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ORTODÔNTICO NA ATRATIVIDADE DA FACE

P: perfil; D desvio-padrão; T1: antes do tratamento ortodôntico; T2: depois do tratamento

4. INFLUÊNCIA DO SORRISO NA ATRATIVIDADE DA FACE

4.1.1 Maloclusão e fatores psicológicos

Um dos principais objetivos do tratamento ortodôntico, para o qual se direciona o plano de tratamento, é a correção de desvios da oclusão ideal - caracterizada por classe I canina, dentes alinhados, ausência de rotações e de espaços interproximais, cristas marginais niveladas, incisivos e caninos inferiores a contactarem as faces linguais dos dentes ântero-superiores, linhas médias coincidentes, uma sobremordida vertical adequada e os planos oclusais retos ou com uma ligeira curva de Spee (Andrews 1972; Casko, Vaden e col. 1998). O tratamento ortodôntico beneficia a fisiologia e a oclusão; no entanto, a maioria dos adultos que procuram tratamento fazem-no motivados pela aparência estética, dando pouco importância a fatores estruturais e funcionais (Baldwin 1980; Feu, Oliveira e col. 2012; Palomares, Celeste e col. 2012).

Os índices de necessidade de tratamento ortodôntico refletem assim esta discrepância, entre desvio das normas oclusais e desvio das normas estéticas. Até aos anos oitenta, a necessidade de tratamento medida por diversos índices baseava-se apenas em critérios oclusais. Nos Estados Unidos, em 1986, foi criado e validado pela Universidade de Iowa o Índice de Estética Dentária, no qual se identificam dez características oclusais que são ponderadas de acordo com o grau de importância estética atribuída por leigos (Jenny e Cons 1996). Em Inglaterra, Brook e Shaw desenvolveram o Índice de Necessidade de Tratamento Ortodôntico (INTO), que inclui um componente clínico e um componente estético (Brook e Shaw 1989). Neste último, existem dez imagens frontais de dentições completas com diferentes graus de maloclusão e compromisso estético, para que se escolha a imagem mais próxima do caso a ser avaliado. O componente estético tem um peso elevado na ponderação final da necessidade de tratamento ortodôntico. Nestes dois índices, desenvolvidos em países diferentes, está implícito que uma mais-valia importante do tratamento ortodôntico é beneficiar a aparência dentária e, consequentemente, o bem-estar social e psicológico da pessoa que recebe o tratamento. O componente estético do INTO (CE-INTO) é um indicador mais importante para a estética facial que outras medidas objetivas, como a sobremordida horizontal ou os ângulos ANB e SN-GoGn (Kiekens, Maltha e col. 2006).

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A importância da aparência dos dentes não é igual para todos os indivíduos, variando de acordo com o género e a idade. Vallittu e colaboradores demonstraram, através de 254 questionários, que a estética dentária é mais importante para as mulheres relativamente aos homens e, quanto à idade, para indivíduos jovens em relação aos mais velhos (Vallittu, Vallittu e col. 1996). Pacientes com um nível de educação mais baixo valorizam dentes mais brancos e a perceção de que os dentes brancos são mais bonitos diminui com a idade.

As crianças dão pouca importância à aparência dentária, a não ser que esta seja motivo de provocação e gozo por parte dos seus pares (Shaw, Meek e col. 1980). No entanto, o principal motivo de procura de tratamento ortodôntico pelas crianças não são as provocações a que estas estão sujeitas, mas sim a vontade dos pais, sendo a mãe o elemento mais relevante de ambos os progenitores (Baldwin e Barnes 1965). Um questionário realizado a crianças entre os 10 e 14 anos que procuravam tratamento ortodôntico, determinou a quantidade de provocações a que estas estavam sujeitas, a sua autoestima e a qualidade de vida relacionada com a saúde oral (Seehra, Fleming e col. 2011). A necessidade de tratamento ortodôntico em relação à estética dentária foi também avaliada neste grupo de indivíduos, através do CE-INTO (Brook e Shaw 1989). A prevalência de provocações em crianças por parte dos seus pares foi de 12,8%, havendo uma forte associação entre as provocações e a classe II divisão 1, a sobremordida vertical e horizontal aumentadas e um INTO elevado. Os indivíduos que eram mais frequentemente alvo de gozo e troça por parte dos colegas, apresentavam um nível baixo de aptidão social, de capacidade atlética, de autoestima geral e de autoestima relacionada com a aparência física, podendo-se concluir por isso que havia um impacto negativo na qualidade de vida relacionada com a saúde oral. Uma avaliação subsequente dos indivíduos sujeitos a provocações por parte dos seus pares, que tinham entretanto começado tratamento ortodôntico, permitiu concluir que 78% dos participantes deixaram de ser perturbados devido à sua maloclusão (Seehra, Newton e col. 2013).

Crianças de 11 anos e jovens adultos com os incisivos superiores alinhados, são julgadas como mais atrativas em relação a outras condições dentárias, como sejam incisivos protrusivos, apinhados, a ausência de um incisivo lateral e fenda unilateral do lábio (Shaw 1981; Shaw, Rees e col. 1985). Para ambas as idades, ou seja, crianças de 11 anos e jovens adultos, a condição fenda unilateral do lábio foi a que obteve a pior classificação de atratividade. Crianças com os incisivos alinhados

165 foram avaliadas com maior capacidade em fazer amigos e menor agressividade, enquanto que os adultos com os incisivos alinhados foram percebidos como mais amigáveis, inteligentes, populares e de classe social mais alta.

Os efeitos psico-sociais da maloclusão foram estudados longitudinalmente entre a adolescência e a idade adulta, num grupo de crianças dinamarquesas (Helm, Kreiborg e col. 1985). Entre 1965 e 1966, a prevalência de maloclusão foi registada em 977 adolescentes com idades compreendidas entre os 13 e os 19 anos. Quinze anos depois, 86% da amostra original respondeu a um inquérito que incluiu questões gerais sobre a perceção da imagem corporal e questões específicas acerca da auto- perceção e das implicações sociais da aparência dentária. Em relação à imagem corporal, os jovens adultos mostravam-se agradados, de uma forma geral. A satisfação com a aparência dentária foi inferior à satisfação obtida para qualquer outra porção da face, em ambos os sexos. Para os indivíduos com maloclusão, o contentamento com a aparência dentária era significativamente menor, quando comparados com indivíduos com uma oclusão normal. Quando questionados diretamente sobre qual a porção do corpo que tinha uma aparência que mais os preocupava, 11% dos jovens adultos – ou seja, 33 indivíduos - responderam que eram os dentes. Dos jovens que deram esta resposta, 32 pertenciam ao grupo da maloclusão, com prevalência elevada de sobremordida horizontal superior a nove milímetros, sobremordida vertical superior a sete milímetros e falta de espaço na região dos incisivos superiores. A preocupação com a aparência dentária surgiu em terceiro lugar na lista geral de preocupações, sendo apenas ultrapassada pela constituição corporal e pela textura da pele. A aparência dentária, no entanto, não depende apenas da maloclusão, mas também de ausências dentárias, cáries, restaurações e alterações na coloração dos dentes.

Na investigação anteriormente citada, os indivíduos com maloclusão que responderam quinze anos depois ao inquérito, recordaram mais memórias desfavoráveis relativamente aos dentes durante a adolescência, quando comparados com indivíduos sem maloclusão (Helm, Kreiborg e col. 1985). Estes jovens adultos estavam mais cientes da maloclusão, mais insatisfeitos com a aparência dentária, achavam que os seus dentes tinham pior aspeto que os dos colegas e foram por tudo isso alvo de provocações. Essas mesmas provocações, por parte dos colegas, em relação à aparência dos dentes, foram sete vezes mais frequentes comparativamente aos adolescentes com uma oclusão normal. Cinquenta por cento dos indivíduos com

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sobremordida horizontal excessiva foram gozados pelos outros, quanto à sua aparência dentária, tendência que se verificou para outros tipos de maloclusão, como a falta de espaço e a sobremordida vertical excessiva.

A provocação e ameaça entre crianças em idade escolar pode levar a sentimentos de depressão, isolamento, ansiedade e baixa autoestima das vítimas (Hawker e Boulton 2000). Por outro lado, as crianças que ameaçam os seus pares apresentam também maiores distúrbios psicológicos (Kumpulainen, Rasanen e col. 1999). Os alvos mais comuns de provocação entre crianças são o peso e a altura, mas os dentes e usar aparelho são também fortes motivos de gozo (DiBiase e Sandler 2001; Shaw, Meek e col. 1980). No entanto, apenas 15% das crianças que procuram tratamento ortodôntico referem ser vítimas de provocações na escola (Baldwin e Barnes 1965). É difícil quantificar o benefício do tratamento ortodôntico em termos psicológicos nas crianças, mas este benefício torna-se aparente na idade adulta, uma vez que a perceção da maloclusão aumenta com a idade. Desta forma, é provável que o tratamento de crianças com os dentes evidentemente mal posicionados ajude no desenvolvimento de adultos mais saudáveis psicologicamente, com uma melhor imagem corporal.

A aparência dentária foi determinada como sendo o quarto fator de provocação entre crianças da mesma idade, estando a seguir à altura, ao peso e ao cabelo (Shaw, Meek e col. 1980). Mais ainda, um estudo recente que recorreu a 920 inquéritos a crianças entre os 11 e 12 anos de idade, concluiu que os dentes são mesmo o principal alvo de provocações na escola, sobrepondo-se a características como a força e o peso, tendo sido frequentemente citados problemas como grandes diastemas, ausências dentárias, alterações na forma e cor dos dentes e a projeção dos incisivos superiores (Al-Bitar, Al-Omari e col. 2013).

Kilpeläinen, Phillips e Tulloch demonstraram, através de inquéritos aos pais de 313 pacientes com menos de 16 anos, que 44% dos jovens tinham sido alvo de provocações devido à aparência dos seus dentes (Kilpelainen, Phillips e col. 1993). A presença de uma sobremordida horizontal superior a sete milímetros aumentou a probabilidade de provocações 5,5 vezes, enquanto que o alinhamento incorreto da dentição aumentou 2,4 vezes. Os piores problemas visíveis durante a fala e o riso, podem desencadear gozo e provocação entre crianças e adolescentes. Desta forma, o tratamento ortodôntico poderá ser um meio de prevenir distúrbios de ansiedade relacionados com a aparência.

167 Com base em investigações científicas publicadas recentemente, conclui-se que as maloclusões apresentam um impacto negativo a nível social e emocional em crianças e adolescentes, de acordo com uma revisão sistemática (Dimberg, Arnrup e col. 2015). Mais ainda, maloclusões severas podem limitar as capacidades sociais de jovens adultos (Choi, Kim e col. 2015) e o tratamento ortodôntico em adultos pode aumentar significativamente a sua auto-estima (Johal, Alyaqoobi e col. 2015).

4.1.2 Diferenças entre leigos e profissionais na perceção da