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Capítulo 2 Políticas de Atração de Investimentos: O Brasil

2.2 O Brasil e a regulamentação em IEDs

2.2.3 Direito Integracional e Internacional

2.2.3.1 Mercosul

Como membro do bloco regional é de se esperar que a normatização sobre IEDs produzida no âmbito integracional venha a produzir efeitos no Brasil. Porém, na realidade, como em quase todos os aspectos ligados à temática da integração regional dos países sul- americanos, o Mercosul, a questão se encaminha para o desinteresse do corpo administrativo-governamental, para a falta de comprometimento da política externa (não só a brasileira, como a de todos os membros) e para a inabilidade negocial brasileira.

Já se pode adiantar que no frenesi inicial, alguns anos depois da constituição do bloco, quando as esperanças e a vontade da implementação de políticas comuns superavam os obstáculos intra- regionais, foram criados três instrumentos legais que versam sobre o assunto, quais sejam: a) o protocolo de Colônia (MERCOSUL/CMC/DEC nº. 11/93) que trata dos investimentos procedentes dos Estados-membros do processo integracional; b) o protocolo de Buenos Aires (MERCOSUL/CMC/DEC nº. 11/94) que trata dos investimentos provenientes de Estados não-membros do Mercosul; c) decisão 08/93 do Conselho do Mercado Comum (CMC), que indica a necessidade de regulação mínima para os fluxos de capital.

Em suma, os dois Protocolos são os tratados mais relevantes dentro da temática concernente com o tratamento de IEDs no Mercosul, pois, além de estabelecer o que se entende por investimento107, indica os objetivos que permearam a decisão negociada intrabloco sobre o tema.

pois o diferencial da supranacionalidade só pode ser observado no bloco europeu. Nesse sentido ver: SEITENFUS, Ricardo A. S.; VENTURA, Deisy. Introdução ao Direito Internacional Público. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.

107 Os termos do artigo 1º do Protocolo de Buenos Aires, que define o que é investimento são

os seguinte: “ O termo “investimento” designará, em conformidade com as leis e regulamentações do Estado Parte em cujo território se realize o investimento, todo tipo de ativo investido direta ou indiretamente por investidores de um terceiro Estado no território do

A Dec. 08/93 do CMC, conforme salienta Silveira (2002) foi internalizada pelo Uruguai (leis 16.749, 16.774; Dec. 344/96 e Circ. BCU 1.534) e pelo Paraguai (lei 210/93), sendo que Brasil e Argentina argumentaram que já possuíam legislação que tratava da regulamentação108 de movimentos de capital à época da concretização da norma integracional.

Ambos os protocolos ainda não são válidos, pois o de Colônia, apenas a Argentina o incorporou ao sistema jurídico nacional e o de Buenos Aires soma-se, além da Argentina, o Paraguai. Assim, verifica-se a pouca importância que o Brasil dá à questão de IEDs dentro do Mercosul, o que não é de se estranhar, pois se nem dentro do país o assunto é tratado com a postura que deveria, imagine em um âmbito internacional de negociação, onde, apesar da definição de bloco de “integração”, ainda predominam a competição e a rivalidade históricas.

Interessante é notar, porém, que no preâmbulo do protocolo de Buenos Aires se estabelece a harmonização jurídica dos Estados-parte, conforme se segue:

“Destacando-se a necessidade de se harmonizar os princípios jurídicos gerais a serem aplicados por cada um dos Estados-parte aos investimentos provenientes de Estados não-parte do Mercosul, visando a não criar condições diferenciadas que não distorçam o fluxo de investimentos”.

Estado-parte, de acordo com a legislação deste. Incluirá, em particular, ainda que não exclusivamente:

a) a propriedade de bens móveis e imóveis, assim como os demais direitos reais tais como hipotecas, cauções, e direitos de penhora;

b) ações, cotas societárias, e qualquer outro tipo de participação em sociedades;

c) títulos de crédito e direitos a prestações que tenham um valor econômico; os empréstimos estarão incluídos somente quanto estiverem diretamente vinculados a um investimento específico;

d) direitos de propriedade intelectual ou imaterial incluindo em especial, direitos do autor, patentes, desenhos industriais, marcas, nomes comerciais, procedimentos técnicos, know-how e fundo de comércio;

e) concessões econômicas conferidas por lei ou contrato, incluindo as concessões para prospecção, cultivo, extração ou exportação de recursos naturais.

108 Silveira (2002) salienta, porém, que não se observa na legislação brasileira, norma com

Observa-se que o fundamento da norma é evitar a criação de competição intrabloco na corrida pela atração de IEDs. Somente esse motivo poderia ser suficiente para afastar o legislador brasileiro de uma apreciação e posterior incorporação da norma, apesar de que tal atitude seja prejudicial ao processo de integração.

Além disso, observando-se mais detidamente o protocolo de Buenos Aires verifica-se que assuntos cruciais como a promoção de investimentos109, tratada no item “B” do artigo 2° e a proteção de investimentos tratada no item “C” do mesmo dispositivo, ficam a cargo dos países, isoladamente.

Outro ponto interessante é o abordado no item “H” do artigo 2º, que trata da solução de controvérsias entre um investidor e um Estado- parte. Observa-se que o critério de escolha da jurisdição aplicável fica totalmente a cargo do investidor. Esse item tem importância capital, pois ao estabelecer a possibilidade de escolha de solução de controvérsia entre Estado e investidor através de meios arbitrais (incluindo-se aí instituições internacionais de arbitragem, como o ICSID), vai de encontro ao posicionamento brasileiro nesse sentido. O Brasil é o único país do bloco que não assinou a Convenção de Nova Iorque e portanto não faz parte do ICSID (MAYORGA, 1999), o que, se levado em consideração as regras da própria instituição e seu histórico interpretativo110 (por exemplo os casos Mafezzini e Pirâmides) não impediria o país de ser levado ao procedimento arbitral se porventura o país internalizasse a Dec. 11/94.

Não obstante essas determinações, o que também chama a atenção, é o fato de que essas normativas constituem-se, quando muito, em um guia de definições acerca de investimentos. Não estabelece uma política comum intrabloco, que vise um incentivo aos IEDs. Não

109 Artigo 2°, “B”, 1, da Dec. 11/94 do CMC: “Cada Estado-parte promoverá em seu território os

investimentos de Terceiros Estados , e admitirá tais investimentos conforme suas leis e regulamentações”.

110 Para saber mais sobre o assunto, ver: STERN, Brigitte. O Contencioso dos Investimentos

estabelece ainda, uma política de planejamento industrial ou o desenvolvimento de planilhas de vantagens regionais para a aplicação de investimentos estrangeiros.

Assim, conforme afirma Chudnovsky (1999, p.11), “as políticas contemporâneas de competitividade exigem um elevado grau de coordenação entre autoridades, agências e instâncias governamentais”, o que efetivamente não se observa no Mercosul. Além disso, continua dizendo que “ tudo isso está ausente do quadro regional: o Estado está fragmentado, os governos não se articulam, os instrumentos estão dispersos e o capital nacional está na defensiva”.

Conclui-se então, que apesar de existir algumas normativas acerca de Investimentos estrangeiros no quadro legislativo do Mercosul, observa-se que são mecanismos insuficientes, além de inoperantes, já que não estão em vigor, face ao descaso dos Estados parte. Para a existência de uma política comum relativa a esse tema, política essa absolutamente necessária para a atração de IEDs para o Mercosul, de maneira efetiva e equilibrada, evitando distorções intrabloco, há que se ter o desenvolvimento de normas mais bem trabalhadas, mais específicas, que tratem do fenômeno da forma mais ampla possível. Além disso, um pouco de seriedade e comprometimento por parte dos Estados parte é ingrediente imprescindível para que essa e qualquer outra política trabalhada no âmbito do Mercosul tenha resultados.

Assim, hoje, não há que se falar em política sobre investimentos no Mercosul. Esse assunto é tratado de maneira fragmentada pelos Estados parte, que desenvolvem autonomamente suas próprias políticas sobre esse assunto.