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CARACTERIZAÇÃO MOLECULAR DE ESPÉCIES DE ASPERGILLUS AFLATOXIGÊNICOS

13. INSTITUTO! DE! TECNOLOGIA! DE! ALIMENTOSIITAL!

1.5.5 Diagnose molecular de fungos micotoxigênicos

1.5.5.3 Metabólitos secundários de A flavus

Os metabólitos secundários são produzidos por diversos organismos, inclusive fungos. São pequenas moléculas bioativas que podem possuir propriedades que causam malefícios como, as toxinas das micotoxinas, ou benefícios farmaceuticos como antibióticos (penicilina e cefalosporina), antifúngicos (griseofulvina) e drogas anti-tumorais (terrequinone A) para a humanidade (Hoffmeister & Keller, 2007). Os metabólitos secundários raramente afetam ao crescimento ou reprodução do fungo sob condições laboratoriais, porém possuem papel importante na ecologia do fungo como fatores de adaptação como, proteção aos raios U.V., repelentes contra predadores, entre outros (Ehrlich et al., 2010; Reverberi et al., 2010).

Os genes envolvidos na síntese dos metabólitos secundários, normalmente, estão agrupados no genoma onde cada grupo de genes contém genes enzimáticos e, frequentemente, fatores de transcrição para compor a síntese do metabólito (Turner, 2010). No genoma de A. flavus já foram verificados 55 grupos de genes sob 28 condições diferentes, incluindo, patogenicidade na planta hospedeira, fatores ambientais, perda ou superexpressão de reguladores globais do metabolismo secundário como, LaeA e o grupo de genes que sintetizam a aflatoxina (Georgianna et al., 2010).

A diagnose molecular específica de fungos produtores de aflatoxinas, envolve a identificação de regiões alvo da via biossintética de aflatoxinas. Nos últimos anos o uso da genética vem proporcionando um maior conhecimento sobre o mecanismo regulatório, mostrando que a via biossintética de aflatoxinas é regulada por diversos mecanismos (Georgianna, 2008). A biossíntese da aflatoxina B1 envolve 23 reações enzimáticas, iniciando pela síntese do acetil-CoA. Um total de 15 precursores intermediários são descritos na via, envolvendo 25 genes agrupados em uma região de 75 Kb de DNA (Bhatnagar et al., 2006). Esses genes que estão envolvidos na síntese da aflatoxina aparentam ser altamente conservados entre as espécies de A. flavus e A. parasiticus. O genoma completo de A. flavus possui 37Mb e 8 cromossomos. A partir de seqüências completas do genoma de A. flavus, pode-se falar que o grupo de genes responsáveis pela produção de aflatoxinas está localizado perto de uma região telomérica do cromossomo 3 (Payne et al., 2007) (figura 8).

Figura 8: Grupo de genes responsáveis pela síntese de aflatoxina de A. flavus. As setas indicam a direção de transcrição de cada gene. As diferentes cores usadas nas setas indicam a função de cada gene na via. aflA, aflB participam da síntese de ácidos graxos, e aflC (gene em azul) sintetiza o ácido norsolorinico (NOR). O NOR, mais a frente, é sintetizado para esterigmatocistina (genes em amarelo) e

vermelho. Nomenclatura atual dos genes é mostrada acima das setas, e a nomenclatura antiga dos genes, é mostrada abaixo. Os genes em cinza não têm a sua função atribuída (modificado de Amaike & Keller, 2011).

A via biossintética de aflatoxinas é uma das vias de metabólitos secundários de fungos micotoxigênicos mais estudada, onde a maioria dos genes têm suas funções determinadas. O cluster da aflatoxina é conservada em vários graus em diversas espécies de fungos incluindo, A. parasiticus, Aspergillus ochraceoroseus, Emericella astellata, A. flavus var. parvisclerotigenus, Aspergillus toxicarius, A. nomius, Aspergillus pseudotamarii, Aspergillus zhaoqingensis, A. bombycis, Emericella venezuelensis, A. rambellii, A. nidulans e seu anamorfo Emericella nidulans, A. oryzae, A. sojae, e mesmo fungos distantes como Dothistroma. Entretanto, somente os Aspergilli produzem aflatoxinas ou a esterigmatocistina (Amaike & Keller, 2011).

A via biossintética possui dois genes reguladores independentes. O gene aflR codifica um fator de transcrição zinc-finger com ligação DNA (Zn(II)2Cys6), que regula a

expressão de genes biossintéticos da aflatoxina e esterigmatocistina. Uma superexpressão do aflR, aumenta a produção de aflatoxinas e regula positivamente outros genes da via biossintética da aflatoxina (Price et al., 2006). O aflR é capaz de ligar-se a região consenso do motif 5’-TCGN5CGR-3’ encontrada nas regiões promotoras de diversos genes da

aflatoxina e esterigmatocistina (Woloshuk et al., 1994). Um segundo sitio de ligação, 5’- TTAGGCCTAA é descrito como importante na autoregulação de transcritos de aflR em A. flavus e A. parasiticus (Chang et al., 1995). Outro gene também envolvido na regulação da via biossintética de aflatoxinas é o aflS ou aflJ. aflR e aflS são transcritos divergentemente por promotores diferentes, onde o seu produto regula a produção de aflatoxinas através da ligação e ativação do aflR. Apesar de o aflR iniciar a transcrição gênica independentemente, Georgianna & Payne (2009) sugerem que a proteína sintetizada pelo gene aflS aumenta a transcrição gênica da via quando ligado ao ativador aflR.

Diferente dos genes aflR e aflJ que estão presentes na via biossintética de aflatoxinas, genes como laeA e veA, localizados fora dessa via, são reguladores globais do metabolismo secundário de aflatoxinas (Bok & Keller, 2004; Calvo et al., 2004; Cary et al., 2007). Ambos os genes regulam o desenvolvimento do fungo e afetam a produção de sterigmatocistina e aflatoxina.

A via de conversão da aflatoxina segue a conversão do acetato em policetídeo, sedo convertido em antraquinonas, em seguida é convertido em xantonas e finalmente em aflatoxinas. O genes envolvidos nos principais passos de conversão da aflatoxina e suas funções compreendem os genes aflA (fas-2), aflB (fas-1) e aflC (pksA) envolvidos na conversão do acetato em ácido norsolorinico (NOR), conhecido como o primeiro precursor estável da via da aflatoxina. Estudos envolvendo a deleção do gene aflC, relataram a falta da produção da aflatoxina e seus intermediários, demonstrando que esse gene é importante para a biossíntese da aflatoxina (Feng & Leonard, 1995; Trail et al., 1005). Os genes aflD (nor-1), aflE (norA) e aflF (norB) estão envolvidos na conversão do NOR em averantina (AVN). NOR é convertido em AVN por redutase/ enzima dehidrogenase, e essa reação é

reversível dependendo de NADP(H) ou NAD(H) (Yabe et al., 1991). A deleção do gene aflE envolvido na conversão de NOR para AVN não prejudicou a habilidade dessa conversão, podendo ser devido a presença dos genes aflD, aflF e outros genes NOR redutase presentes no genoma (Cary et al., 1999). O gene aflG (avnA) codifica o citocromo P450 monooxigenase que converte o AVN em hidroxiaveratina (HAVN), e o gene aflH (adhA), codificador de um álcool dehidrogenase, está envolvido na conversão da HAVN em averufina (AVF). O gene aflI (avfA) que codifica uma oxidase, converte o AVF em um acetato versiconal hemiacetal (VHA), e para a conversão do VHA em VAL está relacionada ao gene aflJ (estA). A VAL é convertida em versicolorina B (VERB) pelo produto do gene aflK (vbs). Esse é um passo chave na formação da aflatoxina, uma vez que há a formação do anel bisfurano. Esse anel é necessário para a ligação ao DNA, dando a aflatoxina característica de mutagênica (McGuire et al., 1996). O gene aflL (verB) que codifica o citocromo P450 monooxigenase/desaturase, está envolvido na conversão de VERB em versicolorina A (VERA). Estudos têm demontram que a formação do VERA pelo VERB é um ponto de ramificação para a síntese do AFB1 e AFG1 do AFB2 e AFG2 (Bhatnagar et al., 1991; Yabe & Hamasaki. 1993). Os genes aflM (ver-1) e aflN (verA) estão envolvidos na conversão de VERA em demetilesterigmatocistina (DMST). O gene aflO (omtB, dmtA) está envolvido na conversão do DMST em esterigmatocistina (ST), e em DMDHST em DHST. Nos estágios finais da síntese da aflatoxina B1 (AFB1) são conduzidos por duas enzimas, a metiltransferase codificada pelo gene aflP (omtA) que converte a esterigmatocistina em O- metilesterigmatocistina, e uma oxidoredutase codificada pelo gene aflQ (ordA) que converte a O-metilesterigmatocistina em AFB1 (Yu et al., 2004) (figura 9, tabela 1).

Figura 9: Biossíntese da aflatoxina por A. flavus. Setas indicam a direção de síntese da via. Círculos sem preenchimento indicam produto enzimático. Quadrados indicam identificação da enzima (Enzyme

Commission number – E.C. number). Genes codificadores de enzimas são descritos ao longo da via

Tabela 1: Genes envolvidos na via biossintética da aflatoxinas de A. flavus. Nomenclatura atual dos genes envolvidos na síntese da aflatoxina, outras denominações usadas para cada gene correspondente, produtos enzimáticos e suas funções são descritas nessa tabela. Siglas usadas na tabela indicam: FAS (ácidos graxos sintases), PKS (policetídeo), NOR (ácido norsolorinico), AVN (averatina), HAVN (5’-hidroxiaveratina), AVF (averufina), VHA (acetato versiconal hemiacetal), VAL (versiconal), VERB (versicolorina B), VERA (versicolorina A), ST (esterigmatocistina), DMST (demetilesterigmatocistina), DMDHST (demetildihidroesterigmatocistina), OMST (O-metilesterigmatocistina), DHOMST (dihidro-O- metilesterigmatocistina).

Gene

Outros nomes

usados Produto enzimático Função na via biossintética

aflA fas-2 (hexA) Subunidade alfa FAS Acetato em policetídeo aflB fas-1 (hexB) Subunidade beta FAS Acetato em policetídeo

aflC pksA PKS Acetato em policetídeo

aflD nor-1 Redutase NOR em AVN

aflE norA (adh-2) NOR redutase/desidrogenase NOR em AVN

aflF norB Desidrogenase NOR em AVN

aflG avnA (ord-1) P450 monooxigenase AVN em HAVN aflH adhA Álcool desidrogenase HAVN em AVF ou AVNN

aflI avfA (ord-2) Oxidase AVF em VHA

aflJ estA Esterase VHA em VAL

aflK vbs VERB sintase VAL em VERB

aflL verB Dessaturase VERB em VERA

aflM ver-1 Desidrogenase/Cetorredutase VERA em DMST

aflN verA Monooxigenase VERA em DMST

aflO omtB O-Metiltransferase I ou O-metiltransferase B DMST em ST, DMDHST em DHST aflP omtA O-Metiltransferase A ou O-metiltransferase II ST em OMST, DHST em DHOMST

aflQ ordA (ord-1) Oxidoredutase/P450 monooxigenase OMST em AFB1 e AFG1, DHOMST em AFB2 e AFG2 aflR aflR Ativador de transcrição Regulador da via

aflS aflJ Potenciador (enhancer) de transcrição Regulador da via aflT aflT Proteína transmembrana Não atribuídos

aflU cypA P450 monooxigenase Não atribuídos

aflV cypX P450 monooxigenase Não atribuídos

aflW moxY Monooxigenase Não atribuídos

aflX ordB Monooxigenase/oxidase Não atribuídos aflY hypA Proteína hipotética Não atribuídos

Trabalhos caracterizando genes da via biossintética da aflatoxina quanto a sua síntese são descritos. Liu & Chu (1998) em análise com isolados que não produzem aflatoxinas de A. flavus, A. sojae e A. oryzae cultivados em meio propício para a produção de AFB1, mostrou que mesmo na presença do mRNA do gene aflR e o seu produto AFLR, a produção do mRNA do gene aflP não foi detectada. Ehrlich et al. (2004) descreve que um defeito no gene aflU (cypA) de A. flavus é o responsável pela perda da síntese das aflatoxinas G1 e G2. Abdel-Hadi et al. (2011) em estudo deletando o gene aflD (nor-1) concluiu que há diminuição da produção de AFB1 por A. flavus e AFG1 por A. parasiticus.

Sistemas de PCR múltipla usando mais de um par de primers para a identificação de fungos aflatoxigênicos têm sido desenvolvidos. Os genes alvo usados nessa identificação por PCR convencional e RT-PCR são os genes aflD, aflI, aflM, aflO, aflP, aflQ, aflR e aflS (Chang et al., 1992; Yu et al., 2000; Skory et al., 1992; Bhatnagar et al., 1991; Payne et al., 1993; Meyers et al., 1998). Levin (2012) cita três sistemas diferentes de diagnose de fungos aflatoxigênicos. Os sistemas são baseados em reações de PCR individual e múltipla envolvendo genes alvo da via biossintética da aflatoxina aflD, aflR, aflS, aflJ, aflM, aflO e aflP (Shapira et al., 1996; Färber et al., 1997; Rahimi et al., 2008). Nakamura et al. (2011), Em análise de sequências multilocus (MLSA) baseado no genes aflR, aflS, aflE e aflK,

desenvolveu um sistema de PCR que diferencia A. oryzae e A. sojae de amostras produtoras de aflatoxinas, A. flavus, A. toxicarius e A. parasiticus.

Vários estudos vêm sendo feitos na tentativa de correlacionar genes da via biossintética a fungos produtores e não produtores de micotoxinas, onde o gene aflR é principal alvo por ser um regulador positivo da via metabólica (Yu et al. 2004; Somashekar, 2004). Entretanto, Paterson (2006) sugere que o gene aflR não seja confiável para o uso de diferenciação de aflatoxinas por também estar envolvido na regulação de produção de esterigmatocistina, o penúltimo precursor da produção de aflatoxinas, o qual pode apresentar um resultado falso positivo. Genes como aflP ou aflQ, aparentemente, são os melhores candidatos para estudos de distinção entre fungos produtores e não produtores de micotoxinas por não serem relevantes para a biossíntese de esterigmatocistina, uma opção válida para primers diferenciadores de aflatoxinas em alimentos. Rodrigues et al. (2008), testaram os genes aflD e aflQ da via biossintética de A. flavus por meio de PCR e RT-PCR, para verificar a presença de expressão, onde a presença de ambos os genes não mostraram correlação com a aflatoxigenicidade do fungo. A expressão de aflD não foi considerada como um bom marcador para o diferenciamento de isolados aflatoxigênicos e não aflatoxigênicos, mas aflQ mostrou boa correlação entre a expressão e habilidade de produção de aflatoxinas.

Diversos estudos têm sido realizados com intuito do desenvolvimento de um sistema específico de PCR para espécies aflatoxigênicas. Entretanto, devido a diversidade nucleotídica entre indivíduos das quatro espécies produtoras de aflatoxinas, ainda não há um sistema robusto para essa identificação.

1.5.5.4 Genes da via biossintética de aflatoxinas: polimorfismos e expressão