• Nenhum resultado encontrado

A luta pela efetivação da Lei nº 4.270 e os marginalizados do Grupo dos Contratados

3 A ASSOCIAÇÃO DE PROFESSORES DO ESTADO DO MARANHÃO:

3.5 Década de 1980: as contradições das lutas e o crescimento da entidade

3.5.1 A luta pela efetivação da Lei nº 4.270 e os marginalizados do Grupo dos Contratados

considerados fundamentais para a carreira do magistério:

a- prover condições para a profissionalização do magistério do 1º e 2º graus, mediante condigna remuneração, assegurando-lhe a permanência dos profissionais habilitados, inclusive, em todas as regiões do Estado;

b- definir responsabilidades e direitos na área do magistério, garantindo condições para o ingresso e progressão na carreira, de acordo com as habilitações adquiridas; c- estabelecer critério de movimentação de magistério, dentro de normas que atendam aos seus interesses e também aos sistemas de ensino;

d- definir as exigências de constantes aperfeiçoamento e atualização do profissional do magistério, oferecendo igualdade de tratamento entre os funcionários e os contratados no regime da legislação do trabalho.

O Estatuto do Magistério, portanto, estabeleceu a norma de um regime jurídico do pessoal docente e especialista em educação a nível do ensino de 1º e 2º Graus vinculado ao magistério oficial dos Estados e, em casos especiais, conforme previsto, também, aos Municípios.

Assim, para obter concessão de auxílio financeiro da União aos sistemas estaduais de ensino, os governos deveriam considerar o Decreto n.º 71.244, de 11 de outubro de 1972, que estabeleceu alguns desses critérios:

Art 1º. Para concessão do auxílio de que trata o artigo 54 da Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971, considera-se satisfatório o Estatuto do Magistério Público que contiver, entre outras, as seguintes disposições:

a) paridade da remuneração dos professores e especialistas com a fixada para outros cargos a cujos ocupantes se exija idêntico nível de formação;

b) igual tratamento de professores e especialistas, funcionários ou contratados; c) não discriminação entre professores em razão de atividade, área de estudo ou disciplina que ministrem;

d) processo de aperfeiçoamento dos professores ou especialista, e, em particular, o que envolva afastamento do pessoal do magistério para realização de cursos de especialização e atualização.

e) prazo máximo de um ano para o início do pagamento dos avanços verticais ou horizontais resultantes de maior titulação, a contar da data do requerimento que a comprove;

f) avanços horizontais por tempo de serviço e por atividade em locais inóspitos ou de difícil acesso, além dos previstos nos itens anteriores; e

g) normas sobre o regime jurídico e o campo de aplicação; conceitos que definam pessoal do magistério e sua atividades; direitos e vantagens especiais da carreira do magistério, incluindo promoção, acesso e regimes de trabalho; preceitos éticos

especiais; critérios de admissão e movimentação do pessoal; deveres e proibições especiais; administração das unidades escolares.

Art 2º. As normas deste Decreto aplicam-se também às fundações e entidades instituídas ou mantidas pelos Poderes Públicos.

Art 3º. Este Decreto entrará em vigor, para os convênios de concessão de auxílio federal a serem estabelecidos, a partir do ano de 1973, revogadas as disposições em contrário.17

A APEMA, naquele momento, como também ocorria com suas congêneres, em diferentes estados brasileiros, trabalhava pela reformulação e execução do Estatuto do Magistério que havia sido publicado no Diário Oficial em 31 de dezembro de 1973; mas, que não atendia aos anseios da categoria, uma vez que dava abertura para a execução da Lei n° 3.578 de 14 de novembro de 1974, responsável por nomear professores interinamente, trazendo insegurança e produzindo estagnação na carreira. (SILVA, 2013, p. 164).

A professora Darcy Moraes Reis ao conceder entrevista, ressalta uma reivindicação universal entre a categoria de professores do Brasil: “um melhor salário para o professor primário deveria ser pago”, e acrescentou,

[...] “que o Governador olhe para essa classe pois eles também são humanos. Melhores condições de trabalhos, porque o professor primário também é gente e pode-se considerá-los como os mais sofridos do magistério” (apud O IMPARCIAL, 15/10/1980, p. 7).

A professora Ana Maria Gama, nessa mesma reportagem, reivindicou: “gostaríamos que o governador esclarecesse a situação dos professores que ainda não foram enquadrados, além de um salário mais elevado para a classe” (id.).

Nas vozes das professoras é possível mensurar o nível de insatisfação do professorado, sobretudo, o grau de decadência em que se encontrava a educação básica pública maranhense, pois além de tudo o professor não tinha estabilidade no exercício do serviço público.

Como parte dos docentes da rede pública estadual atuavam, tanto na rede privada como na rede municipal de São Luís, foi a partir das lutas empreendidas pela efetivação do Estatuto do Magistério do município, em 1978, que os docentes passaram a reivindicar um novo estatuto para o grupo do magistério do ensino público estadual.

Essa reformulação do estatuto foi uma das principais reivindicações da categoria ao governador João Castelo (o último conduzido ao cargo indiretamente, exercendo mandato de 1979 a 1982), e a APEMA impôs ações efetivas em prol dessa pauta, reivindicando questões

De salário, de carga horária, de aprovação do estatuto do magistério... No governo de 1978 a 1982 que fui deputado, tivemos a aprovação do estatuto do magistério. A espinha dorsal do que existe hoje foi aprovado nessa época na Assembleia Legislativa, tem isso tudo lá. Nós lotamos aquela Rua do Egito, ali, a assembleia

17 Fonte: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1970-1979/decreto-71244-11-outubro-1972-419670-

lotada inteiramente de professores, foi o movimento maior do mundo. (MÁRIO CARNEIRO, Entrevista concedida em 22/01/2016, ANEXO B, p. XXXII)

Em 23 de dezembro de 1980, a Lei nº 4.270 que dispôs sobre o Estatuto do Magistério de 1º e 2º grau do Estado do Maranhão foi, finalmente, publicada, no Diário Oficial, trazendo em seus artigos, parágrafos e incisos, os seguintes princípios e objetivos:

Art. 1º - O presente Estatuto regula o provimento e a vacância dos cargos públicos do pessoal docente e especialista em educação, em nível do ensino de 1º e 2º Grau, para:

I – estimular a profissionalização do pessoal do magistério, mediante remuneração condigna, e assegurando-lhe a permanência em todas as regiões do Estado;

II – definir direitos e responsabilidades;

III – estabelecer requisitos e condições para o ingresso e a progressão na carreira; IV instituir incentivos financeiros e funcionais;

V – fixar critérios para a elevação e a movimentação de pessoal.

A categoria acreditava que os benefícios com uma lei dessa envergadura fosse de fato contribuir para trazer dias de mais tranquilidade ao professorado, que por serem em sua maioria contratados, sofriam com as sucessivas arbitrariedades impostas pelo governo.

E com a implantação do estatuto, aí a categoria se sentiu mais fortalecida, entendeu? [...] deu uma garantia maior, a categoria não tinha segurança. Quando entrou o chamado estatuto, todo mundo sentiu, inclusive, o impacto dessa luta, todo mundo se sentiu orgulhoso de ter participado disso. (ADAILTO CARVALHO, entrevista em concedida em 21/01/2016, ANEXO B, p. VII).

A grande questão era que, apesar das regras, os Estados e os municípios aprovavam e regulamentavam Estatutos do Magistério sem nenhum compromisso em cumprir os mesmos, conforme fica claro no discurso que foi proferido, naquela ocasião, pelo professor Antonio Anacleto Ferreira (empossado em 29/06/1981), presidente da APEMA: “O Novo Estatuto do Magistério está pronto, regulamentado, mas não atende, em seu todo, o que o professor deseja. A classe está querendo, pelo menos, que ele seja efetivado” (O IMPARCIAL, 20/11/1981).

Quando questionado sobre as críticas recebidas, o Secretário Estadual de Educação, professor Antonio Carlos Beckman, respondeu aos jornalistas nos seguintes termos:

[…] com a efetivação, todos os professores nomeados serão amparados pelo novo Estatuto. A medida de sua implantação, os demais professores serão atendidos. Ficarão de fora apenas os contratados, já que o Estatuto é elaborado especificamente para professores nomeados […] as críticas que vem sendo feitas ao novo Estatuto, muitas delas são gratuitas, não contribuem para nada. Estamos fazendo um trabalho de defesa do Magistério e vêm pessoas desprovidas de bons propósitos, criar um clima de inquietação. A nossa meta é apenas garantir aos professores a sempre almejada valorização da classe. E a lei de efetivação dos interinos já é um grande passo, já que os professores que estão de fora passarão a se beneficiar de todos os dispositivos do novo Estatuto e não só aqueles que se beneficiavam com o antigo. (O IMPARCIAL, 20/11/1981 p. 6)

Por aqueles dias, havia muitas preocupações no interior da categoria, uma delas se referia aos trabalhadores nomeados interinamente por meio da Lei n° 3.578 de 14 de novembro de 1974. Concernente ao o Art. 88 da Lei Estadual n° 6.110, de 15 de agosto de

1994, eram “professores, administradores escolares, inspetores escolares, orientadores educacionais e supervisores escolares” atuando no serviço público maranhense sob o aparato jurídico de uma legislação que não oferecia estabilidade.

Sobre os professores desse grupo de trabalhadores, o secretário de administração, José Antonio da Costa Brito, havia prometido que dentro de três meses, realizaria um “curso especial seletivo” que seria o passaporte para efetivação/nomeação dos mesmos. Assim, a expectativa era que após participação no curso viria a efetivação no Estado e finalmente gozariam dos benefícios do Estatuto do Magistério que acabara de ser aprovado.

No entanto, outra vicissitude acometia a categoria. Eram os professores “boias-frias” (contratados em regime de carga-horária, e maior parte da categoria docente pública estadual), tal qual o professor Antonio Anacleto Ferreira os denominava (O IMPARCIAL, 15/10/1981, p.5). Estes não poderiam participar do curso seletivo em razão de terem sido contratados por meio da Lei n° 4.277, dispositivo legal que deixava à margem a maior parte do professorado. Dito de outra forma, o Novo Estatuto do Magistério não abarcaria essa parcela da categoria em razão de não terem o direito a realizar o curso seletivo que lhes garantiria a efetivação na rede estadual de ensino. Em concordância com o professor Adailto Carvalho, militante de base da APEMA, lembramos que “antigamente tudo era por aula, hora-aula, e era uma dificuldade, não desse aula não tinha salário, dia que adoecia não tinha salário, era uma dificuldade, pensa?” (Entrevista concedida em 21/01/2016, ANEXO B, p. II)

A rede pública estadual maranhense, segundo edição de O Imparcial (15/10/1981, p.6), contava nesse período com aproximadamente 30 mil professores, no entanto, apenas 7 mil docentes estavam regularmente contratados para atuar no 1º Grau, e aproximadamente 800 profissionais no 2º Grau.

A grande maioria do professorado foi contratada por meio de dispositivos como a Lei n° 4.277/81, a famigerada “Lei do Cão”.

A Lei do Cão surgiu no governo de Castelo, e eu era deputado. Naquela época o governador Nunes Freire entregou o Governo do Estado para João Castelo com 22 mil funcionários, o João Castelo deixou o estado com 52 mil funcionários. Ele nomeou 50 mil funcionários para o Estado(MÁRIO CARNEIRO, Entrevista concedida em 22/01/2016, ANEXO B, p. XXXIV)

Essa Lei nº 4.277 de 27 de abril de 1981, que instituiu regime jurídico aos servidores admitidos em caráter temporário, dava certas providências, conforme transcrito abaixo.

Art. 1º - A presente Lei estabelece o regime jurídico dos servidores admitidos em serviços de caráter temporário ou contratados para funções de natureza técnica especializada, nos órgãos da administração direta e autárquica do Estado.

Art. 2º - Além dos funcionários públicos e do pessoal regido pela Legislação trabalhista, poderá haver na administração estadual servidores:

II – contratados para o desempenho de função de natureza técnica especializada. Art. 3° - As formas de provimento, classificação e remuneração dos servidores de que trata esta Lei, serão definidas em regulamento próprio. (MARANHÃO, 1981)

Esse aparato legal oferecia ao governo a liberdade de deliberar sobre esses servidores, que receosos de perderem, muitas vezes a única fonte de renda, se submetiam a todo tipo de desrespeito imposto pelo governo aos trabalhadores. Isso se materializava, por exemplo, nos baixíssimos salários que não eram ajustados mesmo com a oscilação inflacionária, muito comum nesse período, e no atraso frequente dos salários.

A APEMA estava passando por um processo de transição que deu origem a um novo impasse relacionado às suas deliberações que foram, então, expressas nas páginas d’O Imparcial, datado de 07 de junho de 1981. As quais informavam sobre o resultado da eleição para compor a nova diretoria da APEMA, realizada no dia anterior, e demonstrava que muitos professores ficaram insatisfeitos com o impedimento de abertura de novas chapas para concorrem ao pleito, uma vez que o Estatuto da entidade só possibilitava participação de associados em cargos de direção caso estivessem na condição de fundadores. Talvez isso explique a participação de apenas 40% dos 700 associados da época, e a formação de chapa única na qual se elegeu Antonio Anacleto Ferreira. Este aproveitou seu discurso para afirmar que em sua gestão iria procurar priorizar a reformulação do estatuto da entidade, bem como a estrutura física da sede. (p.2)

Por outro lado, a base da categoria via que os pontos primordiais a serem considerados pela nova direção da APEMA, pelo menos, naquele momento era especialmente, a regulamentação do Estatuto do Magistério, que desde janeiro daquele mesmo ano (1981), havia sido aprovado pela Assembleia Legislativa mas, até então não tinha sido regulamentado, além da pauta nacional de aposentadoria do professor aos 25 anos de serviço e 12% do orçamento da União para o setor da Educação. Isso acabou provocando divergências entre a base e a nova direção do sindicato.

Dois decretos foram incorporados também ao Estatuto do Magistério que dispuseram sobre as progressões horizontal e vertical, Decretos nº 8.214, de 10 de agosto de 1981, e o de N.º 8272, de 10 de setembro de 1981. Essa legislação acabou por não suprir as necessidades dos professores, sobretudo porque sua execução foi, arbitrariamente, e sucessivas vezes impedida pelos governos que seguiram.