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Mais valia absoluta e mais valia relativa

ENSINO MÉDIO PÚBLICO: CATEGORIAS E MARCO DE REFERÊNCIA TEÓRICO-CONTEXTUAL

1.5. Mais valia absoluta e mais valia relativa

Marx distingue em toda mercadoria seu valor de uso de seu valor de troca. O valor de uso é aquele que um objeto tem para satisfazer uma necessidade. Este conceito se refere aos recursos das coisas aos quais são úteis para a satisfação de qualquer tipo de necessidade, desde as mais biológicas até as mais espirituais. O valor de troca é, por sua vez, aquele que um objeto tem no mercado, e se expressa em termos quantitativos, medidos pelo dinheiro. Um dos traços peculiares da sociedade capitalista é que nela a força de trabalho constitui-se em mercadoria, ou seja, dado que o produtor não dispõe de outro recurso para obter bens e meios para sua subsistência, deve por à venda a força de seu trabalho no mercado.

Diferentemente de outras mercadorias que satisfazem meras necessidades humanas, a força de trabalho tem a peculiar característica de produzir outras mercadorias. Por isto, Marx (2006, p. 63) afirmou: “Quem, com seu produto, satisfaz a própria necessidade gera valor de uso, mas não mercadoria. Para criar mercadoria, é mister não só produzir valor de uso, mas produzi-lo para outros, dar origem a valor de uso social”. Desta forma, enquanto o trabalho possui um valor de uso, a força de trabalho (mercadoria) também apresenta um valor de troca. “Na realidade, o vendedor

54 da força de trabalho, como o de qualquer outra mercadoria, realiza seu valor de troca e aliena seu valor de uso” (MARX, 2006, p. 227).

É válido acrescentar que “as mercadorias vêm ao mundo sob a forma de valores de uso” (Idem, 2006, p. 69), e por serem criadas pela força de trabalho e resultarem do dispêndio da força humana de trabalho adquirem valores de troca. Assim, o preço de uma mercadoria é determinado pelo tempo médio de trabalho social empregado na sua produção. Logo, o preço da mercadoria não aparece no momento em que ela vai para o mercado. Seu valor é produzido desde o primeiro momento pela quantidade de trabalho necessário para fabricar o produto.

No processo de produção da mercadoria, portanto, além do processo de produção, também envolve o de valorização ou de criação de valor. É neste momento que a mais-valia apresenta-se como categoria fundamental porque expressa a essência da exploração capitalista sobre o trabalhador. Dentro da análise epistemológica marxista, mais-valia é o valor que o trabalho não pago do trabalhador assalariado cria sobre o valor de sua força de trabalho13 e que fica em poder do capitalista. O trabalhador despende mais horas produzindo mercadorias por um valor superior a seu salário e não recebe pelo sobretrabalho. Isso resulta na chave da exploração do trabalhador pelo capitalista, ou seja, é o trabalho não pago com o que se forma o capital. Portanto, capital é trabalho social não pago, a mais-valia socialmente produzida e apropriada pelo capitalista. Marx (2006, p. 253-254), analisa tal processo da seguinte forma:

Quando o trabalhador opera além dos limites do trabalho necessário, embora constitua trabalho, dispêndio de força de trabalho, não representa para ele nenhum valor. Gera a mais-valia, que tem, para o capitalista, o encanto de uma criação que surgiu do nada. A essa parte do dia de trabalho chamo de

tempo de trabalho excedente, e ao trabalho nela despendido, de trabalho

excedente14. [...] A taxa de mais-valia é, por isso, a expressão precisa do grau

de exploração da força de trabalho pelo capital ou do trabalhador pelo capitalista.

Sabe-se que, ao organizar a produção, o capitalista desembolsa uma determinada soma em dinheiro para adquirir meios de produção e para comprar a força de trabalho, a fim de obter um excedente de valor sobre a quantidade de capital inicial antecipado. Assinala Marx (2006, p. 271) que “capital é trabalho morto, que, como um

13 Para Marx (2006, p. 197), força de trabalho e “o conjunto de das faculdades físicas e mentais existentes

no corpo e na personalidade viva de um ser humano, as quais ele põe em ação toda vez que produz os valores de uso de qualquer espécie”.

55 vampiro, se reanima sugando o trabalho vivo e, quanto mais o suga, mais forte se torna”.

A força de trabalho assalariado possui a faculdade de criar um novo valor, com a particularidade de que este é maior do que a própria força de trabalho, pois o capitalista obriga o trabalhador a trabalhar além do tempo necessário com o objetivo de reproduzir o valor de sua força de trabalho. Por isso, no capitalismo, o trabalho assalariado é a única fonte de mais-valia, ou seja, a única criadora de novo valor. Sabe- se que as matérias primas e máquinas utilizadas na produção só transferem seu valor ao novo produto e não o incrementa. Deste modo, durante a jornada de trabalho o trabalhador, deve criar valor para cobrir seu salário, ou seja, é o sobrevalor de que se apropria o capitalista. O tempo que demora em criar seu salário é o tempo de trabalho

necessário, e o que corresponde à mais-valia é o tempo de trabalho excedente.

Considera-se que a força de trabalho é uma particular mercadoria cujo valor de troca (salário) é menor que o valor que confere ao produto. A diferença entre o salário pago ao trabalhador e a parte do valor que este aporta ao produto (valor) se chama mais- valia. Vale acrescentar, todavia, que a mais-valia apresenta-se sob duas modalidades. Em primeiro lugar está a mais-valia absoluta, a qual o capitalista obtém mediante o prolongamento da jornada de trabalho. A definição de mais-valia absoluta apresentada por Marx elucida melhor o que se quer dizer:

A produção de mais-valia absoluta se realiza com o prolongamento da jornada de trabalho além do ponto em que o trabalhador produz apenas um equivalente ao valor de sua força de trabalho e com a apropriação pelo capital desse trabalho excedente. Ela constitui o fundamento do sistema capitalista e o ponto de partida para a mais-valia relativa (MARX, 1968, p. 585).

Como se observa, a criação de mais-valia absoluta constitui a base do sistema capitalista, já que é condição fundamental de exploração ao prolongar a jornada de trabalho mais além do tempo necessário. A mais-valia absoluta alcançou sua máxima difusão nos estágios iniciais do capitalismo, quando o trabalho manual ainda predominava nas fábricas. Mas quando apareceu a grande indústria, que passou a operar com base em máquinas, foi possível aumentar a mais-valia, incrementando a produtividade do trabalhador, ou seja, a mais-valia relativa. Sobre esta questão, esclarece Marx (2006, p. 365) que a elevação da produtividade do trabalho em geral produz

modificação no processo de trabalho por meio da qual se encurta o tempo de trabalho socialmente necessário para a produção de uma mercadoria,

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conseguindo-se produzir, com a mesma quantidade de trabalho, quantidade maior de valor de uso.

O aumento da produtividade do trabalho nos setores que produzem meios de subsistência para os trabalhadores diminui o valor desses meios necessários para reproduzir a força de trabalho, o qual conduz a uma redução do tempo de trabalho necessário. Então, enquanto “a produção de mais-valia absoluta gira exclusivamente em torno da duração da jornada de trabalho; a produção da mais-valia relativa revoluciona totalmente os processos técnicos de trabalho e as combinações sociais” (MARX, 1968, p. 585). Com isto, o ganho que o capitalista obtém como consequência do aumento da produtividade do trabalhador decorre da exploração da mais-valia relativa, e isto acentua o grau de exploração sobre os trabalhadores.

É de se perguntar por que o trabalhador se deixa explorar uma vez que é ele que tudo produz pelo trabalho. Marx; Engels (1965), Marx (1968; 2006) Chauí (1980) sustentam que os homens crêem que são desiguais por natureza, pois a ideologia mascara a divisão social do trabalho. Bourdieu (201015), por sua vez, defende que a violência simbólica legitima a desigualdade socioeconômica e submete os indivíduos à submissão da classe dominante.