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LORCA E A INFLUÊNCIA POPULAR — EL CANTE JONDO

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 76-86)

5. A ANÁLISE DA POESIA DE LORCA

5.1 LORCA E A INFLUÊNCIA POPULAR — EL CANTE JONDO

Para se entender as influências que Neruda sofrerá de Lorca é fundamental entender como Federico García Lorca absorverá em sua poesia a influência da cultura popular, do Cante Jondo, e através deste, da influência árabe e cigana na Espanha. Lorca é o mais multifacético dos poetas da Geração de 1927, que sofre um sentimento de perda de referência, derivado do fim do Império Espanhol. Os poetas não sabiam qual era o papel da Espanha e dos seus intelectuais no século XX. Por conta desta decadência espanhola, há uma busca de um retorno poético, a busca de um novo “espanholismo”. Lorca será assim, contraditoriamente, o mais espanhol, o mais universal e o mais local de todos os poetas espanhóis. Ele conseguirá isto, porque se recebe influência do passado espanhol, esta será estética, na busca inicial de um gongorismo que acabará por soar pouco em seus versos. Sua busca do passado, o remeterá ao futuro, aceitará os ritmos, a musicalidade dos marginais apátridas na Espanha, os mouros e os ciganos. Com isto sua poesia será a mais inovadora, ao mesmo tempo que sorverá séculos de tradição multicultural negada na Espanha tradicional católica e imperial. Lorca será o poeta dos marginais. Na busca de um novo espanholismo pela Geração de 1927, ele será internacional e multicultural, sem sequer necessitar sair da temática andaluz.

O Cante Jondo é uma marca indelével e permanente na sua poesia, tanto na forma, no ritmo interno e na musicalidade, quanto na temática “Bodas de Sangre”, “Romance de la Luna”. Lorca não só foi influenciado pelo Cante Jondo, foi um estudioso do ritmo e da poesia cigana, tendo escrito trabalhos teóricos e feito conferências sobre o tema. Numa Espanha convulsionada, isto por si só era uma opção de classe, os ciganos, povo nômade por excelência e marginalizado, tanto na idade média, quanto no nascente capitalismo espanhol, o lumpesinato perseguido e apátrida.

A Espanha vivia uma transição difícil, antigo império colonial, seu poderio e sua riqueza também foram sua desgraça. O ouro espanhol financiou a revolução industrial na Inglaterra. O fácil acesso da Espanha ao ouro e a prata das Américas, sem investimento nas manufaturas e na futura industrialização, acabou por tornar a

indústria espanhola incipiente e a Espanha completamente dependente dos países industrializados dominantes, principalmente depois da derrota da “armada invencível”. Mesmo numa situação de dependência, indústria desestruturada, estrutura feudal no campo e na sociedade. Os ciganos eram duplamente marginalizados e estigmatizados: na sociedade feudal, perseguidos pela religião oficial por paganismo; no capitalismo, incompatíveis por seu nomadismo com a revolução burguesa.

Neste capítulo, vamos trabalhar com a transcrição de uma conferência proferida por Lorca em um jornal chamado, El Noticiero Granadino, em dias posteriores a uma conferência proferida em Sevilha, em 1922. Segundo Lorca, o Cante Jondo é um conjunto de canções cujo tipo genuíno e perfeito é a “siguiriya gitana”, vejamos a definição de Lorca:

Se da el nombre de cante jondo a un grupo de canciones andaluzas, cuyo tipo genuino y perfecto es la siriguiya gitana, de las que derivan otras canciones aún conservadas por el pueblo, como los polos, martinetes, carceleras y soleares. La coplas llamadas malagueña, granadinas, rondeñas, peteneras, etc., no pueden considerarse más que como consecuencia de las antes citadas, y tanto por su arquitectura como por su ritmo, difieren de las otras. Estas son llamadas flamencas.

El gran maestro Manuel de Falla, auténtica gloria de España y alma de este concurso, cree que la caña y la playera, hoy desaparecidas, casi por completo, tienen en su primitivo estilo la misma composición que la siguiriya y sus gemelas, y cree que dichas canciones fueron, en tiempo no lejano, simples variantes de la citada canción. Textos relativamente recientes, le hacen suponer que la caña y la playera ocuparon en el primer tercio del siglo pasado, el lugar que hoy asignamos a la siguiriya gitana. Estébanez Calderón, en sus lindísimas “Escenas andaluzas”, hace notar que la caña es el tronco primitivo de todos los cantares, que conservan su filiación árabe y morisca (…)(LORCA, FALLA, 2005)

Assim, o Cante Jondo é, desde seus primórdios, uma mescla de culturas, Andaluzia foi um dos principais polos de dominação e da cultura árabe, assim, o ritmo, a musicalidade e a poesia, herdada pelos ciganos, se deu com uma mescla em relação a cultura mourisca que lá havia antes. Lorca mostra que a caña é o tronco primitivo destes cantares, e tem origem árabe, ele observa com agudeza que caña se diferencia pouco de gamis, que segundo Lorca daria o similar árabe para canto. Lorca, todavia, diz que o Cante Jondo é uma mescla de música indiana, segundo ele, os grupos originais de ciganos que habitavam em Andaluzia teriam vindo da Índia e de lá trazido sua música, na Espanha se mesclou, o cante jondo, aos ritmos árabes, enquanto o Flamenco, seu parente próximo, recebeu uma mescla maior da cultura europeia.

cultural, mas esta mistura de ritmos, harmonias e estéticas musicais e poéticas, com influência dos vários povos que habitavam a Andaluzia, tanto que o Cante Jondo não se desenvolve em outras regiões da Espanha. Para García Lorca, o Cante Jondo tem influência até da igreja católica, em seu canto litúrgico, gregoriano lamentoso, na invasão da península pelos árabes islâmicos, houve tolerância religiosa e os cristãos puderam conservar sua crença, cultos, culturas, festas e tradições. Assim, na invasão islâmica, ao canto católico, juntou-se a música dos árabes sarracenos, criando uma nova forma de cultura popular. Por fim, a chegada dos ciganos à Espanha foi o último elemento que faltava para a estrutura final que se conhecia então como Cante Jondo. Ratificamos, que a prova de que ele não é um canto genuinamente, ou puramente cigano, é que ele não existe em nenhum outro lugar que não seja Andaluzia, que ele é resultado desta mescla cultural única, dos povos que habitavam esta região. Vejamos o que ele diz:

Las diferencias esenciales del cante jondo con el flamenco, consiste en que el origen del primero hay que buscarlo en los primitivos sistemas musicales de la India, es decir, en las primeras manifestaciones del canto, mientras que el segundo, consecuencia del primero, puede decirse que toma su forma definitiva en el siglo XVIII.

El primero, es un canto teñido por el color misterioso de las primeras edades, el segundo, es un canto relativamente moderno, cuyo interés emocional desaparece ante aquél. Color espiritual y color local, he aquí la honda diferencia.

Es decir, el Cante Jondo, acercándose a los primitivos sistemas musicales de la India, es tan sólo un balbucio, es una emisión más alta o más baja de la voz, se una maravillosa ondulación bucal, que rompe las celdas sonoras de nuestra escala atemperada, que no cabe en el pentagrama rígido y frío de nuestra música actual, y abre en mil pétalos las flores herméticos de los semitonos.

El cante Flamenco no procede por ondulación sino por saltos; como en nuestra música tiene un ritmo seguro y nació cuando ya hacía siglos que Guido d´Arezzo había dado nombre a las notas.

El Cante Flamenco se acerca al trino del pájaro, al canto del gallo y a las músicas naturales del bosque y la fuente.

Es, pues, un rarísimo ejemplar de canto primitivo, el más viejo de toda Europa, que lleva en sus notas de desnuda e escalofriante emoción de las primeras razas orientales.

El maestro Falla, que ha estudiado profundamente la cuestión y del cual yo me documento, afirma que la siriguiriya gitana es la canción tipo del grupo Cante Jondo y declara con rotundidad que es el único canto que en nuestro continente ha conservado toda su pureza, tanto por su composición, como por su estilo, las cualidades que lleva en sí el cante primitivo de los pueblos orientales (LORCA, FALLA, 2005).

Assim, o Cante Jondo é uma mescla de cantos andaluzes, carregados de orientalismo que tem origem na civilização bizantina. Segundo a versão de Lorca, os ciganos chegaram à Espanha por volta de 1400, fugindo da Índia, em meio ao conflito de Mouros com Cristãos, expulsos, segundo a versão meio mítica e lendária,

pelos cem mil guerreiros do Grande Tamerlan.

Conceituando, em poucas linhas o que seja o Cante Jondo, é importante entender a influência que ele vai ter na poesia lorquiana. Se vemos nas próprias notas de Lorca, há questões conceituais estéticas importantes, como a “pureza” e o “primitivismo” do Canto, há em todos os escritores da Geração de 1927, a busca de um “espanholismo perdido”, com a timidez da classe burguesa espanhola, e a decadência de sua aristocracia, a opção pelos pobres e marginalizados é uma das formas de procurar uma nova identidade nas camadas populares. Também há questões técnicas. O Cante Jondo dialoga com a temática lorquiana, já que o desespero, a dor, a morte, são temas afeitos à Lorca, vejamos na poesia do Cante Jondo:

Ay de mí, perdí el camino; en esta triste montaña ay de mí, perdí el camino; déxame meté l´rebañu por Dios en la to cabaña. Entre la espesa flubina, ¡ay de mí, perdí el camino! déxame pasar la noche en la cabaña contigo. Perdí el camino

entre la niebla del monte,

¡ay de mí, perdí el camino! (LORCA, FALLA, 2005).

Lorca alimenta-se de boa parte desta temática e estética. A repetição de palavras para marcar o ritmo, dor, solidão, desespero, lamento. O Cante Jondo dialoga com a temática da poesia de Lorca. Federico, o poeta da lua, da noite, da solidão, do desespero, da agonia, do subconsciente, do onírico, que acabará por levá-lo até o surrealismo. Lorca é um sorvedouro de influências e temáticas, um calidoscópio que leva para a estética canônica acadêmica todo o influxo da cultura popular, por exemplo:

Romance de la Luna Luna — A Conchita García Lorca La luna vino a la fragua

con su polisón de nardos. El niño la mira, mira. El niño la está mirando. En el aire conmovido mueve la luna sus brazos y enseña lúbrica y pura, sus senos de duro estaño. Huye luna, luna, luna. Si vinieran los gitanos, harián con tu corazón collares y anillos blancos. Niño, déjame que baile.

Cuando vengan los gitanos, te encontrarán sobre el yunque con los ojillos cerrados.

Huye luna, luna, luna, que ya siento tus caballos. Niño, déjame, no pises mi blancor almidonado. El jinete se acercaba tocando el tambor del llano. Dentro de la fragua el niño tiene los ojos cerrados. Por el olívar venían,

bronce y sueño, los gitanos. Las cabezas levantadas y los ojos entornados. ¡Cómo canta la zumaya, ay cómo canta el árbol! Por el cielo va la luna. con un niño en la mano. Dentro de la fragua lloran, dando gritos los gitanos, El aire la vela, vela.

El aire la está velando (LORCA, 1999, 350).

O Romance de la luna luna, um dos poemas mais famosos de Lorca tem transplantado para a poesia acadêmica vários elementos populares do Cante Jondo. Primeiro o uso de versos com ritmo musical sem rima. Boa parte da estrutura rítmica de toda a poética de Lorca, se dá na repetição de palavras ou estruturas, assim como a canção popular feita na rua, as coplas. Estruturas muito comuns na canção popular medieval e que chegaram até o Brasil através dos cordéis e dos repentistas. Também a temática. O mundo de Lorca é caótico, não é o mundo romântico que busca uma redenção e tem heróis com valores decadentes cavalheirescos. Há uma fotografia da realidade, crua, sem que seja suavizada, todo martírio, dor, mas também a musicalidade, a festa, a sexualidade (Bodas de Sangre).

Neste poema, parece que há uma fotografia de uma cena, como se Lorca fosse um pintor ou um cineasta e captasse o momento, incluído seu movimento. O poeta não influencia moralmente no texto, não faz nenhum tipo de evocação, parece que ele apenas pinta a estrutura que vê, como um pintor numa tela. Isto não signifique que ele seja neutro, a própria escolha da temática e da estética, já é uma posição, humanista e antiburguesa por excelência, além de inovadora popular, renovando a estrutura temática e estética da Espanha. Luna, gitanos, morte (vela, “ojos” cerrados), os temas de Lorca se repetem neste poema e se fixam como uma

nova estrutura e marca poética. Vejamos outro poema extremamente famoso de Lorca:

La luna y la muerte

La luna tiene dientes de marfil ¡Qué vieja y qué triste asoma! Están los cauces secos, los campos sin verdores y los árboles mustios sin nidos y sin hojas. Donde Muerte, arrugada, pasea por sauzales con su absurdo de ilusiones remotas. Va vendiendo colores de cera y de tormenta como una hada de cuento mala e enredadora La luna le ha comprado pintura de la Muerte. En esta noche turbía ¡está la luna loca! Yo mientras tanto pongo en mi pecho sombrío una feria música

con las tiendas de sombra (LORCA, 1999, pp. 280).

Lorca expressa neste poema os temas mais variados do Oriente. A morte, a lua (identificada com a morte, a escuridão), o sacrifício. Nota-se também o elemento pictórico, “pintura de la muerte”, o mundo como representação, a poesia como pintura a agonia de viver à sombra da morte, a noite, que evoca o sonho e o subconsciente: elementos, estes últimos que fariam a passagem para a poesia surrealista, que não é tema deste texto. Como o tema desta dissertação é a influência do Cante Jondo, e as influências que sofrem o Cante Jondo. Vamos agora mostrar como esta opção pela confluência popular Andaluz, importante centro de difusão da cultura árabe na Península Ibérica, fez com que Lorca fosse o poeta espanhol que mais vai influenciar a poesia árabe, inclusive a contemporânea.

Segundo Maritza Requena, a obra lorquiana realiza um resgate do romano ou do latino, do outro lado do árabe, no ritmo, nas palavras e na temática. Lorca é um retrato da diversidade cultural que conforma la identidade espanhola, o principal poeta desta confluência da Geração de 1927, e cuja influência vai transcender esta geração e as fronteiras espanholas. Córdoba, Granada e Andaluzia foram as grandes cidades de dominação árabe, assim, a cultura andaluz reflete estes séculos de dominação e influência, como inclusive já vimos, ao explicar o

Cante Jondo. Segundo Maritza Requena, os mesmos temas do sacrifício, do amor sem fim e vivo aparecem expressos com o mesmo fim nos poetas árabes antecessores de Lorca na cultura árabe andaluz.

Em Lorca se fundem, o erudito (Góngora), o popular e o folclórico; O galego e o árabe andaluz; o antigo e o tradicional e o novo e vanguardista, o espanhol e o universal, o mais universal dos espanhóis, por ser o mais espanhol dos universais. Em Lorca pulsa o espanholismo trágico de Cervantes em Quixote, é o trágico da aridez da terra que foi um império, mas não fez a passagem deste império para um país que tivesse hegemonia na modernidade, o bucólico, o trágico e o cômico de Quixote. La tauromaquia espanhola como o próprio Lorca denominou, como busca de uma força que estaria na terra espanhola, a resseca Mancha e a Andaluzia, esta busca de uma identidade e uma essência perdida, que o fazem símbolo de uma época trágica para os espanhóis. Era que culmina no seu sacrifício, em sua tragédia pessoal, como se ele fora o sacrifício humano, o cordeiro, desta busca incessante um novo ente espanhol.

Por conta destas contradições vivas que foi a poesia lorquiana, de suas opções temáticas e estéticas, ele foi o poeta predileto dos jovens poetas árabes. Além das questões estéticas, há questões políticas que explicam esta confluência (Lorca influenciado pelo arabismo, Lorca influencia os árabes). As opções que Lorca fez, sua identidade socialista (mesmo que não militante com o PSOE) e sua execução por razões político-estéticas. E porque dizemos político estético, porque Lorca não pode ser considerado um militante socialista como Miguel Hernández. Todavia, todas as suas opções, seu laicismo rebelde, sua opção pela língua, temática e estética popular, cigana, com extrema influência árabe, seu teatro mambembe e popular, dedicado às massas pobres espanholas; tudo o identifica como um escritor libertário militante. Sua influência moura por suas opções populares podem-se ver em poemas que louvam as cidades espanholas Mouriscas:

Sevilla

Sevilla es una torre llena de arqueros finos. Sevilla para herir. Córdoba para morir. Una ciudad que acecha largos ritmos,

y los enrosca como laberintos.

Como tallos de parra encendidos.

¡Sevilla para herir! Bajo el arco del cielo, sobre su llano limpio, dispara la constante saeta de su río. ¡Córdoba para morir! Y loca de horizonte, mezcla en su vino lo amargo de Don Juan y lo perfecto de Dioniso. Sevilla para herir.

¡Siempre Sevilla para herir! (LORCA, 1999, pp. 378).

O elogio às cidades mouras, a estética de repetição popular, como se fora uma canção ou uma procissão, o poema limpo, claro, sem exageros, transborda todavia da referência popular e faz um retrato de uma das mais importantes cidades de influência mourisca. Aqui uma observação é necessária, este poema de Lorca aqui transcrito está bem longe dos poemas prosa, mesmo que neles haja a liberação da antiga métrica italiana, e haja uma mudança para versos livres assimétricos, os poemas são musicais com ritmo marcado internamente mesmo que não rimados. Lorca vai retomar na sua ruptura, na verdade, a tradição anterior da poesia espanhola, com origens mouriscas, do ritmo musicado interno, muitas vezes dado pela repetição de palavras, como em Verde que te quiero verde, assim, a influência mourisca e cigana faz de Lorca o poeta espanhol, local e internacionalista por excelência. Vejamos um poema que se enquadra perfeitamente na referência estética temática que aqui elucidamos:

Canción del Jinete Muerto En la luna negra

de los bandoleros, cantan las espuelas. Caballito negro.

¿Dónde llevas tu jinete muerto? …Las duras espuelas

del bandido inmóvil que perdió las riendas. Caballito frío.

¡Qué perfume de flor de cuchillo! En la luna negra,

sangraba el costado de Sierra Morena. Caballito negro.

¿Dónde llevas tu jinete muerto? La noche espolea

sus negros ijares clavándose estrellas. Caballito frío.

¡Qué perfume de flor de cuchillo! En la luna negra,

¡un grito! y el cuerno largo de la hoguera. Caballito negro.

¿Dónde llevas tu jinete muerto? (Lorca, 1999, pp. 290).

Já o título do poema é revolucionário, Canção do ginete morto, a morte não era um tabu para Lorca, antes, um tema recorrente, a noite, a escuridão (até o cavalo é negro), a beleza lúgubre (flor de cuchillo), enfim, a estética e a temática lorquiana estão prenhes de toda uma temática milenar, do embate dos povos que habitavam e habitam a região granadina. A temática árabe dialoga facilmente com a estética proposta por Lorca. O recebimento dos influxos árabes no ritmo e na métrica lorquiana, assim como sua temática, em que aparecem os povos marginalizados e as cidades de colonização árabe, reforçam os traços que o fariam ser amado e cantando por poetas islâmicos. A temática da lua, da noite, da morte, uma temática que aliás, dialogará com um movimento ao qual, sem aderir em manifestos, Lorca foi prenunciador na Espanha e um de seus incentivadores, o surrealismo, no qual o sonho, o onírico, o medo, a morte, o id, o subconsciente, todo o lado oculto do ser humano transborda. Sigamos na temática do lúgubre, da morte em Lorca:

Murió al amanecer Noche de cuatro lunas y un solo árbol, con una sola sombra y un solo pájaro. Busco en mi carne las huellas de tus labios. El manantial besa al viento sin tocarlo.

Llevo el no que me diste, en la palma de mi mano, como un limón de cera casi blanco.

Noche de cuatro lunas y un solo árbol,

En la punta de una aguja,

Está mi amor ¡girando! (LORCA, 1999, 316)

A obsessão pela morte, que era pessoal, mas que era também influência literária islâmica e cigana. Parecia uma previsão da tragédia de seu término precoce, ele era o poeta que morreu ao amanhecer. Numa noite surrealista de quatro luas e um campo desnudo de uma só árvore. Assim foi também a sua morte, a poesia

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 76-86)