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2 R EVISTA DA L ITERATURA

6.1 Metodologia

O presente trabalho objetivou avaliar a topografia de restaurações realizadas através da técnica do Tratamento Restaurador Atraumático com emprego de dois materiais diferentes: um cimento de ionômero de vidro, Fuji IX®, e um cimento de óxido de zinco e eugenol reforçado, IRM®. Para tanto, optou-se por um estudo clínico que, como tal, apresenta dificuldades inerentes a qualquer pesquisa in vivo, mas, em contrapartida, permite apreciações mais reais dos fenômenos intrabucais.

A seleção da amostra pode ser citada como uma das primeiras dificuldades durante a realização deste trabalho. Quanto ao número, realizou-se uma tentativa de cálculo amostral (POCOCK, 1993), porém as fórmulas matemáticas e estatísticas demonstraram que seria necessário número inviável de restaurações. Portanto, optou-se pela seleção de amostra sem a preocupação com um número pré-determinado e, sim, respeitando os critérios de inclusão e exclusão, obtendo- se, ao final, amostra viável do ponto de vista clínico.

A obtenção de 98 restaurações só foi possível pela inclusão de 3 diferentes locais de atendimento, visto que os indivíduos participantes do estudo pertenciam a grupo específico da população, o qual possui acesso à água proveniente de abastecimento público e a dentifrícios fluoretados. Assim, a maioria dos participantes não apresentava alto índice de cárie, fato esse que diferencia o presente trabalho dos demais encontrados na vasta literatura acerca do ART, os quais são constituídos de pesquisas em campo, porém, em sua maioria, direcionados a populações extremamente desfavorecidas (PHANTUMVANIT et al., 1995a ; PHANTUMVANIT et al., 1995b; PHANTUMVANIT et al., 1995c; PILOT et al., 1995; FRENCKEN, MAKONI & SITHOLE, 1996; LUO et al., 1999; MICKENAUTSCH et al., 1999; LO et al., 2001).

Além disso, não foi possível padronizar o tamanho das cavidades cariosas, bem como sua profundidade, o que gerou grande variabilidade nas dimensões das restaurações e, de alguma forma, pode ter influenciado os resultados obtidos. Entretanto, tendo em mente a proposta do ART de promover saúde bucal para populações carentes, estudos que avaliam o desempenho clínico desse tipo de restauração não podem desconsiderar as necessidades de tratamento destes grupos. Fatores éticos e humanistas inviabilizam a seleção de cavidades com tamanho e profundidade padronizados, visto que esta seleciona indivíduos que possam efetivamente garantir o sucesso da técnica curativa em questão, enquanto exclui pacientes que apresentam necessidade real de tratamento (VENTIN, 2001). Oliveira (2000) já havia levantado esse questionamento. Em seu estudo, não se selecionaram casos para a execução da técnica, o que juntamente com outros

fatores contribuiu para que seus resultados fossem inferiores aos demais publicados na literatura (FRENCKEN et al., 1994; FRENCKEN et al., 1996; MALLOW, DURWARD & KLAIPO, 1998; LUO et al., 1999). Outros estudos também demonstraram essa preocupação, não tendo sido fixado limite para o tamanho e/ou profundidade da restauração (HOLMGREN et al., 2000; LO & HOLMGREN, 2001). Ainda quanto a esse aspecto, Mallow, Durward & Klaipo (1998) não encontraram diferença estatisticamente significante na taxa de sucesso das restaurações realizadas com Fuji II® e acompanhadas por 3 anos, quando o diâmetro e a profundidade das cavidades foram investigados.

Após a seleção dos pacientes e a instituição do tratamento, a pesquisa ainda encontrou outra dificuldade relacionada às consultas de revisão, necessárias para avaliação direta das restaurações e para a realização das moldagens seqüenciais de acompanhamento. A falta de assiduidade constituiu problema em alguns casos, pois levou à exclusão de alguns pacientes, a qual gerou amostras que possuíam apenas a réplica inicial. E, ainda, devido à falta de assiduidade, outras tiveram menor tempo de acompanhamento do que o previsto, contribuindo para a subdivisão da amostra em grupos de acordo com o tempo de observação (Grupos 1, 2 e 3). Assim, como em outros trabalhos, a perda de pacientes ao longo do tempo mostra-se como influente variável sobre os resultados finais (WENDELL & VANN, 1988; MALLOW, DURWARD & KLAIPO, 1998; FRENCKEN, MAKONI & SITHOLE, 1998; OLIVEIRA, 2000; LO & HOLMGREN, 2001).

O Fuji IX® é um cimento de ionômero de vidro especificamente desenvolvido para o ART (DAVIDSON & MJÖR, 1999; FRENCKEN & HOLMGREN, 2001), já

testado em uma série de estudos (FRENCKEN, MAKONI & SITHOLE, 1998; MICKENAUTSCH et al., 1999; LUO et al., 1999; LO et al., 2001). A utilização do IRM® na prática do ART, porém, não constitui procedimento muito comum, só figurando na literatura consultada na pesquisa de Oliveira (2000). A utilização desses dois materiais no presente estudo teve o intuito de confrontar um “padrão- ouro” para o ART (Fuji IX®) com material de eficácia comprovada historicamente (IRM®) e custo, mais adequado para a situação do sistema público de saúde de países em desenvolvimento, como o Brasil.

A perda da forma anatômica está relacionada ao desgaste, podendo o critério USPHS, estabelecido para a forma anatômica, ser empregado na análise direta do mesmo (STUDERVANT et al., 1986), como efetuado neste estudo. Cehreli & Altay (2000) também consideraram o critério de forma anatômica do USPHS como avaliação do desgaste de restaurações, ao trabalhar com compômeros.

Observações clínicas diretas não têm sensibilidade suficiente para identificar o desgaste de restaurações em dentes posteriores, principalmente nos estágios iniciais do mesmo (BOKSMAN et al, 1986; VANN, BARKMEIER & MAHLER, 1988). O uso de métodos indiretos permite avaliação mais sensível, possibilitando a quantificação do desgaste, como já havia sido proposto por diversos autores (LEINFELDER et al., 1986; STURDEVANT et al., 1986; CEHRELI & ALTAY, 2000). A associação entre métodos parece ser o caminho para os trabalhos que se propõem estudar o desgaste das restaurações ao longo do tempo (LEINFELDER et al., 1986). Smales & Yip (2002) sugeriram o emprego do USPHS

associado a algum método indireto, para a avaliação de programas que envolvam o ART.

A partir de réplicas é possível quantificar a perda da forma anatômica, seja pela comparação com escalas pré-determinadas (LEINFELDER et al., 1986; LO et al., 2001; YIP et al., 2002a), seja com o auxílio de uma sonda periodontal milimetrada (LUO et al., 1999; HO, SMALES & FANG, 1999). A quantificação da área da restauração pode ser considerada como outra opção para o acompanhamento do comportamento clínico das restaurações, no que tange ao desgaste sofrido ao longo do tempo.

Para calcular as áreas restauradas optou-se pelo Programa Image Pro Plus®, o qual, juntamente com o sistema Auto Cad®, tem sido usado na pesquisa odontológica (BENSON, PENDER & HIGHAM, 2000; PRIMO, 2000; NEVES, 2001; VENTIN, 2001). Como qualquer outro método que depende do operador, não apresenta exatidão de resultados, porém mostra-se bastante eficaz.

Apesar de o coeficiente de correlação intraclasse obtido (0,78) ser considerado bom, é necessário entender que tal índice é medida meramente estatística, podendo não representar o real significado clínico. Torna-se necessário esclarecer que havia grande variabilidade entre as 2 medições realizadas para as 66 amostras selecionadas aleatoriamente. Como o coeficiente de correlação intra-classe é definido a partir da divisão da variabilidade entre as medidas pelo somatório das mesmas com a variabilidade dentro das medidas, é extremamente prudente acreditar que a grande variabilidade entre as medidas

sugere tendência a obter-se índice alto. Provavelmente, no presente estudo, isso se somou à presença de restaurações de diferentes tamanhos.

Para explicar a grande variabilidade encontrada nas repetições, é possível levantar alguns questionamentos. Optou-se pela confecção das réplicas em resina epoxídica, por esse material apresentar maior reprodutibilidade que o gesso pedra melhorado, o qual só é capaz de reproduzir fendas de grandeza maior que 0,050 mm (ANSI/ADA, 1989). A resina epoxídica, apesar de constituir material extremamente fidedigno, apresenta coloração âmbar, o que dificulta a obtenção de contraste. A metalização das amostras foi realizada no intuito de diminuir a dificuldade de visualização da área restaurada, entretanto essa não foi suficiente para eliminar a falta de contraste. Seria interessante, para estudos futuros, que o operador pudesse ser auxiliado por uma imagem clínica do elemento restaurado. A utilização destas incorreria, porém, em problema, devido à dificuldade em padronizar requisitos para as fotografias realizadas in vivo, tais como distância e angulação fixas. Segundo Benson, Pender & Higham (2000), pode haver sub ou super-estimação da área mensurada, dependendo do ângulo em que a máquina fotográfica for posicionada.

A opção de realizar várias mensurações de uma mesma réplica resultou do esforço para se chegar a valor mais próximo do real, como recomendado pela Lei dos Grandes Números (MEDRONHO, 2002). Assim, o presente trabalho apresentaria maior confiabilidade dos resultados e conclusões se fossem utilizadas as médias de várias medições, ao invés de valor único obtido em um só momento.

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