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4.2 ADI N 5.956/DF E OS FUNDAMENTOS DO PEDIDO DE

4.2.1 Manifestações juntadas na ADI n 5.956/DF

Expostos os pontos principais da peça inicial protocolizada pela Associação do Transporte Rodoviários de Cargas do Brasil, resta apresentar as demais manifestações juntadas nos autos da ADI n. 5.956/DF. Destacam-se as ponderações do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) e da Procuradoria-Geral da República.

4.2.1.1 Manifestação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça. Suas funções estão dispostas na Lei n. 12.529, de 30 de novembro de 2011. Em suma, ele exerce três funções, quais sejam:

Preventiva: analisar e posteriormente decidir sobre as fusões, aquisições de controle,

incorporações e outros atos de concentração econômica entre grandes empresas que possam colocar em risco a livre concorrência.

Repressiva: investigar, em todo o território nacional, e posteriormente julgar cartéis

e outras condutas nocivas à livre concorrência.

Educativa: instruir o público em geral sobre as diversas condutas que possam

prejudicar a livre concorrência; incentivar e estimular estudos e pesquisas acadêmicas sobre o tema, firmando parcerias com universidades, institutos de pesquisa, associações e órgãos do governo; realizar ou apoiar cursos, palestras, seminários e eventos relacionados ao assunto; editar publicações, como a Revista de Direito da Concorrência e cartilhas (BRASIL, 2011, grifou-se).

Nesse sentido, atendendo o chamamento judicial do Ministro Relator da ADI n. 5.956/DF, o Conselho manifestou-se no processo sobre o tabelamento de frete advindo da Lei n. 13.703/2018, sobre aspectos relacionados à concorrência de mercado, pois essa é a sua incumbência.

Colhe-se do documento juntado aos autos da ADI n. 5.956/DF que a jurisprudência do CADE tem incorporado a ideia de defesa do exercício dos primados da Livre Iniciativa e, consequentemente, refuta a intervenção estatal na economia.

Assevera que os tabelamentos de preços, são, por eles entendidos, como prática lesiva, da qual podem advir problemas na seara da concorrência.

Ademais, ressalta que o Conselho foi instado a responder à consulta sob o n. 08700001540/2018-68, apresentada pelo Sindicato dos Transportadores Autônomos de Contêineres e de Cargas em Geral de Itajaí e Região e pelo Sindicato das Empresas de Veículos de Transportes de Carga e Logística de Itajaí e Região, para clarear dúvidas sobre o tabelamento estabelecido pela MP n. 832/2018 – convertida na Lei n. 13.703/2018. E, por consequência da análise do dispositivo, afirmou que há grande possibilidade desse tipo de tabelamento acarretar danos à sociedade e aos próprios motoristas autônomos.

A seguir, trecho que transparece esse entendimento do Conselho Administrativo de Defesa Econômica:

Em uma análise ainda superficial sobre o conteúdo da norma atacada, o CADE entende que há risco real da tabela gerar um risco para os próprios caminhoneiros, seja porque se aumenta o risco de o cliente decidir internalizar o serviço de frete, a depender dos custos mínimos impostos via tabela, seja porque se cria a possibilidade

de, em um cenário com excesso de oferta, parte dos motoristas decidir, por sua vontade própria, não seguir a tabela, criando distorções de competividade dentro do própria classe de transportadores, em que os cumpridores da norma irão perder competividade (BRASIL, 2018c).

Dessa transcrição, denota-se uma real preocupação que também é manifestada por parte dos caminhoneiros quando da criação do tabelamento. O cumprimento dos preços é fator preponderante para que a norma tenha eficácia e não gere distorções, nem venha a criar atritos entre os próprios motorista autônomos. Assim, a força vinculante se fez necessária, conforme já apresentado, mediante as penalidades impostas pela Lei em caso de não cumprimento das suas disposições.

Não obstante, ainda que impondo seu entendimento e informando sua jurisprudência, o Conselho reconhece que, em situações com certas especificidades, havendo a necessidade de políticas públicas, o Estado pode implantar regulamentações, desde que preenchidos determinados requisitos:

[...] apesar de manter posição pública crítica com relação aos efeitos concorrenciais e econômicos de determinadas formas de regulação estatal (dentre elas, o tabelamento), o CADE reconhece que em determinadas situações específicas o interesse público se manifesta pela maximização de outros primados constitucionais que impõem uma atuação mais presente/impositiva do Estado, por meio de regulação expressa com decorrente mitigação do ambiente concorrencial [...] (BRASIL, 2018c).

Entretanto, o CADE demonstra sua preocupação com as políticas públicas setoriais que venham a acarretar prejuízos ao consumidor final. Afirma em sua análise concreta do tabelamento dos preços dos fretes que esse conduziria a um aumento substancial a ser absorvido pelo consumidor final, não sendo adequado, do ponto de vista do Conselho, como melhor forma de funcionamento de mercado.

4.2.1.2 Manifestação da Procuradoria-Geral da República

A Procuradoria-Geral da República, na ocasião representada por Raquel Elias Ferreira Dodge, quando instada a opinar sobre o caso, juntou aos autos da ADI em comento, exposição de seu entender.

Inicialmente, fez um breve relatório dos fatos e das demais manifestações na ação ocorridos até o devido momento, após demonstrou sua opinião:

O estabelecimento de tabela de preços dos serviços de transportes de cargas constitui situação de intervenção excepcional do Estado na ordem econômica, com vistas a

superar situação de colapso e garantir a remuneração adequada do trabalho, em prol da valorização do trabalho humano e da vida digna (BRASIL, 2018c).

Sobre a valorização do trabalho humano aduziu:

A valorização do trabalho humano é tema que permeia todo o texto constitucional. Está presente como fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1.º- IV), direito social (art. 6.º), catálogo de direitos dos trabalhadores (art. 7.º) e como fundamento da ordem econômica (art. 170) e da ordem social (art. 193). Esse preceito constitucional inserido no contexto da ordem econômica objetiva evitar que as forças econômicas se sobreponham ao desempenho das atividades humanas. Esclarece, portanto, que o trabalho humano não pode ser considerado sob a perspectiva de mero fator de produção, pois diz respeito à efetivação da dignidade da pessoa humana (BRASIL, 2018c).

Tratou, também, de apontar o desequilíbrio enfrentado pelo setor transportes. Nesse sentido, afirmou que a medida instituída pelo ato normativo contestado na ADI configura medida indispensável para restabelecer o desempenho regular da atividade do motorista autônomo e garantir-lhe remuneração adequada visando à sua subsistência e tornando digno seu trabalho.

Corrobora seu sentir afirmando que a ordem econômica possui a finalidade de garantir a existência digna e deve pautar-se no apreço da valorização do trabalho. Não é, de qualquer forma, ilegítimo o tabelamento de preços, no caso concreto, com fim de conter a situação desvirtuada que permeia o setor econômico dos transportes de cargas.

Segundo a Procuradora, a Livre Iniciativa e a Livre Concorrência devem ser conciliadas com o Princípio da Dignidade Humana, com a Valorização do Trabalho, e também com os demais princípios da ordem econômica (BRASIL, 2018c).

Ao fim, enfatizou que a norma se mostra adequada para instituir a regularidade do mercado e assegurar um patamar de preços justos, uma vez que outras medidas, anteriormente aplicadas, não foram suficientes para resguardar essa normalidade:

[...] é constitucional a política nacional de pisos mínimos no transporte rodoviário de cargas instituída pela Lei 13.703/2018, uma vez que configura medida excepcional destinada a superar situação de crise no mercado concorrencial e assegurar remuneração dos serviços prestados acima do preço de custo (BRASIL, 2018c).

Nota-se que o entendimento da Procuradora-Geral se funda nos preceitos constitucionais da Valorização do Trabalho Humano e da Dignidade da Pessoa Humana, os quais se sobressaem em relação aos princípios constitucionais liberais que, por sua vez, foram assinados como mitigados na ADI n. 5.956/DF.

5 ANÁLISE DA POSSIBILIDADE DA MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DA LIVRE INICIATIVA

Na intenção de apresentar a possibilidade da admissão da mitigação do Princípio Constitucional da Livre Iniciativa frente ao sancionamento da Lei n. 13.703/2018, busca-se analisar os posicionamentos doutrinários que lhe circundam, suas limitações advindas do texto constitucional e, ao fim, demonstrar o entendimento da Suprema Corte sobre como aplicá-lo.

5.1 POSIÇÕES DOUTRINÁRIAS ACERCA DAS LIMITAÇÕES DO PRINCÍPIO DA

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