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Parte II Enquadramento teórico

2. Linguagem e pensamento

2.1.

Vygotsky

Linguagem e pensamento têm raízes genéticas diferentes, mas a linguagem interfere no desenvolvimento percetual desde o nascimento na sua interação com os adultos.

O desenvolvimento do pensamento é, pois, determinado pela linguagem, ou seja, pelos instrumentos linguísticos do pensamento e pela experiência sociocultural da criança. O crescimento intelectual da criança depende do seu domínio dos meios sociais de pensamento, ou seja, da linguagem.

Durante a evolução do pensamento e da linguagem, as relações estabelecidas entre ambos contribuem para que se modifiquem. A linguagem torna-se intelectual e o pensamento verbal.

A palavra dá forma ao pensamento criando novas modalidades de atenção, memória, imaginação... O pensamento torna-se simbólico e abstrato.

De modo a evidenciar a relação entre o pensamento e a linguagem, Vygotsky (2007) defende que a representação dessa relação se possa representar por dois círculos que se intersetam em parte, de acordo com o esquema da figura seguinte.

A região de sobreposição do círculo L (Linguagem) com o círculo P (Pensamento) constitui o “Pensamento verbal” (Pv). A parte mais significativa do pensamento (“Pensamento técnico e instrumental” (Pti)) não se relaciona diretamente com a linguagem. Por outro lado, alguns aspetos da linguagem não têm ligação com o pensamento (região de L exceto Pv). Esta situação é exemplificada com o caso de uma pessoa que declama um poema memorizado. Sobre o significado das palavras e a formação de conceitos Vygotsky (2007) afirma que a partir do momento que a criança descobre que tudo tem um nome, cada novo objeto que surge representa um problema que a criança resolve atribuindo-lhe um nome. Quando lhe falta a palavra para nomear este novo objeto, a criança recorre ao adulto. Esses significados básicos de palavras assim adquiridos funcionarão como embriões para a formação de novos conceitos e ainda para a formação de conceitos cada vez mais complexos.

É no significado que o pensamento e a linguagem se unem em pensamento verbal e, portanto, é no significado que encontramos a relação entre o pensamento e o discurso. De um modo muito simplista podemos dizer que o significado é um ato de pensamento, mas é simultaneamente uma parte da palavra enquanto tal, pertencendo, portanto, tanto ao domínio da linguagem como ao do pensamento. Assim sendo, o significado das palavras é, simultaneamente, pensamento e linguagem, constituindo a unidade do pensamento verbal.

2.2.

Worf: Linguagem, pensamento e realidade

17

Tal como Vygotsky, foi na relação entre linguagem e pensamento que Benjamin Lee Worf (1897-1941), antropólogo linguístico americano, centrou a sua atenção e desenvolveu o seu trabalho investigativo. Foi apenas a partir de 1931 que Worf iniciou a sua atividade nesta área de estudo e deveu-se à influência de Edward Sapir (1884-1939) também antropólogo linguístico americano. Sapir explorou as implicações do estudo da linguagem para a compreensão da cultura e da personalidade e de forma preliminar desenvolveu a proposta de que cada língua forma o mundo conceitual do falante. Enquanto aluno e colaborador de Sapir, Worf começou por se dedicar ao estudo das línguas nativas indianas e consequentemente foi desenvolvendo argumentos, entendidos como uma extensão dos trabalhos de Sapir, que sustentam que a estrutura de uma determinada língua tende a condicionar/influenciar o modo de pensar de quem usa essa língua. Esta ideia, de que diferentes idiomas determinam diferentes habilidades cognitivas, em que a língua não é apenas o reflexo da realidade, mas sim o contributo para a sua construção, deu corpo à designada hipótese Sapir-Worf.

São dois os principais argumentos (duas teorias) da hipótese Sapir-Worf: Teoria de determinismo linguístico segundo a qual a linguagem que é falada determina a maneira como o individuo que a fala irá interpretar o mundo ao seu redor e Teoria de relativismo linguístico que sustenta que a linguagem influencia o pensamento sobre o mundo real. Estas teorias têm sido tema de estudo e de discussão e, apesar de na década de 70 terem sido praticamente postas de parte, são encaradas como sendo fortes argumentos abrindo perspetivas sobre a origem do conhecimento e a construção da realidade com implicações relevantes no domínio da educação.

Segundo Worf (1978), é apenas através das formas de representações permitidas pela linguagem natural (língua que se utiliza para comunicar) que o orador pode ter acesso ao mundo. Sustenta ainda que as línguas são portadoras, quer no seu léxico assim como na sua sintaxe, de modelos mentais culturalmente variáveis, e que estes permitem uma perceção da realidade de acordo com a cultura associada a cada uma dessas línguas (Worf & Carroll, 1978). Tal como foram apresentadas por Worf, estas conclusões não foram obtidas a partir de uma hipótese validada cientificamente, mas sim a partir de estudos empíricos que lhe permitiram uma visão geral sobre a influência da linguagem na perceção da realidade. A linguagem como sistema de significados específicos pode orientar oradores numa direção de pensamento e não noutra.

17Este título é o mesmo que o do livro editado por John B. Carroll (1978), que reúne vários textos de

Worf, e em cuja introdução se pode ler que este seria o título do livro de Worf que não chegou a ser escrito. Segundo John B. Carroll, esta edição inclui os textos mais interessantes e úteis de Worf para a linguística em geral.

Capítulo 4

“Uma geometria não pode ser mais verdadeira do que outra; poderá ser mais conveniente.”

Henri Poincaré in La science et l’hippothèse, (Poincaré, 1917, p. 67)

Geometria –

História, Natureza e Ensino/Aprendizagem

A nossa preocupação de estudo é um aprofundamento didático sobre o ensino/aprendizagem da Geometria. Neste sentido, entendemos ser de extrema importância apresentar neste capítulo um breve desenvolvimento histórico da Geometria, da sua natureza e do seu ensino/aprendizagem. Por fim referimos ainda algumas investigações em ensino/aprendizagem da Geometria.

1. Breve incursão pela história da Geometria - De Euclides até ao