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Limites objetivos e subjetivos

No documento Coisa julgada inconstitucional (páginas 30-33)

2.2 CARACTERIZAÇÃO DA COISA JULGADA

2.2.6 Limites objetivos e subjetivos

A autoridade da coisa julgada só opera relativamente àquilo que constituiu o assunto da sentença (CHIOVENDA, 1998, p. 493), confinando a extensão do caso julgado a limites. Em relação a esse alcance, urge entender qual parte do pronunciamento judicial forma a coisa julgada (limites objetivos).

De início, ratifique-se que a sentença deverá apresentar em seu conteúdo um silogismo lógico, consistente em relatório, fundamentação e dispositivo, conforme prevê o art. 458 do Código Processo Civil. Porém, nem tudo o que disposto estiver no discorrer da sentença fará coisa julgada, sendo necessário avaliar o que realmente ficará abrangido por aquela autoridade.

Tal alcance encontra amparo no art. 468 do Código de Processo Civil, que preconiza que a sentença transitada em julgado tem força de lei “nos limites da lide e das questões decididas.” Interpretando esse dispositivo é razoável entender que será na conclusão da sentença que o juiz decide a lide, acolhendo ou rejeitando o pedido, razão pela qual o dispositivo se tornará firme e imutável por força da coisa julgada. Preleciona José Arnaldo Vitagliano (2005, p. 61):

O que faz coisa julgada material é o dispositivo da sentença, a sua conclusão. Pode- se dizer que a coisa julgada se restringe à parte dispositiva da sentença; a essa expressão, todavia, deve dar-se um sentido substancial e não formalista, de modo que abranja não somente a parte final da sentença, mas também qualquer outro ponto em que tenha o juiz eventualmente provido sobre os pedidos das partes.

A coisa julgada incidirá no comando, porque é nesse ponto que ocorre a atividade jurisdicional propriamente dita, quando se realiza o juízo de subsunção, criando uma lei ao caso concreto.

Por outro rumo, no relatório e na fundamentação não há certificação por parte do magistrado da vontade do direito que incide sobre o caso concreto, ou seja, não há julgamento propriamente dito, podendo ser rediscutidos em outro processo (GONÇALVES, 2008, p. 250).

Corrobora com essa afirmação o art. 469 do Código de Processo Civil, ao indicar que a coisa julgada não abrangerá os motivos, ainda que relevantes para o julgamento, a verdade dos fatos e a apreciação da questão prejudicial, salvo se essa for decidida incidentalmente (BRASIL, 2010).

No tocante aos motivos, eles não serão acobertados pela coisa julgada porque auxiliam o esclarecimento da decisão, mas não alteram o seu conteúdo (CAMPOS, 1988, p. 26). Propugna Humberto Theodoro Júnior (2005, p. 537):

Os motivos, ainda que relevantes para fixação do dispositivo da sentença, limitam-se ao plano lógico da elaboração do julgado. Influenciam em sua interpretação mas não se recobrem de manto de intangibilidade que é próprio da res iudicata. O julgamento, que se torna imutável e indiscutível, é a resposta dada ao pedido do autor, não o “porquê” dessa resposta.

Os motivos, portanto, auxiliam a elucidar o pronunciamento, podem mesmo determinar o entendimento do dispositivo, porém, não farão coisa julgada.

A verdade dos fatos se torna temerária na medida em que um fato tido como verdadeiro em um processo poderá ser a inverdade comprovada em outro, sem que isso obste a coisa julgada firmada na primeira relação. Ademais, a verdade fática resulta da apreciação das provas, sendo inserida entre os motivos da decisão, e, por isso, não é abrangida pela coisa julgada (THEODORO JÚNIOR, 2009, p. 539).

Por último, as questões prejudiciais também não farão coisa julgada:

A decisão de tais questões não faz coisa julgada, quando feita incidentalmente no processo, ou seja, quando proferida como motivação da sentença. Por outras palavras, se a resolução da questão prejudicial se dá apenas como preparação lógica da sentença, não fará coisa julgada, tomando a natureza jurídica e a eficácia de motivo da sentença. (AMARAL, 2008, p. 69).

Porém, se tais quesitos forem provocados e decididos em ação declaratória incidental, farão coisa julgada, por força do art. 470 do Código de Processo Civil.

De toda forma, somente se submeterá à coisa julgada material a norma jurídica concreta situada na parte dispositiva da sentença decorrente da atuação da jurisdição que julga, de forma profunda e exauriente, a questão principal posta na demanda. Daí deduzir Giuseppe Chiovenda (1998, p. 495):

Em conclusão: objeto do julgado é a conclusão última do raciocínio do juiz, e não as premissas; o último e imediato resultado da decisão, e não a série dos fatos, das relações ou dos estados jurídicos que, no espírito do juiz, constituíram os pressupostos de tal resultado.

Tem-se, pois, delineados os limites objetivos da coisa julgada. Passa-se à análise de seus limites subjetivos.

Na temática do alcance subjetivo cumpre examinar se seus efeitos atingem somente as partes da relação processual ou é extensível a terceiros. Por força de imperativos de ordem técnica e natureza política, os sujeitos que suportarão a coisa julgada serão apenas as partes, com fulcro no art. 472 do Código de Processo Civil.

Comentando o mencionado artigo, Moacyr dos Santos Amaral (2008, p. 72) explica que o motivo de somente sobre as partes incidirem os efeitos da coisa julgada reside no fato que os terceiros não participaram da relação processual. Comentando também o tema José Rogério Cruz e Tucci (2006, p. 39):

Não integrando o contraditório, não é titular de poderes, faculdades, ônus, deveres e sujeição próprios das partes. Ora, por não terem participado dos atos que precedem e preparam o julgamento final, os terceiros não podem sofrer os efeitos da sentença de mérito e muito menos se vincularem à coisa julgada material.

Resta claro que o art. 472 do Código Processo Civil ao excluir o terceiro da incidência da coisa julgada, trouxe como pano de fundo a inspiração nas garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, afinal, somente as partes deduziram em juízo e instigaram a resposta jurisdicional (AMORIM, 2010, p. 86- 87).

Isto não significa que os terceiros possam ignorar a coisa julgada (THEODORO JÚNIOR, 2009, p. 533), pois, como observa Giuseppe Chiovenda (1998, p. 499-500) “como todo o ato jurídico relativamente às partes entre as quais intervém, a sentença existe e vale com respeito a todos, e continua: “todos, pois, são obrigados a reconhecer o julgado entre as partes; não podem, porém, ser prejudicados”.

Destarte, o que todos devem respeitar é a eficácia natural da sentença, tendo em vista que essa se projeta de maneira inter partes. Entretanto, existe a exceção consistente na coisa julgada ultra partes:

A coisa julgada ultra partes é aquela que atinge não só as partes do processo, como também determinados terceiros. Os efeitos da coisa julgada estendem-se a terceiros, pessoas que não participaram do processo, vinculando-os. Pode ocorrer em inúmeras hipóteses. São exemplos os casos de substituição processual em que o substituído, apesar de não ter figurado como parte na demanda terá sua esfera de direitos alcançados pela coisa julgada. (DIDIER JÚNIOR; OLIVEIRA; BRAGA, 2007, p. 488).

Portanto, tratando a sentença de ato emanado do poder estatal, apresentará eficácia erga omnes, porém seus efeitos serão imutáveis apenas inter partes (AMORIM, 2010, p. 98), salvo as exceções acima apontadas.

No documento Coisa julgada inconstitucional (páginas 30-33)