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Paulo II em outubro de 2000" Casa de frei Galvão, Guaratinguetá

CAPÍTULO 2 – OS MILAGRADOS POR OUTROS

2.4 O milagre de Sandra e seu filho Enzo

Se anjos existem e são como os pintaram os renascentistas, o menino Enzo de Almeida Gallafassi, 7 anos, bem poderia passar por um. Tem bochechas rosadas, cabelos claros (mas sem cachos) e olhos verdes.

A reforçar a imagem ainda há uma ocorrência tida como divina: ele é o fruto do segundo milagre atribuído ao frei Galvão, aquele que consumou a canonização do santo brasileiro.

A mãe de Enzo, Sandra Grossi de Almeida, 37, tem má-formação do útero e, antes de dar à luz, sofreu dois abortos espontâneos, um deles de gêmeos.

Tomou pílulas do frei Galvão durante a terceira gravidez, novamente atribulada e de alto risco. Enzo nasceu prematuro e com problemas pulmonares.

Hoje é saudável. Bastam alguns minutos de contato para, da aura sagrada, escapulir um garoto próximo do que mesmo católicos praticantes chamam candidamente de diabinho, irrequieto, esperto e sempre com respostas desconcertantes.

Alvo certo da mídia nesses dias carregados de religiosidade, o menino-milagre tem tido uma agenda cheia. Veículos de várias partes do mundo querem contar a sua história.

Para a mãe, essas aparições todas são como uma missão irrevogável: "Sei que minha família foi escolhida para representar um povo inteiro. Então, tenho o compromisso comigo mesma de mostrar meu caso".

Para o garoto, é um saco. Indagado sobre o que tem achado de tantas entrevistas, diz somente "chato", e logo sorri. Quando o tema é futebol, Enzo conta que, além do Palmeiras, torce para a Itália, terra dos ancestrais dos pais. E por quê? "Porque o Brasil é ruim."

Está adiantado na escola. Cursa o terceiro ano do ensino fundamental (antiga segunda série) num colégio de classe média em Brasília, onde a família, paulistana, vive há quatro anos e meio. Ele se destaca numa turma de 25 alunos. "O Enzo é superinteligente. Em matéria de domínio de assunto, é o primeiro de sua classe", comenta a professora Kênia Cristina de Queiroz.

O desafio é tentar tratar normalmente uma criança que, de repente, foi cercada de mesuras e holofotes. Após uma das primeiras aparições na TV, a classe o aplaudiu quando ele entrou no dia seguinte. Na última segunda, muitos o cumprimentaram pela reportagem exibida no "Fantástico" da véspera. A professora diz que ele fica tímido. "Preparo a turma [para encarar com normalidade], e tento explicar, sem entrar em detalhes, por que é famoso".

Num terreno intangível mesmo para adultos, não é fácil. No início, [os colegas] diziam coisas como "Enzo, que legal, você nasceu", relembra Kênia.

A reportagem conversou com um aluno de turma de Enzo, que disse saber da maratona de entrevistas do colega, mas não soube responder o motivo. Informado pelo repórter, exclamou: "Sério? Que doido".

Todo o resto é normal. Enzo largou o piano e o judô; faz aulas de basquete e de futsal. Adora videogame, especialmente os jogos Need For Speed Underground 2 e Fifa-2007.

Ainda não fez a primeira comunhão. Os pais esperam que ele receba a hóstia inaugural de Bento 16 na missa de amanhã no Campo de Marte, quando frei Galvão será canonizado. "Vamos ver se vai dar certo", diz Sandra. De um coisa Enzo está convicto, caso fique cara a cara com o pontífice: o que gostaria de pedir a ele. "Um Hot Wheels", diz, citando a marca dos minicarrinhos de ferro. Aliás, mais um para sua coleção, que, diz ele, soma 132. (VICTOR, 2007).

A começar pelo título da reportagem, o garoto do primeiro milagre vira “celebridade instantânea”. Provavelmente, muito mais que Daniella, até porque o processo em questão, o da canonização, implicava no nascimento do menino Enzo e na plena recuperação de sua mãe, Sandra. E outro ponto é que o destaque a ele foi mais marcante até porque a beatificação, da qual participou Daniella, se deu fora do Brasil e, por conseguinte, foi essa celebração menos trabalhada pela imprensa nacional. Por sua vez, a canonização de frei Galvão, como já visto, implicou em um evento de grande monta, com a vinda de um papa ao Brasil, foi todo ele

estruturado não só para a canonização, mas porque a Igreja intentava atingir outros pontos e discussões durante a visita de Bento XVI. E a cerimônia da santificação tinha seus personagens no palco: representantes do clero, artistas famosos, familiares, políticos e, claro, os milagrados. E Enzo não poderia faltar.

A reportagem até destaca uma possível aura de santidade que paira sobre a vida e a história do “menino-milagre”. No entanto, indica também caracteres humanos e normais no comportamento de uma criança, como o gosto por brincadeiras. E nesse sentido faz questão de lembrar que todo o ambiente anterior à canonização era cansativo, “um saco” para o menino, fator que a reportagem grifa no intuito de apontar que, muito provavelmente, o menino não compreendesse o significado do que acontecia.

A adjetivação dada pelo repórter, “menino-milagre”, contudo, não exime uma associação da figura de um anjo a Enzo. Diferente da situação de Daniella – que na canonização tinha para si mais claro o que ela representava – Enzo, mais pueril que ela, representa um papel mais angelical, ingênuo até no noticiário do período. E para isso, provavelmente, contribua a mãe, que declara se sentir responsável, dotada de uma missão, compromissada com o papel de serem ela e o filho porta-vozes do acontecido.

E, por fim, a notícia menciona a primeira eucaristia de Enzo. Isso também direciona para a compreensão de que a canonização, mais do que um evento para o frei, era em si uma grande cerimônia para o público espectador, no qual se exaltavam também os personagens ligados à memória do primeiro santo brasileiro. E não só a primeira comunhão de Enzo foi marcante no período. Dias antes da canonização, Sandra e seu esposo fizeram o casamento religioso no mosteiro da Luz, em São Paulo.

Passados sete anos, quatro meses e 25 dias desde o nascimento de Enzo de Almeida Gallafassi, os pais dele, Sandra Grossi de Almeida e Cesar Augusto Gallafassi, subiram anteontem à noite ao altar da capela do mosteiro da Luz (centro de São Paulo) para receber o sacramento do matrimônio. Sandra, Cesar Augusto e Enzo são a família agraciada com o segundo milagre atribuído ao frei Galvão – foi a "comprovação" desse milagre pelo Tribunal Eclesiástico que permitiu a canonização do religioso (o primeiro nascido e criado no Brasil). Apenas quatro dias separaram a cerimônia de casamento da chegada de Bento 16 ao Brasil, na quarta. A família deve se apresentar diante do papa na missa que acontecerá no Campo de Marte, cenário da canonização do frei. Foi uma celebração íntima. Testemunharam-na 66 amigos e parentes. A noiva vestia um longo branco, símbolo da pureza virginal. Nas mãos, uma rosa vermelha fazia as vezes de buquê. Dois passos à frente, ia o pequeno Enzo, sorridente dentro do meio-fraque. No altar, o pai – vestido como o filho – chorava.

Os noivos, que moram em Brasília, onde Cesar Augusto é sócio de uma editora, fizeram questão de que o casamento acontecesse no mosteiro da Luz, fundado por frei Galvão em 1774. Segundo a igreja, o nascimento de Enzo (em 1999, depois de uma gravidez de alto risco) só foi possível por intercessão miraculosa do frei - por causa de uma anomalia uterina, três gestações anteriores tinham terminado em abortos espontâneos.

Na hora da troca das alianças, foi o filho quem as entregou aos pais, ao som de "Jesus Alegria dos Homens", de Bach. Depois da bênção do padre Armênio Nogueira, a noiva desceu do altar amparada pelo marido e por Enzo. No caminho, fez questão de se abaixar para depositar a rosa vermelha sobre a pedra do túmulo do frei Galvão.

Sandra diz que não teve nada a ver [a escolha da data do casamento] com a visita do papa. "Foi uma homenagem a meus pais, que se casaram no mesmo dia". “Mas vocês já estão juntos há bastante tempo, não é?”, perguntou a Folha. Não houve resposta (CAPRIGLIONE, 7/05/2007).

Novamente, a reportagem identifica a família como sendo agraciada, ao passo que na sequência menciona a comprovação do milagre entre aspas. Não acata, nem nega o fato. Porém, a partir do momento em que tais fatos ligados à família de Enzo são noticiados pela imprensa, no mínimo essa contribui para evidenciar e notabilizar as pessoas que estão intimamente ligadas à figura de Antonio Galvão de França.

A notícia dá espaço para o diálogo sobre o casamento dos pais de Enzo. A mãe nega a relação entre seu casamento e a canonização, cinco dias depois. Porém, o que a Folha de S. Paulo faz é tentar mostrar que não é tão desconexa a relação. Os pais se casam na capela do mosteiro – onde o frei está enterrado – com o filho como padrinho das alianças, e chama a atenção para o fato de a união se dar dias antes da chegada do papa. Fica evidente que a reportagem quis salientar uma correlação entre os eventos. Sem querer divagar sobre a opinião dos milagrados citados pelo jornal, todavia advém uma tentativa, por parte de Sandra e César, de oficializar, de sacramentar a união deles, devido à responsabilidade que creem ter na canonização de frei Galvão.

No entanto, a explicação da noiva é outra. Diante da indagação da repórter sobre há quanto tempo estavam juntos, ela e seu esposo, não houve resposta. E ela não responde, muito provavelmente porque, talvez, essa resposta implicasse no fato de ela ter que reconhecer que seu casamento não era reconhecido até então pela Igreja, apesar de ser ela mãe de um milagrado. Em contraposição, fica que ao se casaram em público, talvez não se importassem com tal fato, ou seja, se mesmo sendo eles – Sandra e o esposo – pais de um milagrado – não fossem ainda casados na cerimônia religiosa.

A participação de frei Galvão na vida dessa família será para sempre, provavelmente, assim como eles estão também a ele associados, como mostra a fotografia abaixo de um quadro exposto na Casa de frei Galvão, em Guaratinguetá. O menino se apoia no ombro da mãe, que segura uma pequena estátua do frei, que está ao fundo, a abençoá-los, rodeado por uma aura de luz, que sempre remete a uma ideia de santidade e de algo sublime.

Ilustração 23 – Quadro alusivo ao duplo milagre: gravidez de Sandra e nascimento de seu filho Enzo. Casa de frei Galvão, Guaratinguetá

Esse quadro foi pintado com base em uma fotografia que saiu na revista Veja (2007a). A cena é a mesma, só não tem o frei ao fundo os abençoando. Porém, a pose da mãe e do filho, a imagem nas mãos, o fundo azul – que lembra a catedral de Brasília – é idêntico ao da fotografia dessa revista semanal.

A mesma cena foi escolhida talvez por ser uma fotografia preparada para demonstrar a fé de ambos no seu protetor, além de ter circulado em uma fonte jornalística de grande monta no país, dando assim mais credibilidade e mais confiança no depoimento deles, que são testemunhas da presença constante do frei em suas vidas.

Mister reforçar essa questão porque a reportagem quis salientar essa ideia para o leitor: o menino Enzo, apesar de ser extremamente ligado a uma causa religiosa, tem pais que não são casados na Igreja a qual se ligam. Retomando o milagre, para a postuladora, o que houve na canonização foram dois milagres. Vale retomar a fala da irmã Célia a respeito. Ela conta como foi a seleção do milagre e a conclusão do caso:

Irmã Célia: E vou pra esse médico pra ele dar uma olhada. Então eu fui, o consultório dele não é

longe, aí ele começou, “esse é fraco, esse é fraco”, bom eu disse, quanto não né? Me dá o quinto. Aí ele disse, “esse é bom. Só que falta documentação”. Eu sei. Esse aqui? Tinha mais um, que era esse. “Também é bom, só falta documentação”. Aí eu saí de lá e fui no consultório da doutora Vera Lúcia. Levei 3 horas pra ser atendida. Me atendeu 10 da noite, porque o consultório dela é assim, né? Aí, ela me disse, eu disse, “doutora, eu sei que é tarde, amanhã de manhã a senhora não me permite a moça fazer xerox do material que a senhora tem aqui?” É da Sandra. Aí eu disse, “a senhora acha que aquele caso é bom pro Vaticano?” “Ótimo. É, milagre, acho que aquela menina [Sandra] devia ter morrido”. Aí no dia seguinte fui lá, né, a moça me fez, aí fui no hospital... pedir, não dá pro senhor me dá hoje, mas se não puder o senhor me dá amanhã. Queria pagar, não, a senhora não paga. Aí encontrei com o diretor, falei com ele, falei “olha, tem um caso bonito, vai entrar no Vaticano”. Ah é? Agora tô atrás de documentação, mas depois preciso de carimbo...aí, no dia seguinte de tarde, eu voltei nesse mesmo médico, que trabalha junto na clínica, ele é clínico-geral e pediatra, a outra senhora é ginecologista né? Então eu tinha o pão e o queijo né. Aí, ele falou, não te disse que era bom? Chamou a médica, aqui, aqui, o caso é bom, aí, que eu fiz, dei um pulinho até Roma né?

Entrevistadora: Quantas vezes a senhora foi?

Irmã Célia: Eu atravessei o Atlântico 61 vezes. Ta, aí então, aí eu telefonei pro meu médico, né, eu

disse doutor o senhor está em causa esse semana? Estou, porque eu queria marcar uma consulta...Aí, ta bom, aí eu cheguei lá, telefonei, tá bom, 3 horas da tarde. Porque ele descansa depois do almoço, aí eu fui lá, levei esses casos, mas levei só quatro, limpei isso aí, né? No avião, eu já fui pondo tudo no italiano, né?...Aí ele viu, esse caso é bom, esse caso é bom, eu já vou estudar e já faço as minhas perguntas médicas...quando abriu a porta da casa dele ele falou, due milagre, due milagre, o da mãe e o da criança. Aí eu fui, me deu uma coisa, né? Aí, depois ele disse, não, não tinha miracolo, temos due miracolo! Aí ele me fez as questões, a primeira parte a senhora sabe fazer, a da invocação também... (cf. APÊNDICE B).

E se são dois milagres, então, Sandra é milagrada também. Talvez fosse esse o motivo que provocou nela e em seu marido a iniciativa de se casar perante um padre. Irmã Célia retoma o tema da construção de um processo de canonização. Na sua fala, ela aponta ao menos dois médicos que procurou em São Paulo, para buscar documentos que pudessem provar, para o Vaticano, que o caso de Sandra e Enzo se tratava de um milagre. E, depois, já na Itália, ela novamente recorre a um médico – esse trabalha para o Vaticano – e ele informa- lhe que ali se tem dois milagres, não um apenas. O papel da irmã Célia é arregimentar o máximo de documentos que puder para apresentar para a Congregação para as Causas dos Santos, em Roma. Para o Vaticano, esses documentos servem como provas e relatos afirmativos da existência do milagre e mais que isso, retoma-se a discussão já feita no primeiro capítulo de que, nesse momento, a Igreja utiliza-se da ciência para dar a característica de naturalidade ao fato, de oficial, de espontâneo e orgânico.

Finalmente, o que se apreende das reportagens que trouxeram à baila os relatos dos milagrados conhecidos, como Daniella e Sandra e Enzo, é que tais fatos são milagres aos olhos da Igreja, ou de parte dela. Há quem conteste – como médicos contestaram o caso de Daniella; há quem os veja como testemunhos vivos de santidade, enquanto outros neles identificam mais fatores comuns do que caracteres que os distingam como seres especiais.

Todo milagrado, na imprensa, foi tratado como uma celebridade momentânea. Os jornais e revistas traziam os fatos e davam argumentos para o leitor pensar e refletir, aceitar ou não frei Galvão como santo. Na constituição da memória e na construção da imagem de frei Galvão para o público são importantes os relatos dessas pessoas que crêem ter vivido uma experiência espiritual que os aproxima do frei. Torna-se inevitável, para a compreensão do imaginário, entender que, se não fossem Daniella, Enzo e Sandra, poderiam ser outros os milagrados. Mas, hoje, a Igreja alicerça os seus processos em cima de testemunhos reais e vivos os quais são porta-vozes de suas próprias experiências de graça e de milagre.

A fala dessas pessoas e a reprodução de muitas delas na imprensa ajudam a definir um perfil de milagreiro em torno de Antonio Galvão França; reforçam a aura de um homem santo e bom, que atende aos pedidos de grávidas, bem como cura meninas gravemente doentes, além de todos os outros relatos que a memória registrou, que o associam à figura de um homem dotado de dons espirituais e sobrenaturais.

E, há, por fim, uma passagem da vida do frei que foi salientada pela imprensa, em especial, após a canonização, que era sua dedicação à construção, edificação de prédios. No dia 25 de outubro de 2008, o jornal O Globo trouxe a seguinte matéria:

SÃO PAULO – Hoje é o dia do primeiro santo brasileiro, São Frei Galvão. Como parte das homenagens, o Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de São Paulo (Crea- SP) vai conferir ao frei o título de Honoris Causa de Engenheiro e Arquitetura.

Segundo o capelão do mosteiro, Armênio Rodrigues Nogueira, mesmo sem ter feito engenharia, o frei teve contribuição ativa no projeto e na construção do Mosteiro da Luz, na região central da capital. Além disso, o santo é patrono da construção civil desde 2000. Por isso a homenagem. – É muito bonito ver uma entidade civil dando um título para um santo. Ficamos muito honrados – conta padre Armênio.

A cerimônia de entrega vai acontecer no final da missa do meio-dia, no Mosteiro da Luz. São esperadas cerca de 4 mil pessoas ao longo do dia no local. Serão realizadas missas durante o dia inteiro, a cada duas horas. A primeira celebração acontecerá às 8h.

Para acompanhar a entrega, será instalado um telão do lado de fora da igreja. O dia termina no mosteiro, com uma procissão seguida de queima de fogos em homenagem ao santo. Segundo Armênio, as irmãs do mosteiro produziram número suficiente das famosas pílulas do santo para atender toda a demanda deste sábado.

– As irmãs, com certeza, produziram um tanto a mais para atender a todos os fiéis do santo – explica. Na igreja de Frei Galvão, em Guaratinguetá, terra natal do santo, haverá missas, procissão e até um show da banda Acauã, no fim do dia. No domingo, como encerramento das festividades, está programada uma carreata para o santo. (FERREIRA, 2008).

O destaque dado pelo jornal tangencia especialmente a atribuição de um título que é conferido a um santo a alguém já falecido. Não questiona o gesto, mas aponta que essa era uma forma de, no dia dele, dar mais valor e conferir mais notoriedade ao primeiro santo brasileiro. Além do que o reconhecimento da participação dele na construção do que é um dos prédios mais antigos da capital paulista demonstra um frei que punha a mão na obra,

participava, trabalhava. Não só um frei bondoso e generoso, mas um santo que trabalhou, que construiu, colaborando na edificação de obras pertencentes à Igreja Católica.

Essa característica do frei trabalhador, assim como outras já demonstradas, está exposta na Casa de frei Galvão, em Guaratinguetá, no Vale do Paraíba. A plaqueta abaixo do quadro diz: “Frei Galvão, arquiteto e operário”. É uma cena na qual se remete à construção do frontispício do Mosteiro da Luz. Ao seu lado estão duas freiras e alguns operários, todos negros, provavelmente escravos, que são os que realmente estão carregando material, baldes da cabeça, batendo estacas, trabalhando na cena retratada no quadro. Nas mãos do frei há uma enxada, gesto que aponta sua participação como um homem que arregaçava as mangas e ia à labuta; colocava as mãos na obra.

Ilustração 24 – Quadro que retrata frei Galvão e sua participação na construção do Mosteiro da Luz. Casa de frei Galvão, Guaratinguetá.

Noutro ponto fica a importância de se celebrar o dia dele. A reportagem aborda como em São Paulo e em Guaratinguetá se preparavam eventos, carreatas, missas, produção de pílulas, para dar conta dos devotos que acorreriam a esse lugar no dia 25 de outubro. Gestos como esse – qual seja, o de anualmente celebrar o dia do santo, e no caso dele, a igreja, às vezes, o celebra também em maio, devido à canonização – são uma maneira de não só realimentar a memória, mas abre-se espaço para que novos elementos constituam essa memória historicizada. Nesse sentido, juntamente com os recortes que a história já vinha efetuando para reconstruir essa colcha de retalhos que conta quem é Antonio Galvão de França, se alinhava a ideia de que ele era um protetor dos engenheiros.

Ilustração 25 – Placa alusiva à fundação do Mosteiro da Luz por frei Galvão. Mosteiro da Luz, São Paulo.

Fica desse gesto o fato de que qualquer prática ou atitude realizada por um santo é