• Nenhum resultado encontrado

Um dos aspectos dos estudos sobre dinâmica evolutiva de espécies cultivadas é justamente a integração de escalas de análise.

Região REGIÃO Unidade geográfica COMUNIDADES Unidades culturais ROÇAS Unidades ecológicas

A Figura 1 ilustra o contexto de coleta de informações em diferentes níveis amostrais. Neste esquema, apresentado por Martins (2001), é possível compreender e acomodar diferentes perguntas e uso das técnicas discutidas, não considerando, porém, os níveis como excludentes, mas inter-relacionados hierarquicamente.

A roça está inserida numa estrutura organizada em níveis sucessivos de complexidade (Martins, 2001). Assim, este esquema permite, por exemplo, estudar a organização da diversidade de variedades de espécies entre regiões geograficamente distintas, onde cada região consiste de um conjunto de comunidades humanas. No contexto das comunidades estão inseridas as roças que cada família maneja. Neste esquema, a “região” é considerada a unidade geográfica, ou seja, onde pode acontecer fluxo de gens a partir de trocas de variedades a grandes distâncias; as “comunidades” compreendem as “unidades culturais” onde, definidas ainda pelo comportamento humano, podem ocorrer trocas em distâncias menores; e o nível “roça” compreende a unidade onde ocorrem os eventos micro-evolutivos (Martins, 2001). Este mesmo modelo, entretanto, pode ser compreendido de outra maneira, por exemplo, na organização e estruturação de perguntas e métodos quanto ao manejo da paisagem e manejo da diversidade em estudos comparativos: a “unidade geográfica” pode conter os elementos de diferenciação biofísica, a “unidade cultural” pode conter os elementos que permitem compreender as especificidades tanto de manejo da paisagem pelas comunidades humanas como no uso da diversidade cultivada, e a “unidade biológica” pode remeter para as questões sobre os eventos micro-evolutivos.

Figura 1. Esquema hierárquico de coleta de variedades para fins de análise de estrutura

genética da diversidade cultivada, assim como de integração de escalas de estudo (baseado em Martins, 2001, com modificações).

II. Objetivos

O objetivo geral da tese é analisar os fatores que têm influenciado a conservação, a perda e a amplificação de diversidade de espécies cultivadas, tendo com modelo a mandioca (Manihot esculenta Crantz). A atividade agrícola itinerante servirá como base para análise das relações entre homem, planta, e ambiente, lançando mão para isso de uma abordagem interdisciplinar. Para analisar estas relações, os objetivos específicos foram:

a) Analisar as características do manejo local agrícola caiçara no âmbito da agriculura itinerante (de coivara),

b) Comparar as roças itinerantes caiçaras às roças caboclas a partir de parâmetros edáficos.

c) Analisar as mudanças nas áreas de uso agrícola nos últimos 30 anos sob o aspecto da cobertura vegetal.

d) Analisar a diversidade de variedades cultivadas de mandioca quanto às características morfológicas e genéticas, e sua estruturação no espaço.

e) Conhecer e comparar a diversidade de variedades de mandioca cultivadas por populações caboclas amazônicas, à diversidade cultivada por populações caiçaras. f) Analisar os fatores de perda, conservação e geração de diversidade varietal de

mandioca entre os caiçaras

Os capítulos foram organizados como subdivisões de cada objetivo. No primeiro capítulo é feita uma caracterização e descrição da amostra de agricultores estudados, assim como do uso dos solos das roças itinerantes. As amostras de solos das roças caiçaras da região do complexo estuarino-lagunar de Iguape-cananéia e Ilha Comprida, na Mata Atlântica, são também comparados aos solos de roças caboclas, manejadas na região do baixo e médio Rio Negro, na Amazônia. Este capítulo trata especificamente do contexto local do manejo de roças e visa uma descrição geral dos ambientes de cultivo sob o contexto edáfico. O segundo capítulo trata do contexto regional das mudanças da cobertura vegetal nas áreas de uso agrícola tradicional na região do litoral sul de São Paulo. Com uma abordagem centrada na análise de mudanças espaciais e temporais, são analisadas imagens de satélite entre os anos de 1975 e 1999. O terceiro capítulo analisa o contexto regional do manejo de espécies e variedades de espécies cultivadas por agricultores caiçaras. Visa discutir o contexto amplo da conservação, assim como das perdas de variedades cultivadas,

ou de erosão genética. A mandioca é analisada como parte do manejo geral das variedades e espécies cultivadas pelas populações caiçaras. No quarto capítulo são analisadas as características morfológicas das variedades de mandioca. São avaliados os principais critérios de identificação de variedades usados pelos caiçaras. Neste capítulo é analisado também o fluxo de variedades entre agricultores com base na localização das variedades no espaço. No quinto capítulo a análise da diversidade das variedades de mandioca é aprofundada, sob o aspecto da diversidade genética. Utilizando uma abordagem da genética de populações, é avaliado como a diversidade está distribuída e estruturada no espaço. Neste capítulo são analisados tanto os fatores de conservação genética, como de amplificação da diversidade intra-específica da espécie. No sexto capítulo, alguns fatores de interação entre o manejo itinerante e componentes da histórica vital da espécie são analisados. Alguns processos evolutivos de amplificação de diversidade de mandioca, são discutidos.

A abordagem utilizada neste estudo envolve então um arranjamento de conceitos ligados tanto à domesticação de plantas, de manejo da paisagem, como de influências sócio-econômicas e ambientais sobre o uso da diversidade cultivada (Figura 2).

Figura 2. Diagrama esquemático das relações dos temas da abordagem utilizada na tese. Domesticação

Ação humana Manejo - Paisagem Atividade humana

Dinâmica evolutiva

Amplificação de diversidade

Conservação de diversidade Perda de diversidade