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No âmbito formativo, nesses três anos de pesquisa, em que me via e me viam observando as crianças, perguntando sobre seus desenhos e outras produções, sobre o que faziam, sempre para lá e para cá com a câmera na mão, recolhendo material, olhando murais, pastas, estantes; surge como reflexo dessa mexida na escola, que não passou despercebida a ninguém - o interesse das professoras dos bebês, das crianças de um ano, de instaurar no dia a dia, por conta própria, a prática da Mesa de Desenho, no Grãozinho - outra unidade, que funciona em uma casa distinta a escola maior - o Grão.

O trabalho de adaptação vivido nessa unidade perdura por um período longo, e há sempre muitos aspectos a serem cuidados, principalmente os de ordem emocional e afetiva. O começo do dia no Grãozinho se faz em meio aos choros de separação, as solicitações de colo, as necessidades de aconchego entre outras coisas; por isso, a Mesa de Desenho, no começo do dia, era contemplada de vez em quando, mas nunca teve a sistemática da outra casa, do Grão. A tentativa de instituí- la diariamente foi audaciosa e começou a acontecer por volta do segundo bimestre de 2015, pela equipe da tarde e, depois, pela da manhã que se sensibilizou com os registros feitos pela equipe da tarde.

Instituída a Mesa para os pequenos, ela toma rumos inesperados, com a preocupação já incorporada das professoras de procurar saber dos interesses, das possibilidades expressivas dos bebês, de como se relacionam com os materiais, com os suportes, com o próprio traço, com o traço do outro, dos gestos, das falas. O modo de conduzir, dando a autonomia necessária para a pesquisa da criança, sem deixar de olhar com apuro para os acontecimentos, já analiso como resultado desta minha investigação da Mesa, que passou a fazer parte de nossas reflexões sobre as artes visuais e a criança pequena.

Preocupadas também em como dar visualidade ao que descobrem e vivem com as crianças, os professores fazem seus próprios registros (escrito, fotográfico ou filmado) com o intuito de compartilhar entre elas, educadoras, e pais. Vejamos algumas fotos selecionadas por mim, tiradas pela equipe da manhã e da tarde do Grãozinho, que dão pistas do olhar do adulto e da escuta dele para o que vem da criança na Mesa.

Na Figura 130, o papel foi fixado à Mesa para ser preenchido por qualquer criança. Algo de interessante existe nessa ação dos professores, que trabalharam muito mais com os suportes coletivos do que com os individuais; será possível perceber isso em todas as fotos apresentadas, porque no exercício autônomo do desenho as crianças de um ano não dão importância aos suportes individuais - elas desenham naquele que está à sua frente e também no do colega, na mesa, no chão, enfim, não é preciso diferenciá-los já que o que importa é o rabisco, o movimento, a energia motora e sensorial.

O rabisco é isento de nomes e significados. “Os rabiscos se parecem; não são, portanto singulares, mas ao mesmo tempo, são a raiz da descoberta/de cada rabiscador/ do traço e das possibilidades entre um papel, um lápis ou caneta e ele” (MACHADO, 2002: 8).

Percebam na Figura 130, o interesse da criança pelo restinho de papel que está embaixo da Mesa, é lá que ela quer desenhar.

Com a parede toda disponível (Figura 132), Tomás testa também a madeira que serve de apoio para seus pés (para que não afundem na areia). E desenha com as duas mãos! (Figura 131). Para a criança pequena não há regras; é maravilhoso aprender com elas, e ver como são livres para experimentar. Com a ausência de crianças maiores (no Grãozinho há apenas crianças de um e dois anos), a ideia do suporte coletivo faz muito sentido para a ação da criança.

Na Figura 132, é possível também ver Tomás rabiscado no braço. Na maioria das vezes, o corpo é o próprio suporte para o desenho da criança pequena. Tomás não está sem blusa só porque está calor, mas também porque lhe é permitido desenhar no corpo, pintá-lo, expressar-se por ele.

FIGURA 132 (foto do acervo da escola)

Ao desenhar, a criança brinca com o lápis, a caneta, o giz e o papel; o material vira também brinquedo; e fonte de interação. Nas Figuras 133 e 134, as crianças mostram os seus interesses em investigar os materiais, e são minuciosas e muito atentas a eles - aproximam dos olhos, examinam por todos os lados, colocam na boca, jogam no chão, tiram sons, apertam, esmagam, cheiram...

Como vimos, a Mesa é uma prática simples e, ao mesmo tempo, produz significados importantes para a expressividade da criança, para os processos autônomos, singulares, inventivos e criativos. A Mesa abandonada pelo professor ainda trará algo de especial para a criança, com o ambiente bem montado, com os materiais à disposição, ela não deixará de produzir, mas não trará nada para ele; a qualidade da presença do professor é que fará a diferença para os dois.

Como vimos, a Mesa é uma prática simples e, ao mesmo tempo, produz significados importantes para a expressividade da criança, para os processos autônomos, singulares, inventivos e criativos. A Mesa abandonada pelo professor ainda trará algo de especial para a criança, com o ambiente bem montado, com os materiais à disposição, ela não deixará de produzir, mas não trará nada para ele; a qualidade da presença do professor é que fará a diferença para os dois.

FIGURA 133 (foto do acervo da escola)

Observem os trechos construídos pela professora da tarde para a comunicação aos pais sobre esse processo vivido na Mesa Desenho, sobretudo:

...o intuito é de perceber os interesses do grupo quanto à dinâmica da atividade, o tipo de material e como cada um se permite à investigação dos materiais. ... Desenho com rabiscos explorando com o que se risca e em que suporte se risca; contudo, consideramos que para as crianças pequenas, essa aproximação tem como principais características a exploração e a experimentação. (texto de reunião de pais - professora Sandra Araújo G1 tarde - março 2015).

... quero dar atenção especial ao grafismo que já começa a se evidenciar de forma mais clara a partir de agora. Durante as experiências expressivas e plásticas, algumas manifestações afetivas podem ocorrer no momento em que a criança “trabalha”. No caso do desenho, durante o traçado algumas verbalizavam como se criassem algum enredo sobre o que estavam fazendo. Além de se evidenciar o prazer mecânico, ou seja, aquilo que diz respeito ao próprio ato motor de rabiscar, também destaca-se, agora, o prazer visual e imaginativo enquanto as crianças estão no processo de criação de seu desenho. (texto de reunião de pais - professora Sandra Araújo G1 tarde - setembro 2015).

A criança desenha para brincar (Figura 135). O desenho é lúdico, é impulso para a invenção. (ALBANO, 2012)

Como vimos, a Mesa é uma prática simples e, ao mesmo tempo, produz significados importantes para a expressividade da criança, para os processos autônomos, singulares, inventivos e criativos. A Mesa “abandonada” pelo professor (com o ambiente bem montado e materiais à disposição), ainda trará algo de especial para a criança, pois ela não deixará de produzir; mas não trará nada para o professor. A qualidade da presença dele é que fará a diferença para ambos.