Fonte: Google Maps, adaptado pela autora, 2014.
Paralelamente a esse quadro protetor do direito à cidade dos moradores da área, a partir dos anos 1960 até hoje, pela sua posição central (2,5 km do centro) e imbricada entre as áreas estratégicas do pólo médico da Ilha do Leite e a zona residencial e comercial det al.to padrão de Boa Viagem que já se expandeu até o antigo bairro popular do Pina, moradores começaram a serem expulsos por diversos motivos. Assim, em 1975, as várias enchentes que ocorriam no Recife e em particular no Coque e outras partes da cidade justificaram o desvio do braço do Capibaribe e a remoção por motivo de insalubridade dos moradores da ilha que eles chamavam de Ilha da Pitangueira e hoje se chama Ilha do Zeca. Não existem estimativas exatas do número de moradores realocados, mas vários entrevistados citam que entre 2.000 pessoas e 5.000 pessoas moravam no lugar, fato que confirma Mayrinck (1991) e que foram reassentadas em conjuntos habitacionais no Ibura no Recife e no Janga em Paulista, bairros periféricos da região metropolitana. Interessante notar que dois decretos de 2008 e 2012 permitem a implantação numa parte da Ilha do Zeca (32 hectares) de empreendimentos de 28 pavimentos.
Em seguida, a execução de várias obras justificou a remoções de moradores contra indemnização ou auxílio-moradia, estratégias que não garantiram o direito à
82 moradia dessas pessoas: a implantação do metrô, a construção e depois ampliação do viaduto Capitão Temudo e a instalação de equipamentos urbanos (fórum de justiça, AACD etc.), como o mostra a tabela a seguir. Lima Junior (2013) estimou assim que o Coque já perdeu 51% de seu território original, como já vimos na introdução.
Tabela 7: Obras que Removeram Moradores do Coque
ANO OBRA
1960
Obra de desvio do Rio Capibaribe, houve remoção dos moradores da Ilha da Pitangueira, hoje conhecida como a Ilha do Zeca, para o Janga e UR 10, no Íbura, numa estimativa de mais de 5.000 moradores (Mayrinck,
1991). O principal motivo alegado para a remoção foi a insalubridade da área, mas dois decretos de 2008 e 2012 estão permitindo construções na
área.
1978 Na construção do viaduto Capitão Temudo, houve remoção dos moradores da Vila do Papel.
1982
Para a construção do Metrô, houve remoção dos moradores da beira da linha. A empresa de urbanização do recife - URB, segundo um artigo
publicado pelo Diário de Pernambuco do dia 5 de fevereiro de 1980, desapropriou e realocou uma média de 700 famílias do Coque para a construção do metrô. A previsão era construir novas casas no entorno para
que a população possa continuar morando no bairro, o que foi feito através do programa Promorar, mas numa proporção menor (350 casas).
1998 Na construção do Fórum e AACD, houve remoção dos moradores da Vila Jesus.
2002 Na construção das alças do viaduto Capitão Temudo, houve remoção dos moradores da Vila Pantanal e Vila do Papel.
2013 Para a construção do Terminal Integrado de Passageiros da Joana Bezerra pelo governo do Estado de Pernambuco: foram removidos os moradores do Sítio Histórico do Cajueiro do Coque e derrubadas árvores
83 centenária.
2013
Para a construção do muro que cercou o terreno doado ao OAB, houve remoção dos feirantes.
2013 - 2014
Para a realização da obra de revestimento do canal Ibiporão, houve e ainda tem remoção dos moradores que moravam na beira do canal.
Fonte: Ponto de Cultura do Espaço Livre do Coque, completado pela autora.
Paralelamente, a área está sofrendo novas expulsões de moradores para permitir a realização de obras públicas e a implantação de equipamentos urbanos, tais como a Operação Urbana Consorciada - OUC Joana Bezerra, aprovada pela lei 17.645/2010 que visava a implantação de um pólo jurídico (hoje cancelada) e que expulsou os feirantes de um terreno, cercado até hoje por um muro erguido pela Ordem dos Advogados do Brasil - OAB ou a implantação do terminal integrado de ônibus da Joana Bezerra. Vale salientar que frente a essas expulsões e fora as casas construídas pelo programa PROMORAR nos anos 1980, nenhuma moradia de interesse social foi construída no Coque para assegurar o direito à moradia dos expulsados. Um conjunto habitacional chamado “Vila Brasil I”, localizado no mapa 11 abaixo, está atualmente sendo construído fora do zoneamento da ZEIS, para realojar somente as pessoas da ZEIS dos Coelhos e está prevista a construção de outro conjunto habitacional na rua Realeza como foi anunciado pelo Prefeito Geraldo Julho em setembro de 201334 através de uma parceria com o programa Minha Casa, Minha Vida, do Governo Federal e destinado aos moradores do Coque, Coelhos e Vila Brasil.
34 Disponível em: <http://www2.recife.pe.gov.br/geraldo-anuncia-upinha-dia-habitacional-compaz-e- outras-acoes-para-o-coque/>
84 Avanços, estagnações ou retrocessos em termo de inserção sócio-espacial
No sentido de problematizar os desafios da inserção sócio-espacial da área, elaboramos critérios a ser verificados através de várias fontes de coleta e análise de dados já apresentadas na introdução.
Ao nível espacial, verificamos a evolução de parâmetros urbanísticos e arquitetônicos entre 1979 e hoje, em particular no que avançou em termos de condições de habitabilidade, o que não avançou ou até mesmo regrediu.
Ao nível social, nós focalizamos primeiramente sobre as relações do Coque com o resto da cidade, em particular na mobilidade que os moradores da área têm, verificando assim em que medida se dão as trocas entre os diferentes pedaços da cidade. Num segundo tempo, nos interessamos nas relações entre poder público, moradores e canais de participação sobre os projetos de urbanização do Coque.
Em relação à unidade habitacional, apesar do quadro legal e dos instrumentos existindo que priorizam expressamente as melhorias de habitabilidade da área para os moradores de baixa renda, a ZEIS do Coque não foi urbanizada por completo, existindo áreas com diferentes níveis de urbanização. Assim, vivem lado a lado moradores em áreas urbanizadas que são chamadas “as Vilas” e outros em áreas com condições de habitabilidade muito precárias como o Espólio Estevinho e a Areinha.
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