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MEDITAÇÃO INTERNA E EXTERNA

As práticas meditativas usualmente se apresentam como experiências internas. Tanto a oração cristã como a meditação introduz ao devoto para o seu próprio mundo interior, deixando de lado o mundo externo. Assim os renunciantes indianos, os anacoretas cristãos e todos aqueles desligados do mundo formam por tradição um grupo humano de buscadores isolados do meio social.

Os monastérios e os claustros se converteram em lugares mais apropriados para estas vivências transcendentes e interiores. A solidão e a contemplação foram e tem sido ainda as companhias frequentes do reencontro pessoal. A descrição mais comum do caminho interior leva sempre a isolarem-se do mundo, como se este mecanismo fosse o único meio de acesso ao divino.

O Bhagavad Gita15 tem sido o texto principal da tradição

da India. Em seus parágrafos de delineiam os três possíveis caminhos que qualquer buscador pode utilizar para conhecer a sua essência. Este texto sagrado apresenta muito claramente, através de seus dezoito capítulos, os caminhos do karmayoga16,

o bhaktiyoga17 e o gnanayoga18. É neste livro fundamental, onde

encontramos os sinais corretos sobre o que é a meditação. 15 Capítulo especial da epopeia do Mahabharata, o qual é considerado como

seno um Upanishad ou libro de inspiração divina, cujo ensinamento é referência para os buscadores da Realidade.

16 O caminho da realização interior mediante a reta ação ou dharma. 17 O caminho da realização interior mediante a devoção inegoista. 18 O caminho da realização interior mediante o discernimento ou viveka.

Tem que entender que os primeiros seis capítulos do Gita tratam sobre o karmayoga, e o resumo de forma geral desta via de realização mediante a ação se encontra no capítulo seis. Da mesma forma, desde o capítulo sete ao dezoito se desenvolve a natureza do bhaktiyoga e do gnanayoga, respectivamente. Desta maneira iniciaremos o desenvolvimento da auto-indagação, descrita como sendo uma prática meditativa associada a um corpo físico passivo ou quieto, onde se restringem os sentidos e a mente se reafirma no interior. Posteriormente analisaremos a indagação tal como apresenta o Bhagavad Gita, sob a luz da interpretação do advaita.

Estudante- O perfil do imaginário coletivo mostra a meditação como sendo uma prática que se realiza sentado em uma complexa postura, que se apresenta em ter uma posição especial das mãos e se acompanha de algum mantra, é assim?

Sesha- Essa é a versão mais frequente que se tem da meditação. Algumas de suas afirmações são válidas, mas ainda se advertem, pelo tom de sua voz, como se fosse fora do contexto sobre o qual eles foram projetados desde os tempos antigos. Existem varias classificações a respeito da prática meditativa. Por exemplo, existem a meditação nirguna Brahman (Brahman sem atributos) e a meditação saguna Brahman (Brahman com atributos). Referimo-nos as práticas meditativas nas quais se apresenta a atenção disposta à ausência de categorias mentais, ou a atenção disposta a variados tipos de categorias mentais como são o canto de mantras, cânticos ou visualizações.

Também existe um tipo e meditação dependendo se a atenção se pousa no mundo externo ou no interno. Neste caso é importante notar que se quaisquer umas das fronteiras dos cinco sentidos físicos participam da percepção, então o mundo que se adverte é o externo. Quando, ao contrário, os sentidos se desconectam devido

a que a atenção se firma no mundo interno, então, de imediato se aviva a realidade interna.

Em virtude do anterior, a Auto-indagação de Ramana é um tipo de prática interna que se apresenta associada a uma meditação nirguna Brahman.

Tabela 2

A prática meditativa segundo apresentem ou não categorias mentais

Tipo de prática

meditativa Observação Tipo de via

Nirguna Brahman A mente não se prende em nenhum tipo de categoria mental. Gnanayoga Saguna Brahman

A mente associa-se a diversas categorías mentales, tales como los

mantras (palabras de poder), kirtams

(cánticos), bijans (monosílabos) e todo tipo de visualizações.

Karmayoga y bhaktiyoga

Tabela 3

A prática meditativa segundo se atende ao mundo externo ou interno

Tipo de prática

meditativa Observação Tipo de via

Externa A atenção pousa nos objetos de cog-nição. Quaisquer dos cinco sentidos estão ativos no processo cognitivo.

Gnanayoga, Karmayoga y Bhaktiyoga

Interna

A atenção pousa exclusivamente no mundo interno. Os cinco sentidos se desconectam impedindo que o mun- do externo apareça.

Gnanayoga y Bhaktiyoga

E.- Realmente a sua apreciação a respeito da meditação é um tanto nova.

S.- Será nova para quem desconhece a mais profunda metafísica advaita e que além, não conhece com profundidade a experiência não-dual.

E.- O que quer dizer com Brahman com ou sem atributos?

S.- Se refere em que a mente escolha um objeto para ser iluminado ou não pela atenção. Normalmente a atenção se associa a percepção tal como um vidro translúcido se associa a cor. A atenção não é um objeto, mas fortalece a cognição de objetos. Da mesma forma, a translucidez do vidro não representa uma cor, graças ao qual permite a apreciação de cores sem afetar os seus tons.

Brahman representa, associado à nirguna ou saguna, a possibilidade de apreciar a infinitos atributos com os quais a mente pode associar-se. Quando a mente se associa a uma «forma», a uma «cor», ou a qualquer categoria mental como o «carinho» ou a «tristeza» que possa ser percebida, então esta experiência representa o surgimento mental de qualquer dos infinitos atributos que a mente pode pensar. E.- A meditação parece um mundo muito complexo…, possui muitas

variantes que são difíceis de detectar por um leigo no tema. S.- A meditação não é um mundo complexo, mas sim é complexo

outorgar-lhe um tratamento teórico devido à naturalidade de sua simplicidade. Deve entender que a linguagem humana está estruturada para criar ideias e com elas construções mentais cada vez maiores e mais elaboradas. Não existe uma linguagem que tenda a fracionar as ideias para chegar ao espaço entre as letras. Por isto, explicar o simples geralmente confunde.

E.- Então a mediação pode existir sem que medeie qualquer posição física passiva?

S.- Com certeza. A meditação não é um tipo de ação, mas a acompanha, como o faz o espaço ao vento. A meditação não é um tipo de pensamento nem de emoção, mas as acompanha tal como o sorriso acompanha a alegria.

Erroneamente se tem apresentado a meditação como sendo uma atividade exclusivamente passiva, pois o corpo deve permanecer não apenas em silêncio, mas sim, totalmente quieto e acompanhando a uma mente interiorizada. Na verdade, isto não é assim. A não-dualidade em que se encerra a meditação pode expressar-se acompanhando a percepção, seja pelos sentidos ativados ou não. É possível meditar realizando qualquer ação, ou seja, converter a vida cotidiana em um intermediário da liberdade interior. Meditar não requer sentar-se em um local isolado e desconectar os sentidos refugiando-se no interior; também a meditação pode ser realizada no dia a dia. A este tipo de prática meditativa que se realiza como purificante mental a denominamos de karmayoga.

E.- A religião requer que nos matriculemos como monges para seguir o divino. Mas, se a ação é um purificante, então qualquer pessoa em qualquer condição poderá transformar-se e experimentar a graça divina...

S.- Assim é. Um dos maiores erros de nossa cultura ocidental tem sido outorgar a terceiros a nossa própria salvação interior. Temos sido castrados ao divino ao aceitar a falsa premissa de requerer intermediários para nos aproximarmos de Deus. Quando nossa salvação depende de matricular-nos em uma crença, limitamos a nossa transformadora força interior. A força do cotidiano é imensa. O cotidiano viver inclui qualquer atividade, a partir dos simples atos, as maiores responsabilidades. Ser hábil na ação é yoga. A ação realizada corretamente é capaz de reestruturar a mente

induzindo no processo cognitivo e ao surgimento de viveka, o discernimento metafísico.

E.- No entanto, não é a «reta ação», a qual você denomina «dharma», o único mecanismo de transformação interior, pois também há a via da devoção ou do amor inegoista.

S.- De fato, tanto o saber como o amor são contínuos, ou seja, são entidades sem fronteira alguma, nem finais e nem internas. Para o advaita a Consciência é um contínuo, semelhante ao que é o Amor. Quando nos situamos em qualquer deles a mente se adverte não-diferenciada daquele que conhece o ama. A devoção é uma força que integra o amante com o amado. A expressão mais forte e intensa da devoção é reconhecer o amado em cada canto da vida. O devoto finalmente assume que a Divindade se encontra em todas as coisas de sua criação.

Um devoto que vê a Deus em todas as coisas tem que ter uma força interior que pouquíssimos seres humanos têm alcançado. Nosso amor apenas nos permite nos entregar aos filhos ou no universo do casal e a outra coisa de acordo com a atividade. Mas amar sem egoísmo, é tão imenso que ao fazê-lo desgarra o devoto sem a possibilidade de poder armar novamente a individualidade.

Assim, como uma parte de um todo, reparte o seu afeto amoroso a todo aquele que conhece, sem a possibilidade de ter controle de decidir a quem vai amar. O devoto se converte em escravo de quem ama e isso lhe outorga a sua liberdade. Converte-se em um «ninguém» que ao mesmo tempo é um «todo», através de um sentimento que se espalha na própria criação. O devoto vê a Deus através dos olhos de sua criação.

A AUTO-INDAGAÇÃO DO «EU»