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2.4 – MÚSICA E MOVIMENTO

A associação entre música e movimento, tanto comportamental quanto neurológico (através das culturas e ao longo da história), sugere uma ligação antiga evolutiva entre música e dança ou, mais geralmente, entre som e movimento (LEVITIN; TIROVOLAS, 2009, p.217). De fato, a teoria motora da percepção da fala argumenta que aprendemos a falar, observando os movimentos da boca e dos lábios dos outros (Liberman, 1982; Liberman e Mattingly 1985 apud LEVITIN; TIROVOLAS, 2009, p. 217).

A recente descoberta dos neurônios-espelho1, de acordo com Rizzolatti et al.(1996), citado por Levitin e Tirovolas (2009), e as evidências de sua presença na área de

1

Células cerebrais chamadas de espelho que são capazes de analisar cenas e interpretar as intenções dos

outros (http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=34918). Os estudos sobre neurônios-espelho também geraram evidências de que a arquitetura de convergência-divergência (uma zona de convergência-divergência é um conjunto de neurônios onde muitas alças de sinalização (feedforward/feedback loops) fazem contato) é satisfatória para explicar certas operações mentais e comportamentos complexos. A principal descoberta nessa área de investigação é que a mera observação de uma ação impele atividade em áreas motoras relacionadas. O modelo das zonas convergentes-divergentes (ZCD) é ideal para explicar essa constatação. Considere o que acontece quando agimos. Uma ação não consiste apenas em uma sequência de movimentos gerada pelas regiões motoras do cérebro. A ação abrange representações sensoriais simultâneas que emergem nos córtices

Broca, segundo Heiser et al.(2003), também citado por Levitin e Tirovolas (2009), sugerem um substrato neuroanatômico para a teoria motora da percepção da fala e a conexão entre música e dança. Ouvir música pode ativar os neurônios-espelho que nos levam a pensar (pelo menos inconscientemente) sobre os movimentos motores que seriam necessários para fazer a música. A dança pode ser concebida como uma extensão ou fenômeno complementar aos movimentos necessários para criar música. Tem sido observado que as crianças são capazes de cantar com maior facilidade as melodias que receberam por um dos sentidos (audição) e reproduzir com outro sentido (vocal-motor) sem maiores problemas. A área de Broca pode ser a sede dessa habilidade também. Se assim for, a conexão entre música e dança pode ser pensada como uma extensão dos movimentos necessários para vocalizar, simplesmente aplicada a outras regiões do corpo (LEVITIN, TIROVOLAS, 2009, p.218). O movimento voluntário dos membros para a música, o que caracteriza a dança, ativa o precuneu (fig. 09), uma região do lobo parietal.

Figura 09 – Precuneu – lobo parietal

A música não existe sem movimento. O som é transmitido através das vibrações das moléculas. Algum movimento físico é necessário para definir as vibrações dessas moléculas em primeiro lugar: bater, arrancar, curvar-se, soprar ou forçar o ar através das somatossensitivos, visuais e auditivos. O modelo das ZCDs sugere que a co-ocorrência repetida dos vários mapas sensitivo-motores que descrevem uma ação específica leva a repetidos sinais convergentes na direção de uma ZCD específica. Em ocasião posterior, quando a mesma ação for percebida, digamos que pelo sentido da visão, a atividade gerada em córtices visuais ativa a ZCD correspondente. Subsequentemente, a ZCD usa projeções retroativas divergentes na direção dos córtices sensoriais iniciais para reativar as respectivas associações da ação em modalidades como a somatossensitivas e a auditiva. A ZCD também pode sinalizar em direção a córtices motores e gerar um movimento-espelho. Da nossa perspectiva, os neurônios-espelho são neurônios de ZCD envolvidos no movimento.

cordas vocais (LEVITIN; TIROVOLAS, 2009, p.218). Mesmo quando deitados completamente imóveis, os ouvintes em estudos de fMRI2 mostraram ativação nas regiões do cérebro que normalmente orquestram o movimento motor para a música, incluindo o cerebelo, gânglios basais e áreas do córtex motor – é como se o movimento fosse impossível de suprimir. Tocando uma sequência musical em sincronia com o pulso, são envolvidas as áreas motoras pré-suplementar e suplementar, o córtex pré-motor dorsal, o córtex dorso lateral pré-frontal, o lobo parietal inferior e o VI lóbulo do cerebelo, medida pela resposta BOLD3 (Chen et al., 2008 apud LEVITIN; TIROVOLAS, 2009, p.218).

Ao ouvir música, muitas pessoas relatam que é difícil não movimentar seus corpos, mesmo sendo um aceno de cabeça no ritmo, o balançar do corpo ou um toque com os pés. Este movimento é processado através do núcleo geniculado medial, uma estação de retransmissão auditiva subcortical (Brown & Parsons, 2008 apud LEVITIN; TIROVOLAS, 2009, p.218). Levitin e Tirovolas (2009), citam um outro artigo, escrito por Levitin et

al.(2003) onde relatam que a ausência da comunicação das estruturas corticais seguidas

automaticamente, movimentos sincrônicos para a música podem, portanto, ser interpretados como biologicamente (bem como comportamentalmente) inconscientes.4 Janata et al.(2007), citados por Levitin e Tirovolas (2009), afirmaram que quando jovens adultos foram solicitados a descrever as atividades associadas com as músicas de seu passado, as comumente relembradas eram as danças.

A conexão entre música e movimento mostra-se também em estudos de percepção visual em performances musicais. Assistindo a uma performance musical, mesmo com o som

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fMRI – Functional magnetic resonance imaging – Imagem de Ressonância Magnética Funcional 3

BOLD – Blood-oxygen-level dependence - Dependência do nível de oxigênio no sangue. 4

This movement is processed via the medial geniculate nucleus, a subcortical auditory relay station (Brown &

Parsons 2008); the absence of communication to cortical structures following automatic, synchronous movement to music can therefore be interpreted as biologically (as well as behaviorally) unconscious (cf. Levitin et al. 2003; Levitin & Menon 2003).

desligado, é transmitida uma grande quantidade de informações estruturais e emocionais entre a música e o movimento (Chapados & Levitin, 2008; Davidson, 1993; Vines et al., 2005, 2006 apud LEVITIN; TIROVOLAS, 2009, p.218).

No caso dos disléxicos, a coordenação motora é beneficiada através dos movimentos corporais que, sincronizados com o ritmo e a pulsação musicais, promovem o equilíbrio e a conscientização dos movimentos realizados pelo corpo. Este processo deve ser estimulado, respeitando o tempo da automatização da resposta do indivíduo e aumentando lenta e gradativamente as atividades propostas.