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5.2 Encontros e planejamentos com os professores – março/abril

5.2.2 Março e abril – em análise

As dificuldades apresentadas pelos professores, durante os três encontros que tivemos, estavam relacionados à suas resistências internas em mudar seus paradigmas, ao se permitirem, nas aulas, recursos diferentes que não apenas os já tradicionalmente conhecidos, como o quadro de escrever, pincel e listas de exercícios. Havia um evidente desconforto nas professoras P2 e P5, quanto à perspectiva de mudança nas suas práticas pedagógicas, em virtude do enraizamento das tradições, que na perspectiva de Tardif & Lessard (2008, p.48-49) “geram um poder pessoal e coletivo” e de acordo com as questões aqui discutidas corresponde ao ensino centrado no professor, na aula essencialmente expositiva, como um modelo de ensino que se apresenta, forte, arraigado, difícil de ser confrontado, mudado ou mesmo discutido.

Para perguntas como o computador no ensino atrapalha, ajuda, ou depende do

contexto? Como reverter o fracasso em Matemática?, os professores não tinham

opinião formada e, pelas atitudes de impaciência, neutralidade ou desinteresse, indicavam não ter muita disposição para investigar.

Apesar de eles terem consciência da pouca aprendizagem dos alunos em Matemática e da própria limitação imputada à falta de conhecimento relativo ao uso das tecnologias contemporâneas no ensino, se permitiam afastar, de si, o ônus dessa “dívida”, como se as soluções para esses problemas, caso existissem, estivessem bem distantes dali, possivelmente em outras mãos, que não as daquele grupo. Apresentaram hipóteses para tentar justificar o desconhecimento dos alunos em Matemática, mas desacompanhadas de propostas que objetivassem minimizar a falta de interesse dos educandos nessa disciplina e nem mesmo vincularam o desenvolvimento do projeto a uma tentativa do resgate do ensino com qualidade.

É possível que a acomodação do professor no papel de mero transmissor ou facilitador seja decorrência da cultura de que no âmbito escolar as atividades estão, em certo sentido, orientadas para a socialização do conhecimento em vez da sua elaboração. A esse respeito, Tardif & Lessard (2008, p.227) se manifestam, dizendo que “Os professores nunca viram o seu saber específico devidamente reconhecido”, pois apesar da importância da sua missão, há o senso comum de que ao professor basta que domine bem sua matéria específica e que apresente boa comunicação com os alunos.

Na perspectiva de observar e ser observado, propostas pelo projeto, notei que os professores se incomodaram com essa possibilidade na medida em manifestaram

diversas reclamações com a coordenadora CP. Outra dificuldade sentida relacionou-se à compreensão das teorias acadêmicas Seqüência Fedathi e Engenharia Didática. Realizar planejamento na configuração dessas teorias mostrou-se inviável e estressante aos professores. Para melhorar o canal de comunicação com estes, e tornar mais compreensível o momento do planejamento, foi desenvolvido um roteiro de planejamento das sessões didáticas (apêndice 09).

Daí a importância do docente reconhecer sua responsabilidade intransferível em aceitar o fato de que a qualidade do processo educativo está intimamente relacionada à sua melhor qualificação na relação com o conhecimento que está legitimado a ensinar. Os professores apresentaram desconforto pela possibilidade de aprender novos conhecimentos que pudessem ser agregados aos seus valores.

Com relação ao demasiado crédito no projeto, por parte do núcleo gestor, em decorrência da ampliação da ação digital na escola verifiquei a necessidade de alguns ajustes a serem feitos para os próximos encontros. Apesar de considerar o fato de que as tecnologias digitais acarretam novas exigências aos contextos escolares pelas possibilidades de expansão das relações sociais e do acesso à informação, era importante não deixar essa comunidade escolar alimentar o sentimento da fé exagerada e cega às virtudes das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) no ensino (LESSARD & TARDIF, 2008).

Era preciso trabalhar junto aos sujeitos da pesquisa a possibilidade de que o computador no ensino não significava necessariamente que os alunos aprenderiam mais ou com menores dificuldades do que nas classes tradicionais. Era importante desenvolver a consciência crítica no grupo de que, a partir da vivência do projeto, seria possível avaliar o impacto das tecnologias digitais sobre os conhecimentos escolares, especificamente no ensino dos professores e na aprendizagem dos alunos.

Quanto à divulgação do pré-teste e apresentação do projeto nas turmas, a equipe do projeto deveria ter tido a iniciativa de apresentar e não de esperar que os professores, que se apresentavam, naquele momento, bastante confusos e inseguros, o fizessem. Essa falha foi corrigida somente na primeira sessão didática, no período de 08/05 a 14/05. A reação dos alunos, relativa ao projeto, foi bastante natural e neutra, sem pré-julgamentos a favor ou contra o que fosse ser desenvolvido, embora demonstrassem não ter visão plena das informações ditas.

A análise qualitativa do pré-teste do 6º identificou a acentuada dificuldade dos alunos com a leitura, escrita e interpretação das situações-problema propostas, tomando como referência a noção de que nas operações básicas os alunos não conseguiram calcular o resultado de subtrações mais complexas e de divisões exatas por números de um algarismo. Verificou-se na escola pesquisada a realidade já anunciada do SAEB de 2003 acerca de o aprendizado da Matemática estar abaixo do aceitável. Em alguns casos, os auxiliares do projeto relataram que precisaram ler questões, pois alguns alunos não entendiam mesmo o que estava escrito. Isso me fez compreender que as dificuldades dos alunos não se limitavam apenas ao contexto da Matemática, mas de Português, também. Os alunos apresentavam conhecimentos equivalentes ao que se espera de um aluno da 3ª série do Ensino Fundamental, muito abaixo do esperado, portanto.

No pré-teste do 9º ano, os dados indicaram que os alunos tinham sérias dificuldades na operacionalização com os inteiros e em conhecimentos prévios de Álgebra. Muitos alunos mostraram dificuldade na leitura e interpretação das questões. Indicaram um conhecimento compatível com conceitos do 7º ano do Ensino Fundamental.

O pré-teste do 1º ano do Ensino Médio evidenciou que os alunos com os quais iríamos trabalhar tinham sérias dificuldades com relação aos tópicos de Álgebra. Tomando como base as análises de rendimento dos alunos realizadas pelo SAEB (2003) verifica-se, nessa série, também, a compatibilidade de resultados insatisfatórios. Essa realidade alertou para o fato de que era preciso muita coerência, organização e clareza nas ações pedagógicas e didáticas no planejamento das sessões, junto aos professores para favorecer efetivamente o conhecimento dos alunos. Nas três séries, o desafio se constituiu em recuperar a defasagem de conhecimentos matemáticos de, no mínimo, dois anos, em um.

De posse das evidências que se apresentaram em março e abril, o trabalho junto aos professores no uso das tecnologias digitais no âmbito escolar precisava avançar além da concepção do aperfeiçoamento extrínseco e instrumental. Pelo contrário, a formação poderia acontecer ali mesmo na intimidade da escola por meio de uma ação didática diferenciada.