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Modelo pedagógico e modelo curricular

CAPITULO III – DO CURRÍCULO AOS MODELOS CURRICULARES

3.4. Modelos Curriculares para a Educação Pré-Escolar

3.4.1. Modelo pedagógico e modelo curricular

Numa abordagem ampla, o conceito de modelo permite, segundo Oliveira-Formosinho (2002, p.20), compreender os elementos e as dinâmicas de um sistema – quer o sistema seja um modo de ensinar, de supervisionar ou de gerir uma organização. Dando relevância ao sistema como um modo de ensinar, o modelo surge, como uma estrutura que nos ajuda a simplificar e a organizar a prática educativa servindo como “um padrão ou plano de assunções e comportamentos a serem imitados” (Oliveira-Formosinho, 2002, p.21). Importa, contudo, clarificar que a pedagogia da infância se organiza em torno de três pólos indissociáveis: 1) saberes e teorias; 2) crenças e valores e 3) ações práticas. Esta triangulação permite “convocar crenças e valores, analisar práticas e usar saberes teóricos, constituindo um movimento triangular de criação de um «espaço ambíguo»

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- o espaço da pedagogia – que nos reenvia para uma triangulação praxiológica” (Oliveira- Formosinho, 2007, p.14). Esse referencial teórico que permite combinar um quadro de valores, uma teoria e uma prática é o modelo pedagógico, na medida em que “permite concretizar no quotidiano do terreno uma práxis pedagógica” (Oliveira-Formosinho, 2007, p.29). Para Ataíde (1986, p.26), os modelos pedagógicos são:

conjuntos coerentes de referências nas quais assentam o trabalho do educador e a relação pedagógica; não são guias, receituários nem manuais, ou se o forem, deixam talvez de ser pedagógicos e passam a ser apenas modelos. Acima de toda a base teórica ou teorizada, está o educador-pessoa e as crianças-pessoas, como sujeitos da relação educativa. As reações das crianças por um lado, o espírito crítico e as convicções do educador, por outro lado, permitem avaliar e corrigir constantemente o processo. O eco das famílias, a opinião interessada dos colegas, o próprio poder de reflexão dos educadores são fatores essenciais, qualquer que seja o modelo pedagógico ou o estilo de trabalho seguidos. (…) Os conhecimentos, a experiência e a maturidade de cada educador, aliados a um profundo desejo de contribuir para o progresso de todas e de cada uma das suas crianças, são os requisitos que irão assegurar o êxito do modelo pedagógico que ele escolher em cada etapa da sua vida pessoal e profissional.

O modelo curricular permite que se elaborem um conjunto de orientações (gerais e específicas) referentes à prática educacional. Constituem dimensões curriculares o espaço, os materiais, o tempo, as interações, a observação, o planeamento e avaliação das crianças, os projetos e atividades e a organização e gestão dos grupos. A inter-relação entre as várias dimensões, a conexão destas com as áreas curriculares integradas, as interfaces da escola com a comunidade constituem o modo de organização e orientação de um modelo curricular. Neste sentido, Oliveira-Formosinho (2007, p.30) define modelo curricular como “ um importante andaime para apoiar o professor na procura de um quotidiano com intencionalidade educacional, em que as

crianças envolvam-se, persistam, aprendam e desenvolvam um habitus para aprender” e

Formosinho (2013, p.16) atribui-lhe o objetivo de “integrar os fins da educação com as fontes do currículo, os objetivos com os métodos de ensino e estes métodos com a organização do espaço e do tempo escolar”.

Na área da educação de infância, o conceito de modelo curricular é, para Serra (2004, p.39), “uma estrutura concetual ideal que está na base de todas as tomadas de decisão curricular que se vão processando ao longo do desenvolvimento de determinado currículo.” Os modelos curriculares tomam como ponto de partida diferentes visões de criança, de aprendizagem, de currículo e sobretudo diferentes aceções de jardim-de-infância. Neste sentido, Spodek e Brown (1996, p.15) entendem modelo curricular como

uma representação ideal de premissas teóricas, políticas, administrativas e componentes pedagógicas de um programa destinado a obter um determinado resultado educativo. Deriva de teorias que explicam como as crianças se desenvolvem e aprendem, de noções sobre a melhor forma de organizar os recursos e oportunidades de aprendizagem para as crianças e de juízos de valor acerca do que é importante que as crianças saibam.

Assim, um modelo curricular sustenta e serve de base às práticas educativas proporcionando, aos educadores, práticas diversificadas de ensino-aprendizagem: “o modelo curricular é uma gramática que cria linguagem, significados, uma estrutura concetual e prática, um contexto de experiência e comunicação com a experiência, um contexto de ação e reflexão” (Oliveira-Formosinho, 2007, p.31).

As concetualizações em torno dos modelos pedagógicos e modelos curriculares em educação de infância são objeto, desde há algum tempo, de abordagens que enformam diferentes olhares e raízes teóricas atravessando os modelos curriculares várias fases distintas. Segundo, Spodek e Brown (1996, p.42), numa primeira fase os modelos baseavam-se numa visão intuitiva da natureza da infância e das crianças e eram alicerçados em “pressupostos explícitos sobre a natureza do conhecimento e de como o conhecimento podia ser adquirido pelas crianças”. Numa segunda fase, dá-se início à influência do conhecimento científico do desenvolvimento e aprendizagem da criança na educação de infância. Foi Maria Montessori a sua percursora, assentando no pressuposto de que o “primado da autoeducação da criança levava a educadora da escola Montessori a assumir uma função de ensino indireto, preparando o meio e demonstrando o uso dos materiais” (Spodek & Brown, 1996, p.20). Numa terceira fase (anos 60 e 70), foi visível a criação de modelos alternativos que refletiam uma variedade de teorias do desenvolvimento e objetivos programáticos, caraterizada também pela ênfase colocada nas variações a considerar nas planificações e em diferentes visões sobre o tipo de conhecimento que é mais útil para as crianças. Segundo Spodek e Brown (1996, p.42), poderíamos considerar o cenário atual da educação de infância como representando uma quarta fase porque “apesar das iniciativas de desenvolvimento curricular continuarem, não estão a ser desenvolvidos quaisquer novos modelos curriculares”, uma vez que a mudança de padrões e as variações no interior de um modelo tendem a que os professores não sejam consistentes com a teoria que adotam, sendo influenciados por elementos do âmbito do seu contexto escolar. Segundo Spodek e Brown (1996, p.43) estas influências incluem as necessidades de gestão da sala de aula e as exigências impostas pelos sistemas escolares que, muitas vezes, estabelecem objetivos e avaliam a aprendizagem fora do modelo.

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Para além desta visão, os modelos pedagógicos atuais poderão ser analisados segundo duas linhas orientadoras: os seguidores de uma linha essencialmente comportamentalista e os seguidores de uma linha essencialmente construtivista. Os primeiros (Watson, Thorndike, Pavlov) centram os seus estudos nos comportamentos, atos e reações observáveis da criança; os segundos (Piaget) consideram que o conhecimento é construído pelo próprio, sendo essa construção alicerçada no desenvolvimento de estruturas internas. A compreensão dos modelos curriculares poderá ser compreendida, ainda, pela abordagem teórica ou prática, isto é, 1) os modelos construídos a partir da prática pedagógica e 2) os modelos elaborados a partir de uma teoria. Relativamente aos modelos construídos a partir da prática pedagógica enquadram-se o “modelo lúdico de Froebel, o científico de Montessori, o progressista de Dewey, o global de Decroly, o personalista de Faure, a escola nova e a escola moderna de Freinet” (Castilho, 2011, p.74). Estes modelos preocupam-se em encontrar um suporte teórico que sustente a prática, assim como, explicar os valores filosóficos que lhe servem de fundamento.

Enquadram-se nos modelos elaborados a partir de uma teoria o modelo maturacionista, o modelo comportamentalista e o modelo cognitivista. Segundo Castilho (2011, p.74) o “modelo maturacionista tem a sua raiz na psicologia dinâmica considerando o desenvolvimento socio emocional da criança como a principal finalidade da educação de infância” assumindo a criança o centro do currículo – pedagogia de situação. O modelo comportamentalista encontra fundamentos na teoria behaviorista, focando-se na aquisição de competências académicas, isto é, os educadores propõem atividades prescritas num programa – modelo João de Deus. O modelo cognitivista baseia- se, segundo Castilho (2011, p.75), nas teorias psicológicas de desenvolvimento cognitivo, nomeadamente as de Piaget, preocupando-se em compreender a criança, tomando como ponto de referência o seu estádio de desenvolvimento – modelo High/Scope.

Para Castilho (2011, p.75), os modelos são o fio condutor que serve de roteiro para o desenvolvimento de práticas pedagógicas coerentes com as conceções e, simultaneamente, um referencial teórico e prático. Neste sentido, um modelo curricular serve de sustentação para o desenvolvimento da prática pedagógica dos educadores de infância, não havendo “nenhuma contradição entre as orientações curriculares e os modelos curriculares, ou seja, as orientações curriculares nacionais (na educação de infância, como em qualquer nível de ensino) são compatíveis com a adoção e desenvolvimento de modelos curriculares diversos” (Formosinho, 2013, p.21).

Para além dos princípios teóricos e epistemológicos de cada modelo e a sua correspondência com a prática educativa, importa compreender a prática de avaliação e a linha pedagógica inerentes a cada modelo.