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CAPÍTULO 3 – E ELES, QUEM SÃO?

3.1 As imagens da LI

3.1.3 A LI como certificadora de status social

Observemos os seguintes excertos:

MÔNICA ALVES: O que a língua inglesa significa pra você? Explique.... Além do conhecimento de uma língua estrangeira e da facilidade de comunicação com várias outras pessoas... inglês pra mim... ele significa... status... é uma li/ é um diferencial! A pessoa que fala inglês hoje... ela é vista de maneira diferente... E eu gosto dessa::: dessa visão! Eu gosto de ser diferente! [...] Acima de qualquer outra coisa eu estudo inglês porque eu gosto! Eu peguei amor pela língua eu acho lindo eu acho interessante... e é por isso que eu estudo inglês! (Coleta 1 – depoimento – 1º período)

LARISSA: eu considero o inglês uma língua importantíssima... [...] No Brasil essa língua não tem o valor, ela não tem o reconhecimento que ela deveria ter. Eu acho assim que... não é não é bem isso tipo como se... eu não tô sabendo expressar, mas é como se tipo assim eu acho que nas esCO:::LAS principalmente as públicas eu acho que eles dão muito pouco valor à língua inglesa... E::: e eu não acho isso legal entende? Eu acho tipo assim que a língua inglesa deveria ter mais destaque! E é isso que eu acho que tá faltando... (Coleta 1 – depoimento – 1º período)

MARIZA: Os meus objetivos de::: de estudar o o inglês... pra poder tá aí no mercado de trabalho concorrendo é::: comunicando é é::: o meu currículo ser um currículo valoroso, porque eu sei que é, é importante! VALORIZA o currículo de uma pessoa quando tem lá, é, que a pessoa sabe o inglês. (Coleta 2 – depoimento – 7º período)

MARIANA: Hoje em dia... eu não tenho oportunidade de::: é::: utilizar o inglês devido às minhas amiza:::des que não falam inglês e::: apesar d’eu achar essa língua MUITO importante... é::: na vida de qualquer pessoa. (Coleta 2 – depoimento – 7º período)

Nos dizeres de Mônica Alves e Mariza, a LI é representada como algo que confere um diferencial aos falantes ou aprendizes. Um diferencial reconhecido pelas outras pessoas: status, diferencial, vista de maneira diferente, ser diferente; meu

Outro – a LI, mais uma vez, como objeto idealizado, fetichizado, que dinamiza as relações na aprendizagem do idioma. Esse desejo estranho, diferente, cujo contato/confronto põe em jogo as relações discursivas da subjetividade, desloca e (re)significa o imaginário do aprendiz/falante. (NEVES, 2002; REVUZ, 2002; SERRANI, 2002), desestabilizando identificações. Nos dizeres de Larissa ressoam dizeres sobre a não valorização da LI: uma língua importantíssima, essa língua não

tem o valor, não tem o reconhecimento que ela deveria ter, dão muito pouco valor à língua inglesa, a língua inglesa deveria ter mais destaque. No entanto, esse objeto,

que parece tão caro à ela, pela cadeia parafrástica que observamos, é permeado pela de Larissa: eu considero, Eu acho assim, eu não tô sabendo expressar, eu

acho que, eu acho, eu não acho isso legal, Eu acho. Acreditamos que essa dúvida,

que desestabiliza a da importância da LI, seja produto do encontro/confronto com outro, o diferente, o estrangeiro, que pode ser, até, doloroso, pois demanda do sujeito um grande trabalho subjetivo (REVUZ, 2002). O “ser diferente” nos remete, também, ao próprio caráter do estrangeiro – aquilo que não é próprio de mim – e, mesmo, assim me constitui, revelando a heterogeneidade constitutiva da subjetividade (AUTHIER, 2004). Essa constatação também pode ter provocado a dúvida de Larissa. No entanto, esse diferencial da LI (ser do outro, estrangeira, capaz de mobilizar deslocamentos e viabilizar acesso ao sonho consumista) nos parece certificador de certo status social adquirido, e por isso, nos remete à imagem de superioridade do estrangeiro quando comparado ao brasileiro (CORACINI, 2007, p. 69).

A expressão status social é comumente utilizada para se representar alguém que possui certo conjunto de características sociais que o inclui em determinado grupo e o diferencia de outro. Certamente esse conjunto de características confere a seu possuidor um destaque social. O status social pode ser atribuído ou adquirido. Este se refere ao status social que alguém consegue a partir de seu próprio esforço. É o caso do status social profissional, que é adquirido a custo de muito estudo, por exemplo. Já o status social atribuído pertence à alguém, seja por herança social ou familiar, como o título de monarca. Quanto ao status social do aprendiz ou falante de LI como LE, ele é adquirido, pois é produto de um processo de aprendizagem que demanda esforços do aprendiz.

Neste sentido, a LI tem valor comercial, um objeto comercial, representação já observada nos enunciados analisados na seção 3.1.2. Na visão

sociológica, Bourdieu (2001) afirma que, a linguagem é um conhecimento que agrega valores comerciais, podendo ser considerada um capital cultural. O capital cultural é um conjunto de conhecimentos que fornecem a quem o possui acesso a outros conhecimentos e espaços sociais (teatro, cinema, IES, clubes, etc.) (BOURDIEU, 2001, p. 297). Assim, o status social conferido pelo capital cultural LI ao seu falante está relacionado, portanto, ao valor mercadológico desse idioma. Lembramos que o status social que o falante da LI como LE agrega em uma cultura como a do Brasil, provoca efeitos de sentido também na imagem do aprendiz desse idioma. Segundo Bourdieu (2001, p. 122) uma das formas de validação do capital cultural do aprendiz (em qualquer área do conhecimento ou instituição de ensino) é representada pelo diploma que recebe ao concluir seus estudos. Em nosso contexto, a conclusão do curso de graduação em Letras confere aos graduandos não só a habilitação para lecionar LP, LI e respectivas Literaturas, mas também o status social de detentor de tais capitais culturais; isto é, do status social adquirido. Não podemos desconsiderar as representações de benefícios agregados aos possuidores desse capital: a melhora do currículo, a possibilidade de ingressar ou ascender no mercado de trabalho, a maneira diferente como as pessoas o vêem; como observamos nos dizeres dos graduandos, em tópicos anteriores de nossa análise.

Vale lembrar que, segundo Rezende (2006), esse valor mercadológico agregado à LI enquanto capital cultural, sustenta a proliferação de EIs pelo país. Parece-nos que essa realidade é também sustentada pela própria busca do status social de consumidor cultural; já que para consumir bens simbólicos88 (ou culturais), como conhecimentos em diversas áreas, livros, viagens, dentre outros – uma pessoa necessita possuir certo capital cultural, a LI, por exemplo. Como todo discurso é constitutivamente heterogêneo (AUTHIER, 2004), lembramos que há um atravessamento de um discurso contrário, o de que certos bens simbólicos não produzem esse efeito de sentido, como o curso de Letras, por exemplo. No imaginário nacional, o curso é representado como fácil, sem prestígio dentre os

      

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Segundo Bourdieu (2001, p. 114-119) os bens simbólicos caracterizam-se por certos produtos intelectuais, eruditos em sua maioria, privilegiados por um grupo social respaldado pelo lugar social que ocupa (geralmente em universidades ou outros espaços de formação intelectual como escolas, museus, galerias de arte, igrejas, empresas, etc.) cujo acesso depende de certo capital cultural que confere ao sujeito a possibilidade de possuir, acessar ou consumir tais bens.

cursos universitários. Neves (2002, p. 107) aponta para a contradição entre os efeitos de sentido do prestígio da LI e do desprestígio do curso de Letras:

O ensino de inglês é de longe o maior responsável pelos lucros dessa

faculdade de Letras, conferindo maior poder e status aos membros

dessa comunidade de ensino. Com isso, pensamos que os cursos de graduação em língua inglesa oferecem atraentes oportunidades de prática

a seus alunos/estagiários e talvez mais possibilidade de aumento de

prestígio numa carreira representada em geral como de ‘baixo prestígio’. (grifo nosso)

Frente a essa representação da LI e do curso de Letras, acreditamos que o graduando possa ser motivado a aprender o idioma, uma vez que, no imaginário de tais graduandos, ele constitui via para acesso ao mercado de trabalho e atendimento das demandas sociais. Lembrando que essas representações constituem evidências do material simbólico que tece a subjetividade de graduandos e professores (assim como de outros sujeitos). A partir disso, podemos situar essa representação da LI como produto do discurso do capital (LACAN, 1992) cujo efeito, como vimos, é perpetuar o consumo, gerando lucro aos senhores capitalistas (a globalização, a tecnologia e seus portadores). Assim, a LI enquanto certificadora de status, da mesma forma que a LI como senha de acesso ao mercado de trabalho, estabelece uma relação comercial, em que é adquirida na ilusão de que proporcionaria aos seus compradores prazer e satisfação plena, que, no entanto, não se concretiza, demandando nova aquisição e assim sucessivamente.

Não podemos nos esquecer de que a LI enquanto capital cultural, parece sustentada por um discurso universitário (LACAN, 1992), cujas tradições científicas (da escrita de artigos científicos em LI) demandam a aprendizagem do idioma para se acessar a um saber. Nessa perspectiva, o professor, situado no discurso do mestre (LACAN, 1992) reverencia e transmite o conhecimento buscado no saber universitário. Dessa forma, a LI é certificadora de status social não só pelo acesso ao consumo de produtos tecnológicos, mas também, produtos acadêmicos.

Passamos às representações do aprendiz de LI nos enunciados dos graduandos, logo, na formação dos mesmos.