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CAPITULO I – POLITICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO: INCLUSÃO E FORMAÇÃO

CAPITULO 2- A ÊNFASE NA EDUCAÇÃO E DO TRABALHO COMO ELEMENTO DE

2.6. Lei de Execução Penal

Após a análise da legislação educacional brasileira, com referência aos presos do sistema penitenciário, é necessário que se inicie a análise da Lei de Execução Penal Nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (BRASIL, 1984), cujo objetivo é dispor sobre as sentenças ou decisões criminais, ao mesmo tempo em que propicia condições para a reinserção do preso na sociedade.

São indiscutíveis os avanços da Lei de Execução Penal, ao compará-la a leis anteriores e mesmo às leis de outros países. A assistência ao preso e ao egresso como dever do Estado, com o fito de prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade, é um avanço que consta na LEP. A assistência ao preso deve ser: material, de saúde, jurídica, educacional, social e religiosa24. A assistência educacional prevista na LEP foi referendada pela Constituição Federal de 1988, que garantiu a oferta da educação a jovens e adultos e, assim, aumentou as expectativas em relação ao seu cumprimento em todos os locais do país.

A seção V, Art. 17, da LEP, regulamentou a modalidade de educação a ser ofertada: “A assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado” (BRASIL, 1984). A definição do tipo de educação a ser ofertada foi preocupação constante dos elaboradores da Constituição Federal e da LDB, já que, num país com uma política neoliberal, preparar o aluno de classe social baixa para o mercado de trabalho é essencial. No sistema penitenciário, pode ser considerado um facilitador para a

futura inserção do preso no mercado de trabalho, mas, para que essa inserção obtenha êxito, faz-se necessário um trabalho voltado à unidade entre o saber e o fazer, ou seja, nortear-se pelos princípios de uma escola unitária (GRAMSCI, 1979).

Sob alegação de melhoria da qualidade de ensino, autonomia da escola, de busca de parcerias e de flexibilização do sistema escolar, é vista a preponderância de uma política educacional neoliberal, que realiza mudanças na natureza e na organização do sistema educacional brasileiro, que aprofunda a dicotomia entre a educação para os menos favorecidos e a educação para as elites, que reforça o caráter de classe de nossa sociedade (NEVES, 2000).

Nos inegáveis procedimentos que favorecem as classes sociais mais altas do Brasil, aparecem os que permitem às outras classes sociais um mínimo de direitos. Deve-se lutar, portanto, para algumas garantias legais serem atendidas, entre as quais a obrigatoriedade da oferta do ensino de 1º grau, o qual seria integrado ao sistema da unidade federativa, Art. 18 da LEP (BRASIL, 1984), uma vez que o aluno, ao cumprir sua pena, poderá continuar os estudos em qualquer local, sem grandes prejuízos no acompanhamento do processo de ensino e aprendizagem.

O artigo 20 da LEP dispõe o que se segue: “As atividades educacionais podem ser objeto de convênio com entidades públicas ou particulares, que instalem escolas ou ofereçam cursos especializados” (BRASIL, 1984). Para cumprir esse artigo, é relevante observar que a educação ofertada nas unidades prisionais pode compreender um vasto e diversificado campo de experiências educativas, nem sempre identificáveis com ações de escolarização, mas com propósitos variáveis.

Essas modalidades educacionais são realizadas com o empenho de iniciativas governamentais e não-governamentais, de universidades, associações, igrejas, entidades empresariais e trabalhadores de vários setores. Os projetos vinculados a esses segmentos têm contribuído para a minimização dos problemas enfrentados no cotidiano dessas unidades.

Com o fito de solucionar os problemas inerentes ao sistema penitenciário do Estado, valendo-se da colaboração da comunidade, algumas unidades prisionais mais abertas à participação da sociedade conseguem cumprir as normatizações - Art. 4º da LEP (BRASIL, 1984). Essa participação da comunidade pode ser concretizada no cumprimento do artigo 21 da referida Lei, que prevê bibliotecas com um acervo de livros instrutivos, recreativos e didáticos.

Os direitos dos presos, inseridos na Seção II, Capítulo IV, Art. 41, referentes à educação já haviam sido mencionados nos artigos anteriores da mesma Lei, com alguma

diferença em relação à redação: “[...]; VI – exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; VII – assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa; [...]” (BRASIL, 1984).

Para acompanhar o cumprimento dos direitos dos presos pela administração dos estabelecimentos penais, foi criado o Conselho da Comunidade e, dentre as quatro incumbências propostas, a última citada conta com um apoio mais efetivo para minimizar as dificuldades dos presos: “[...]; IV – diligenciar a obtenção de recursos materiais e humanos para melhor assistência ao preso ou internado, em harmonia com a direção do estabelecimento” (BRASIL, 1984).

Se a direção do estabelecimento prisional for acessível, o Conselho da Comunidade tem possibilidade de realizar muitas atividades que favorecerão o bem-estar dos presos, até mesmo com a ampliação de suas incumbências, participando ativamente na gestão democrática da unidade prisional.

Na Cadeia Pública de Bragança Paulista/SP, com a criação da Associação de Assistência e Proteção ao Condenado (APAC), a criação do Conselho da Comunidade permitiu a gestão coletiva de uma unidade prisional, sem que isso se caracterizasse em sua privatização e sem que o Estado abrisse mão de suas prerrogativas na execução penal.

A criação das APACs é possível apenas em locais onde os responsáveis pela justiça e segurança estejam voltados para reduzir os problemas sociais, já que é com base em atitudes corajosas que se consegue avançar. Foi o que ocorreu em Bragança Paulista, com a participação ativa do juiz das execuções criminais, do ministério público, do delegado seccional, na condição de diretor da cadeia local, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo, de empresários, comerciantes e populares. Com a implantação da APAC, vê-se um novo modelo de gestão que se fortalece com a colaboração da comunidade e que não é realizado de forma a assumir as responsabilidades do Estado, ou seja, é uma maneira diferenciada de se administrar uma unidade prisional.

A LEP prevê no Art. 83 que “o estabelecimento penal, conforme a sua natureza, deverá contar em suas dependências com áreas e serviços destinados a dar assistência, educação, trabalho, recreação e prática esportiva” (BRASIL, 1984). Os locais que têm espaço físico para cumprir este artigo, normalmente não contam com recursos humanos e financeiros para poder colocá-lo em prática satisfatoriamente.

A Delegação dos Direitos Humanos fez uma apreciação sobre a LEP, ao mencionar que ela é uma obra extremamente moderna de legislação; que reconhece um respeito saudável aos direitos humanos dos presos e contém várias provisões que ordenam o tratamento

individualizado, protege os direitos substantivos e processuais dos presos e garante a assistência médica, jurídica, educacional, social, religiosa e material. Vista como um todo, o foco desta lei não é a punição, mas, ao invés disto, a “ressocialização das pessoas condenadas” (HUMAN RIGHTS WATCH, 1998, n. p.). Afirmou-se, então, que a realidade não condiz com as descrições da lei, enumerando-se alguns problemas verificados:

O sistema penal no país sofre a falta de uma infra-estrutura física necessária para garantir o cumprimento da lei. Em muitos estados, por exemplo, as casas de albergados simplesmente não existem; em outros, falta capacidade suficiente para atender o número de detentos. Colônias Agrícolas são igualmente raras. [...], não existem vagas suficientes nos presídios para suportar o número de novos detentos, forçando muitos presos condenados a permanecerem em delegacias por muitos anos (HUMAN RIGHTS WATCH, 1998, n. p.).

Essa disparidade entre a elaboração das leis pelo Poder Legislativo e sua execução pelo Poder Executivo ocorre com frequência no Brasil. O Legislativo e o Executivo não têm planos e ações complementares, e, assim, as leis ficam apenas no papel. Observa-se um país com leis penais modernas e uma realidade totalmente adversa, constituída por um sistema penitenciário em grande parte deficitário, o que acarreta um índice de mais de 50% de reincidência, que perpetua a criminalidade e a violência na sociedade, conforme dados do Plano Nacional de Segurança Pública (BRASIL, 2000).