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(%) LUGAR DO DESENHO Pré Total Cosmos 2,0 6,9 21,4 6,5 Céu 49,0 48,3 35,7 46,7 Superfície 49,0 44,8 42,9 46,7 Total 100,0 100,0 100,0 100,0 N 49 29 14 92 F2= 56,990 p=0,000

As crianças das três idades estudadas colocam Deus tanto no céu, quanto na superfície da Terra. Quando Deus está no céu, na grande maioria das vezes está dentro da atmosfera da Terra, embora algumas crianças das três faixas tenham desenhado Deus longe do planeta, entre as estrelas, numa visão mais cósmica.

A prece mais popular de todo o mundo cristão dirige-se ao “Pai nosso que estais no céu”. Desde as sociedades mais primitivas, ensina Eliade (2002) que:

O que está completamente fora de dúvida é a quase universalidade das crenças num ser divino celestial, criador do universo e assegurador da fertilidade da Terra (graças às chuvas que derrama). Esses seres são dotados de uma presciência e de uma sabedoria infinitas; as leis morais e frequentemente rituais do clã foram por ele instauradas durante a sua breve permanência ma terra. (p.39)

A categoria “transcendental”, segundo o mesmo autor, revela-se ao homem que contempla o céu de modo imediato, não como operação lógica, racional, mas simbólica:

O simbolismo é um dado imediato da consciência total, ou seja, do homem que se descobre como tal, do homem que toma consciência de sua posição no universo; estas descobertas primordiais estão ligadas de maneira tão orgânica ao seu drama que o mesmo simbolismo determina tanto a atividade de seu inconsciente quanto as mais nobres expressões de sua vida espiritual. (p.40)

Desta maneira, o céu simboliza a imutabilidade, o elevado, o infinito, o poderoso, tudo aquilo que um vivente da Terra é incapaz de alcançar, sendo, por excelência, a morada da divindade, o regulador da ordem cósmica e das potências superiores. No Novo Testamento, especialmente em Mateus, a expressão Reino dos Céus substitui por uma metáfora o impronunciável nome de Deus. No Apocalipse o céu é a morada de Deus, o lugar da Nova Jerusalém.

Jung, [1991c(1958)], a respeito do céu e dos sinais e significados que a psique moderna nele projeta, comenta que a situação de tensão atual consciente é tamanha, que, na presença de ameaça ao mundo, as projeções ampliam seus espaço para além das organizações e potências terrestres, “para o céu, isto é, para o espaço cósmico dos astros, onde outrora, os senhores dos destinos, os deuses, tinham sua sede nos planetas.”(p. 610). O céu é o lugar da ordem apaziguadora, e o que “proporciona à personalidade a maior unidade e totalidade possíveis. Ele cria a imagem da grande personalidade do homem-Deus, do homem primordial ou anthropos, [....], é um predecessor do Messias, a figura dogmaticamente definida de Cristo.” (p.622)

As crianças desenham Deus no céu, tanto indiferentemente dormindo, brincando, jogando futebol, vendo televisão, conversando com as estrelas, varrendo nuvens e cuidando de si mesmo, quanto se relacionando com a humanidade e

interferindo na vida. O nível de interferência também varia: ora Deus recebe no céu as almas dos que já morreram (Pré, e oitava série, meninas), ora atua escrevendo as leis (Pré e quarta série), apenas observando com maior ou menos satisfação o comportamento dos seres humanos: “Deus está chorando pelo que a humanidade faz com o livre arbítrio” – de uma menina da oitava série, ou diretamente fazendo milagres, principalmente nos desenhos das crianças da quarta série. De muitos desenhos de Deus, distanciado no céu, apenas emanam bênçãos, paz e amor para a humanidade.

Quase a metade das crianças das três idades medidas desenha deus na superfície da Terra, junto com os seres humanos. Tal aproximação de Deus com a humanidade pertence tanto ao universo cristão, quanto à humanidade de maneira mais geral. Segundo Eliade (2002), por toda parte a divindade celeste suprema cedeu lugar a outras formas religiosas. Embora a forma de tal substituição varie, seu sentido é sempre o mesmo: “a passagem da transcendência e da passividade dos seres celestes às formas religiosas dinâmicas, eficientes, facilmente acessíveis.” (p.51) Eliade fala de uma progressiva queda do sagrado no concreto, na qual a vida do homem e seu meio cada vez mais se impregnam de sacralidade. A hierofania celeste cede lugar a teofanias mais próximas, mais íntimas. Deus, na Terra, participa das atividades humanas. No desenho das crianças temos Deus plantando árvores até na oitava série, assim como batendo pênalti e fazendo cachorro-quente no fogão, ainda que apareça em forma de luz. Para as crianças menores, Deus brinca das mesmas brincadeiras que elas, e, prosaicamente, “passeia de ônibus com Jesus no fim de semana”. Temos Deus colhendo a fruta no jardim, dançando funk com sua namorada (Maria) e, principalmente para as crianças da quarta série, encarnado em Jesus morrendo na cruz. Nesta idade, Deus está preso na representação coletiva, cultural, humanizada, de Jesus. Como Jesus, passeia pela Terra tocando cegos e fazendo seus milagres, mas, mais frequentemente, morre na cruz. Trata-

se da idade na qual, segundo o desenvolvimento dentro dos círculos arquetípicos, descritos por Byington (1983), nas crianças, sob a influência patriarcal, imagens e símbolos se fixam nas tendências de adaptação ao meio externo, cultural, e manifestam- se num padrão que cultiva o aprendido, a tradição e o já conhecido. Mais tarde, já na adolescência e inserindo-se gradualmente no ciclo da alteridade, Deus, ainda que na superfície da Terra, já tem atividades mais espontâneas, como dar “um rolê na praia”, ou “dá um carro pro cara”.

1. E. Presença de atributos na imagem de Deus

Tabela 5: Distribuição dos atributos de Deus.

ATRIBUTO DO DESENHO (%) Presença 82,0 Ausência 18,0 Total 100,0 N 150

Tabela 5A: Distribuição dos atributos de Deus, quando presentes, quanto ao sexo.

SEXO (%) ATRIBUTO

DO

DESENHO Masculino Feminino Total

Presença 78,7 85,3 82,0 Ausência 21,3 14,7 18,0 Total 100,0 100,0 100,0 N 75 75 150 F2 = 1,13 p = 0,286