• Nenhum resultado encontrado

3. TRÊS TRADUÇÕES DE ALICE PARA O PORTUGUÊS – ASPECTOS

3.3 As três tradutoras – uma apresentação

3.3.3 Maria Luiza X de A Borges – Jorge Zahar Editor

Apesar de atuar há vários anos como tradutora, Maria Luiza X. de A. Borges nunca fez nenhum curso de tradução, formou-se em psicologia. Em entrevista à autora

desta dissertação199, afirma que: “sou psicóloga, com mestrado em psicologia clínica. Estudei línguas (mais francês do que inglês e de maneira irregular), mas sou autodidata como tradutora” (BORGES, 2008). Isso, no entanto, não a impediu de traduzir por volta de cento e cinqüenta livros. De acordo com Borges, “o fundamental é o português e é onde a maioria dos livros traduzidos peca” (SILVA, 2002). Por isso, ressalta que

uma credencial fundamental para o tradutor, e com freqüência negligenciada, é um conhecimento firme de português. Nossa ferramenta fundamental é a nossa língua. É com ela que devemos ser capazes das proezas que a tradução exige. E essa ferramenta, é sobretudo lendo que a adquirimos (BORGES, 2008).

Seguindo essa diretriz, Borges traduziu inúmeras obras sobre diversos assuntos para a Jorge Zahar Editor, incluindo os cinco volumes de histórias de Sherlock Holmes escritas por Arthur Conan Doyle: “As aventuras de Sherlock Holmes”, “As memórias de Sherlock Holmes”, “A volta de Sherlock Holmes”, “O último adeus de Sherlock Holmes” e “Histórias de Sherlock Holmes”.

A maioria de suas traduções foi publicada pela Jorge Zahar Editor. Contudo, Borges também traduziu para outras editoras. Os livros “Uma vida de peso” de Mikael Ollivier e “Nenhum peixe aonde ir” de Marie-Franchine Hebert, que visam o público infanto-juvenil, foram publicados pela Edições SM. Outras obras traduzidas foram: “Ficções apaixonadas: gênero, narrativa e violência em Clarice Lispector” de Marta Peixoto para a editora Vieira e Lent, e “Ética e excelência: cooperação e integridade nos negócios” de Robert C. Solomon para a editora Civilização Brasileira. Os sites200 da “Livraria da Travessa”, “Martinsfontes Paulista: Livraria” e “Dedalus” apresentam grande parte de suas traduções.

Em 2002, Maria Luiza X. de A. Borges traduziu a edição anotada de “Alice”, publicada pela Jorge Zahar Editor. Nesse ano, foi indicada para o prêmio Jabuti201 pela sua tradução da história de Lewis Carroll (SILVA, 2002). Também recebeu, nessa mesma época, menção honrosa pelo Prêmio União Latina de Tradução Científica e

199 As citações de Borges foram retiradas da entrevista à autora desta dissertação, em 16 de dezembro de

2008. Vide anexo D.

200<http://www.travessa.com.br>, <http://www.martinsfontespaulista.com.br>, e <http://dedalus.usp.br>. 201 Instituído pela Câmara Brasileira do Livro desde 1959, esse prêmio literário é um dos mais

prestigiados do país. É uma homenagem à personalidade de um personagem do livro “Reinações de Narizinho” de Monteiro Lobato. “Na trama, o leitor é apresentado a uma tartaruga vagarosa, mas obstinada”, uma “fórmula para se destacar” e conquistar esse prêmio (CALS, 2008)

Técnica por causa de sua tradução do livro “Tempo, amor, memória: um biólogo notável e sua busca das origens do comportamento” de Jonathan Weiner, publicado pela Editora Rocco202. Mesmo com sua vasta experiência na área, Borges destaca que continua “aprendendo e cada livro é uma aventura” (BORGES, 2008).

3.3.3.1 Borges e a tradução de “Alice: edição comentada”

Maria Luiza X. de A. Borges foi convidada pela Jorge Zahar Editor para traduzir “Alice: edição comentada”. A tradutora concordou em participar desse projeto, destacando o porquê:

aceitei o convite porque acredito que Alice comporta um sem-número de traduções (a minha certamente não será a última) e porque representava um desafio. Com seus muitos trocadilhos, jogos de palavras, rimas, poemas, Alice é um bom exemplo de que tradução literária, a rigor, não existe. O que fazemos é tentar recriar uma aproximação da obra em outra língua (BORGES, 2008).

De acordo com Borges, a editora não indicou um público específico a ser alcançado pela tradução. Essa tradutora indica que

assim como não há público específico para Alice, o [texto de partida] (segundo creio), tampouco tive em mente qualquer público específico ao fazer a tradução. Acredito que a tradução, como o [texto de partida], admite muitas leituras, por públicos de todas as idades. Já as notas do Gardner são mais voltadas para o leitor adulto (BORGES, 2008).

Com essa afirmação, a tradutora enfatiza a universalidade da obra de Carroll. Contudo, por causa das notas explicativas de Martin Gardner, essa versão específica da história tem sido considerada leitura para adultos, interessados nas entrelinhas da narrativa de Carroll.

Ainda em relação à sua tradução, Borges aponta que teve “total liberdade” durante o percurso tradutório (BORGES, 2008). Entretanto, seu trabalho foi revisado, como ela própria recorda: “a editora não fez nenhuma interferência a priori, mas, ao receber o livro pronto, deparei [...] com alterações (poucas) introduzidas pela revisão”

202 Segundo o site da DTIL (“Direção, terminologia e indústrias da língua”),

(BORGES, 2008). No geral, Borges quase não notou as diferenças, mas aponta que quanto aos “versinhos e poemas rimados”, uma de suas “maiores dificuldades”, as modificações infelizmente “quebraram o pé” dos seus versos (BORGES, 2008). Por causa desse tipo de experiência, a tradutora agora opta por trabalhar lado a lado com os revisores de suas traduções literárias porque assim “o resultado é certamente melhor” (BORGES, 2008).

Ao longo de sua tradução, Borges não simplificou termos, nem substituiu os trocadilhos e paródias por outros conhecidos pelo leitor brasileiro contemporâneo. O intento, portanto, não foi facilitar a leitura da história de Carroll de forma direta, mas por meio das explicações à margem do texto traduzido. As referências culturais, como indica Borges, são “praticamente todas [...] explicadas pelo Martin Gardner”. A proposta é apresentar uma tradução que possa ser objeto de análise para estudiosos que queiram se aprofundar na obra, conhecendo mais sobre Carroll e o contexto que o levou a escrever as aventuras de Alice. Nesse sentido, Borges (2008) ressalta que “a tentativa foi sempre chegar o mais perto possível, se não da letra, pelo menos do espírito do [texto de partida]”.