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Capítulo 1. Enquadramento Teórico

1.2. O professor do século XXI

1.2.2. Mal-estar do professor

Para melhor compreender o papel do professor do século XXI, consideramos oportuno entender quais as dificuldades e obstáculos com que se depara a classe docente, e que por sua vez complicam, a vários níveis, o caminho a percorrer para o alcance da representação do “bom professor”. Poucas ou nenhumas passagens seriam melhores do que a de Justino, para contextualizar alguns dos obstáculos atuais à docência:

“A dispersão disciplinar, as cargas horárias mal distribuídas, a quantidade de docentes e a consequente dificuldade de articular e integrar tudo isto convergem no princípio de ensinar mal um pouco de tudo, quando seria preferível ensinar bem o que é fundamental” (Justino, 2010, p.77).

Duvidamos que seja novidade para algum cidadão português, a luta atual travada pelos professores por melhores condições de trabalho. O cidadão não informado, na sua ignorância, pode dizer que a luta apenas se faz por questões de congelamentos de carreiras e por discordâncias governativas, mas o professor de hoje debate-se e manifesta-se por muitos outros motivos. A pouca carga letiva das suas disciplinas confrontada com as queixas dos programas extensos, as turmas cada vez maiores, as condições das escolas que, por vezes, são de longe as menos aconselháveis, e a juntar a tudo isso o descrédito da sua imagem social e uma remuneração financeira considerada insuficiente são alguns dos problemas com que o professor tem de lidar. Por sua vez, os professores podem

ultrapassar estes obstáculos, mas estes trazem consequências e surgem assim os problemas de aumento do menosprezo face à sua profissão, a desmotivação, o menor empenho, o insucesso nas suas funções, que afeta a relação e desempenho com os alunos e, no culminar de todo este processo, o abandono da profissão.

O julgamento social é um dos problemas enfrentados pela classe docente, e é descrito por José M. Esteve assim:

“O julgamento social dos professores tem vindo a generalizar-se. Desde os políticos com responsabilidades em matéria educativa até aos pais dos alunos, todos parecem dispostos a considerar os professores como o principal responsável pelas múltiplas deficiências e pela degradação geral de um sistema de ensino fortemente transformado pela mudança social. Ora, mais do que responsáveis, os docentes são as primeiras vítimas” (Esteve, 2005, p.104 apud Fernandes, 2017, p.24).

Fruto de todo um contexto em que a visão sobre os problemas que afetam o ensino português parece afunilada para o constituinte menor da escala do Sistema Educativo Português, o professor, o julgamento social aponta o professor como o causador da “degradação geral” da educação em Portugal. É necessário romper esta “solução fácil”, e entender que o professor, embora seja capaz de cometer erros, não faz as leis, nem gere o Sistema Educativo. É necessário compreender o panorama geral, aumentar a escala, e analisar políticas educativas e governativas.

O problema da precariedade da profissão em relação à colocação e contratação é outro obstáculo que atormenta os aspirantes a e os professores. Esta precariedade não só traz consigo uma instabilidade profissional, financeira, emocional e familiar aos professores, o que dificulta bastante o desempenho do seu papel, como também faz com que uma significativa percentagem desista da carreira de docente. E ainda afasta dos cursos de formação de professores possíveis candidatos.

O crescente desempenho de funções burocráticas por parte do professor é uma das principais queixas que se fazem ouvir diariamente pelos corredores das escolas. Cada vez mais se ouvem as queixas dos professores em relação ao tempo e energia gastos no cumprimento de burocracias que afeta diretamente o tempo investido na preparação das

suas aulas. Questionamo-nos, até, se as críticas por parte dos professores em relação ao pouco tempo de lecionação que têm face à quantidade de conteúdos dos programas, e o investimento exterior que isso acarreta, já se fazem ouvir há algum tempo, carregá-los com cada vez mais funções burocráticas não é agravar ainda mais o problema? O caminho a percorrer não é no sentido oposto?

A acrescentar aos problemas anteriormente expostos, levanta-se também a questão da integração dos professores em início de carreira, que surge num período de grandes mudanças e constante adaptação dos jovens docentes, que por vezes não são recebidos e vistos do modo mais correto pelos restantes profissionais. Profundamente relacionado com o conflito de gerações, os professores em início de carreira vêem-se estereotipados, principalmente com uma inexperiência que se confunde com ingenuidade, e em casos mais extremos com incompetência, cabendo-lhes, neste estereótipo, um nível inferior em relação aos restantes docentes. Naturalmente, um professor em início de carreira não é realmente tão experiente como um professor que exerce a profissão há décadas, mas tal como todos os recém-formados de uma classe profissional, a experiência adquire-se com a prática. Mas não deixa de ser um erro grave associar inexperiência a incompetência, pois não há uma barreira de anos de exercício da profissão que separe a competência da incompetência. Tanto um jovem professor como um professor em final de carreira podem ser incompetentes.

Estes são os principais problemas que o professor dos nossos dias tem de enfrentar e que sem dúvida dificultam o correto desempenho da sua função. A juntar a estes surgem também outros obstáculos que, embora não tão frequentes, podem dificultar o exercício da profissão, como por exemplo a relação com os pais. Tudo isto enquanto o Professor, no final do dia, não deixa de ser uma pessoa, e que como qualquer outra, se lhe são postos diversos obstáculos para a prática da sua atividade, estes podem não comprometer o correto exercício da mesma, mas tornam-na profundamente desgastante.

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