• Nenhum resultado encontrado

2 PARLAMENTARISMO REVOLUCIONÁRIO: UMA TRADIÇÃO HISTÓRICA

2.9 O livro A questão parlamentar e a Internacional Comunista: uma breve análise

O livro intitulado A questão parlamentar e a Internacional Comunista, reúne nove textos sobre o tema, foi publicado na cidade de Lisboa, Portugal, pela editora do Secretariado Unificado da IV Internacional (SU-QI), Antídoto, hoje Combate, e mesmo não estando datado inferimos pela Introdução que é da primavera de 1975.

Depois da criação da Quarta Internacional por Trotsky em 1938, o assassinato deste pelas mãos do stalinismo no México e a Segunda Guerra Mundial, em 1953 o Secretariado Internacional influenciado pelo trotskista grego Michel Pablo apoiado pela maioria de sessões define uma política tática de entrismo nos Partidos Socialistas e os Partidos Comunistas. Aqueles que são contrários a esta política formam no mesmo ano o Comité Internacional da Quarta Internacional (CI-QI).

Na década posterior avançaram em posições políticas convergentes, por exemplo em relação a oposição ao stalinismo nos levantes da Polônia e Hungria em 1956, o apoio a revolução cubana de 1959 que em 1961 se declara socialista e a luta pela Independência da Argélia. Enquanto isso várias sessões renunciam a dirigir Partidos Comunistas e decidem construir entre o Secretariado Internacional e o Comité Internacional, um comité conjunto para preparar um Congresso e uma Conferência Mundial em 1963 com o objetivo de reunificar a IV Internacional. Desta forma foi criado o Secretariado Unificado da IV Internacional, estando a direção conformada por Pierre Franck, Ernest Mandel, Livio Maitan y Joseph Hansen, como mencionamos no capítulo 2.

A Introdução, não está assinada, mas expressa a posição política dos editores, menciona três debates: reforma ou revolução, delimita e diferencia bem bolchevismo de stalinismo e a polêmica parlamentarismo revolucionário de abstencionismo na III Internacional que é o debate que estrutura todo o livro.

O primeiro artigo é de Grigori Zinoviev: O parlamentarismo e a luta pelos soviets, que faz parte de uma circular do Comité Executivo da Internacional Comunista de setembro de 1919, que expressa uma necessidade de unificar a tática sobre o tema. Todos os grupos concordam em reconhecer a luta pela ditadura do proletariado sob a forma de poder dos soviets mas é preciso distinguir claramente duas questões que não tem nenhuma ligação lógica: o reconhecimento do princípio dos soviets e o parlamentarismo. Importante diferenciar o Parlamentarismo como uma forma desejável de organização do Estado da utilização do Parlamento com o objetivo de contribuir com a revolução. Tem

que ficar claro que a forma da ditadura do proletariado são os soviets, assim que a palavra de ordem para todos os países deve ser: Abaixo o Parlamento! Viva o poder dos Soviets! Mas, falado isso, para Zinoviev é possível utilizar o Parlamento com o objetivo de desenvolver a luta revolucionária de classe. Apresenta os exemplos dos bolcheviques que participaram nas eleições para assembleia Constituinte e dissolveram 24 horas depois para realizar o poder dos soviets ou os deputados que tiveram na Duma do czar, o de Karl Liebknecht na Alemanha e Zeth Hoeglund na Suécia, assim como os parlamentares revolucionários búlgaros. Importante que seja entendido como uma questão tática a utilização do parlamento em proveito de uma estratégia comunista enquanto não se tenha força para derrubá-lo, sabendo que o centro de gravidade está na luta extraparlamentar, que as intervenções no Parlamento correspondem à essas lutas, que façam trabalho legal e ilegal, estejam dirigidos pelo partido e não se enredem nas formas parlamentares.

Na continuação se apresentam três discursos sobre o tema no mencionado II Congresso da Internacional Comunista, os de Nicolai Bukharine, de Amadeo Bordiga defendendo a posição da fração abstencionista italiana e o discurso de Vladimir I. Lenin. Para Bukharine o parlamentarismo revolucionário é um novo parlamentarismo, porque os soviets operários são instrumentos de combate do proletariado, mas que não existem fora da Rússia soviética, o que existem são os Parlamentos burgueses, e se deve participar para destruí-lo a partir de seu interior. Nos parlamentos burgueses deve-se ter espiões próprios, agente de informações que trabalhem de forma permanente com a classe dominante burguesa mantendo a independência política.

A diferença central do novo parlamentarismo do parlamentarismo revolucionário, com o da II Internacional, é que antes esses parlamentares tinham uma relação orgânica com o Parlamento se integravam como parte integrante do sistema, e agora não, são uma ação parlamentar que se relaciona com o movimento operário de fora do Parlamento em lutas extra institucionais. Retoma os exemplos também dos bolcheviques, de Karl Liebknecht na Alemanha e Zeth Höglund na Suécia, assim como os parlamentares revolucionários búlgaros, destacando que é central a questão da construção do partido.

Bukharine conclui que o velho parlamentarismo dos oportunistas será superado por um novo parlamentarismo verdadeiramente revolucionário, entendido como um método tático no marco de uma estratégia para a derrubada da burguesia, a destruição do Estado e do sistema capitalista.

O terceiro texto é o discurso de Amadeo Bordiga como representante da fração abstencionista italiana no mesmo II Congresso da Internacional Comunista de Julho de

1920. A posição dos abstencionistas é um antiparlamentarismo, cuja a diferença dos anarquistas que são por princípio ou os sindicalistas que também negam a ação política, que está é formulada, no caso da fração esquerda do Partido Socialista Italiano (PSI), a partir de uma interpretação das críticas de Marx à democracia burguesa. Entendem que deve ser o Parlamento a primeira máquina burguesa a ser destruída, propondo boicote às eleições e aos órgãos burgueses, agitando a ditadura do proletariado. Reconhece o papel de parlamentares revolucionários como Karl Liebknetch na Alemanha e Zeth Höglund na Suécia, mas realiza uma comparação com os parlamentares socialdemocratas e chegam a conclusão da necessidade de boicote das eleições burguesas (ZINOVIEV, BORDIGA et al.; Sem data, p. 39-49).

No quarto texto temos o discurso de Valdimir I. Lenin no mesmo Congresso da Internacional, o que foi uma resposta política ao grupo representado por Amadeo Bordiga. Para Lenin, como membros do Parlamento burguês é possível em determinadas condições históricas, sendo que os soviets não podem se construir artificialmente, lutar contra a sociedade burguesa e o parlamentarismo. Justamente é preciso lutar contra as ilusões parlamentares desde o interior do próprio parlamento e mostrar as massas a verdade dos fatos. Os comunistas, para Lenin, são obrigados a travar luta no seio do próprio Parlamento para o destruir.

Uma questão política relevante tem que ser tida em consideração, se todas as classes são levadas ao Parlamento, a participar da luta parlamentar mesmo com hegemonia burguesa é porque os conflitos de classe se refletem no Parlamento. Se o argumento é que não se pode confiar nos deputados comunistas, caso não exista disciplina partidária, a pergunta é por quê deveria existir Partidos Comunistas tão fracos de disciplina durante a ditadura do proletariado.

O quinto texto é uma breve resposta de Bordiga a Lenin, onde refirma que a recusa a participar do Parlamento é que essa instituição deixou de influir nos acontecimentos num sentido revolucionário.

Na sexta parte temos o uma sessão do livro Esquerdismo, Doença Infantil do

Comunismo, de Vladimir I. Lenin, escrito em 1920: Deve-se participar nos Parlamentos burgueses? no qual realiza a defesa e validade dessa tática polemizando centralmente

com os esquerdistas Alemães e Holandeses.

Lênin afirma que o Parlamento burguês constitui um espaço a ser ocupado pelos revolucionários com o objetivo de agitar um programa revolucionário, tal como consta nos documentos da III internacional.

Discutindo contra as tendências ultra-esquerdistas da Internacional Comunista, que consideravam uma traição de princípios participar no Parlamento burgûes, Lênin reafirmou sua postura de que os marxistas na época imperialista devem sim ocupar todos os mecanismos legais que possibilitem difundir o programa da revolução socialista para educar as massas operárias que ainda depositavam sua confiança nas instituições do Estado burguês, e dessa forma fazer o uso tático do parlamento burguês dentro de uma estratégia maior, a saber, revolucionária.

Afirma Lenin em Esquerdismo, Doença Infantil do Comunismo:

A participação num parlamento democrático-burguês, longe de prejudicar o proletariado revolucionário, permite-lhe demonstrar com maior facilidade às massas atrasadas a razão por que semelhantes parlamentos devem ser dissolvidos, facilita o êxito de sua dissolução, facilita a ‘supressão política’ do parlamentarismo burguês. (LENIN, 1981, p.63-64).

O revolucionário russo continua desenvolvendo o tema numa parte de seu livro

Marxismo e revisionismo:

Todo aquele que não compreender a inelutável dialética interna do parlamentarismo e do democratismo burguês, dialética que conduz a uma solução do conflito ainda mais brutal que anteriormente, fazendo intervir com mais intensidade a violência de massa, jamais saberá conduzir no terreno desde parlamentarismo uma propaganda e uma agitação conformes aos nossos princípios e susceptíveis de preparar de fato as massas operárias para que participem vitoriosamente nesses conflitos. (LENIN, 1971, p. 63-64).

Por sua vez, na sétima parte do livro constam as teses aprovadas no II Congresso da III Internacional sobre o tema, com introdução de Trotsky e as Teses de Bukarine e Lenin, na parte intitulada: O Partido Comunista e o Parlamentarismo. É importante destacar que neste livro não aparece publicada a Terceira parte desta resolução que é sobre a tática. Sendo assim complementamos com os Manifestos, Teses e Resoluções do 2.º

Congresso da III Internacional, a Internacional Comunista (IC), realizado em Moscou

em julho de 1920, onde na parte dedicada ao Partido Comunista e o Parlamentarismo a resolução aparece completa.

A oitava parte apresenta as Teses sobre o parlamentarismo apresentadas pela

fração abstencionista comunista do Partido Socialista Italiano e a nona e última parte é

Sobre o tema podemos incorporar criticamente outros dois textos. Um de Lucio Magri: Parlamento y consejos obreros, que forma parte do livro Consejos Obreros y

Democracia Socialista, na coleção de Cadernos de Passado y presente com o número 33,

assim como Revolución socialista y antiparlamentarismo de Gyorgy Lukács que leva o número 44 na mesma coleção.