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CAPÍTULO I: PATATIVA DO ASSARÉ – O VOO DO ARTESÃO DA

1.2 Influências: Literatura de Cordel, Camões, Castro Alves e Machado de

1.2.1 Literatura de Cordel

45BESCHI, Carlos. Pro modo de traduzir Patativa. Disponível em: <www.patativa.gnumerica.org>. Acesso

em: 10 mar. 2015, p. 1.

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O termo Cordel tem sua origem na França, na região de Provença e significa: cordão ou barbante. Quando se referir ao gênero poético, será grafado com inicial maiúscula. Como sinônimo de folheto, livro, material impresso, será grafado com inicial minúscula. Essa palavra era desconhecida do povo do Nordeste brasileiro até ser relacionada ao folheto popular ou folheto de feira. A Literatura de Cordel no passado era conhecida como romance,

folheto ou verso. Há vários outros nomes atribuídos ao cordel: livro de histórias matutas,

poesias matutas, livro de história antiga, histórias de João Grilo, folheto antigo, livrinho de Feira...

Para Fernando Paixão47, os folhetos ganharam a denominação de cordel a partir da

década de 70 com a chegada do brasilianista francês Raymond Cantel, que foi um dos pesquisadores franceses responsável pela divulgação da poesia de Patativa do Assaré naquele país. Raymond Cantel informou que esses folhetos eram vendidos na Europa em cordéis ou barbantes. Surge então o termo Literatura de Cordel, até então desconhecido. Na França, o folheto era conhecido como Literatura de Colportage.

Para Marco Haurélio48, a literatura de cordel, ou o seu substrato, chegou ao Brasil – ou

à terra que depois seria assim denominada – a bordo das primeiras caravelas. Sendo próprio do ser humano, deslocando-se geograficamente, além dos conhecimentos que lhe garantam a sobrevivência, levar consigo, a sua cultura.

Aqui cabe perguntar: quem eram esses aventureiros e o que faziam a bordo, durante a longa e, certamente, tediosa travessia? O pesquisador italiano Silvano Peloso assinala a predileção deles por “divertimentos mais sedentários”, incluindo a leitura coletiva hábito que sobreviveria, cerca de quatro séculos depois, nos serões noturnos do Nordeste. [...] Assim, uma tradição com forte carga simbólica foi se aculturando e se expandindo com as levas de colonos estabelecidos no Novo Mundo, possibilitando a ampla difusão da poesia tradicional no continente. No Brasil, após iniciada a marcha do litoral ao sertão, as atividades econômicas deram nova coloração às imagens arquetípicas herdadas da Europa. O intercâmbio se ampliou, e a poesia tradicional, mormente no Nordeste, se consolidou com as singularidades que a aproximam de outras manifestações plantadas na América Espanhola. Fundada sob o signo do fantástico, a poesia popular supriu uma lacuna que a historiografia incipiente não podia preencher. Quando, no fim do século XIX, o Nordeste assistiu ao ressurgimento – no Brasil, seria mais correto dizer “surgimento” – da poesia popular em sua forma escrita e em grande escala, o caminho já estava preparado. E a voz do poeta popular, ampliada pela coletividade, pôde levar o necessário em termos de literatura a uma população em sua maioria ágrafa.

47PAIXÃO, Fernando. O mundo encantado da Literatura de Cordel. Oficina de Literatura de Cordel – I

Encontro Nacional de Juventudes e Espiritualidade Libertadora. Apostila. Fortaleza: 2014, p. 2.

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A estrutura poética/textual da poesia de cordel é composta de verso, estrofe, rima, métrica e oração.

Verso: é cada uma das linhas que compõem o poema. Conhecido também como pé. Quando um verso é mal feito, ou não tem métrica, recebe a expressão “pé quebrado”. Estrofe: é um conjunto de versos. No cordel pode ser composta em quadra, sextilha e décima (salvo quando é uma peleja de cantador recriada no folheto, onde pode se usar, além dessas, outras diversas formas de estrofes).

Rima: é a repetição do mesmo som no final dos versos, ou a correspondência de sons no final de palavra diferentes. No cordel é usada a rima soante e ou consoante.

Métrica: é a medida dos versos ou o metro, de acordo com sua quantidade de sílabas poéticas. A medida mais utilizada no cordel é a redondilha maior, que conta de sete sílabas poéticas.

Oração: é a coerência, a espontaneidade, a clareza do assunto abordado, é a fidelidade ao tema, como se diz no ditado popular, é “dizer coisa com coisa”, é o autor se fazendo entender pelo leitor.

Marco Haurélio49 sobre a estrutura do cordel irá dizer:

Os poetas populares costumam afirmar que o cordel se equilibra em um tripé que o caracteriza e, de certo modo, o define. Esse tripé é composto por métrica, rima e oração. Métrica e rima dispensam definição. O mesmo não se pode dizer da oração que, para os poetas, é aquilo que dá sentido ao texto. Pode estar relacionada à fluência, mas, também, pode ser sinônimo de verossimilhança. O verso, também chamado de pé, é preferencialmente o de sete sílabas poéticas, ou redondilha maior. Quando essa medida é desrespeitada, diz-se que o cordel é de “pé quebrado”.

Para Antonio Iraildo Alves de Brito50, cantoria e cordel podem ser considerados como

duas manifestações artísticas inseparáveis. Um e outro têm a mesma fonte: são essencialmente orais. Claro que literatura de cordel, como o próprio nome já indica, tem mais relação com a escrita. Mas ambas são literatura oral, compostas para serem declamadas.

É a partir do cordel como mediação que se pode perceber uma de suas características marcantes: o caráter combativo. Quem sabe isso seja pela liberdade com que o autor se permite diante da linguagem. Aos poetas parece importar dizerem a sua palavra e por meio dela explicar o mundo em

49HAURÉLIO, Marco. Literatura de Cordel do sertão à sala de aula. São Paulo: Paulus, 2013, p. 111. 50BRITO, Antonio Iraildo Alves de. Patativa do Assaré porta-voz de um povo – as marcas do sagrado em sua

suas várias facetas. [...] Um aspecto essencial da literatura de cordel é o fato de ser escrita em verso. As estrofes, a métrica, as rimas marcam o “índice de oralidade”, a voz em potência no texto. De modo que o cordel não é uma coisa feita de qualquer jeito, como às vezes se pensa. Há regras, inclusive rígidas, a serem observadas. O tipo de estrofe mais usado nos folhetos de cordéis são as sextilhas (estrofes de seis versos).