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5 INSTITUIÇÕES DO CAMPO JURÍDICO ESPAÇOS PARA A PRÁTICA PROFISSIONAL

5.4 MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS E DE PROTEÇÃO

5.4.1 Medidas em meio aberto: liberdade assistida e prestação de serviço à comunidade

De acordo com a Resolução Nº 109 do Conselho Nacional de

33 A medida de advertência consiste no comparecimento do adolescente,

obrigatoriamente acompanhado dos pais ou responsáveis, perante a autoridade judicial (juiz e representante do Ministério Público) o qual vai lhe informar sobre as implicações de sua conduta, e literalmente lhe “advertir” quanto a sua prática infracional. Após a admoestação verbal, a medida é reduzida a termo e deve ser assinada pelo adolescente e demais pessoas presentes. A medida de obrigação de reparar o dano é aplicada quando o ato infracional apresentar reflexos patrimoniais implica no comparecimento do adolescente perante a autoridade judicial, para que o adolescente devolva, restitua ou compense a vítima.

Assistência Social - CNAS, de 11 de novembro de 2009, a qual aprova a Tipificação Nacional dos Serviço Socioassistenciais, o cumprimento das medidas de prestação de serviço à comunidade e liberdade assistida se dá no Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida Socioeducativa, o qual deve ficar localizado no CREAS34 (Centro de Referência Especializado de Assistência Social). Este Serviço, de acordo com a referida Resolução tem por finalidade:

[...] prover atenção socioassistencial e acompanhamento a adolescentes e jovens em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto, determinadas judicialmente. Deve contribuir para o acesso a direitos e para a resignificação de valores na vida pessoal e social dos (as) adolescentes e jovens. Para a oferta do serviço, faz-se necessário a observância da responsabilização face ao ato infracional praticado, cujos direitos e obrigações devem ser assegurados de acordo com as legislações e normativas específicas para o cumprimento da medida (CNAS, 2009, p. 22).

O cumprimento da liberdade assistida35 se dá pela realização de um acompanhamento sistemático do adolescente, a ser realizado pelo menos

34 De acordo com o documento Orientações Técnicas: Centro de Referência

Especializado de Assistência Social do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS, 2011, p. 23): "Considerando a definição expressa na Lei nº 12.435/2011, o CREAS é a unidade pública estatal de abrangência municipal ou regional que tem como papel constituir-se em lócus de referência, nos territórios, da oferta de trabalho social especializado no Sistema Único de Assistência Social (SUAS) a famílias e indivíduos em situação de risco pessoal ou social, por violação de direitos. Seu papel no SUAS define, igualmente, seu papel na rede de atendimento. O papel do CREAS e as competências decorrentes estão consubstanciados em um conjunto de leis e normativas que fundamentam e definem a política de assistência social e regulam o SUAS. Devem, portanto, ser compreendidos a partir da definição do escopo desta política do SUAS, qual seja, afiançar seguranças socioassistenciais, na perspectiva da proteção social".

35 De acordo com o SINASE, a Liberdade Assistida pode ser Comunitária (LAC),

onde cada técnico terá sob seu acompanhamento e monitoramento o máximo de vinte orientadores comunitários. Sendo que cada orientador comunitário acompanhará até dois adolescentes simultaneamente; ou Liberdade Assistida Institucional (LAI), onde cada técnico acompanhará simultaneamente no máximo vinte adolescentes.

uma vez na semana, com a equipe técnica do programa, pelo período mínimo de seis meses, não há fixação de prazo máximo (a finalização da medida será decidida pela autoridade competente, o que ocorre geralmente por recomendação da equipe de acompanhamento). A equipe técnica para atuação no Serviço está regulamentada na Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Sistema Único de Assistência (NOB-RH/SUAS), onde estão previstos pelo menos dois assistentes sociais para cada oitenta indivíduos atendidos, além de outros profissionais36. O Art. 119 do ECA define algumas diretrizes para o cumprimento da medida:

I – promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência social; II – supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula; III – diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua inserção no mercado de trabalho; IV- apresentar relatório do caso (BRASIL, 1990).

Para a operacionalização do programa exige-se a elaboração do Plano Individual de Atendimento (PlA). O PIA, é um elemento fundamental no cumprimento da medida de liberdade assistida, mas também está previsto nas demais medias socio-educativas. Este documento deve ser construído pela equipe técnica, contanto com a

36 Na Resolução Nº 109 do CNAS, constam como atribuições da equipe que

atende no Serviço em meio aberto: acolhida; escuta; estudo social; diagnóstico socioeconômico; referência e contra referência; trabalho interdisciplinar; articulação interinstitucional com os demais órgãos do sistema de garantia de direitos; produção de orientações técnicas e materiais informativos; monitoramento e avaliação do serviço; proteção social pró-ativa; orientação e encaminhamentos para a rede de serviços locais; construção de plano individual e familiar de atendimento, considerando as especificidades da adolescência; orientação sociofamiliar; acesso a documentação pessoal; informação, comunicação e defesa de direitos; articulação da rede de serviços socioassistenciais; articulação com os serviços de políticas públicas setoriais; estímulo ao convívio familiar, grupal e social; mobilização para o exercício da cidadania; desenvolvimento de projetos sociais; elaboração de relatórios e/ou prontuários (CNAS, 2009, p. 23).

participação do(a) adolescente e da família. Nos termos da Lei de Execução do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, lei federal nº 12.594/2012 determina o art. 52 e 53

O PIA deverá contemplar a participação dos pais ou responsáveis, os quais têm o direito de contribuir com o processo ressocializador do adolescente, sendo esses passíveis de responsabilização administrativa, nos termos do art. 249 da Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 (ECA), civil e criminal. Art. 53 O PIA será elaborado sob a responsabilidade da equipe técnica do respectivo programa de atendimento, com a participação efetiva do adolescente e de sua família, representada por seus pais ou responsável (BRASIL, 2012).

Neste documento, que não se quer estático e tão pouco guardado em uma gaveta, devem estar contidas questões como os objetivos e metas a serem alcançados durante o cumprimento da medida e as perspectivas de vida futura para o adolescente37. Nesse sentido, o PIA não pode ser estático porque a realidade não é, e sendo constante as perspectivas de mudança, o PIA deve sempre ser revisto, não podendo jamais constituir- se no preenchimento de um documento burocrático a ser simplesmente encaminhado às autoridades competentes.

No que concerne ao acompanhamento da medida de Prestação de Serviços à Comunidade, segundo o SINASE, deve ser estruturado para a concretização de uma ação pedagógica, de forma que deve ser considerado como prestação de serviços de relevância comunitária pelo

37 De acordo com Art. 54 do ECA deve constar no plano individual de

atendimento, no mínimo: I - os resultados da avaliação interdisciplinar; II - os objetivos declarados pelo adolescente; III - a previsão de suas atividades de integração social e/ou capacitação profissional; IV - atividades de integração e apoio à família; V - formas de participação da família para efetivo cumprimento do plano individual; e VI - as medidas específicas de atenção à sua saúde. Art. 55. Para o cumprimento das medidas de semiliberdade ou de internação, o plano individual conterá, ainda: I - a designação do programa de atendimento mais adequado para o cumprimento da medida; II - a definição das atividades internas e externas, individuais ou coletivas, das quais o adolescente poderá participar; e III - a fixação das metas para o alcance de desenvolvimento de atividades externas (BRASIL, 1990).

adolescente. Para tanto, a equipe técnica deverá identificar no município os locais para a prestação de serviços, a exemplo de: entidades sociais, programas comunitários, hospitais, escolas e outros serviços governamentais; as tarefas devem ser gratuitas e de interesse do adolescente. O tempo em que a medida será executada é determinado, em princípio, pelo Ministério Público. Na audiência de apresentação, o período máximo é de seis meses, podendo ser revisto; a jornada máxima de trabalho deve ser de oito horas semanais. A medida, assim como a de Liberdade Assistida, não pode implicar prejuízo da escola ou do trabalho, já que a inclusão nestes universos se constitui em direito fundamental dos adolescentes e, muitas vezes, em metas a serem alcançadas a partir de sua adesão ao serviço. Cabe destacar que, para a aplicação desta medida, a autoridade precisa contar com a concordância do adolescente (visto que não é permitido o trabalho forçado em nenhuma circunstância) e ainda observar a sua capacidade de dar cumprimento ao que lhe está sendo proposto.

A principal crítica que se dirige a execução das medidas em meio aberto, reside na falta de recursos e investimentos por parte do poder público municipal na implementação de um atendimento de qualidade para os adolescentes. O que leva muitas vezes os profissionais a se utilizarem de estratégias com pouca ou nenhuma efetividade. Nesse sentido, afirma Oliveira et al. (2006b), as estratégias utilizadas pelos profissionais são limitadas no tempo e, na maioria das vezes, se constituem em “operações de reposição”, como por exemplo a concessão de bolsas-auxílio ou de empregos temporários. Por outro lado, segundo ele, os profissionais realizam uma inserção dos adolescentes pelo “déficit”, ao garantir atendimentos precarizados de saúde e educação, ou encaminhá-los para empregos de baixa remuneração e valorização social.

E mais grave, ainda, é o fato de que não raramente se reduz a prestação de serviços à comunidade feita por jovens de periferia em lugares e funções insalubres, como a faxina de banheiros públicos, enquanto aos adolescentes de maior poder aquisitivo é dado o privilégio de pagarem, com o dinheiro dos pais, uma cesta básica (OLIVEIRA et al. 2006b, p. 59).

Para Tejadas (2009), o desafio que se coloca aos profissionais que atuam nas políticas públicas pertinentes ao cumprimento das medidas socioeducativas reside na materialização da proteção dos direitos

humanos, através da estruturação de condições que permitam ao adolescente gerar um projeto de futuro. Além disso, para a autora, não adianta apenas ofertar o serviço, é necessário garantir as condições para a sua permanência no atendimento, que envolve, segundo ela, tanto aspectos metodológicos quanto meios materiais, como a oferta do transporte ou da passagem para o comparecimento no atendimento. Por fim, a autora remete ainda a necessidade de superação de qualquer prática de caráter "tutelar, moralista ou segregatória", que procure alcançar o que ela chama de "sujeito idealizado", desprezando o contexto em que se forja a sua identidade; e ressalta a importância de uma articulação dos diversos programas sociais para que se direcionem ao atendimento das necessidades dos adolescentes.

No que tange a articulação dos programas sociais, Koller (2009) ressalta algumas questões que dizem respeito a própria estruturação da política, indicando que muitas vezes os profissionais não possuem uma apropriação adequada sobre o SUAS ou mesmo sobre o CREAS e as possibilidades de articulação

As inseguranças pessoais e profissionais geradas pelo pouco conhecimento que as categorias têm sobre a estrutura do SUAS e, consequentemente, pela constituição dos CREAS, pode afetar relações interpessoais e interprofissionais, que não somam na construção deste processo. Por isso a importância da qualificação permanente. Por prestar serviços especializados, é requisito fundamental que os diversos profissionais que atuam nos CREAS também sejam especializados naquilo que diz respeito à complexidade dos serviços em que vão atuar. Os múltiplos serviços especializados exigem que assistentes sociais, psicólogos, pedagogos e advogados trabalhem de forma articulada e integrada, garantindo a qualidade interventiva e o eficaz atendimento ao usuário. A prática profissional requer, entre tantos aspectos, a compreensão sobre os conceitos de multi-transinterdisciplinaridade e de intersetorialidade, com vistas ao melhor atendimento à população. O relacionamento técnico entre as diversas categorias profissionais que atuam nos CREAS exige maturidade, disposição, conhecimento teórico-prático e ético- político que favoreçam e ampliem o diálogo,

quanto aos diferentes procedimentos interventivos. Em relação à intersetorialidade, sempre que necessário, a complementaridade das ações deve ser buscada junto à rede socioassistencial de execução direta do poder público ou nas Organizações Não Governamentais/ONGs e, sobretudo, junto ao Sistema de Garantias de Direitos (SGD). Cabe ressaltar que a articulação e a interlocução permanente do CREAS com o SGD, é inerente e essencial ao desenvolvimento adequado dos serviços, visto que a intervenção está focada na questão da violação de direitos dos usuários (KOLLER, 2009, p. 14).

A ainda incipiente implantação do SUAS e de todos os serviços que ele congrega coloca a execução das medidas socioeducativas em meio aberto, em um vasto campo de vulnerabilidades que envolvem por exemplo: a apreensão do significado dessa política pelos seus operadores e a população em geral; a sua colocação quase sempre marginalizada perante a questão econômica e outras prioridades; a sua estabilidade na arena das disputas políticas.

A execução da medida socioeducativa no âmbito da assistência social exige dos profissionais a compreensão de termos jurídicos e de códigos próprios desse campo que não fazem necessariamente parte da sua formação.