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CARACTERÍSTICAS DAS POPULACÕES HUMANAS E DO USO LOCAL DAS ROÇAS UTILIZADAS PARA AGRICULTURA DE COIVARA.

1.3. Material e métodos

1.3.1. Caracterização da atividade agrícola e das populações envolvidas no estudo.

É importante destacar que no primeiro contato como os informantes foram expostos os objetivos e finalidades da pesquisa, a origem dos entrevistadores, e o destino das informações. Em todos os casos a pesquisa se desenvolveu apenas após exclarecimento de dúvidas e da anuência dos entrevistados. Em nenhum caso houve recusa em disponibilizar informações, e a pesquisa de desenvolveu num ambiente de confiança entre as partes.

Foram utilizadas ferramentas de pesquisa etnográfica como roteiros de entrevista, questionário semi-estruturado, entrevistas informais e observação participante (Apêndice 1)8 (Vertler, 2002; Bernard, 1995). Como parte deste último método foram consideradas as atividades de convivência nos períodos de trabalho de campo, incluindo atividades de preparo e cultivo de roças, e preparo de farinha de mandioca (farinhadas).

8 Informações sócio-econômicas detalhadas deste dois bairros podem ser obtidas em Hanazaki (2001).

Nos bairros de São Paulo Bagre, município de Cananéia, e Pedrinhas, município de Ilha Comprida, pode ser feito um detalhamento maior das atividades dos agricultores atuais, e do histórico familiar relacionado a agricultura. Estas duas comunidades foram escolhidas

em função da facilidade de acesso, pelo contraste no uso de recursos (Hanazaki, 2001) e por ter sido as comunidades escolhidas para desenvolvimento de diversos sub-projetos associados ao projeto temático “Floresta e Mar”, visando estudos intregrados de ecologia humana e teoria de conflitos (ver também o capítulo 3).Na comunidade de São Paulo Bagre foram feitas 25 entrevistas em 17 residências (100% das famílias), e em Pedrinhas foram feitas 36 entrevistas em 33 casas, totalizando neste bairro aproximadamente 50% do total de famílias locais (Hanazaki, 2001). Foi usado como critério para esta amostra, a escolha de 1/3 dos moradores locais. Assim, escolhia-se uma, a cada três casas, para integrar a amostra (Hanazaki, 2001).

No início de 1999 foram feitas viagens de reconhecimento da área de estudo. Entre junho de 1999 a setembro de 2000 foram executadas viagens mensais de 5 dias em média, totalizando 90 dias de campo para as entrevistas relacionadas à caracterização do manejo agrícola, das espécies e variedades cultivadas, e para coleta de solos. Estas entrevistas foram complementadas em viagens a campo feitas durante os meses de abril e maio de 2001 (30 dias); outubro e novembro de 2001 (15 dias), e entre março e abril de 2002 (15 dias). Portanto ao todo foram 150 dias de campo entre os meses de junho de 1999 e abril de 2002.

Todos os agricultores foram visitados mais de uma vez, e todas as roças cultivadas no período foram mapeadas através de GPS (Sistema de Posicionamento Geográfico), para a caracterização espacial das roças e análise das mudanças temporais e espaciais no uso da terra. A unidade de análise será considerada como “unidade familiar”, composta de um casal com filhos residentes numa mesma residência. Como unidade familiar, entende-se a unidade de análise de produção e consumo, cuja capacidade de trabalho depende da mobilização de seus membros, manejando recursos produtivos e/ou para subsistência (Netting, 1993).

1.3.2. Caracterização dos solos usados para agricultura no Vale do Ribeira (SP) e Rio Negro (AM).

De cada unidade familiar foram coletadas amostras de solo de pelo menos uma roça que estava sendo manejada na ocasião das entrevistas. Em alguns locais foi possível coletar amostras de roças de idades de uso diferentes, totalizando assim 45 amostras que foram analisadas de duas maneiras: a) como amostras de solos da região sul do Estado de São Paulo; e b) como amostras para um estudo comparativo com amostras de solos de 18 roças estudadas9 entre agricultores caboclos da região do médio Rio Negro (AM), entre a cidade de Novo Airão e a foz do Rio Unini (AM) (entre as coordenadas geográficas: 2o22´262”N - 61o05´152”O, e 1o38´425”N - 61o41´117”O).

O estudo dos solos na região do Vale do Ribeira foi contextualizado sob a interpretação de três tipos de parâmetros: a) químico; b) físico; e c) cultural. Foi estudado o manejo a partir da fertilidade dos solos utilizados para agricultura, assim como a maneira que estes solos são escolhidos, nomeados e utilizados.

Entre os caiçaras foram analisados dois níveis de conhecimento sobre solos. Em um nível agregado serão consideradas as informações de todos os agricultores estudados. Em um nível mais detalhado será considerada a categorização de solos existente nas imediações da comunidades de Icapara, Aquários, Vila Nova e Praia do Leste (município de Iguape), que exibem maior heterogeneidade de ambientes utilizados para atividades agrícolas.

Das 45 amostras de solos coletadas, 36 são de roças em cultivo, 7 são de taperas e 2 amostras são de roças sobre sambaquis, que serão estudadas separadamente. Foram calculadas as correlações de Spearman (rs) entre as idades dos agricultores em anos, e o número de roças, as idades e as somas das áreas das roças em m2. Foram descontadas as áreas de taperas e sambaquis.

Taperas são áreas de sítios abandonados, mas que ainda são visitados, e até usados, exporadicamente para cultivo, por apresentarem solos de maior fertilidade. Sambaquis são amontoados artificiais de conchas de moluscos, vestígios de alimentação de grupos humanos. Dos sítios de sambaquis encontrados na região, 80% deles são datados de 8000 até 2000 anos (b.p), embora a maioria dos sítios datados esteja entre 5000 e 3000 (b.p.) (Prous, 1992). Os solos sobre os sambaquis podem representar antigos acampamentos

9 Estes dados foram coletados em conjunto com o projeto “Uso de Recursos Aquáticos e Vegetais no Rio Negro” (FAPESP - 98/16160-5), coordenado pela profa. Dra. Alpina Begossi do NEPAM/UNICAMP.

utilizados em tempos históricos por populações indígenas migrantes, porém a idade destes solos não é bem definida (Prous, 1992).

As amostras foram coletadas até 20cm de profundidade, que é a camada efetivamente explorada pelas raízes das espécies agrícolas cultivadas (Hernani et al., 1987; Nicholaides e Moran, 1995).

Foram amostrados de 10 a 15 pontos em cada roça, cujo solos foram depois misturados e acondicionados em sacos plásticos. Os parâmetros analisados no laboratório do Departamento de solos e nutrição mineral da ESALQ/USP (Campus de Piracicaba/SP), para a caracterização química e física, foram: matéria orgânica “MO”(g dm-3); fósforo “F” (mg dm-3); “pH” (em CaCl2); potássio “K”, cálcio “Ca”, magnésio “Mg”, hidrogênio mais alumínio “H+Al”(em mmolc dm-3). Dois índices, derivados dos parâmetros químicos, foram obtidos: soma de bases (“SB”), e saturação por bases (“V%”). As classes de textura física são: até 14% - arenosa (“AR”); 15 a 24% - média-arenosa (“MD-AR”); 25 a 34% - média argilosa (“MD-ARG”); 35 a 59% - argilosa (“ARG”); e 60% ou superior – muito argilosa (M-ARG). Os métodos analíticos seguiram os procedimentos descritos por Raji et al. (1987).

As 36 amostras referentes apenas às roças em cultivo foram agrupadas e analisadas segundo a idade de uso da roça. As classes de idade foram definidas em função da idade de uso no momento da coleta da amostra, e foram agrupadas em 3 classes de idade: de 1 mês até 12 meses (classe 1), de 13 até 24 meses (classe 2), e de 24 ou mais (classe 3). É importante ressaltar que a idade é de uso do solo no ciclo agrícola estudado no momento da coleta, que corresponde ao tempo entre amostragem e momento em que a roça foi preparada para plantio.

Foram utilizados 10 índices estimados pelas análises de solo: pH (PH), porcentagem de matéria orgânica (MO), fósforo (P), hidrogênio mais alumínio (H+Al), potássio (K), cálcio (CA), magnésio (MG), saturação por bases V(%); e porcentagem de areia (AR) e porcentagem de argila (ARG). Os dados foram analisados através do teste de Kruskal- Wallis para cada variável. Para estudo das correlações foram usadas as correlações de Pearson para variávies contínuas e de Sperman para variáveis discretas. Entre as variáveis de solo e idade da roças, optou-se pelo uso da idade em meses da roça (variável IDADE) e não da classe de idade.

As roças da Mata Atlântica foram comparadas à roças da região do baixo e médio Rio Negro. Foi utilizada a mesma metodologia de coleta e análises executada nas roças da Mata Atlântica. Foram utilizados os mesmos parâmetros químicos e físicos analisados nas roças da Mata Atlântica para comparação. Foram considerados os valores médios das amostras dos dois locais, para execução do teste de Kruskal-Wallis no estudo das variáveis separadamente. Foi utilizado Análise de Componentes Principais (PCA) para ordenação das amostras considerando um grupo de 8 variáveis, excluindo variáveis compostas como saturação por bases (V%), e variáveis complementares como teor de argila (ARG). Para o PCA foram avaliadas as variáveis: pH, H+A, K, P, Mg, Ca, MO, e teor de areia – (AR), utilizando a matriz estandardizada para execução da análise de correlação. Também foram retiradas 3 amostras consideradas outliers, constituindo-se então de uma análise com uma matriz de 51 linhas (roças) e 8 colunas (variávies).

Todas as análises estatísticas univariadas foram executadas pelo programa SPSS versão 10.0.5.. Para a Análise de Componentes Principais (PCA) foram utilizados os programas Fitopac versão 3.18 de autoria do Prof. George Shepherd do Departamento de Botânica da UNICAMP, e o programa MVSP versão 3.1f (Kovach Computing Services, 2003).