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Uma das necessidades primárias do homem é a alimentação. A este respeito, existem diversas discussões em âmbito mundial geradas pela falta de alimentos, pela dificuldade de encontrar condições favoráveis para o cultivo de todas as cadeias alimentares, por questões relacionadas à alta do preço das commodities e pelo excesso de demanda para pouca oferta em nível mundial. Nesta subseção será apontada a importância da agricultura para a sociedade, levando ao estudo do trigo, que é o grão mais importante na alimentação humana, mostrando como está a produção brasileira desta cadeia e também a produção mundial.

O representante da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), Hélder Muteia, 2011, apontou a queda no ritmo da produtividade agrícola, o crescimento da demanda mundial por alimentos e a volatilidade dos preços, fatores estes que levam a uma imediata insegurança alimentar, que é combatida pela organização. A FAO apontou também que em 2011 a produção mundial de cereais em geral, caiu 1,1%, enquanto o consumo subiu 1,9% no mundo. Na visão de Bacha (2004) a agricultura tem seis papéis no processo de desenvolvimento econômico, sendo o primeiro o fornecimento de alimentos para a população, em seguida o fornecimento de capital para a expansão do setor não agrícola. Em terceiro, a agropecuária deve fornecer mão-de-obra para o crescimento e diversificação das atividades voltadas para a economia, sendo seguido pelo fornecimento de divisas para compra de insumos e bens de capital para promover o desenvolvimento de atividades econômicas. Em quinto lugar, a agricultura acaba por

se constituir em um mercado consumidor para os setores não agrícolas. Por fim, o sexto item, está focado no mercado agrícola brasileiro, fornecendo matéria-prima necessária para o desenvolvimento da indústria em geral.

“Nosso país ocupa a posição número 1 no mundo em pelo menos três produtos: cana-de-açúcar (açúcar e agora, mais recentemente, o álcool), citrus (com ênfase no suco concentrado congelado) e também no café”. (NEVES; ROSSI, 2004, p. 35).

A agricultura e a pecuária do MERCOSUL cresceram significativamente nos últimos anos. A produção de soja no Brasil, Argentina, Uruguai, Bolívia e Paraguai dobrou entre 2000 e 2006. Aumentos significativos também puderam ser observados na produção de milho, arroz, frango e leite. Em grande medida este aumento esteve ligado a uma demanda internacional aquecida dos preços dos commodities no mercado internacional, bem como no aquecimento da demanda doméstica do MERCOSUL. (BATALHA et al, 2009, p. xii)

Ainda, conforme Neves e Rossi (2004, p. 235), “o Brasil caminha também para a liderança mundial nas exportações de carne bovina e de soja, apresentando atualmente o menor custo de produção mundial nestas cadeias.”

Nos últimos anos, foi observado largamente um boom no setor agrícola brasileiro, fortemente impulsionado pela soja, carne bovina, avicultura, suco de laranja, cana-de-açúcar e milho. A soja e o milho são largamente exportadas para a China, país que só tende a crescer no aspecto populacional. A carne bovina é exportada para globalmente, e a produção por hectare no Brasil é a melhor do mundo. A carne de frango e miúdos, produzidos com foco no mercado consumidor, são amplamente exportados para o Oriente Médio. O suco de laranja, por sua vez, tem como um dos principais mercados os Estados Unidos, enquanto que a cana-de- açúcar tem duas utilizações, a produção de açúcar, item no qual o Brasil também é forte na exportação, e a produção do etanol, como biocombustível.

Por outro lado, temos também produtos que, por diversos motivos não estão contribuindo para o saldo da balança comercial, produtos dos quais as importações são maiores que as exportações. Entre esses produtos encaixa-se o trigo, fundamental para consumo humano e animal. (NEVES; ROSSI, 2004, p. 36).

“Não foi sempre assim. No final dos anos 80 o Brasil chegou a produzir sete milhões de toneladas de trigo. E, em compensação, nos últimos cinco anos importou, na média, mais do que isso.” (NEVES; ROSSI, 2004, p. 35).

De acordo com Batalha et. al. (2009), eram oferecidos pelo Estado subsídios10 à produção e garantia de comercialização a preços pré-estabelecidos para esta cadeia. Tal política chegou em 1987 a suprir 93% da demanda brasileira.

Decisões políticas do Governo – como fortalecer o Mercosul – e erros da cadeia produtiva – sempre desarticulada – foram responsáveis por esse desequilíbrio. Falácias – do tipo “o trigo brasileiro é de má qualidade” – também serviram para diminuir a confiança do produtor brasileiro em seu próprio produto. (NEVES; ROSSI, 2004, p. 36).

A este respeito, Neves e Rossi (2004, p.95) acrescentam que “em relação à autossuficiência, no início de 90, o Brasil produzia 40% do volume de trigo consumido no país, sendo que esta porcentagem caiu para 16,5% na safra 1999/2000.”

O consumo de trigo no Brasil vem apresentando taxas de crescimento positivas, passando de 7,43 milhões de toneladas em 1990 para 10,65 milhões de toneladas em 2006. [...] daqui a dez anos, o Brasil deve elevar seu consumo para cerca de 14 milhões de toneladas, devido ao crescimento populacional e ao aumento de consumo per capita. (EMBRAPA, 2008, apud BATALHA et al., 2009, p. 244).

Conforme Batalha e outros (2009, p. 245) “a produção nacional se concentra basicamente nos Estados do Rio Grande do Sul e Paraná, que respondem por cerca de 90% da produção”. Segundo dados da Conab11

(2008), o Paraná por sua vez produz aproximadamente 56% do trigo nacional, e o Rio Grande do Sul cerca de 34%.Há ainda uma pequena produção nos estados de Minas Gerais, Goiás, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina. A produção nacional é em sua grande maioria transportada por caminhões, somente uma pequena parte que é escoada do sul (Paraná e Rio Grande do Sul) para os moinhos do nordeste que é carregada em navios graneleiros.

Ainda segundo Batalha et al. (2009), os custos de produção no Brasil são extremamente elevados, a maior parte do valor é formada por fertilizantes e defensivos agrícolas, que precisam ser utilizados devido às condições de clima e ______________

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Ação governamental de fornecer aos produtores um incentivo econômico maior do que aquele originado somente do mercado. No caso do incentivo à produção no Brasil, ele é dado através da redução de preço de determinado insumo ou através de diminuição nas taxas de juros de

financiamentos contraídos pelos agricultores, sendo estas inferiores às praticadas no mercado. (MENDES, 1998).

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Companhia de Abastecimento Nacional, órgão federal que acompanha a trajetória do setor agrícola desde o plantio até a distribuição. Pertence ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. (NEVES; ROSSI, 2004).

solo brasileiras. Soma-se a isso, o fato que a maior parte do transporte é feita em caminhões, e grande parte das estradas do sul está em mau estado de conservação. Há também estradas em boas condições aonde foram implantados pedágios, elevando o frete, logo é verificável que os gastos com transporte se elevaram bastante. Em relação à armazenagem, há silos suficientes, porém eles não possuem divisões, impedindo separar as classes de trigo.

“O total de impostos que incide sobre o trigo nacional gira em torno de 25% do valor FOB. É interessante frisar que essa taxa é bem superior aos impostos pagos pelo trigo importado que entra no País.” (Batalha et al., 2009, p. 249).

A China é o maior produtor individual de trigo, sendo responsável por 17,52% da produção mundial dos últimos cinco anos, seguida por Índia (12,19%), Estados Unidos (9,97%) e Rússia (6,5%). A União Européia, como bloco, também tem grande participação na produção (17,79% nos últimos cinco anos). (NEVES; ROSSI, 2004, p. 115)

“A importância internacional desse grão é devida à utilização do trigo como a principal fonte energética na alimentação da população de muitos países”. (NEVES; ROSSI, 2005, p. 114). O trigo é matéria-prima para a produção da farinha de trigo, que é principal ingrediente na fabricação de diversos alimentos essenciais e de consumo diário na alimentação do ser humano, como, por exemplo, pães e massas.

O trigo é o grão mais comercializado no mundo representando 35,63% do comércio internacional, seguido pelo milho (24,54%). Apesar de ser o mais comercializado, esse volume corresponde à somente 18,37% do total produzido no mundo. Isso acontece, pois, há um grande consumo interno dentro dos países produtores.

Ainda de acordo com Neves e Rossi (2004), atualmente os Estados Unidos são os maiores exportadores de trigo, cuja participação média nas últimas 5 safras foi de 24,84% no comércio mundial do grão, sendo seguido pelo Canadá (14,31%), Austrália (14,12%) e União Européia (13,81%).

Isso mostra que o trigo que é comercializado no mundo é o excedente dos países produtores, e que os principais países com condições de produzir este excedente, devido à alta produtividade por hectare, estão no norte das Américas (EUA e Canadá).

“O Mercosul não figura como grande produtor de trigo. A Argentina, maior produtora do bloco, não aparece entre os cinco maiores produtores mundiais, voltando a maior parte de sua produção para exportações regionais.” (BATALHA et al., 2009, p. 241).

A caracterização da Argentina como mercado exportador está diretamente associada ao Brasil, pois, desde a desregulamentação do mercado brasileiro e do mercado argentino, passando o primeiro a produzir menos e o último a produzir maiores quantidades, que o Brasil está dependendo do mercado argentino para abastecer o mercado nacional.

“Nos últimos cinco anos, cerca de 70% do trigo consumido no Brasil foi proveniente de outros países, em especial da Argentina”. (NEVES; ROSSI, 2004, p. 119).

Conforme já mencionado, a produção nacional não supre mais que 50% da demanda interna, obrigando o país a optar por mercados secundários para obter o trigo necessário para suprir a demanda. Por esta razão, conforme Batalha et al. (2009), o Brasil desponta como um dos maiores importadores do mundo, tendo no ano de 2005 importado 6,718 milhões de toneladas, totalizando 6,12% das importações mundiais.

Em relação à origem do trigo importado, nota-se a supremacia do produto proveniente da Argentina, principalmente devido ao custo inferior. Até 2001, a Argentina era responsável por cerca de 95% das importações brasileiras de trigo; outros 5% eram originados dos EUA, Paraguai, Canadá e Uruguai. (NEVES; ROSSI, 2004).

A Argentina, historicamente, possui uma produção por hectare maior que a brasileira, comparável, segundo Batalha et al. (2009) a produção Canadense e Australiana, com 2,5 toneladas/hectare, estando somente um pouco abaixo da produtividade observada nos Estados Unidos.

A Argentina apresenta ainda custos de produção reduzidos se comparados aos grandes exportadores mundiais, sendo assim possível manejar as exportações mesmo com o valor de 20% de imposto sobre o trigo a ser exportado, conforme segue “Argentina, com 41 US$/tonelada, e Canadá, com 43 US$. França e EUA apresentam custos bem superiores (68 e 80 US$/tonelada, respectivamente.)” (BATALHA et al., 2009, p. 252).

Todavia, existe ainda um importante e crítico fator ao citar a Argentina como principal fonte de fornecimento para o Brasil, é que, após a 2006, foi adotada uma política de retenção de trigo para a exportação, fato que se deu após a crise de desabastecimento e alta nos preços internos argentinos por haver exportado demasiada quantidade do grão. Em adição, nos anos seguintes, o país passou por uma grave seca, reduzindo as quantidades finais das safras.

A qualidade do trigo produzido nos EUA e Canadá é diferente da produzida no Brasil e Argentina, sendo que o oriundo do Canadá é preferido por boa parte dos moinhos brasileiros, devido à características específicas e ao maior cuidado na separação e processamento dos grãos. (BATALHA et al., 2009, p. 239).

Este também é um dos motivos para os moinhos brasileiros optarem pela compra não somente da Argentina, mas também do Canadá (com melhores grãos) e dos Estados Unidos. As variações de trigo plantadas nesses países são distintas do que plantam Brasil e Argentina. Logo, é possível observar que a importação de trigo norte americano acontece devido a outro fator relevante: dependendo da finalidade da farinha (pão, massas, biscoitos) é que se escolhe qual tipo de trigo será utilizado ou como a mistura será feita.

Portanto, a redução da produção nacional de trigo, em favor da desregulamentação do setor e focando na importação na década de 1990 transformou o Brasil em um país importador, colocando-o a mercê dos demais produtores mundiais e sua disponibilidade do grão, bem como sua precificação. Este estudo pretende aprofundar como a estrutura das escolhas feitas impactou na produção de trigo brasileira, tornando o Brasil incapaz de suprir sua demanda interna por trigo desde então. Mais uma vez, este trabalho pretende contribuir para a compreensão dos aspectos que levam o Brasil a importar trigo e apontar as consequências desta opção.

3 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS

O problema de abastecimento alimentar no mundo é um tema atual que gera muita discussão, em decorrência da limitação de espaços cultiváveis, das instabilidades climáticas, e, principalmente, da quantidade de pessoas no mundo que precisa ser alimentada.

De fato, o trigo é um dos principais alimentos com fontes energéticas capazes de saciar e fornecer nutrientes, sendo largamente utilizado para a confecção de farinha de trigo e seus derivados. Por sua tamanha utilidade, ele está presente no dia-a-dia de grande parte da população.

No entanto, embora estejamos falando de um item essencial na alimentação humana, que é inclusive regulamentador da cesta básica brasileira12, esta é uma cadeia na qual o Brasil não apresenta aptidão suficiente na produção, sendo deficitário a ponto de ter que importá-la de outros países produtores.

Para melhor explicar este tema serão apresentados dados referentes ao mercado de trigo no Brasil e na Argentina, expondo em seguida o histórico do trigo no Brasil e também os entraves que dificultam a produção local.

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