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O QUE É DE DENTRO, O QUE É DE FORA

6 A LITERATURA INFANTIL NO CEARÁ

E ASSIM ACONTECEU...

“... Oh! Dona Maria, oh! Mariazinha, entra nesta roda ou ficará sozinha!...”

Fui ao Tororó – Ciranda

A história da Literatura Infantil no Ceará data de um tempo não muito distante, sendo razoável afirmar que ela está, ainda, na fase do engatinhar, ou seja, dando os passos iniciais para se firmar no seleto cenário nacional.

Segundo depoimento Geraldo Jesuíno, professor do Curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Ceará, artista gráfico, escritor e diretor da Imprensa Universitária da mesma Instituição, por volta de trinta anos algumas publicações foram lançadas em nossa Capital, o que representou um verdadeiro caráter desafiador e solitário.

Tratava-se de escritores que, apaixonados pela Literatura Infantil, obstinadamente lançavam suas obras no mercado, as quais eram vendidas de forma acanhada a amigos e distribuídas nas poucas livrarias locais. Esses escritores detinham excelente poder aquisitivo e, por isso, tinham condições de produzir, editar e lançar suas publicações sem maiores preocupações com tiragem, vendagem, lucro, etc. Como exemplo, podemos citar a obra O Menino

e o Arco Íris, de Artur Eduardo Benevides, com data de copiragem de 1975

(exemplar que tenho em mãos). Referida obra contempla textos poéticos, trazendo em seu bojo raras ilustrações a bico de pena.

Outro artista a mencionar é Diogo Fontenelle, odontólogo, artista plástico e grande aficionado pela Literatura Infantil, que publicou, em 1972,

Baila-Balão, com poesias curtas e ilustrações a bico de pena, em todas as

páginas.

Nesse período inexistia uma política de amparo à editoria local, que assegurasse ao escritor o mínimo de incentivo para publicação de sua produção literária.

Contudo, fora do Estado, mais uma vez brilhava a estrela da nossa ilustre e saudosa conterrânea Rachel de Queiroz, que, em 1969, lançava sua primeira obra infantil, intitulada O Menino Mágico, impressa por uma editora do sul do País, e que veio a ganhar o prêmio Jabuti de Literatura Infantil, patrocinado pela Câmara Brasileira do Livro. Depois, outras produções de sua autoria, igualmente destinada ao público infantil, foram lançadas no mercado: Andyra (1992), Cafute & Pena de Prata (1996), Xerimbabo (2002) e Memórias de menina (2003). É oportuno registrar, neste trabalho, o extraordinário talento literário dessa mulher de fibra, fala e sentimento nordestinos, de cujos valores não abria mão e os proclamava onde estivesse, reconhecidos em todo o mundo, e que se faz respeitar através de seus textos literários.

Em 1981, a Literatura Infantil Cearense ganha grande impulso com a consolidação do Projeto A Biblioteca da Vida Rural Brasileira, uma parceria da Universidade Federal do Ceará com o Ministério da Educação e Cultura. Programa de leitura pioneiro no Nordeste, consistia em produzir e publicar obras de caráter regional, contemplando várias coleções: Trancoso, Cordel, Teatro e Escola, cujo objetivo era levar leitura e informação às comunidades periféricas rurais.

Em decorrência desse projeto, foram lançados, em média, mais de cinqüenta títulos, distribuídos gratuitamente para a sua clientela em especial, ou seja, as crianças das comunidades carentes. Essas produções traziam em seu bojo textos breves, combinados com abundantes imagens à base de monocromia. Ao final de cada obra, eram apresentadas sugestões pedagógicas, de forma a melhor explorar a história.

O professor Geraldo Jesuíno afirma que “neste Projeto não apenas as crianças tiveram acesso a um trabalho pedagógico de alta qualidade, desenvolvido tanto para as da cidade quanto para as do Interior, como permitiu, também, que as equipes formadas por professores, ilustradores e escritores se deslocassem para conhecer a realidade da vida rural. Para tanto, fizeram pesquisas, conversaram com as crianças das localidades visitadas, enfim conheceram a real cultura desse povo específico, recolhendo seu vocabulário, entendendo seu imaginário, seu meio, sua cultura, angariando subsídios para melhor retratar a realidade daquele povo, através de textos literários”.

O que se pode observar nos títulos publicados por esse Projeto é um apurado senso profissional, posto que, antecedendo à produção do texto, era realizada uma pesquisa criteriosa e valiosa, com o propósito de recolher dados para melhor retratar simbolicamente, através de personagens ficcionais, a realidade vivida por aquele povo em especial... Era a Literatura Infantil servindo de instrumento essencial de prazer, informação e formação.

Através do Projeto Biblioteca da Vida Rural, novos autores foram revelados, com destaque para os escritores Vanderlou, Maria Elias Soares, Marita Balsells e vários outros.

Ainda de acordo com o depoimento do professor Geraldo Jesuíno, “muitas oportunidades foram oferecidas através deste Projeto, não só em nível de escritores, como também de ilustradores, equipe editorial e fotomecânica, enfim para um grupo valioso de novos talentos envolvidos com a produção editorial”.

Em meados da década de 1980, a verba aprovada pelo governo federal para a realização do Projeto foi sendo gradativamente reduzida, o que resultou no significativo comprometimento da qualidade das publicações, até que, por absoluta falta de apoio financeiro, o Projeto foi finalmente extinto, com

considerável prejuízo para a sociedade, principalmente para os fiéis leitores que já haviam sido beneficiados com as suas produções.

Outra ação que veio contribuir substancialmente para a produção da Literatura Infantil no Ceará foi a implementação da cadeira de Literatura Infantil, na Faculdade de Letras da Universidade Federal do Ceará, em 1987. O professor Horácio Dídimo, licenciado em Letras e bacharel em Direito, mestre em Literatura Brasileira e doutor em Literatura Comparada, foi o empreendedor desta inovação e, ainda, o primeiro e, por muito tempo, o único professor dessa disciplina.

A Universidade Federal do Ceará foi uma das primeiras, no ranking nacional, a incluir, no seu currículo de graduação, a disciplina. Através deste estímulo, novos talentos foram gradativamente lançados no mercado, como afirma o professor Horácio Dídimo: “Eu mesmo fui incentivado a produzir textos infantis a partir da existência desta cadeira”. E citou, como exemplo, seus livros

A Cara dos Algarismos e o Mestre Jabuti.

O mestre Horácio Dídimo opta em sua obra, na maioria das vezes, por um gênero poético, textos breves, de profundo conhecimento e sensibilidade apurada, recheados de otimismo e esperança, desembocando numa efervescente religiosidade, como ele mesmo declara: “Passei a ver a palavra poética, a palavra literária como reflexo de Deus, da palavra divina. Vejo até um sentido trinitário na própria palavra, porque ela é formada de silêncio, de som e de sentido. E eu vi, nisso aqui, uma imagem trinitária do silêncio criador do Pai, da palavra redentora do Filho e do sentido santificador do Espírito Santo”.

A partir daí, grandes nomes foram surgindo no cenário da Literatura Infantil cearense, como Helena Lutéscia, Elvira Drumond, Heitor Simões, Mino, Lauro Sérgio e tantos outros, enriquecendo o acervo de produções voltadas para uma clientela muito especial, a criança.

Instituída em 11 de abril de 1985, pela Empresa Jornalística O Povo, a Fundação Demócrito Rocha é uma Entidade privada, sem fins lucrativos que atua em diferentes segmentos da sociedade, como na Educação, Cultura, Ciência e Tecnologia, nas Artes e Letras, na Comunicação Social e, ainda, na Saúde e no Desenvolvimento Regional, buscando em suas ações canalizar, estimular e difundir a criatividade, o saber e o fazer do nosso povo.

A Fundação Demócrito Rocha detém, atualmente, um grande poderio no que se refere a publicações destinadas ao publico infantil em nosso Estado. Com efeito, desde 1989 vem desenvolvendo um projeto editorial de qualidade, que busca, entre outras ações, estimular a produção literária local, e, através desta produção, preservar as mais variadas manifestações culturais de nosso povo.

Do depoimento colhido junto a Socorro Acioli, editora adjunta da Fundação Demócrito Rocha, graduada em Comunicação Social, mestre em Literatura Infantil e ainda escritora, podemos afirmar que essa Entidade vem se consolidando rapidamente no mercado editorial, cearense e brasileiro, com livros que abrangem diversas áreas do conhecimento. A Literatura Infantil, por sua vez, vem ganhando espaço no universo literário, não só em nível regional, bem assim em nível nacional. Reforçando, afirma a depoente que: “uma média de doze a treze títulos infantis foram lançados em 2002, e que essa média vem crescendo ano após ano, e sua divulgação está ganhando espaço nacional, chegando algumas obras a serem elogiadas nos jornais Folha de São Paulo e O Estadão”.

Ainda segundo Socorro Acioli, isso se dá em razão do processo de divulgação, que vem se aprimorando gradativamente. Alguns títulos estão sendo colocados no circuito editorial nacional, via grandes livrarias. Em Fortaleza, além de encontrar as obras de nossos conterrâneos em diferentes pontos de vendas, pode-se adquiri-los na própria loja da Fundação Demócrito

Rocha, situada na Avenida Aguanambi, 282, em sua loja virtual WWW.fdr.com.br.

Um fato que vem confirmar a proliferação da Literatura Infantil em nosso Estado se reporta ao lançamento de vários títulos, promovido pela Fundação Demócrito Rocha, em parceria com a Biblioteca Pública Governador Menezes Pimentel, na 6ª edição da Bienal Internacional do Livro. Essas obras foram escritas e ilustradas por artistas conterrâneos e editadas pela própria Fundação, ficando expostas em vários “stands” durante todo o período de realização do evento.

O lançamento dos livros contou com boa participação do público infantil, registrando-se que as crianças, logo após a solenidade, adquiram os livros e solicitaram autógrafos dos respectivos autores. Estavam presentes ao ato os escritores Fabiano dos Santos, Daniel Adjafre, Kelson Bravos, João dos Santos, Guaraciara de Barros Leal, Cira Montezuma, Fábio Beneduce, Horácio Dídimo, Almir Mota e muitos outros.

O evento a que nos referimos se constituiu num verdadeiro banquete literário, com vários pensamentos migrando em uma só direção: a difusão da cultura regional, através de uma das mais completas expressões artísticas, a Arte Literária, pois a Literatura Infantil não é só arte, é arte polivalente, no sentido de que se liga muito a qualquer outra linguagem artística, como à música, à dança, ao teatro e à pintura. É, por si só, interdisciplinar.

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