer que dos 35 países compõem a OCDE e mais nações associadas, o Brasil continua com índices abaixo da média, segundo dados do relatório ―o Brasil investe 5.5% do PIB nos ensinos fundamental,

médio e superior‖ (OCDE, 2016, tabela b4.2). Mantemos uma posição inferior em relação aos outros participantes da pesquisa levada a cabo pela OCDE. A necessidade de investimento para a educação ―superior‖ no Brasil é de 10% do PIB em educação. Somente a partir de 10% (do PIB em educação) seria possível melhorar a qualidade do ensino e avançar na educação, criando o equilíbrio necessário, entre avanço e qualidade de forma consistente. Como maior garantidor para nossa afirmativa sobre a insuficiência orçamentaria, se faz importante destacar, também, que o Brasil é um dos últimos colocados no total de investimento anual por estudante. Ficando à frente apenas de México, Colômbia e Indonésia.

A qualidade da educação superior, de acordo com Dias Sobrinho (2012, p. 26) ―deve corresponder à qualidade definida pelos atores supranacionais do mundo científico, de acordo com os imperativos da economia globalizada.‖ Ainda segundo o autor ―diferentemente das práticas mais comuns, a qualidade não é reduzida a seus aspectos quantificáveis e mensuráveis, nem o ensino superior deve ter um único propósito instrumental.‖ (p. 26). Qualidade medida por índices de produtividade, situação nos rankings, % de sucesso dos estudantes; adequação ao mercado de trabalho; utilização das novas tecnologias de informação e comunicação – afinal, um conceito que é definido a partir de dados quantitativos e que não considera qualidade, por ex., a inclusão dos sectores mais desfavorecidos da população ou a inclusão de novas culturas e epistemologias.

Retomando a análise do PNE, na meta - 14.13) - tenciona-se ―aumentar qualitativa e quantitativamente o desempenho científico e tecnológico do País e a competitividade internacional da pesquisa brasileira, ampliando a cooperação científica com empresas, Instituições de Educação Superior - IES e demais Instituições Científicas e Tecnológicas – ICTs‖ (BRASIL, PNE, 2014-2024). Do mesmo modo, questionam-se as transformações da economia, neste caso ―mundial‖, e os mecanismos a serem adotados, uma vez que, ainda assim, não se encontram definições estratégicas para sustentar tais metas.

Nas estratégias propostas, a 15.11, aspira ―implantar, no prazo de 1 (um) ano de vigência desta Lei, política nacional de formação continuada para os (as) profissionais da educação de outros segmentos que não os do magistério, construída em regime de colaboração entre os entes federados;‖ (BRASIL, PNE, 2014-2024). Se analisarmos os artigos 63, 66 e 67 da LDB, referidos anteriormente, é possível observar que são ações que já haviam sido previstas e, ou estão, ou deveriam estar em andamento e efetivadas e não justificam estar relacionadas dentro do PNE 2014-2024, como metas e estratégias a serem cumpridas.

Quanto à estratégia 16.1) realizar, em regime de colaboração, o planejamento estratégico para dimensionamento da demanda por formação continuada e fomentar a respectiva oferta por parte das instituições públicas de educação superior, de forma orgânica e articulada às políticas de formação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios‖ (BRASIL, PNE, 2014-2024), vem acentuar o exposto na Constituição de 1988, em seu Art. 21447.

Apesar das ―mudanças‖ e ―avanços‖ verificados no PNE 2014-2024, tem-se a ideia de que seu desenvolvimento se relaciona com o modo de produção capitalista no Brasil, fomento da iniciativa privada, embora com o incremento de algumas políticas de impacto social, como o REUNI e PROUNI. Conforme dito, nada está especificamente direcionado ao ensino superior e/ou ao docente do ensino superior. As metas e estratégias apontadas foram destaques que, genericamente, buscamos traduzir para o ensino superior, já que o novo PNE sancionado em junho de 2014, é voltado quase que ―especificamente‖ à educação básica e ao professor da educação básica, sem contar o fato de que as metas são desproporcionais aos recursos destinados ao programa, além do importante agravante do PNE estar se firmando com política educacional ligada, apenas, à formação de trabalhadores que atendam as demandas da produtividade, desprestigiando, cada vez mais, uma formação superior atrelada a uma educação autônoma em relação ao neoliberalismo, ao sólido sistema sócio econômico capitalista.

Quanto às Resoluções CNE/CP (Conselho Nacional de Educação Conselho/ Pleno) considerando que a Resolução nº 2, de 1 de julho de 2015, revoga as que vigoravam anteriormente, como cita seu art. 2548, optamos em desconsiderar os demais citados no texto da revogação e propor a análise a partir da resolução em vigor. O texto da referida resolução, inicia dizendo que ―define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados e cursos

47 Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a:609 I - erradicação do analfabetismo; II - universalização do atendimento escolar; III - melhoria da qualidade do ensino; IV - formação para o trabalho; V - promoção humanística, científica e tecnológica do País. VI - estabelecimento de metas de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto.

48 Art. 25. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário, em especial a Resolução CNE/CP nº 2, de 26 de junho de 1997, a Resolução CNE/CP nº 1, de 30 de setembro de 1999, a Resolução CNE/CP nº 1, de 18 de fevereiro de 2002 e suas alterações, a Resolução CNE/CP nº 2, de 19 de fevereiro de 2002 e suas alterações, a Resolução nº 1, de 11 de fevereiro de 2009, e a Resolução nº 3, de 7 de dezembro de 2012. (BRASIL, 2015, CNE/CP).

de segunda licenciatura) e para a formação continuada‖ (BRASIL, CNE/CP, 2015, p. 1), bem como traz uma série de considerações que definem a importância ―profissional do magistério‖, a ―valorização profissional,‖ devendo ser asseguradas pela formação inicial e continuada. Contudo, assim como na LDB, a formação inicial e continuada para o ensino superior só aparece genericamente e sua base central está direcionada, fundamentalmente, para a educação básica, o que serviu para delimitar sua explanação.

Tendo concluído a análise dos documentos nacionais, importante para buscarmos compreender como figura legalmente a formação continuada para o docente do ensino superior, na atual conjuntura em nosso país, seguimos, dando continuidade à pesquisa, analisando os documentos internacionais, cujo objetivo principal é verificar em que medida os princípios genéricos da legislação brasileira se ajustam ou não aos princípios dos documentos internacionais.