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MARTA – Sujeito 2

No documento DOUTORADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA (páginas 117-121)

Marta tem 21 anos e sempre estudou em escola pública. Terminou o Ensino Médio em 2007, prestou o PROUNI e optou pelo curso de Pedagogia, pois era o que mais se aproximava da profissão em que pretende atuar: bióloga.

Bem, como disse nossa amiga Carla, eu também não tinha interesse de ser professora. Sempre tive interesse pela área de Biologia. Para ser bióloga, teria que fazer faculdade de Ciências e ser professora de Ciências. Aqui em Jundiaí tem este curso em apenas uma faculdade, só que ela é muito distante do meu bolso – é cara, não tenho condições de pagar. Então, veio o convênio PROUNI – eu prestei vestibular e consegui 50% de desconto. Minha família tem vários professores – eles me incentivaram a ser professora – e a me formar em Pedagogia. Agora no final do curso, sinceramente, posso afirmar que gostei! Hoje eu sei que, se algum dia frequentar o curso de Biologia eu vou ser um professor mais preparado, pois já tenho Pedagogia e aprendi a ser professor num curso que só faz isto. Vou ser um biólogo bem mais capacitado do que se eu fosse um biólogo sem fazer a Pedagogia.

(MARTA, Grupo de discussão, 28 ago. 2010)

A interrupção do sonho de ser bióloga não é definitiva, pois ela o perseguirá. Informa, nas narrativas, que sua atuação na escola fez com que gostasse da profissão e, olhando para o processo de formação inicial, faz questão de dizer com satisfação que, embora tenha sido professora por acaso, sente-se realizada com a opção e com o que a profissão exige.

Desde os 14 anos de idade, Marta tem trabalhado numa loja de tecidos e estudado no período noturno. Durante os anos iniciais do curso de Pedagogia, cumpriu as horas de estágio atuando como brinquedista, aos sábados à tarde, na Brinquedoteca que funciona com o Projeto Extensão à Comunidade. Declara que não conhecia a dimensão da vida dentro da escola. Essa visão alcançou a partir dos estágios, quando sentiu a responsabilidade de ser professora:

Estar na escola realizando o estágio e vivendo intensamente os desafios do dia a dia, os conflitos com as crianças, as cobranças da coordenadora e tendo o contato direto com os alunos ampliou meu olhar sobre a escola e confirmou minha opção: quero ser professora de uma realidade escolar como a da escola DEO”

(MARTA, Encontro com a pesquisadora, n. 1, 14 abr. 2010)

A aluna traz como lembranças dos melhores momentos na escola as aulas sobre seres vivos, dadas pela Professora Vera Lúcia, na 6ª série do Ensino Fundamental. Explica que nessa aula a professora dava o conteúdo por escrito e depois iam ao laboratório para realizar as leituras de lâminas (apenas uma para classe toda) no microscópio.

Abrimos uma galinha doada por uma mãe e enxergamos os órgãos, fizemos anotações. Fazíamos visita de campo – não era muito longe – ao redor da escola e fazíamos classificação de minerais, de folhas e outros objetos da natureza. Meu grupo era unido: lembro de todos eles até hoje. Sinto que o aluno precisa disso: desafios e prazer nas conquistas. O professor, como inovador das práticas, precisa de criatividade para dar aulas marcantes. (MARTA, Encontro com pesquisadora, n. 5, 19 maio

2010)

A aluna tem clareza do papel do professor e dos desafios e dilemas que deve assumir para propiciar ao aluno momentos de experiências que recorram a procedimentos de conduta e verificação dos resultados. A situação vivenciada, o que presenciou na união do grupo e a lembrança anunciada pela aluna na 6ª série marcaram sua vida. Esses detalhes narrados vêm ao encontro das reflexões feitas por Cunha (2010) sobre a concepção de lugar, uma vez que o lugar é constituído pela concretude que ele representa e pela relação que o indivíduo estabelece consigo mesmo e com os outros.

A aula da Professora Vera deixou marcas, confirmou seu gosto por Biologia e contribuiu para sua identidade pessoal e agora profissional, ou seja, o momento vivido afetou sua identidade. Marta transfere, para seus princípios que envolvem o ser e o estar na profissão docente, a representação que carrega consigo sobre a boa aula e a sensação de pertencimento, uma vez que a imagem do momento se faz presente até hoje na sua vida. Valoriza os conhecimentos profissionais e afirma que os conhecimentos pedagógicos da professora garantem a ação dos alunos.

Marta abraçou o desafio de participar da pesquisa e realizar o estágio nos dois períodos durante o tempo de férias – de 15 a 30 de abril. Entrava na escola às 7h30 e saía às 17h. Almoçava com as professoras e conheceu todas as salas de aula. Esse contato fez com que, em maio de 2010, mediante o convênio firmado com a Secretaria da Educação e as Instituições de Ensino Superior que têm curso de Pedagogia, fosse contratada como professora auxiliar de classe.

Desistiu do emprego de mais de seis anos e foi contratada pelo Programa Escola Nota 1037.

De acordo com Weller (2006), Marta conquistou o lugar e as pessoas que dele compartilham, pois a organização dos atores e dos seus modos de relacionar-se provocou uma transformação recíproca entre ela e as professoras e os alunos. Assim, concorda-se com o autor que o espaço se transforma em lugar quando há possibilidade de participação, expressão e anúncio de desejos e necessidades.

Entre muitas conquistas, uma delas merece destaque: Marta fez parte do grupo de professoras que auxiliavam os alunos no processo de aquisição da escrita alfabética. No mês de junho, diariamente era requisitada pelas professoras para atuar como professora auxiliar, oferecendo atividades de letramento para alunos de 6, 7 e 8 anos.

Para esta aluna, a escola DEO abriu horizontes e confirmou seu desejo de ser professora. Declara que a exigência do estágio foi o grande vilão da sua história, pois saiu da zona de conforto, já que trabalhava num local tranquilo e sabia fazer bem seu serviço, mas decidiu ir para o ambiente escolar, onde a vida é muito agitada, as aprendizagens são provisórias e o conhecimento está em constante construção e reconstrução (Encontro com a pesquisadora, n. 6, 02 jun. 2010).

Marta produziu dez narrativas e participou dos encontros com a pesquisadora. Levou para sua vida profissional as narrativas e, mesmo atuando no Programa Escola Nota 10, decidiu elaborar os registros em forma de narrativas. A tutora que acompanha o Programa elogiou seus registros.

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O Programa Escola Nota 10 já foi anunciado no capítulo 3, p. 59. Ele resulta do convênio assinado pela Prefeitura do Município com as escolas de Ensino Superior que têm curso de Pedagogia. A instituição onde essa pesquisa aconteceu firmou esse convênio, e as alunas sujeitos deste estudo foram convidadas para esse programa. As alunas Rose e Vivi não aceitaram, por estarem profissionalmente colocadas. Marta, Ana Clara e Larissa aceitaram, já que o convênio oferece remuneração pelo trabalho realizado como professora auxiliar de classe e possibilita a atuação nas ações que envolvem a alfabetização dos alunos dos 1º anos do Ensino Fundamental.

No documento DOUTORADO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA (páginas 117-121)